Dessalinização da água do mar, a solução para falta de água?

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Dessalinização da água do mar, a solução para falta de água?

O Relatório Mundial das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento dos Recursos hídricos 2019 não deixa dúvidas. ‘O uso da água tem aumentado em todo o mundo a uma taxa de cerca de 1% por ano desde a década de 1980, o que se deve a uma combinação de crescimento populacional, desenvolvimento socioeconômico e mudanças nos padrões de consumo. A demanda mundial por água deve continuar aumentando a uma taxa semelhante até 2050, o que representará um aumento de 20% a 30% em relação ao nível atual de uso, principalmente devido à demanda crescente nos setores industrial e doméstico’.  Seria a dessalinização uma das soluções? O Mar Sem Fim foi atrás das respostas.

Dessalinização da água do mar, a solução para falta de água?

O problema da falta de água tende a se agravar com as mudanças climáticas e, como quase sempre acontece, quanto mais pobres os países, maior a dificuldade ao acesso de água. Não por outro motivo o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável Nº 6 é Água potável e saneamento – garantir a gestão sustentável da água potável e do saneamento para todos.

Ilustração do objetivo nº6 do desenvolvimento sustentável

Mas, seria a dessalinização da água do mar uma das possibilidades? Descobrimos que o País mais adiantado na dessalinização é a Arábia Saudita, país com 33 milhões de habitantes, onde metade do abastecimento de água potável vem da água dessalinizada. Mas, a que custos?

Segundo o New York Times, de outubro de 2019, ‘a Arábia Saudita e outros países do Oriente Médio e do Norte da África estão no centro desse crescimento, com novos grandes projetos de dessalinização planejados ou em construção’.

Mas o jornal confirma o problema dos custos ainda muito altos. ‘Atualmente, a dessalinização é amplamente limitada aos países mais ricos, especialmente aqueles com muitos combustíveis fósseis e acesso à água do mar’.

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‘Além do Oriente Médio e do Norte da África, a dessalinização fez incursões em partes dos Estados Unidos com escassez de água, principalmente na Califórnia e em outros países, incluindo Espanha, Austrália e China’.

Dessalinização representa 1% da água doce do mundo

Segundo o New York Times, ‘apesar de um suprimento praticamente ilimitado de água do mar, a água dessalinizada ainda representa cerca de 1% da água doce do mundo’.

E acrescenta: ‘Mesmo na Arábia Saudita, onde vastas reservas de petróleo (e a riqueza que vem delas) tornaram o país o líder mundial da dessalinização, responsável por cerca de um quinto da produção global, há uma percepção de que o processo deve ser mais acessível e sustentável’.

Os custos ambientais da dessalinização

O New York Times também aborda esta questão que é essencial no momento em que o mundo se dispõe a trabalhar para mitigar suas emissões.

‘Também há custos ambientais na dessalinização: nas emissões de gases de efeito estufa pela grande quantidade de energia utilizada, e no descarte da salmoura, que além de ser extremamente salgada, é misturada a produtos químicos tóxicos usados no tratamento’.

Em seguida o jornal explica o método usado na dessalinização até agora, a tecnologia conhecida como…

Osmose Reversa, a tecnologia em uso até agora

O NYT mostra que a principal usina de dessalinização, Kaust, usa a osmose reversa’. E explica como funciona: Primeiro a água é passada por um filtro de areia para separar impurezas.

imagemde usina de dessalinização
A foto ilustrou matéria do New York Times com a legenda: Bombas elétricas de pressão de água e tubos de membrana de osmose reversa na Usina de Dessalinização de Sawaco em Jeddah, Arábia Saudita.

Em seguida a água passa por um processo de alta pressão, até ’70 vezes a pressão atmosférica, em tubos de aço recheados com membranas em espiral’.

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‘Os poros microscópicos nas membranas permitem a passagem das moléculas de água, mas deixam o sal e a maioria das outras impurezas para trás. A água doce sai de tubos de plástico no final de cada tubo de aço’.

