Ministra da Amazônia, ou do Meio Ambiente e Mudança do Clima?

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Ministra da Amazônia, ou do Meio Ambiente e Mudança do Clima?

O último avanço na agenda ambiental marinha ocorreu no governo de Michel Temer, de 2016 a 2019. Depois, de 2019 a 2022, essa agenda ficou parada. Nesse período, órgãos como o Ibama e o ICMBio enfrentaram desmoralizações públicas e sofreram com cortes de verbas e de pessoal. Nos últimos cinco anos, considerados os piores para o meio ambiente global devido ao aquecimento fora de controle, os eventos extremos que castigam o litoral, e à perda de biodiversidade, o Brasil ficou parado. Tudo o que aconteceu foi o descontrole sobre a Amazônia, a maior floresta úmida do mundo. Em 1º de janeiro de 2023, começou o governo Lula 3, com Marina Silva no ministério, gerando expectativas de progresso. No entanto, entrando no segundo ano desse governo, a agenda ambiental marinha continua parada. Afinal, Marina Silva é ministra da Amazônia, ou do Meio Ambiente e Mudança do Clima?

Marina Silva, a ministra da Amazônia só se pronuncia no exterior. Imagem, Felipe Werneck/MMA.

Boas e más notícias da agenda marinha a partir de 2023

Apesar da apatia do governo federal, tivemos algumas boas notícias, frutos de ações isoladas de alguns pesquisadores. Por exemplo, pesquisadores do IO – USP, Instituto Oceanográfico da USP, do Centro de Biologia Marinha (CEBIMar), além da UFRPE, descobriram que o tubarão-limão, cuja espécie é uma das dezenas que aparece na lista da IUCN como ‘vulnerável’, está finalmente se reproduzindo e aumentando a população no Atol das Rocas, uma das poucas unidades de conservação federais do bioma marinho, de proteção integral, as mais eficazes, a Reserva Biológica no Atol das Rocas.

As unidades de conservação de proteção integral são as mais restritivas, aquelas em que não se pode  extrair nenhuma espécie de vida marinha. Foram criadas em áreas que são berçários naturais. E, quando tem equipes e equipamentos, mesmo que mínimos, fato raro entre as UCs federais, elas dão resultados. O fato do tubarão-limão estar se recuperando numa época em que a sobrepesca de tubarões é um fenômeno mundial, é uma das provas, mas não a única.

Mais recentemente, informamos que uma pesquisa da Unifesp feita no Refúgio de Vida Silvestre dos Alcatrazes, outra UC federal de proteção integral, mostrou resultados positivos para a recuperação de tubarões ameaçados de extinção. Foram encontradas sete espécies na região, seis das quais estão classificadas como ameaçadas de extinção pela União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN). É uma dupla vitória da conservação marinha, mais uma vez provando que as UCs de proteção integral realmente cumprem seu papel.

A importância dos predadores do topo da cadeia alimentar

Já comentamos que os predadores do topo da  cadeia são importantíssimos para a vida marinha. São animais como os tubarões que mantêm a saúde dos cardumes. Ao mesmo tempo, a espécie que chegou na Terra ainda antes das árvores, há 450 milhões de anos, nunca sofreu tantas ameaças como agora.

Estas ameaças incluem  o aquecimento global, que prejudica toda a cadeia de vida marinha e, especialmente, a sobrepesca. Todos os anos, entre 70 e 100 milhões de tubarões são mortos pela pesca industrial. Essa caçada maciça e indecente, colocou em risco dezenas de espécies de tubarões.

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Falta inspiração ao ministério de Meio Ambiente e Mudança do Clima?

Talvez o sucesso em Alcatrazes inspire o ministério de Meio Ambiente e Mudança do Clima a acelerar mudanças já consensuais entre técnicos, especialistas e ambientalistas. Por exemplo, estão prontos para implementação o Parque Nacional do Albardão e a reclassificação da UC de Florianópolis, de Rebio dos Arvoredos, para Parque Nacional. Parques Nacionais permitem acesso do público e geram empregos e renda com atividades como mergulho de observação, além de promover educação ambiental.

A Rebio dos Arvoredos foi criada em 1990. Desde então, por este tipo de UC não permitir a entrada do público, nova batalha começou. É um consenso que o ICMBio errou ao classificar a unidade. Em primeiro lugar, porque o arquipélago dos Arvoredos fica no ‘quintal’ da população de Florianópolis que, de uma hora para outra, ficou impedida de aproveitar a proximidade das lindas ilhas que ficam a poucos minutos da orla. Se fosse um Parque Nacional, geraria os mesmos bons resultados para a fauna marinha, e ainda poderia gerar empregos e renda com os mergulhos de observação, uma tendência de turismo que cresce no mundo.

