COP30 em Belém, sucesso ou fracasso?

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COP30 em Belém, sucesso ou fracasso?

Torcemos pelo sucesso, evidentemente, mas a nossa opinião pouco importa neste caso. Em novembro Belém recebe a COP30, a principal conferência da ONU sobre o clima. O evento será um grande desafio. Não só pelos temas sensíveis em pauta, mas também pela frágil infraestrutura da cidade. A Fundação Getúlio Vargas (FGV) estima que mais de 40 mil pessoas passarão por Belém nos dias principais. Cerca de 7 mil delas fazem parte da chamada “família COP”, formada por equipes da ONU e delegações dos países.

Catedral da Sé em Belém se preparando para a COP30
A espetacular Catedral da Sé construída em 1719, primeira igreja da Região Norte, é um dos tesouros de Belém. Acervo MSF.

Do lado ambiental, os entraves se acumulam. O governo Lula ainda não criou a prometida Autoridade Climática. A discussão sobre quem comandaria o órgão travou o processo. Como o tema é delicado, ficou para depois. Outro ponto crítico: o Brasil se recusou a assinar o Tratado do Plástico durante a 3ª Conferência da ONU para os Oceanos, em junho, na França. A decisão pegou mal e pode ter reflexos em Belém. E ainda temos a controversa extração de petróleo na Margem Equatorial.

Vencerão os prós ou os contras?

As opiniões estão divididas internamente em ambos os aspectos, ou seja, o ambiental e o referente à infraestrutura. Mas, um aspecto positivo, que fazemos questão de salientar é a escolha do diplomata André Corrêa do Lago que será responsável pelo evento. Foi uma ótima escolha.

Formado em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Corrêa do Lago ingressou na carreira diplomática em 1982. Desempenhou funções no Brasil e no exterior, em áreas como energia, clima e meio ambiente, perante organismos internacionais e na promoção comercial do Brasil.

remodelação do mercado Ver-o-peso para a COP30
O mercado Ver-o-peso está em reformas para encantar os estrangeiros que virão em novembro. Acervo MSF.

A falta de infraestrutura de Belém

A falta de infraestrutura na região Norte é notória e Belém não é exceção. A cidade tem enormes deficiências na mobilidade urbana, segurança pública, saneamento e tratamento de resíduos, para ficar nos mais importantes. Além disso, faltam leitos para receber tanta gente. Em 2024 Belém tinha cerca de 18 mil leitos, o que na melhor das hipóteses representa menos da metade do necessário.

aspectos internos do Theatro da Paz, Belém
Aspecto interno do belíssimo Theatro da Paz, de 1878, cujo piso foi feito com madeiras regionais como acapú e pau amarelo. A notar, o busto de Carlos Gomes, outro orgulho do Pará. Acervo MSF.

Estima-se que a conferência demandará 14 mil vagas nas categorias quatro e cinco estrelas. Mas Belém tem apenas dois hotéis cinco estrelas em funcionamento.

Uma dose de improvisação do governo

Ainda em 13 de junho a Folha de S. Paulo publicou matéria de Giovana Kebian informando que ‘o governo Lula (PT), corretoras e imobiliárias de Belém assinaram em 11 de junho um termo que define boas práticas para os aluguéis durante COP30, a conferência de clima da ONU’.

‘O objetivo do documento, segundo a organização da COP, é definir preços justos na oferta dos aluguéis e contratos transparentes durante o evento’.

regulamento do Theatro da Paz.
Quem apresentar sinal de ‘embriaguez’  será ‘admoestado’. Acervo, MSF.

E prossegue Giovana Kebian: ‘No início do ano, anúncios de aluguel de imóveis em Belém cobravam até R$ 2 milhões por 17 diárias durante o período da conferência’.

‘Outro problema é a falta de hospedagem. Até o momento, a organização da COP30 garantiu a oferta para 36 mil pessoas, o que significa um déficit de 14 mil leitos’.

‘Quarto individual mais barato ficou por R$ 15.960 a diária, chegando a R$ 19.960’

Dois dias depois, em 15 de junho, foi a vez de André Borges alertar pela Folha que, ‘a Secretaria Extraordinária da COP30, vinculada à Presidência da República, tem sentindo na própria pele os reflexos da alta de preços de hospedagem em Belém…A equipe que comanda a organização do evento ainda não sabe onde ficará hospedada. São cerca de 35 pessoas, entre coordenadores e servidores’.

‘De fevereiro a abril deste ano, a Secop30 solicitou orçamentos de hospedagem a algumas redes de hotéis. A reportagem teve acesso a três orçamentos, que expõem altos valores’.