O jornal explica que em todo o mundo, quase todas as novas usinas de dessalinização usam osmose reversa, introduzida meio século atrás, apesar de ter sido melhorada desde que surgiu.

Mas, ainda assim, os esforços para combinar energia renovável e dessalinização ainda estão em estágio inicial. Além da osmose reversa, os sistemas mais antigos das usinas de dessalinização térmicas dependem totalmente de combustíveis fósseis.

Usinas de dessalinização térmicas, as mais antigas

As usinas térmicas geralmente estão localizadas próximas a usinas de energia que queimam combustíveis fósseis e usam o excesso de calor da geração de eletricidade para transformar a água do mar em vapor.

Eles usam uma quantidade enorme de energia – em 2009, o ministro saudita de água e eletricidade estimou que um quarto de todo o petróleo e gás produzido no país foi usado para gerar eletricidade e produzir água potável.

As usinas térmicas são atualmente muito mais caras para operar do que as  de membrana. Mas como as  térmicas ainda têm pelo menos um quarto de século de vida, os pesquisadores estão trabalhando em maneiras de torná-las mais eficientes.

Os rejeitos da dessalinização

O New York Times mostra que, independente do método usado, todas as fábricas produzem salmoura concentrada. E os volumes são maiores que a estimativa da indústria, em média um galão e meio para cada galão de água doce produzido.

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A maneira do descarte tem sido bombear a salmoura de volta ao mar. Mas a água extremamente salgada pode prejudicar as gramas marinhas e as larvas de peixes, e ainda criar camadas sem oxigênio na água que podem prejudicar ou matar outras criaturas marinhas.

Seja pelos rejeitos, seja pela energia fóssil que ainda toca a maioria das usinas de dessalinização, o caminho até encontrarmos uma solução não será fácil, nem barato.

Usina de domo solar, a novidade

A novidade agora é que a Arábia Saudita anunciou em 2020 a construção da primeira usina de “domo solar” capaz de dessalinizar água. A iniciativa é uma parceria entre o governo do país e a empresa privada Solar Water – com sede em Londres – e tem como objetivo desenvolver uma nova técnica neutra em carbono, livre de produtos químicos poluentes e sem grandes quantidades de eletricidade para transformar água do mar em água potável.

O acordo foi firmado no final de janeiro de 2020 e a criação da fábrica  já está em sua fase final, com previsão de conclusão ainda este ano.

A usina está sendo instalada em Neom, uma megacidade da costa norte do Mar Vermelho. Trata-se de uma cidade planejada para incorporar tecnologias inteligentes e também ser um chamariz para o turismo. O projeto  tem um custo estimado em US$ 500 bilhões, e tudo nela deve ser movido por fontes renováveis.

A nova usina de dessalinização

Segundo o site somagnews, ‘a planta é essencialmente uma panela de aço enterrada no subsolo, coberta por um domo [de vidro], fazendo com que pareça uma bola”, disse David Reavley, presidente da Solar Water . Esta instalação é baseada em uma tecnologia experimental de energia solar concentrada, composta por refletores heliostáticos (com aspecto semelhante a painéis), que focalizam a radiação para o interior da base’.

Ilustração de usina de domo solar
A nova planta em breve será testada pela Arábia Saudita. Ilustração, https://www.somagnews.com/.

‘O calor armazenado é então direcionado para a água do mar dentro da cúpula, fazendo com que o líquido evapore e se condense para se tornar água potável. O executivo afirma que a construção ecológica também traz como vantagem um valor relativamente baixo e de fácil aplicação, o que pode favorecer seu aproveitamento econômico em várias partes do mundo onde há escassez de água potável, principalmente no Oriente Médio’.

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Infelizmente, a matéria do site somagnews não menciona custos, nem rejeitos. Pesquisamos mais e encontramos outra, do site da Arábia Saudita, www.spa.gov.sa.

O site diz que a tecnologia é ‘totalmente sustentável’ e ‘100% neutra em carbono’.  Diz ainda que o sistema ‘reduz significativamente o impacto ambiental, produzindo menor quantidade de solução salina’.