Câmara dos Deputados

Em 2021, a agência de notícias da Câmara dos Deputados divulgou que a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável aprovou o Projeto de Lei 4198/12. Esse projeto propõe transformar a Reserva Biológica Marinha do Arvoredo, em Santa Catarina, em Parque Nacional Marinho do Arvoredo.

Outras pautas também alcançaram consenso e estão prontas para serem implementadas. A ampliação do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos é uma delas. Em 2012, durante o governo Lula 2, com Izabella Teixeira no cargo atualmente ocupado por Marina, anunciaram uma proposta para ampliar as Áreas Marinhas Protegidas (AMPs) de Abrolhos, incluindo o Banco Royal Charlotte.

Esperar mudanças do governo anterior, que via o meio ambiente como um empecilho ao crescimento, não era realista. A entrada de Marina Silva gerou expectativas de avanço. No entanto, até agora, Marina focou principalmente na Amazônia.

O que aconteceu de novo na agenda ambiental marinha desde 2019 até 2024?

Nesse período, o cenário internacional apresentou várias novidades. Por exemplo, o combate à pandemia de COVID-19 gerou um aumento significativo no desperdício de plástico, afetando gravemente o meio ambiente, especialmente os oceanos. Com isso, a saúde dos oceanos chegou a um ponto crítico.

Também se observou um aumento na frequência e intensidade de eventos climáticos extremos, que afetam os litorais ao redor do mundo. Além disso, a falta de controle nas medidas contra as mudanças climáticas tornou evidente que a elevação do nível do mar é inevitável, podendo desalojar milhões de pessoas em breve.

Para enfrentar esses problemas, a ONU sugeriu aumentar as áreas marinhas e terrestres protegidas, recomendando que cada país membro proteja no mínimo 30% de seus territórios. Além disso, como forma de dar o exemplo, o tratado de proteção ao alto-mar foi finalmente aprovado pela organização.

Hoje no Brasil temos cerca de 25% de nosso mar territorial ‘protegido’. Entre aspas porque 23% desta proteção aconteceu durante o governo Temer com a criação de duas imensas áreas protegidas, mas em alto-mar, nas ilhas de Trindade e Martim Vaz, e São Pedro e São Paulo. Enquanto isso, nosso litoral continua com apenas 2% de sua área ‘protegida’ , sendo que apenas 0,05% por unidades de proteção integral.

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As ilhas ganharam protagonismo

Ilhas se destacam pela sua rica biodiversidade e alto grau de endemismo, atraindo atenção mundial diante do declínio da biodiversidade. Existem no mundo cerca de 465.000 ilhas, ocupando 5,3% da superfície terrestre. Elas abrigam uma vasta biodiversidade, mas também enfrentam altas taxas de extinção de espécies.

Espécies invasivas, particularmente nocivas às ilhas, receberam foco internacional para combate. Além disso, os manguezais entraram na agenda marinha global como “carbono azul” devido à sua importância como sumidouro de dióxido de carbono. Iniciaram-se programas globais para mitigar mudanças climáticas, restaurando ecossistemas costeiros como os mangues, programas esses que o Brasil não acompanhou, apesar do investimento em outros países.

Segundo informação que consta no site da UNESCO, de outubro de 2022, manguezais estão sendo restaurados em sete Reservas de Biosferas da América Latina e do Caribe. Até a falida Cuba entrou na onda e não precisou investir seus recursos, apenas apresentar um projeto e conseguir, como todos os outros, investimentos de fundos privados preocupados com a crise ambiental. Contudo, além do Brasil ficar de fora por não apresentar qualquer projeto, aqui manguezais continuam a dar espaço para a especulação imobiliária e ou, o crescimento urbano.

Em suma, a agenda marinha não avança, mesmo com um ‘ícone’ do ambientalismo à frente do ministério. Entre as três propostas hoje destacadas, duas envolvem ilhas e uma representa um tímido avanço na proteção de áreas marinhas. Todo o processo burocrático e o levantamento da fauna marinha já estão completos nesses casos. Resta apenas uma decisão política para emitir os decretos necessários. Apesar disso, não há progresso. Por estes motivos é que dizemos que Marina Silva, até prova em contrário, é ministra apenas da Amazônia. O Meio Ambiente e Mudança do Clima, continuam órfãos.

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