São Francisco do Sul (SC) volta a discutir revisão de Plano Diretor

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São Francisco do Sul (SC) volta a discutir revisão de Plano Diretor

A retomada da revisão do Plano Diretor de São Francisco do Sul, paralisada por um ano pela Justiça devido a ‘vícios de origem’ como a falta de divulgação pela prefeitura e baixa participação popular, acontecerá este mês. A importância da revisão de Planos Diretores em cidades litorâneas é ainda maior  em razão dos interesses escusos de muitos prefeitos. Antes de mais nada, a mobilização popular é essencial, especialmente quando prefeitos não cumprem essa obrigação legal. Isso ocorreu em 2022 em uma das cidades mais antigas do Brasil, onde algumas praias ainda são semi-virgens. Um exemplo é a praia do Ervino, onde os moradores protestaram em 2022 contra a proposta de construir prédios de até 18 andares na orla. Essa tendência de erguer edifícios altíssimos nas praias se tornou uma espécie de mania em Santa Catarina.

São Francisco do Sul (SC)

A revisão do Plano Diretor em 2022

O  Plano Diretor de São Francisco do Sul foi desengavetado (plano original do ex-prefeito Renato Gama Lobo – PSD, 2019) pelo atual chefe do Executivo, Godofredo Gomes Moreira Filho (MDB), e estava em análise na Câmara dos Vereadores.

Segundo o grupo Cuidadores do Ervino, o Plano Diretor para o bairro do Ervino é uma mistura do primeiro, de 2019, com modificações propostas pelo vereador Alan Vizoto (PL), curiosamente também proprietário do Grupo Vizoto Imóveis, aprovado por unanimidade na Câmara dos Vereadores.

grupo Vizoto
Fausto Macedo, jornalista do Estadão, foi certeiro na definição: “A corrupção – no Brasil e no mundo – abarca uma multiplicidade de fatores, individuais e coletivos, institucionais e culturais, legais e históricos. Há, especialmente no Brasil, um elemento assaz importante, quase uma antessala para práticas de corrupção: a persistente indistinção de interesses privados e interesses públicos.”

A luta pela paralização da revisão do PD

Os Cuidadores do Ervino protestaram pela falta de participação popular e justificativas técnicas, alertando o MP e MPF dos riscos ao meio ambiente e da inexistência de infraestrutura. Em seguida, a ONG AMECA, parte do núcleo gestor, notificou o Ministério Público sobre irregularidades no processo. Outras entidades se manifestaram com açőes judiciais e, assim,o Promotor Diogo Deschamps abriu uma investigação (01.2022.00040676-4).

Além disso, a AMECA e outros entraram com um Mandado de Segurança (500300-54.2022.8.24.0061/SC) contra o Presidente da Comissão Especial de Revisão do Plano Diretor, Vereador Alan Gabriel Vizoto, e o Presidente da Câmara, Vereador Rangel Alexandre Friolin.

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Eles argumentaram que 78 emendas alteraram completamente o PD, descaracterizando todos os bairros, com diversas alterações de ZEPAs (zonas de preservação ambiental) para uso residencial, novas zonas retroportuárias, um excessivo adensamento e verticalização desnecessária, favorecendo substancialmente indústrias, mineração, incentivando a especulação e a degradação. Emendas sem pareceres técnicos.

Desse modo, o Juiz João Carlos Franco atendeu ao pedido e suspendeu a tramitação do projeto de lei complementar, impedindo que a Câmara de Vereadores votasse o projeto até uma decisão final do mandado de segurança.

Agora, chegou o momento tão esperado.

Audiências públicas em 2023 serão nos dias 6, 8, 11,12 e 14/12, sempre às 19hs

Após intervenção judicial, a Câmara de Vereadores de São Francisco do Sul tomou medidas pouco efetivas contra este “plano imobiliário” para o município. Confirmaram 65 das 80 emendas propostas (outras 2 foram incluídas em 2023). Dos descartes, alguns vereadores eliminaram emendas redundantes ou já inclusas no Plano Diretor (PD).

Em outras palavras, a disputa voltou à estaca zero. O PD em discussão ainda ameaça praias virgens e ignora problemas de infraestrutura, como saneamento básico. Além disso, ele recebeu críticas por não apresentar melhorias na saúde pública ou educação.

Entretanto, sabe-se no município que os vereadores pretendem aprovar a revisão até final do ano (como eles mesmos afirmam); que as decisões já foram tomadas, e que as 65 emendas já estão com seus pareceres “técnicos” prontos.

Em 2022, o único voto contrário foi do vereador “Mira da Estiva” – Sidnei de Mira MDB. Em outras palavras, as novas audiências parecem mais serem para inglês ver, o resultado da votação já estaria acertado na Câmara de Vereadores o que não nos espanta, ao contrário, assim tem sido em todos os municípios costeiros.

