Polo pesqueiro chinês em Rio Grande, proposta indecente

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Polo pesqueiro chinês em Rio Grande, proposta indecente

A China abusa da pesca ilegal. Segunda maior economia mundial, a China é a primeira no ranking  da pesca. Mas não pense que se trata de pesca no mar territorial chinês, ou em sua Zona Econômica Exclusiva, ZEE. A China rouba os recursos pesqueiros do mundo. A frota chinesa não respeita fronteiras, invade o mar territorial de outros países sem cerimônia. Suas imensas frotas às vezes passam anos no mar. Elas são reabastecidas por navios tanque, e transferem a carga para navios-fábrica de modo a continuar pescando. Em 2013, a revista científica Nature alertou sobre a pressão excessiva dos barcos  chineses nos oceanos do mundo. Polo pesqueiro chinês em Rio Grande, proposta indecente.

Imagem de pesqueiro chinês sob a mira da Armada Argentina
Pesqueiro chinês sob a mira da Armada Argentina. O país já afundou um destes barcos pescando ilegalmente em sua ZEE. Imagem, defesa net.

Polo pesqueiro chinês em Rio Grande, proposta indecente

Faz tempo que a China namora o Atlântico Sul. Depois de detonar os cardumes da costa atlântica da África, a frota chinesa passou a rondar o Atlântico e o Pacífico Sul. Em 2013 o país iniciou conversas com o governo do Uruguai visando um terminal de pesca. Os chineses queriam uma base de reparo e fornecimento de recursos  para todos os navios da China e Taiwan.

Ambientalistas reagiram de imediato. O mega projeto envolvendo um terminal de pesca foi  apresentado em 2018 no Instituto Uruguai XXI, uma agência do governo com missão de promover e atrair investimentos.

Parece que não deu certo. Agora a China muda a estratégia, e oferece ao governo do Rio Grande a construção de um polo pesqueiro para seus navios. Se a notícia não fosse do site defesa net, não levaríamos a sério. Afinal, nenhum veículo da grande mídia abordou o assunto até o momento em que este post foi escrito.

Assim acontece quando se trata dos oceanos. Infelizmente a chamada ‘grande mídia’ hoje não tem recursos para enfrentar a realidade das redes sociais. Os jornais, TVs e rádios, passaram a ignorar diversos temas, entre eles os oceanos. A prova é esta proposta que, mesmo   indecente, não foi sequer noticiada no País.

É uma pena. O público leigo não tem noção do que se passa.

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O polo chinês em Rio Grande

O defesa net, em matéria exclusiva, diz que o Projeto de Pesca Integrada oferecido para a cidade de Rio Grande e apresentado pela empresa Ample Develop Brazil LTDA implica em investimentos de US$ 30 milhões de dólares para o Estado do Rio Grande do Sul. O primeiro contato foi com a Secretária de Relações Internacionais, a ex-senadora Ana Amélia Lemos.

Imagem de chineses em reunião com o governo do estado do Rio Grande do Sul.
O encontro da Ample Develop Brazil LTDA com a equipe do governo do Rio Grande do Sul. Imagem, defesa net.

Em seguida, diz o defesa net, ‘o secretário do Meio Ambiente e infraestrutura do Rio Grande do Sul, Arthur Lemos, juntamente com o presidente da FEPAM – Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Toessler – Marjorie Kauffmann e o Secretário Adjunto da Agricultura (RS) Luís Fernando, recepcionaram o presidente da Ampla Brazil, Yunhung Arthur Lung e outros diretores da empresa que entregaram carta de interesse de investimento e esboço do projeto’.

Parece fake news mas não é. Infelizmente. O defesa net mostra fotos dos encontros e publicou trechos da carta de interesse. O mesmo site alertou para os perigos aí embutidos desde o título de sua matéria: Chineses oferecem Polo Pesqueiro no Sul do Brasil. Oportunidade comercial ou Armadilha Geopolítica?

O Mar Sem Fim responde: armadilha geopolítica. Não tenha dúvida.

Recursos pesqueiros do mundo pilhados pela China

Este foi o título de uma de nossas matérias em julho de 2020 sobre os maus tratos do país aos mares. Já se tornou rotina apontar a China pela expansão predatória dos oceanos.

No corpo do texto dizíamos que neste mês de julho as manchetes internacionais denunciaram: ‘Galápagos: frota gigante de 260 navios chineses vasculha o oceano’.