‘O Radisson Hotel Belém, da rede Atlantica Hospitality International, encaminhou ao governo, em 3 de abril, a minuta de um contrato de locação com a cotação de 18 quartos a serem ocupados entre os 2 e 24 de novembro. O quarto individual mais barato ficou por R$ 15.960 a diária, chegando a R$ 19.960’.

Em outras palavras, isso soa improvisação. Todo mundo sabia desde o início que Belém não tinha capacidade de receber este mundo de gente. Por que só agora, a cinco meses da COP, tomam tímidas providências?

Organização tem pontos positivos e negativos

Segundo Olga Lucia Castreghini de Freitas, coordenadora de um projeto de pesquisa sobre a COP30,  a organização do evento tem pontos positivos e negativos. “O que a gente observa de mais problemático é a inexistência de formas de controle social e de participação”, é o que revelou o rfi.

Mais adiante, informa a mesma fonte, muitas obras, principalmente de saneamento, eram necessárias, estavam na gaveta há anos e só agora foram viabilizadas com os recursos disponibilizados, principalmente pelo BNDES e Itaipu Binacional.

Theatro da Paz em reforma para a COP30
O patrimônio histórico e artístico de Belém é uma aula do que aconteceu durante o Ciclo da Borracha. Acervo MSF.

“Belém é uma cidade que tem uma carência estrutural e histórica de obras de saneamento. A COP tem potencializado o surgimento de investimentos e de recursos para uma série de obras de macrodrenagem, por exemplo. Isto é um ponto positivo”.

A restauração de pontos turísticos de Belém, como o Mercado Ver-o-Peso, também é apontada como um ponto positivo pela professora Olga Castreghini de Freitas.

As questões ambientais na COP de Belém

No dia 20 de junho, a presidência brasileira da COP30 apresentou uma nova proposta de agenda climática global. O texto sugere 30 ações concretas, divididas em seis eixos, como estratégia para implementar o Balanço Global (GST) do Acordo de Paris. A informação é do jornal  O Globo.

A proposta defende que o GST funcione como uma espécie de NDC global — ou seja, uma meta coletiva, como já ocorre nas Contribuições Nacionalmente Determinadas feitas por cada país.

O documento define a agenda como um conjunto de iniciativas que unem ambição climática e desenvolvimento, por meio de investimentos, inovação, financiamento, tecnologia e capacitação.

Os seis ‘eixos’ da COP30

Transição energética, da indústria e dos transportes;

Gestão das florestas, oceanos e biodiversidade;

Transformação da agricultura e dos sistemas alimentares;

Criação de resiliência para as cidades, infraestruturas e oferta de água;

Promoção do desenvolvimento humano e social;

Promoção e aceleração de capacidades, incluindo financiamento, transferência tecnológica, fortalecimento e desenvolvimento de habilidades.

“Não faz sentido discutir a questão climática deixando os oceanos de lado”

Mas ainda há sérios problemas da organização da pauta. Por exemplo, especialistas como Alexander Turra, professor titular do Departamento de Oceanografia Biológica da Universidade de São Paulo e responsável pela cátedra UNESCO para a sustentabilidade dos oceanos, alertaram:

“Não faz sentido discutir a questão climática deixando os oceanos de lado, eles são o grande regulador do clima no planeta.” Segundo o professor, os efeitos percebidos na sociedade e nas atividades econômicas passam necessariamente pela intermediação dos mares, além das múltiplas possibilidades de geração de energia renovável associadas às marés, às ondas e até a gradientes de temperatura e salinidade. “Esta última ainda precisa ser bastante desenvolvida no mundo, e o Brasil pode ser um grande protagonista, um grande iniciador desse tipo de caminho.”

“Proteger o oceano é proteger o clima, e, portanto,  a vida”

Em painel promovido pelo MMA, Marina Silva falou sobre avanços e desafios da proteção aos mares. Ela parece ter se inspirado no discurso de Turra…

Porto de Belém
As embarcações tradicionais, menosprezadas no Brasil, farão o deleite das delegações francesa, inglesa, e holandesa pelo menos, eles amam barcos tradicionais. Acervo MSF.

Marina classificou o evento como “estratégico” para “proteção do oceano e pela resposta global à crise climática”. “Proteger o oceano é proteger o clima, e, portanto, proteger a vida”, afirmou. “Por isso, nossa abordagem climática está alicerçada na ciência, na equidade e no reconhecimento do papel central de povos indígenas, comunidades tradicionais, mulheres e jovens, verdadeiros guardiões do oceano e da biodiversidade”, completou.

Contudo, veja a incoerência, o Brasil ignorou os oceanos no plano climático enviado à própria ONU, conforme comentamos. Resta saber se durante a cúpula estes deslizes serão cobrados.

mercado Ver-o-peso
Aromas de Belém. Acervo, MSF.

