Oceano Atlântico e Pacífico não se misturam, falso ou verdadeiro?

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Oceano Atlântico e Pacífico não se misturam, falso ou verdadeiro?

Há uma grande curiosidade sobre o assunto na mídia social. Vira e mexe alguém pergunta, ou publica algo a respeito. O Mar Sem Fim fez uma curadoria para entender o que está por trás desta curiosidade, de onde surgiu a dúvida, e porquê. Descobrimos que tudo começou com um vídeo, provavelmente, fake. Ao mesmo tempo, procuramos os sites estrangeiros de maior renome para pormos um ponto final na dúvida. Em alguns nacionais, mais dedicados à diversão que à ciência, dizem que ‘não se misturam’. Afinal, o Oceano Atlântico e Pacífico não se misturam, falso ou verdadeiro?

Imagem do oceano Pacífico no Alasca
Esta foto também contribuiu para gerar a falsa polêmica. Trata-se do Pacífico no Alasca com suas geleiras. A diferença de cores é explorada pela Science Focus. Imagem, https://www.adn.com/.

Uma confusão provocada pelas redes sociais

O primeiro site que procuramos foi o da BBC Science Focus. Ele explica que embora o ser humano tenha dado nomes diferentes aos oceanos, ‘na realidade não há fronteira entre eles, as correntes fluem continuamente entre ambos e misturam suas águas’.

‘Os oceanos Atlântico e Pacífico se encontram no extremo sul da América do Sul. Nesta região, uma forte corrente transporta água de oeste para leste, varrendo a água do Pacífico para o Atlântico’.

E alerta os internautas, ‘Os vídeos que você pode ter visto online mostrando dois corpos de água de cores diferentes flutuando lado a lado estão, na verdade, mostrando água doce rica em sedimentos e cor clara de geleiras derretidas encontrando água escura e salgada do oceano no Golfo do Alasca (e com o tempo, correntes e redemoinhos fazem com que estes se misturem também)’.

Portanto, a afirmação é falsa: As águas do oceanos Atlântico e Pacífico se misturam, sim.

O nível médio do mar

Segundo a BBC,  ‘o nível médio do mar é  utilizado como referência padrão para a altitude de cidades, montanhas e aeronaves. Isso porque, uma vez que o efeito das marés e ondas tenha sido calculado, o nível do mar depende de apenas duas forças: a força da gravidade e o efeito do giro da Terra – e estes dependem da distância desse ponto de referência final, o centro da Terra’.

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Portanto, não existe um ‘oceano mais alto que outro’ como também vimos nas redes sociais.

Saiba quais são as diferenças entre o Oceano Atlântico e Pacífico

Mas os dois oceanos têm, sim, diferenças apesar de não haver uma fronteira que demarque com precisão a separação entre um e outro. Segundo topógrafos, a linha que marca a fronteira entre o Oceano Atlântico e o Oceano Pacífico passa direto entre o Cabo Horn e a Antártica. Este estreito corpo d’água, o Estreito de Drake.

Estreito de Drake
Estreito de Drake, a parte de mar entre o final da América do Sul, e a ponta da península antártica.

A olho nu, no entanto, você não poderia ver a diferença entre os dois corpos d’água. Da mesma forma que as fronteiras entre países são essencialmente imaginárias, assim são as fronteiras entre os oceanos.

Sabemos mais sobre o espaço sideral do que sobre os oceanos

Já repetimos aqui: sabemos mais sobre o espaço sideral do que sobre os oceanos. Ainda nos anos 60, a corrida espacial impulsionou a ciência a estudar o cosmos. Dinheiro não faltava, afinal a disputa envolvia os dois países mais poderosos da época. Bilhões de dólares financiaram os cientistas.

Conheça os motivos pelos quais sabemos pouco sobre os oceanos

O mesmo não aconteceu com os oceanos. As pesquisas marinhas sempre exigiram investimentos altos e nunca tiveram o mesmo ‘glamour’ da conquista do espaço. Além de cobrirem 71% da superfície do planeta, os oceanos impõem desafios enormes. A pressão nas grandes profundidades e as longas distâncias que os navios precisam percorrer até os pontos de estudo obrigam o uso de equipamentos extremamente caros para alcançar e investigar o fundo do mar.

Tudo isso torna a operação lenta e muito cara. Mesmo os drones aquáticos e os ROVs, robôs operados remotamente, novidades da tecnologia, custam caro. Hoje, submarinos começam a ganhar espaço nas pesquisas sobre os oceanos, realizadas até mesmo com o apoio de satélites. A novidade agora será o usa da IA – Inteligência Artificial na pesquisa submarina. Mas ainda engatinhamos nesse campo.

Imagem de aguas diferentes no golfo do Alasca
Imagens como esta do golfo do Alasca, do jornal Anchorage Daily News é que provocaram a falsa polêmica.

A ignorância da ciência sobre o mar profundo

Não à toa, os cientistas sequer sabem quantas espécies vivem nas profundezas. Estimativas sugerem que existem entre 700.000 e um milhão de tipos de vida marinha – porém, mais de 91% permanecem sem classificação.

Além disso, estudo recente mostra que conhecemos e registramos – a ciência – apenas 0,001% do assoalho marinho.

Uma das diferenças mais marcantes entre o Atlântico e o Pacífico está na salinidade: as águas do Atlântico são mais salgadas e, portanto, mais densas. Isso não impede que ambos os oceanos se misturem, muitas vezes de forma turbulenta, no Estreito de Drake onde o extremo sul da América do Sul e o extremo norte da Antártica formam um ‘funil’ para o vento.

