Bali, Indonésia, ‘paraíso’ ou depósito de lixo?

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Bali, Indonésia, ‘paraíso’ ou depósito de lixo plástico?

Um dos vícios da indústria do turismo é batizar parte dos litorais do planeta como ‘paraíso’, às vezes vão além, ‘paraíso intocado’. Quantas vezes já vi isso em papéis de agências de turismo ou, mais recentemente, nas páginas da internet? Perdi a conta. São inúmeras as praias assim batizadas. Mas neste mundo superpopuloso continuar nesta toada é quase um ato criminoso. No mínimo, é enganador. Bali, Indonésia, ‘paraíso’ ou depósito de lixo plástico?, post originalmente publicado em 2020, e atualizado com novas informações em 2023.

imagem de praia cheia de plástico em Bali, Indonésia
O ‘paraíso intocado’ de Bali, Indonésia. Imagem, National Geographic.

Bali, Indonésia, ‘paraíso’ ou depósito de lixo?

Uma das regiões que recebeu esta alcunha é a ilha de Bali, Indonésia; na verdade, hoje, um ‘paraíso’ de lixo plástico. Até um ícone do jornalismo mundial como a National Geographic ainda utiliza o adjetivo, mesmo ao publicar matéria que mostra como Bali se transfigurou nos últimos tempos.

“Qual é a primeira coisa que vem à mente quando se fala em Bali? Provavelmente, as praias lindas e intocadas da região. Contudo o que aparece com cada vez mais frequência nas praias dessa paradisíaca ilha do arquipélago indonésio não são conchas, mas lixo plástico.”

Praias intocadas?

imagem de praia de Bali
Alguém pagaria para se deleitar com este ‘paraíso’? Imagem,https://www.independent.co.uk/.

A matéria foi publicada em novembro de 2019 com o título Bali luta para conservar suas lindas praias repensando o lixo plástico. Na verdade, o que Bali mais quer é se ver livre do entulho e assim manter os recursos do turismo, uma das atividades que mais empregos gera, e das que mais cresce no mundo.

Nova matéria sobre os esforços de Bali, publicada em 2023

A Bloomberg publicou nova matéria sobre os esforços em Bali para se recuperar da pandemia plástica. Apesar de alguns avanços, o problema persiste. Segundo a Bloomberg, “Durante um período de seis semanas nesta primavera, a organização não governamental indonésia Sungai Watch coletou mais de 40 toneladas de lixo na Baía de Jimbaran, em Bali.”

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Praia de Bali, Indonésia, repleta de plástico
Imagem, YouTube.

A magnitude não surpreendeu ninguém no local. Tsunamis de lixo como este tornaram-se um problema recorrente: eles chegam da vizinha Java, a ilha mais populosa do mundo, durante a estação das monções todos os anos.”

A agência confirma a importância do turismo para a ilha. “Poucos destinos dependem tanto do turismo como Bali, que conta com a indústria para entregar mais de metade do seu produto interno bruto.”

E mostra que o problema está longe de ser resolvido. “Mas o lixo é a questão mais surpreendente: sem um sistema centralizado de recolha ou tratamento de resíduos, o governo estima que 52% do lixo de Bali é mal gerido. Entre cerca de 1.000 lixões ilegais a céu aberto que poluem as águas da ilha e o lixo que se acumula nas costas e nas margens das estradas, o lixo é a maior ameaça à economia do turismo.”

Falta conscientização sobre o ciclo do plástico

A questão é mundial e não se resume apenas à praias, mas ao meio ambiente marítimo e terrestre. Já comentamos inúmeras vezes os problemas, e também as virtudes do material. A invenção do plástico, nos anos 50 do século passado, contribuiu demais com a humanidade. Mas hoje sabe-se que ele nos trouxe um novo problema: como nos livrarmos do plástico usado?

O material é onipresente. Eu mesmo já fiz o possível para usar menos plástico. Mas jamais consegui algo a mais que migalhas. Olhando em volta de onde escrevo me vejo cercado.

Das teclas do computador onde escrevo, às canetas que ficam em volta para anotações. Sem falar no frasco de álcool em gel, das capas dos fios que saem da tomada e mantém vivo meu computador, do mouse que uso para clicar aqui ou ali.

Vivemos uma pandemia de plástico. E Bali não é exceção, é a regra do nosso mundo. Pior, a reciclagem de plástico é quase impossível como já demonstramos. De todo o plástico produzido no mundo, em 65 anos desde a sua invenção, apenas 9% foi reciclado.