Finalmente, dois anos depois de assumir, Marina Silva se compromete com os manguezais!

Desde que a ministra assumiu, em janeiro de 2023, temos cobrado uma posição sobre a evidente necessidade de termos um plano nacional para o replantio de mangues, a exemplo do que estão fazendo dezenas de nações mundo afora. Contudo, no Brasil Marina ainda não disse uma palavra sobre o assunto, assim como não fala sobre o bioma marinho.

Casario histórico de Belém
Casario histórico, tudo está sendo remodelado para receber a COP30 em Belém. Acervo MSF.

Mas, como é sabido, a ministra adora soltar o verbo no exterior.  Assim, ficamos sabendo através do site COP30.br, em inglês, que “Brasil reaffirms its leadership in protecting the ocean and mangroves at the UN Conference”.

‘At the conference’s opening, Brasil’s Minister of Environment and Climate Change, Minister Marina Silva, officially announced the federal government’s endorsement of the Mangrove Breakthrough Initiative, a global effort aimed at safeguarding and restoring mangrove ecosystems by 2030’.

Arre égua, finalmente! Acho que nos próximos posts sobre ações do Ministério de Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, vou escrever em inglês. Quem sabe da certo?

‘250 cientistas de 27 países cobram Lula por ações na COP30’

Em 18 de junho a Folha de S. Paulo publicou a matéria cujo título copiamos acima. ‘Mais de 250 cientistas de 27 países assinaram uma carta na qual pedem ao presidente Luiz Inácio  Lula da Silva (PT) que lidere uma transição energética justa, que leve ao fim do uso dos combustíveis fósseis’.

‘A carta, entregue nesta quarta-feira (18) ao presidente da COP30, o embaixador André Corrêa do Lago, em Bonn, na Alemanha, pede que Lula “seja o líder climático que o mundo precisa”.

‘Os cientistas também pedem que o mandatário torne o fim dos combustíveis fósseis uma prioridade da cúpula climática, que acontece em novembro, em Belém’.

‘Assinam a carta pesquisadores brasileiros de destaque dedicados à ciência do clima, como Paulo Artaxo, Carlos Nobre, José Marengo e Mercedes Bustamante. Cientistas estrangeiros com projeção na área, como a climatologista alemã Friederike Otto, também têm o nome listado. O documento foi entregue ao presidente da COP30 pelo físico climático Bill Hare’.

Mercado de carbono

O Brasil ainda patina nessa agenda crucial. Sexto maior emissor de gases de efeito estufa, foi responsável por 4,5% das emissões globais em 2023. Apesar da aprovação da Lei 15.024/2024, que cria um mercado regulado de carbono, o País ainda não precifica suas emissões. A lei deve entrar em vigor em 2027 — se não houver novo atraso.

Segundo o jornal Valor,  cerca de 25% das emissões globais de gases de efeito estufa já estão precificadas em 2024. Desse total, 6% são tributadas diretamente e 19% estão inseridas em mercados regulados de carbono. Isso mostra que parte das emissões no mundo já sofre penalização financeira. O objetivo é claro: estimular mudanças no consumo, incentivar novas tecnologias e, ao mesmo tempo, gerar receita para financiar ações de mitigação e adaptação ao clima.

A origem dessa ideia está no Acordo de Paris, de 2015. O Artigo 6 prevê a criação de um mercado global de créditos de carbono para viabilizar uma economia de baixo carbono.

Nesse cenário, o governo brasileiro promete levar à COP30 uma proposta ousada: integrar os mercados de carbono do Brasil, União Europeia, China e Califórnia.

Resta saber se esse avanço será possível.

O que podemos esperar da COP30?

Para ser sincero, não esperamos muito. E isso não tem relação apenas com a negligência do Ministério do Meio Ambiente, que continua ignorando o litoral e o bioma marinho ao utilizar “Última Flor do Lácio”.

Como já apontamos, o sucesso da COP30 depende de algo que nenhuma conferência anterior conseguiu: garantir financiamento real para a transição energética e o combate à crise climática. Estamos falando de nada menos que US$ 1,3 trilhão.

porto de Belém
Acervo, MSF.

Os países pobres ou em desenvolvimento não têm como fazer a transição e o combate sem ajuda externa. E, desde que Trump assumiu pela segunda vez a presidência do país mais rico do mundo, a primeira ação foi retirar novamente o país do Acordo de Paris.

De lá para cá, Trump criou uma montanha de atritos com todos os parceiros comerciais ameaçando a economia mundial. Para encerrar, torcemos para que nossa visão esteja errada, e que a COP de Belém seja um estrondoso sucesso.

Você sabia que um filme publicitário usando uma baleia como foco arrebatou todos os prêmios possíveis? É emocionante!

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