Para coroar o processo farsesco, recentemente a prefeitura construiu duas passarelas para ‘melhorar a acessibilidade’ da praia do Ervino. Para tanto, não hesitou em passar uma máquina rasgando a restinga que tem a função de proteger a linha da costa contra erosão, como mostra a foto.

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Restinga decepada na praia do Ervino
O rastro na restinga é mais uma prova de ignorância e pouco caso da prefeitura. A justificativa era que ‘seria apenas braquiária’.

São Francisco do Sul só começou a tratar os esgotos em 2021

Apesar de avançarem na verticalização, a cidade só começou a tratar seus esgotos em 2021. Do mesmo modo, segundo o IBGE, o PLANO DIRETOR não contempla a prevenção de enchentes, inundações ou enxurradas, muito menos deslizamentos. Assim como não há fiscalização para evitar ocupação de áreas de risco, entre muitos outros problemas mais graves e não contemplados no PLANO DIRETOR.

De maneira idêntica, o PD simplesmente não contempla a maior ameaça à humanidade hoje, o aquecimento do planeta e os eventos extremos que têm castigado e destruído inúmeras cidades brasileiras, especialmente as do litoral.

O perverso efeito dos eventos extremos

Não nos esqueçamos das 65 mortes no carnaval deste ano no litoral norte paulista, ou das 918 mortes na Região Serrana do Rio de Janeiro, em 2011, ambas provocadas por eventos extremos.

Mas apesar disso, e da destruição que aconteceu este ano no Rio Grande do Sul pelo mesmo motivo, o PD do prefeito Godofredo Gomes Moreira Filho (MDB) nada propõe para mitigar o fenômeno, ao contrário, expõe ainda mais o município aos seus perigos.

Vejamos as críticas dos Cuidadores do Ervino

1- Estudos demonstraram que a verticalização vai criar sombreamento na restinga,  colocando em risco a sobrevivência da única barreira contra a erosão do mar.

2- Durante as audiências de revisão do plano diretor tampouco foram apresentados estudos técnicos sobre o impacto ambiental da verticalização da orla.

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3- Os acessos à praia não comportam a densidade passiva proposta com a verticalização. O caráter insular do Ervino e sua única estrada de acesso (Gamboa) tornariam inviável o fluxo viário.

praia do Ervino, São Francisco do Sul (SC)
A praia do Ervino onde a prefeitura autorizou prédios com até 18 andares!

4-  A população se mostrou contrária aos prédios altos nas proximidades da orla em diversas ocasiōes formais, por meio dos delegados durante as consultas públicas e na audiência de 2019. Mas isso foi desconsiderado pelo Poder Público. 

Nenhuma razão técnica foi abordada além da ‘necessidade de impulsionar a economia’. Também em 2022 a população foi ignorada por meio dos numerosos protocolos durante as novas consultas públicas e na audiência.

5- O povo do Ervino se manifestou inúmeras vezes nos quatro anos deste processo sempre a favor de desenvolver, porém, mantendo a essência do local  que o atual plano não garante.

Especulação destrói o litoral de Santa Catarina

A especulação imobiliária está devastando os cartões postais de Santa Catarina. Recentemente, a população de Florianópolis reagiu a um Plano Diretor favorável à construção civil. Apesar de 26 inconstitucionalidades, foi aprovado.

O processo em Florianópolis se repetiu em São Francisco do Sul: pouca divulgação e mínima participação popular, com contestações judiciais.

A ocupação de Jurerê Internacional, desde o início, foi um escândalo. Em 2017, a Operação Moeda Verde levou à condenação de 16 pessoas e seis empresas por crimes ambientais e administrativos pelo Juiz Marcelo Krás Borges.

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Balneário de Camboriú é outro exemplo notório, seguido pelo Balneário Perequê. Florianópolis agora enfrenta sérios problemas de erosão costeira, com custos elevados para o erário. Esse mesmo modelo é visto em Itajaí.

Afinal, o que querem os políticos de Santa Catarina? Será que são tão cegos que não veem a caótica situação do litoral do Estado?

Infelizmente, o processo de especulação acelerada já começou no Ervino, com as imobiliárias apostando na aprovação do Plano Diretor. É só pesquisar no Google: “venda de imóveis na praia do Ervino”. Você verá páginas e mais páginas de imobiliárias atiçando possíveis clientes.

Ao nosso ver, o único dado positivo da polêmica do Plano Diretor de São Francisco do Sul foi a posição do Ministério Público que interveio no ano passado. A ver como será neste final de 2023.

Assista ao apelo dos Cuidadores do Ervino

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