Descobertas da arqueologia submarina, conheça

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Descobertas da arqueologia submarina, conheça algumas

A descoberta do local do naufrágio do Endurance, de Sir Ernest Shackleton, deu mais uma prova do quão avançada anda a arqueologia submarina em nossos dias. A atividade começou logo após o mergulho autônomo no início dos anos 1950, graças ao gênio de Jacques Cousteau. Nos 20 anos seguintes, mergulhadores começaram a descobrir, documentar e analisar naufrágios. No início da década de 1970, esses mergulhadores formaram grupos para trabalhar em projetos maiores e aprender sobre arqueologia. Na mesma época, a arqueologia nas universidades começou a oferecer cursos e a disciplina de arqueologia subaquática se enraizou. Mas duas forças contribuíram aos avanços tecnológicos adotados neste campo: a primeira foi a guerra antissubmarino, a segunda, a exploração de petróleo e recursos minerais na plataforma continental. O avanço mais notável se deu com a perfuração de petróleo que, por valer tanto nos dias atuais, compensou os custos de desenvolvimento dos equipamentos quase sempre muito caros para a arqueologia submarina.  Tema de hoje: as novas descobertas da arqueologia submarina.

Descobertas da arqueologia submarina
Em 1933, um comandante da RAF avistou ruínas no fundo do mar ao sobrevoar a foz do Nilo. Ele visitou o local com um estudioso egípcio e descobriu vários artefatos. No final do século, foi revelado que eram as ruínas de duas cidades antigas: Thonis-Heracleion e Canopus. Imagem,Christoph Gerigk/Franck Goddio/Hilti Foundation.

A arqueologia submarina

Dois grandes avanços foram feitos na forma como fazemos a arqueologia marítima debaixo d’água. O primeiro é o uso crescente de veículos submarinos autônomos. Estes robôs, equipados com aparelhos digitais de imagem, podem inspecionar o fundo do mar de forma independente. Sem necessidade de serem controlados por um operador humano. Eles podem ir mais fundo e permanecer na água por mais tempo do que os mergulhadores. Assim foi descoberto o Endurance que encantou o mundo. Mas, os mergulhadores ainda são essenciais.

Um navio helenístico nunca antes visto

Uma equipe de arqueólogos subaquáticos do Instituto Europeu de Arqueologia Afundada (IEASM) descobriu um antigo navio de guerra na cidade submersa de Heraklion, na baía de Abi Qir, no Egito. Heraklion, também conhecida como Thonis, era uma cidade egípcia localizada perto da foz  do Nilo. Durante o final do século 2 a.C, uma combinação de terremotos, tsunamis, aumento do nível do mar e liquefação do solo, resultou na submersão de Heraklion junto com os centros populacionais adjacentes de Canopus e Menouthis.

O navio estava atracado perto do templo de Amon, mas foi atingido por pedras que caíram quando o templo desabou como resultado de um grande evento sísmico. Os destroços enterraram o navio a uma profundidade de 5 metros no fundo de um canal, sepultando os destroços (e protegendo-os) em camadas de argila endurecida. Usando equipamentos de última geração, a equipe do Instituto Europeu de Arqueologia Afundada foi capaz de descobrir o que até então apenas se imaginava, já que havia relatos antigos da embarcação.

destroços de navio helenístico
A equipe desenterra com cuidado artefatos carregados pelo navio descoberto. Imagem, Ministério do Turismo e Antiguidades do Egito.

Para Franck Goddio, presidente do Instituto Europeu de Arqueologia Subaquática, “Os achados de galeras rápidas deste período permanecem extremamente raros, sendo o único outro exemplo, até hoje, o navio Púnico Marsala de 235 a.C”. No entanto, “antes desta descoberta, os navios helenísticos deste tipo eram completamente desconhecidos pelos arqueólogos.”

Já o professor Ehab Fahmy, chefe da Administração Central de Monumentos Afundados,  “a missão também conseguiu encontrar os restos de uma área funerária grega que remonta ao início do século IV a.C., na entrada do canal nordeste da cidade, onde eles foram autorizados a se estabelecer durante a era faraônica tardia, e realizaram seus templos funerários perto do templo principal”.

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O último confronto da primeira Guerra Púnica em 241 a.C.