Como se trata de um site do governo da Arábia Saudita, e até agora desconhecido para nós, não sabemos até que ponto podemos confiar em suas informações. De qualquer modo, em breve a nova usina deve entrar em funcionamento, chamando a atenção da mídia. Então voltaremos ao tema.

Imagem de abertura: https://www.somagnews.com/.

Fontes: https://www.unwater.org/publications/world-water-development-report-2019/; https://www.nytimes.com/2019/10/22/climate/desalination-water-climate-change.html; https://www.somagnews.com/saudi-arabia-builds-solar-plant-to-extract-salt-from-sea-water/,https://www.spa.gov.sa/viewfullstory.php?lang=en&newsid=2028374.

Tubarão-charuto, ou cookiecutter, o pequeno infernal

Comentários

7 COMENTÁRIOS

  1. Mar Sem Fim, como sempre, dando um show de informação!
    Matérias muito bem escritas que abordam assuntos impactantes na qualidade de vida do nosso tão maltratado Planeta Azul (até quando?).
    Além de informativo, Mar Sem Fim está sempre se posicionando em favor da verdade e das causas mais nobres de preservação do meio ambiente, denunciando os desmando e absurdos cometidos em nome dos interesses mais irresponsáveis e criminosos, muitos deles, talvez a sua maioria, sob a assinatura cúmplice das autoridades. Como aliás, estamos cansados de ver em nosso país.
    Acrescento ainda, que além da informação sempre pertinente, termos o prazer da leitura dos textos sempre muito bem elaborados, expondo as ideias e informações com clareza e respeito ao leitor.
    Obrigado, MSF!

    • Cezar de Mercês (ex O Terço, do “Simplesmente” e “Nada no escuro”???? Se for, meu Deus. sua música “Simplesmente” foi a trilha sonora de uma das melhores fases da minha vida. Agora sobre dessanilização da água do mar, acho que será o futuro para o problema da agua doce.

  2. Em nosso país, temos uma perda no abastecimento de água potável superior a 30%, em algumas cidades do Brasil até na ordem de mais de 60%. Também o consumo por habitante/dia é superior ao que a ONU recomenda, de 110L/hab/dia. Trabalhar redução de perdas físicas para patamares compatíveis com a escassez hídrica da região.
    Da mesma forma, temos a tecnologia, já em uso, do reúso direto planejado de água não potável oriunda de estações de tratamento públicas, como no caso de Indaiatuba, no estado de São Paulo. Esta é uma água que independe de mudanças climáticas e do regime de chuvas.
    Em Indaiatuba, a água de reúso produzida estará sendo direcionada para uso industrial, o que diminiurá a captação de água via poços tubulares profundos.
    São soluções que podem ser adotadas, basta vontade política.

  3. Com tantas universidades federal, tantas faculdades e ninguém tem projetos no nordeste para desalinizar águas salobras nos rincões como se tais projetos fossem como ir a Marte. Penas que não tenhamos uns Ellon Musk brasileiros.

  4. Existe um grande equívoco ao associar o grande consumo de energia a demanda da planta de dessalinização. Na verdade, a maior parte do consumo está associado a distribuição de água, muitas vezes tendo que transpor grandes distancias e altitudes.

  5. Reportagem muito boa, mas não apresentou os custos de dessalinização e nem fez comparações de custos com outros processos. Algumas cidade costeiras do Brasil são abastecidas com água de poços tubulares profundos, ou através de aquedutos distantes, e os custos de construção desses poços e aquedutos e de bombeamento da água até a superfície e às cidades são elevadíssimos, ainda mais com os aumentos do custos da energia elétrica. Acredito que para cidades costeiras brasileiras a dessalinização seja viável economicamente, e os resíduos salinos devolvidos de forma racional ao mar não irão gerar impactos ambientais significativos.

    • Se houvessem homens com AGÁ maiúsculos poderiam fazer aquedutos em tubulações de aço para evitarem roubos e trariam água mesmo que fosse do Rio Amazonas.

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