Polo Cabo Branco: progresso ou retrocesso ambiental?
João Avezedo (PSB), governador da Paraíba, alardeia que o Polo Turístico Cabo Branco será o maior complexo turístico planejado do Nordeste. O projeto prevê 21 lotes destinados a resorts, parque aquático, centro comercial e equipamentos de lazer. Hoje, já abriga o Centro de Convenções de João Pessoa, premiado nacionalmente.
O empreendimento da WAM Experience deve receber cerca de R$ 500 milhões em investimentos. Fica em uma área de 654 hectares de Mata Atlântica, oficialmente protegida por lei. E não só isso: o projeto avança sobre uma falésia, outro ecossistema igualmente protegido pela legislação ambiental.


Maior complexo turístico planejado do Nordeste?
A ideia de “turismo planejado” vem ganhando força no discurso oficial. No extremo oeste do litoral do Ceará, por exemplo, acompanhamos outro caso: o projeto do Grupo Carnaúba, que promete criar a primeira praia planejada do Brasil”. Na prática, o que se viu ali foi um intenso processo de especulação imobiliária.
Agora, em João Pessoa, surge mais um megaprojeto com o mesmo rótulo. Concebido ainda nos anos 1980, o Polo Turístico Cabo Branco já enfrentou diversas sanções por seus impactos socioambientais.
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Orla do Rio de Janeiro: praias podem desaparecer totalmenteParaty e turismo, um casamento mórbido e insustentávelFraude no seguro defeso pago a pescadoresEm 2023, o Portal T5 estampou a manchete: “Em um ano, desmatamento da Mata Atlântica cresce 45% em João Pessoa”. Segundo a reportagem, só entre 2021 e 2022, a taxa de desmate na capital paraibana aumentou 45%.

Área faz parte do Corredor de Biodiversidade da Mata Atlântica
Segundo o site Mongabay, a área escolhida para o Polo Cabo Branco integra o Corredor de Biodiversidade da Mata Atlântica do Nordeste. Trata-se de uma região classificada como prioritária para a conservação, dada sua alta relevância biológica.
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Os empreendimentos previstos estão cercados por unidades de conservação. A principal delas é o Parque Estadual das Trilhas dos Cinco Rios, maior UC urbana de João Pessoa, com 575 hectares. O parque abriga mais de 150 espécies de plantas e 70 espécies da fauna, algumas ameaçadas de extinção.
APA de Jacarapé e outros ecossistemas ameaçados
A área do polo abriga a APA de Jacarapé, um remanescente de manguezal onde vive uma comunidade pesqueira tradicional. Já na parte marítima, está a APA Naufrágio Queimado, com cerca de 422 km², criada para proteger recifes de corais e espécies como tubarões.
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Mesmo com a proteção legal, o Parque Estadual das Trilhas dos Cinco Rios também corre risco. A fragmentação da mata e as obras previstas no entorno devem afetar diretamente a integridade do ecossistema.
É o que alerta a ecóloga Paula Frassinete, fundadora da Apan (Associação Paraibana Amigos da Natureza). A entidade já havia denunciado, em 2009, a supressão ilegal de Mata Atlântica durante a construção do Centro de Convenções.
Fragmentação e isolamento dos remanescentes
Para João de Deus Medeiros, coordenador da Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA), o maior desafio para preservar o bioma está justamente na fragmentação e no isolamento dos remanescentes florestais. Em entrevista ao Mongabay, ele foi direto:
“Não faz o menor sentido que, enquanto há campanhas para reconectar esses fragmentos, novos empreendimentos sejam autorizados e aprofundem a fragmentação.”
A legislação também é clara. A Resolução nº 303/2002 do Conama e o artigo 4º do Código Florestal determinam que áreas com falésias devem manter uma faixa mínima de 100 metros preservados a partir da borda — o que nem sempre é respeitado em projetos como o Polo Cabo Branco.
“Fizeram intervenções até o limite da barreira”
Durante vistoria realizada em dezembro de 2023, o procurador Renan Felix constatou que as obras do polo desrespeitaram a faixa mínima de proteção da falésia.
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“Existe uma rua, onde será um boulevard com acesso aos empreendimentos, em que fizeram intervenções até o limite da barreira”, denunciou.
O alerta se soma a dados preocupantes. Segundo artigo de Pedro Henrique Cesar no Brasil de Fato, o projeto prevê a destruição de uma área significativa de Mata Atlântica, o bioma mais ameaçado do país.