O Mar Sem Fim já comentou sobre as grandes batalhas navais das Guerras Púnicas.  Foram três Guerras Púnicas entre 264 a.C. a 146 a.C. Estava em jogo o domínio sobre o ‘mar com fim’ como aludiu ao Mediterrâneo o poeta Fernando Pessoa em seu lindo poema Padrão. A disputa aconteceu entre a cidade estado fenícia de Cartago (atual Túnis), e a potência em ascensão, Roma. Seu principal  protagonista era ninguém menos que o general Aníbal, um ícone da História.

Em novembro de 2013, arqueólogos submarinos anunciaram a recuperação de um tesouro de artefatos na costa da Sicília, local da primeira batalha naval antiga já descoberta, incluindo aríetes, capacetes, armaduras e armas que datam de 2.000 anos. São os resquícios da Batalha das Ilhas Egadi – o último confronto da primeira Guerra Púnica que ocorreu em 241 a.C.

Descobertas da arqueologia submarina: um naufrágio de barco da idade do Bronze

A arqueóloga marinha e pesquisadora do Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS) na França, Giulia Boetto, anunciou a incrível descoberta de um naufrágio de um barco na enseada de Zambratija, na Croácia, que foi datado como sendo de 1.200 a.C

mergulhador em naufrágio de barci costurado
Um mergulhador observa o naufrágio. Imagem, www.lepoint.fr.

A descoberta única e rara é um barco costurado da Idade do Bronze, um tipo de barco de madeira que é literalmente costurado usando cordas, raízes ou galhos de salgueiro. 

Exemplo de barco com casco costurado da idade do Bronze
Um exemplo de um barco costurado. Crédito da foto: World of Boats.

O barco mede 7 metros de comprimento e 2,5 metros de largura e seu casco é costurado,  uma técnica de construção naval praticada no Adriático até a época romana. As técnicas de construção de barcos costurados foram usadas em muitas partes do mundo antes do desenvolvimento de fixadores de metal. Mas, não só apenas barcos encontrados pela arqueologia submarina…

A única caverna subaquática da Idade da Pedra do mundo

Quando o instrutor de mergulho francês Henri Cosquer descobriu, em 1985, o acesso a uma caverna inundada a uma profundidade de 37 metros, durante um mergulho no Mediterrâneo ao largo da costa de Marselha, ele não sabia que escondia um sensação.

Descobertas da arqueologia submarina: as misteriosas pinturas pré-históricas

Ele e seus companheiros mergulharam várias vezes nos meses seguintes. Mas Henri só conseguiu chegar à caverna principal em 1991,  através de um túnel. Mais tarde, levaria seu nome. O espaço estreito e esculpido em pedra estava completamente seco, suas paredes cobertas com misteriosas pinturas pré-históricas.

Desenhos tinham aproximadamente 19.000 a 27.000 anos

Os arqueólogos e cientistas que mais tarde examinaram a caverna descobriram que os desenhos tinham aproximadamente 19.000 a 27.000 anos. As pinturas mostravam principalmente animais – focas, peixes, cavalos, bisões, cabras da montanha, aves marinhas – que eram surpreendentemente realistas.

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desenho de bisões da idade da Pedra
Cavalos negros pintados na caverna descoberta pelo mergulhador Henri Cosquer. Imagem, @Luc Vanrell.

Idade da Pedra

“É a única caverna submarina da Idade da Pedra que conhecemos até hoje”, explicou o arqueólogo marinho Fritz Jürgens, da Universidade de Kiel, que também mergulha para explorar cavernas. “Há condições de conservação particularmente boas lá.”

No final de uma era glacial, esta caverna, que fica a cerca de 11 quilômetros da costa no sul da França, foi usada e pintada por pessoas da Idade da Pedra. Mas, à medida que as calotas polares derreteram, o nível do mar subiu gradualmente e a entrada da caverna ficou em algum ponto submersa. No entanto, a própria caverna mais alta permaneceu seca.

Ilustração da Caverna Cosquer
A caverna ficou tão famosa por suas extraordinárias pinturas da Idade da Pedra que ganhou até verbete na Wikipedia.

“É assim que essas pinturas rupestres da Idade da Pedra de 20.000 anos e muito originais sobreviveram”, disse o pesquisador Jürgens à DW. “Elas incluem uma pintura em estêncil de uma mão humana e a única representação conhecida da Idade da Pedra de um pinguim.”

Depois desta descoberta única o especialista em arte rupestre da França,  Jean  Clottes, foi chamado para colaborar no estudo das pinturas. “Embora imagens de focas como as da Caverna Cosquer tenham sido encontradas em objetos pré-históricos gravados, as pinturas de arau-gigante eram únicas.”