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Estreito de Drake
Estreito de Drake.

Esse funil espreme os ventos, que sopram geralmente de oeste para leste, do Pacífico para o Atlântico ao atravessar o Estreito de Drake. Ali, sob influência da geografia, as águas dos dois oceanos se misturam às vezes com forte turbulência.

O vídeo que circula nas redes, mostrando um suposto encontro entre Atlântico e Pacífico no golfo do Alasca, não passa de fake news.

Imagem de abertura: https://www.adn.com/

Fontes: https://www.sciencefocus.com/planet-earth/is-it-true-that-the-pacific-and-atlantic-oceans-dont-mix/; https://steemit.com/science/@shairanada/science-explains-1-does-the-pacific-ocean-mixes-with-the-atlantic-ocean; https://blogpatagonia.australis.com/where-do-the-atlantic-and-pacific-oceans-meet/#:~:text=According%20to%20topographers%2C%20the%20line,Elizabethan%20explorer%2C%20Sir%20Francis%20Drake, https://www.adn.com/science/article/mythbusting-place-where-two-oceans-meet-gulf-alaska/2013/02/05/.

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Comentários

23 COMENTÁRIOS

  1. Exelente reportagem!
    So acho que sabemos menos do espaço sideral do que dos nossos oceanos, a final a gente(cientificos ,exploradores ,etc..) ja fez muitos mergulhos no mar, em pessoa e com sondas roboticas, ja no espaço sideral fuimos apenas na lua e nao saimos muito mais longe do que dos limites do nosso sistema solar(sondas e robots).
    O espaço sideral e infinitamente maior do que nossos oceanos.
    Obrigado pela reportagem esclarecedora

  2. Matéria utilíssima. Parabéns a todos os envolvidos e aos comentários. Só vem provar que matérias de qualidade chamam a atenção de internautas que buscam o aperfeiçoamento cultural.

  3. Eu lembro de ter visto há alguns anos, uma foto mostrando o absurdo de uma “fronteira física” entre as massas líquidas dos oceanos. Foi uma das razões, entre outras, que me levou a banir redes sociais do meu hábito de usuário de Internet. Essas redes são úteis apenas para veicular propaganda. E infelizmente, a maioria é enganosa.

  4. Há várias causas que explicam os diferentes níveis das marés observados ao longo da costa dos continentes, associadas à atração gravitacional, principalmente da Lua, efeitos da “força centrífuga” associada à rotação da Terra e da Lua ao redor do seu centro de massa comum, efeitos associados às correntes marítimas, que se movem em relação à crosta terrestre etc. O assunto é bastante extenso, mas o fato é que as águas se misturam, tal como apresentado no artigo.

  5. Amigo, bela reportagem, mas no canal do Panamá eles explicavam que as eclusas eram porque o nível dos oceanos em cada entrada do canal ( Atlantica e Pacifico) eram diferentes, então talvez em alguns pontos eles tenham mesmo diferença de altura, embora se equalizem no encontro ao sul. Viu algo a respeito?

    • Olá Geraldo.
      Esse fenômeno ocorre devido aos Ventos Alísios que “empurram” a água superficial do oceano para o Oeste.
      Como o Panamá é um país estreito que “separa” os oceanos podemos perceber essa diferença de altitude dos oceanos em sua costa, isso porque ao leste temos o Atlântico que foi “empurrado” em toda sua extensão desde a África, já ao Oeste temos o Pacífico que está sendo “empurrado” a partir da América.
      A diferença de altitude é perceptível ali na costa panamenha mas não ao longo de toda a extensão do oceano.
      Ficou claro?
      Abraço.

    • na verdade não eh exatamente a diferença entre os oceanos (que eh de poucos centimetros), mas entre os oceanos e o lago Gatún….q permite a travessia

  6. Excelente matéria. Faço apenas um comentário conceitual relativo à frase “a força da gravidade e o efeito do giro da Terra – e estes dependem da distância desse ponto de referência final, o centro da Terra” (reprodução literal do artigo). Embora se trate de uma explicação extremamente simplificada e qualitativa, parece que quando o autor escreve “o efeito do giro da Terra” ele se refere à “força centrífuga”. Se for este o caso, a distância do ponto da superfície da água sujeito à ação da “força centrífuga” não é medida entre o ponto e o centro da Terra, mas entre o ponto e o eixo de rotação da Terra (a rigor, a distância é medida sobre a perpendicular ao eixo de rotação da Terra que passa pelo ponto considerado). Uma figurinha simples ajudaria a explicar melhor.

    • Não exite força centrífuga e sim centrípeta. Esclarecemos que a terceira lei de Newton estabelece que as forças de ação e reação se dão em corpos difrentes.

      • Fernando, você se confundiu; a aceleração de um ponto material que se movimenta, por exemplo, percorrendo uma trajetória plana com raio de curvatura constante, poderá ser decomposta em uma componente tangencial e uma componente normal, informalmente denominada de componente centrípeta da aceleração (aponta para o centro de curvatura da trajetória). A “força centrífuga” atuante nesse ponto material tem a mesma direção da aceleração centrípeta e sentido oposto. Como eu escrevi no meu 1o comentário, uma figurinha ajudaria a explicar melhor, mas você poderá encontrar a explicação em livros introdutórios de mecânica Newtoniana, no capítulo relativo a referenciais não inerciais. Bom estudo.

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