Infográfico mostra rota da frota de pesca da China no Atlântico e Pacífico Sul.
A rota da frota de pesca da China no Atlântico e Pacífico Sul. Ilustração, Diálogo Chino.

‘Uma enorme frota de pesca chinesa, com 260 navios, está atualmente navegando em águas internacionais da América do Sul, entre a Zona Econômica Exclusiva do Equador e a Reserva Marinha do Arquipélago de Galápagos’.

Em razão destes ataques, formou-se uma Aliança Sul-americana contra a pesca estrangeira ilegal no Pacífico.

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A pesca chinesa não respeita sequer santuários marinhos de prestígio internacional como Galápagos. E apesar da proposta apresentada ao Rio Grande o site da Ample Develop Brazil LTDA nada diz sobre o projeto.

Imagem de navio de pesca chinês controlado pela Armada Argentina
Mesmo tendo afundado um deles em 2016, dois anos depois eles estavam na ZEE argentina de novo. A foto ilustra matéria do dialogo-americas.com, com a seguinte legenda: ‘Imagen tomada a bordo de un barco de la Prefectura Naval Argentina en 2018, durante una persecución a un buque chino que hacía pesca ilegal. (Foto: Prefectura Naval Argentina)’. Será que é isso que queremos?

É mais um fato estranho deste perigoso enredo.

‘A pesca no Brasil é uma tremenda esculhambação’

A frase acima, entre aspas, foi dita a este escriba quando começávamos a aprender  os problemas da costa brasileira. Ao chegarmos ao Sul do país, Itajaí, em 2007, entrevistamos o na época chefe do CEPSUL, Centro de Pesquisa e Gestão de Recursos Pesqueiros do Litoral Sudeste e Sul, Luiz Rodrigues.

Abordamos vários dos problemas da pesca no país. Os conflitos entre pescadores artesanais e industriais, a pobre biomassa pesqueira da maior parte de nosso litoral, e os já naquele tempo apontados problemas da indústria mundial da pesca.

Pouco antes do início daquela viagem a revista Science havia publicado um estudo que mostrava que a partir de 2048 as populações de peixes e outros animais marinhos ‘entrarão em colapso caso a tendência de pesca e destruição de habitats continue no mesmo ritmo’.

A destruição de habitats é uma das ‘especialidades’ da pesca de arrasto.

A conversa foi interessante e demonstrou como a pesca sempre foi o que ele nos disse em off, ‘uma tremenda esculhambação’. Cada um faz o que quer, e quase sempre vence o mais forte.

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Perde a biodiversidade marinha brasileira

Mas perde a biodiversidade marinha brasileira. De 2007 para os dias atuais, a situação piorou. Já cansamos de mostrar que o que se passa nos oceanos comove pouco o público. E sem pressão da opinião pública persiste a situação de deus-dará no litoral. Seja via a pesca desordenada, e sem estatísticas desde o governo Dilma!, seja sobre a ocupação do litoral.

Para piorar temos hoje um presidente pescador que supõe que a proteção ambiental impede o progresso do Brasil. Agora chega a China para colocar, talvez, a pá de cal que falta ao oferecer um polo pesqueiro em Rio Grande por US$ 30 milhões de dólares.

Se nossa biomassa é pequena, é oportuno saber que os cardumes migratórios, entre eles os de atuns e afins apesar de ameaçados de extinção, ainda são abundantes ao largo da costa brasileira. E atum hoje é uma commodity valiosa especialmente para os asiáticos, mas não apenas.

Pesca de arrasto consta do projeto

É óbvio que a mortal modalidade consta do projeto. Segundo o esboço a que o defesa net teve acesso, é parte do projeto ‘construir uma frota de pesca de arrasto marinho que não deve ser inferior a 400 barcos’.

Item 2 do esboço, ‘investir em um peixe de congelamento rápido individual (IQF) de 500 toneladas de capacidade diária da planta de processamento’.

O item 3 fala em ‘investir num porto de pesca com instalações de base de pesca para a necessidade essencial da logística de pesca’. E ainda diz que ‘o porto precisa estar ao lado de águas profundas com uma área não inferior a 100 hectares’.

Enquanto isso ocorre no Brasil é bom lembrar que um país com tradição na pesca como Portugal, proibiu o arrasto de fundo em 2014.