O que diz a matéria da Bloomberg  sobre a gestão do plástico, passados três anos da publicação deste post? Vejamos: “O  lixo é a questão mais surpreendente: sem um sistema centralizado de recolha ou tratamento de resíduos, o governo estima que 52% do lixo de Bali é mal gerido. Entre cerca de 1.000 lixões ilegais a céu aberto que poluem as águas da ilha e o lixo que se acumula nas costas e nas margens das estradas, o lixo é a maior ameaça à economia do turismo.”

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Isto mais uma vez mostra a dificuldade de nos livrarmos do plástico, mesmo quando há esforço nacional e vontade política.

Fechar os lixões a céu aberto custará US$ 40 milhões nos próximos três anos

De acordo com a nova matéria da Bloomberg, “serão necessários investimentos de US$ 40 milhões nos próximos três anos – com um orçamento de US$ 150 mil por ano, por local, em cerca de 100 vilarejos para fechar todos os lixões ilegais em Bali.”

“Os países próximos oferecem modelos potenciais para Bali”, diz a Bloomberg. “Tomemos como exemplo a popular ilha de férias das Filipinas, Boracay, que fechou em 2018 durante seis meses para reparar danos ambientais e limpar a poluição que resultou, em grande parte, do turismo excessivo e do desenvolvimento acelerado. Em Bali, seis meses podem significar uma perda de até 3,5 mil milhões de dólares com base nas receitas do turismo de 2019, uma vez que mesmo a estação chuvosa, outrora lenta, está agora tão movimentada como a época alta.”

Quanto a reiniciar do zero, o chefe de turismo Adnyana diz que “a área de Bali é muito grande” para realizar uma paralisação. “Muitas pessoas vão reclamar”, diz ele.”

A agência confirma que o turismo de massa é problema mundial. Contudo, há como gerir o turismo com muito mais facilidade do que o lixo, basta vontade e decisão.

Uma abordagem pode ser seguir o exemplo de Amsterdã, Havai ou Veneza – todos destinos que estão mudando as estratégias de gestão do turismo para um modelo de menor densidade que não se adapta aos mochileiros, mas aos viajantes com salários mais elevados (e teoricamente mais conscientes).”

O governo concorda, mas apenas até certo ponto: em julho, o governador de Bali, Wayan Koster, anunciou que uma taxa turística de US$ 10 seria cobrada de todos os visitantes na entrada a partir de 2024, com os ganhos destinados à conservação ambiental e cultural.”

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Esta estratégia, de cobrar turistas e destinar os recursos à conservação, foi implantada em Ubatuba recentemente, com muitos protestos por parte dos turistas e moradores que não suportam mais os impostos. O Mar Sem Fim defendeu a ideia apesar dos pesares.

Como se vê, o problema do plástico é gravíssimo, e não sea soluções fáceis. A seguir, a conclusão do post original de 2020.

Pior gestão do lixo plástico: Indonésia em segundo lugar

NG: “Em um estudo de 2015 publicado na revista científica Science sobre os 20 países com a pior gestão de lixo plástico, a Indonésia apareceu em segundo lugar. O país gerou 3,2 milhões de toneladas de plástico em 2010, e quase metade disso acabou no mar.”

“A China ficou na primeira posição; os Estados Unidos, na vigésima. O governo indonésio apresentou à National Geographic números um tanto menores que os informados no estudo, mas a conclusão é a mesma: a maior parte do lixo plástico não é bem gerida na Indonésia.”

Proibir sacolas plásticas, é tudo o que conseguimos?

O plástico hoje é um problema mundial. O tema é debatido por grande parte dos países e organizações mundiais como a ONU. E parece que tudo que conseguimos é banir, em alguns lugares, as sacolas e canudinhos de plástico. É muito pouco para uma humanidade que se preparara para colonizar Marte.

NG: “Bali vem tentando enfrentar seu problema com o plástico e, nesse esforço, produziu alguns exemplos dignos de menção. No fim de 2018, o governador balinês Wayan Koster anunciou a proibição de sacolas plásticas, poliestireno e canudos plásticos.”

“O governo indonésio prometeu reduzir o lixo plástico marinho em 70% até 2025. O governo balinês, por sua vez, está transformando o maior aterro sanitário da ilha, o aterro de Suwung, de 32 hectares, localizado na capital Denpasar, em um parque ecológico e uma usina de geração de energia a partir de esgoto e lixo.”