Henri Casquer
Henri Cosquer observa os desenhos que ele descobriu. Imagem, Gamma-Rapho.

O professor Clottes e o resto da equipe ficaram perplexos depois de descobrir que a arte não era obra de apenas um período histórico. Entre os desenhos sobreviventes  estavam  65 estênceis de mão que datam de 27.000 anos e também arte mais recente que remonta a 19.000 anos. “É a pintura mais antiga do mundo para um período pré-histórico.”

E estas são apenas algumas das descobertas recentes da arqueologia submarina que tem um afamado representante no Brasil, Gilson Rambelli, professor associado do Departamento de Arqueologia da Universidade Federal de Sergipe. Mas ele não se conforma com a  Lei federal 7.542, de 1986, que pôs fim ao porcentual concedido à livre iniciativa pela exploração do patrimônio cultural submerso. Saiba mais sobre a legislação brasileira neste link.

A arqueologia submarina como profissão

Fizemos uma rápida pesquisa na net para trazer estas informações ao leitor. As oportunidades de carreira em arqueologia subaquática estão crescendo constantemente. Uma razão é que a consciência do valor do patrimônio cultural desses recursos está aumentando em todo o mundo.

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Outra é que os arqueólogos subaquáticos são capazes de fazer contribuições únicas para nossa compreensão do passado. Nos Estados Unidos, por exemplo, os salários dos arqueólogos subaquáticos variam de $ 13.805 a $ 366.461, com um salário médio de $ 66.235.

E no Brasil…

Sobre a disciplina no País encontramos artigo de Cristiane Eugênia Amarante e Paulo Fernando Bava-de-Camargo (leia aqui na íntegra) que dá uma pista parecida com a do professor Gilson Rambelli:

‘A Arqueologia subaquática vem sendo desenvolvida, no Brasil, desde o início da década de 1990, embora haja antecedentes pontuais. A despeito desse ramo da arqueologia ter avançado significativamente nesses quase 25 anos, ainda há um difícil processo de regulação científica de sua prática’.

Desafio é a legislação brasileira

‘Um dos maiores desafios é a legislação brasileira em relação às regras internacionais. Enquanto a Convenção da UNESCO para a Proteção do Patrimônio Cultural Subaquático (2001), ainda não adotada pelo Brasil, constitui instrumento preservacionista, a Lei federal 7.542/1986, alterada pela 10.166/2000, é extremamente permissiva, possibilitando a comercialização de bens arqueológicos. Essa distorção cria dificuldades para a prática da Arqueologia subaquática em águas territoriais e estimula a caça ao tesouro, uma vez que os maus hábitos internos fornecem desagradável cartão de visitas’.

Agora, depois da extraordinária descoberta do Endurance, que tem apelo mundial e teve destaque em quase toda a a mídia internacional, o impulso será ainda maior. Resta apenas entender a índole humana que investe trilhões de dólares para explorar o espaço sideral, e  muito pouco na exploração oceânica. Não por outro motivo conhecemos hoje  apenas 5% do subsolo oceânico.

Imagem de abertura: Christoph Gerigk/Franck Goddio/Hilti Foundation.

Fontes: https://www.dw.com/en/the-secret-world-of-underwater-archaeology/a-57200329; https://www.ancient-origins.net/news-history-archaeology/incredible-discovery-boat-wreck-croatia-dated-3200-years-001458; https://www.heritagedaily.com/2021/07/underwater-archaeologists-discover-ancient-shipwreck-in-sunken-city/139726.

A última orca em cativeiro do Seaquarium

Comentários

1 COMENTÁRIO

  1. O Brasil necessita integrar-se às normas de exploração arqueológicas adotadas nos países da Europa, Norte da África, Oriente Médio, enfim que contam com história de antes da era cristã. Temos muitos vestígios de civilização antiga no Brasil e muito provavelmente descubramos muitos tesouros como em túneis descobertos na Amazônia, que seriam os caminhos, peabirus, utilizados pelos índios para locomoção sem ter que desbravar as florestas. Estes caminhos correriam por todo o Brasil, de norte a sul e de leste a oeste. Foram encontrados também vestígios de cidades escondidas na Floresta amazônica, próximas a estes túneis. Há desenhos rupestres no Piauí, Paraíba, Minas Gerais e Mato Grosso. Enfim há muito a ser explorado em nosso continente e certamente também em nosso litoral.

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