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O perigo desta proposta indecente

O perigo maior desta proposta é ter chegado no momento em que a legislação ambiental é desfigurada por uma administração equivocada e francamente contrária à conservação. Temos um presidente que, contra as pesquisas e a ciência, investe contra uma tênue tentativa de ordenar a pesca no Rio Grande do Sul.

Simultaneamente, seu ‘ministro’ do Meio Ambiente impede os (poucos) fiscais do Ibama a atuarem contra as queimadas na Amazônia e Pantanal, ameaça fundir o Ibama com o ICMBio, e deixa de lado a regularização de terras na Amazônia.

Vamos nos lembrar da declaração de Tasso Azevedo, coordenador do Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima, em entrevista a este site: “Em 2019 o Programa Terra Legal, que vinha titularizando de 3 a 4 mil propriedades por ano, conseguiu emitir apenas seis títulos de propriedades rurais.”

O STF e a pesca de arrasto no Rio Grande

Para coroar os problemas ambientais brasileiros o STF em recente decisão ‘monocrática’ do primeiro ministro escolhido por Bolsonaro, Nunes Marques, libera o arrasto no Rio Grande do Sul a menos de 12 milhas da costa, contra a vontade de pescadores do Estado, e as pesquisas da academia.

Não há momento pior para agenda ambiental que o atual. E, em meio à enorme polêmica que se tornou mundial, agora a China quer o Brasil como ponte para a devastação que promove nos mares.

Polo pesqueiro chinês e nota publicada pelo SINDIPI

O único ponto positivo desta nova ameaça foi a nota publicada pelo SINDIPI – Sindicato dos Armadores e das Indústrias de Pesca de Itajaí e Região. É um Sindicato forte, conseguiu emplacar o atual secretário da Pesca, Jorge Seif Júnior, cuja família é proprietária de uma empresa de pesca das mais multadas por sinal.

O secretário também é conhecido como o filho ’06’ de Bolsonaro pela intimidade que tem com o presidente, confirmando a ‘esculhambação’ de que falamos. Mas o presidente do SINDIPI, José Jorge Neves Filho, condenou o projeto.

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Imagem de navio da marinha do Equador cercando pesqueiro chinês
Navio da marinha do Equador cercando pesqueiro chinês. Imagem, https://dialogochino.net/.

“José Jorge Neves Filho, vem a público declarar sua total contrariedade e discordância acerca do interesse de empresários chineses de instalar uma base de apoio às suas frotas pesqueiras na cidade de Rio Grande/RS ou em qualquer outra região do Brasil. “

Neves Filho diz na nota que as frotas de arrasto da China “de acordo com informações, baseadas em relatos e publicações de outros países já explorados por essas embarcações, as mesmas não praticam uma pesca sustentável em suas operações, pelo contrário, pescam de forma predatória, processando tudo o que for pescado.”

SINDIPI e o arrasto

Mas nem em sonho imagine que o SINDIPI seja contra a pesca de arrasto. Ao contrário. O Sindicato é favorável à modalidade mais mortal de pesca, combatida em todo o mundo. O que o SINDIPI quer, é que a pesca de arrasto seja praticada apenas pelos armadores brasileiros.

O momento é ruim não só em razão da atual administração e seus ataques à proteção ambiental. Em dezembro de 2019, a Comissão de Meio Ambiente do Congresso aprovou o arrendamento de barcos de pesca estrangeiros por brasileiros para que atuem em nossa ZEE. A porta começa a se abrir…

Felizmente o governador do Estado, Eduardo Leite (PSDB), já demonstrou bom senso diversas vezes desde que assumiu. Não será desta vez que vai fraquejar.

Pelo sim, pelo não, fique atento ao tema. Se ele ganhar as manchetes, então terá chegado a hora da indispensável pressão da opinião pública.

Imagem de abertura: defesa net

Oceano Atlântico e Pacífico não se misturam, falso ou verdadeiro?

Comentários

18 COMENTÁRIOS

    • É incrível como tem gente chata que parece não ter o que fazer. O assunto abordado no post nada tem a ver com barcos chineses arrendados no Brasil. O que o post comenta é uma proposta indecente de se fazer um polo pesqueiro chinês na cidade de Rio Grande. O que isto teria a ver com barcos chineses arrendados para armadores brasileiros? E todos os links de onde vieram as informações constam do post. Mesmo assim um desocupado vem falar em ‘informações falsas por não conhecimento ou hipocrisia!’. Ora, ver ver se estou na esquina!