De acordo com o Instituto SOS Mata Atlântica (2023), João Pessoa ainda conserva cerca de 1.525 hectares de mata, o equivalente a 2.137 campos de futebol. O Polo Cabo Branco ocupa 654 hectares — ou 43% de toda a área verde remanescente da cidade.
Esse desmatamento em larga escala pode causar efeitos devastadores: assoreamento de rios, erosão das falésias, extinção da fauna silvestre, aumento da temperatura e da poluição, especialmente nos bairros urbanos próximos.
Governo da Paraíba dá incentivos para as obras
Não encontrei nos sites oficiais qualquer explicação sobre o corte da vegetação. Por outro lado, descobri que o governo da Paraíba concede incentivos ao projeto. Segundo o site oficial, há benefícios na aquisição de imóveis, além de incentivos fiscais por meio do Programa de Incentivo Locacional.
Além disso, o Polo Turístico Cabo Branco tem redução de 60% no ISS por legislação específica. É, no mínimo, contraditório: um governo que antes se destacava por barrar espigões na orla agora estimula a supressão de mata nativa em larga escala.
Lucena quer pista rodeando falésia ativa
Como se não bastasse o caso de João Pessoa, o município vizinho de Lucena pretende construir uma pista de tráfego sobre a orla, contornando uma falésia ativa — ou seja, uma formação que segue desmoronando com a ação constante das ondas, ressacas e marés.
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O custo estimado da obra é de R$ 200 milhões. Uma proposta que ignora completamente os riscos geológicos e ambientais da região e repete o velho erro de usar o litoral como vitrine imobiliária, não como patrimônio natural.
O que diz o Governo da Paraíba
Para o governador João Azevedo (PSD), o Polo Turístico Cabo Branco é exemplo de sucesso da gestão estadual.
“Tiramos o projeto do papel após 40 anos. Temos rating A do Tesouro Nacional e já geramos um milhão de empregos formais desde 2019”, afirmou em dezembro de 2024.
O investimento mais recente, de R$ 480 milhões, soma-se a um total de R$ 2,2 bilhões já injetados no polo, segundo o presidente da Cinep, Rômulo Polari Filho. A expectativa é de 18 mil empregos na fase de obras, mais de 12 mil leitos e cerca de 2 milhões de visitantes por ano até 2029.
Mas, em meio a uma crise climática global e à destruição de 43% da mata nativa remanescente da capital, o governo não mencionou uma palavra sequer sobre o desmatamento.
Prefeito de João Pessoa também quer detonar a capital
Em 2023 este site questionou o o prefeito de João Pessoa, empresário da construção civil, ex-presidente do Sinduscon (Sindicato da Indústria da Construção e do Mobiliário do Estado da Paraíba), típico representante da República Velha ou República das Oligarquias, Cícero Lucena (PP), que pretende iniciar as obras de alargamento da orla construindo uma pista viária ligando o Cabo Branco à Ponta do Seixas por baixo, contornando a falésia viva e já desmoronando!!
Não dá para acreditar que seja apenas boçalidade, aí tem coisa!
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Há algo de muito podre neste projeto
Enquanto o Governo da Paraíba injeta milhões num projeto controverso, parte da capital segue abandonada. Fala-se em progresso, mas promove-se o corte de 43% da mata nativa remanescente da cidade e a destruição de uma falésia viva.
E ao redor? O cenário é de descaso. Em junho deste ano, fiscais vistoriaram a área de mangue conhecida como Maceió de Intermares, entre João Pessoa e Cabedelo. Segundo o site MaisPB, encontraram casas ilegais no mangue, gado solto, esgoto sendo despejado diretamente no manguezal e tubulações clandestinas por toda parte.
O que mais atrai turistas para João Pessoa sempre foi sua riqueza natural, a Mata Atlântica preservada, a orla sem espigões e o título de cidade mais arborizada do Brasil. Agora, tudo isso está sob ameaça — ironicamente, em nome do turismo.
Ninguém pode se enganar. Há algo de muito podre neste projeto, e não é pouca coisa.
O que diz o Governo do Estado
No mesmo dia em que publicamos este post enviamos uma série de perguntas ao Governo do Estado. Tão logo tenhamos a resposta ela será publicada.
Assista ao excelente vídeo da Associação Esgotei e saiba mais
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nordeste sempre foi terra sem leis , o lugar mais corrupto do brasil . perda de tempo do mar sem fim , infelizmente