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  2. O artigo omitiu que Seif posicionou-se publicamente contra o projeto e que suspendeu a pesca de arrasto dentro das 12 milhas no RS até que melhor regulamentada pelo órgão competente: a SAP.

    • É inacreditável a quantidade de mentiras disseminadas por Bolsonaro e seus seguidores. Seif Jr., o secretário da Pesca, participou de live ao lado do chefe Pinóquio defendendo exatamente o contrário do que diz o comentário. Assista ao vídeo neste post: Pesca de arrasto no Brasil e devaneios de Jair Bolsonaro (https://marsemfim.com.br/pesca-de-arrasto-no-brasil-e-devaneios-de-jair-bolsonaro/).
      Só por isso publicamos este comentário. Para mais uma vez desmascarar as mentiras disseminadas pelo mito e seus cegos seguidores. Não é possível que mesmo com um vídeo de Seif Jr. ao lado do chefe bombardeando a decisão do Rio Grande do Sul de proibir o arrasto dentro das 12 milhas ainda tenha quem minta afirmando o contrário.

  3. Poxa não dá vontade nem de voltar ao Brasil com tanta estupidez e falta de consciência e ganância de quem deveria zelar pelos nossos mares e consequentemente o povo…Da tristeza …

  4. Predador vermelho ; Os navios mineraleiros classe VALEMAX foram lançados no mercado em 2010 pela mineradora brasileira Vale SA. O plano era construir cerca de 60 navios, mas apenas 18 foram entregues. A VALE sofreu um golpe quando a China proibiu esses navios de grande porte de atracar em seus portos, afirmando que eles eram inseguros. O embargo foi suspenso em julho do ano passado, mas naquele momento a VALE já havia vendido ou alugado os cargueiros para proprietários chineses, inclusive a Cosco.defesanet.18.03.16.

  5. Primeiro : para aqueles que acham que forças armadas não tem sentido porque não entramos em guerra. Marinha e FAB precisam de meios para de fato proteger nosso território e seu entorno. E precisam de alianças com os vizinhos para fazer isso em bloco. Sai mais barato e assegura paz.

    Segundo: Este pais precisa de fato trabalhar com o conceito de industria e segmento economico para poder sair da “esculhambação” como dito no artigo. Discussão séria para trazer justiça fiscal, lucratividade que estimule a continuidade condições de trabalho adequadas aos envolvidos, sejam industriais ou artesanais pois é isso que irá garantir a questão de sustentabilidade ambiental. Sò quando há equilibrio e conversa entre as pernas do tripé ele fica em pé. $ , aspectos sociais e aspectos ambientais. Um sem o outro gera problemas no futuro próximo.

    Isso vale para pesca, agricultura, pecuária, industria, serviços, cidades, , etc. Tem que ser o conceito básico aonde o país é estruturado. I

  6. Este artigo me faz lembrar a Guerra da Lagosta,Brasil x França,em 1961.Poucas pessoas devem se lembrar,mas o início do imbroglio começou com a França pedindo autorização para pescar lagosta na costa de Pernambuco,que foi concedida pelo Governo João Goulart.Devido a revolta dos pescadores brasileiros contra esta medida impatriótca,o governo brasileiro voltou atrás,cancelando a autorização.De Gaulle mandou navios de guerra para proteger sua frota pesqueira na costa brasileira e o Brasil demorou a reagir militarmente-nossa frota de guerra estava avariada e alguns navios de guerra cedido pelos EUA ao Brasil foram proibidos pelos norteamrericanos de guerrear uma país amigo(dos EUA )como se o nosso país não fosse amigo dos yankees miseráveis.

    • Luiz, muito obrigado pela lembrança. Consultei a notícia no acervo do Estadão, de fato, nossos governantes também deveriam consultar, é um aprendizado histórico. A forma de redação das notícias no passado chega a ser prazeroso de ler, muito informativo e sem opiniões pessoais, apenas relatam os fatos. As notícias que tomei conhecimento são de 1963 e 1964 e pelo visto, levou anos para ser resolvida.

  7. Essa notícia nos deixa alarmados, contrariados. Não só pela ganância por dinheiro e poder tão presente nos seres humanos, como também pela inépcia do poder público brasileiro, em geral, sobre as questões de preservação e sustentabilidade do Meio Ambiente

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