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Mesmo que Bali avance em suas metas publicadas pela National Geographic, isso está tão distante de acabar o problema como a distância da Terra ao planeta a que pretendemos colonizar. Já fizemos matéria mostrando os litorais mais imundos do planeta. Quase todos ficam na Ásia, apesar do problema estar longe de ser asiático.

No Brasil nem é bom falar. Basta ver o que acontece em cada virada do ano nas praias ‘paradisíacas’ que temos. É de dar nojo. Isso sugere que enquanto todos os governos do mundo não se unirem para acharem uma solução o problema tende a aumentar até sermos engolidos por nossos rejeitos diários.

Os produtores de plástico continuam livres, leves e soltos. Até quando?

NG: “A recente proibição das sacolas plásticas descartáveis pelo governo levantou objeções por parte dos produtores indonésios de plástico, preocupados com o freio que a proibição pode colocar no setor. Os produtores estão convencidos de que a gestão de resíduos precisa ser melhorada, além da redução do uso.”

Aqui há um ponto de concordância com o que já lemos e estudamos sobre o assunto. A redução do uso é obrigação de cada cidadão consciente, e respectivos governos. Mas a indústria do plástico não pode continuar a se eximir como se o problema fosse apenas de cidadãos e governos.

Ela é parte importante do problema e, como todos, tem necessariamente que dar a sua contribuição. Mas, até hoje, ainda não vimos quase nenhuma ação por parte da indústria do plástico.

Enquanto alguns governos e cidadãos procuram dar sua contribuição, uns proibindo plásticos de uso único, outros procurando evitar quando podem o material, a indústria continua a produzir plástico que não é reciclável às carradas.

Exemplos que podem e devem ser seguidos

Pesquisadores mundo afora estudam a criação de plásticos biodegradáveis, mas ainda não vimos (não quer dizer que não existam) nada que seja definitivo.

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Proibição ainda engatinha

Governantes mais antenados aumentam a pressão proibindo a fabricação de alguns itens. Já são mais de 50 os países que baniram certos tipos de plástico. Mas isso também é um paliativo. São quase 200 os países do mundo.

Empresas se unem contra o problema

Em razão da enormidade do problema, surgiu em 2019 a Aliança para o Fim dos Resíduos Plásticos que envolve algumas das maiores empresas do mundo, inclusive algumas produtoras de plástico. A aliança é um movimento de união de cerca de 30 empresas tidas como ‘gigantes’ globais (setores plástico e bens de consumo), de quase todos os continentes, Américas, Europa, Ásia, África e Oriente Médio, e investimentos previstos de US$ 1,5 bilhão de dólares nos próximos cinco anos visando livrar o descarte incorreto do plástico, principalmente, mas não apenas, nos oceanos.

É um começo. Mas longe de ser suficiente. Enquanto estas empresas se uniram em torno de um problema comum da humanidade, outras gigantes fazem o oposto.

110 bilhões de garrafas de coca-cola em 2016

Para se ter uma vaga ideia do tamanho do problema, apenas uma delas tão onipresente em nosso cotidiano como o plástico, a coca-cola, produz 3.400 garrafas de plástico por segundo! Garrafas de plástico não reciclável. Em 2016 foram nada menos que 110 bilhões de garrafas.

Pressão popular, o que resta aos consumidores antenados

Depois de ingerida a bebida, onde vão parar as garrafas? Ao serem divulgados estes números assustadores começou um processo de pressão popular contra a marca. Até que em 2019 a empresa mostrou ínfima reação produzindo garrafas produzidas com plásticos recuperados e reciclados do oceano. Foram apenas 300 unidades.

Calcula-se que um milhão de garrafas plásticas são vendidas por minuto no planeta, algo em torno de 20 mil compradas a cada segundo.

O exemplo de Ruanda

Para os que não acreditam que os países podem e devem ir mais adiante, resta o consolo de Ruanda, na África, que desde 2008 proibiu qualquer plástico não biodegradável. E foi pra valer. As Nações Unidas nomearam a capital do país, Kigali, a cidade mais limpa do continente africano.

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O exemplo serve para vermos como ainda estamos patinando. A África hoje lidera o banimento de plástico no mundo, Ruanda não está sozinha no continente. O país agiu sem se incomodar com os prejuízos provocados para alguns setores da economia. Pensou grande e tem colhido frutos demonstrando que o mundo está atrasado.

Pensar grande no mundo desenvolvido, dito rico, seria incluir obrigações às produtoras mundiais de plástico.

Bali, Indonésia, os ‘paraísos intocados’ vão se proliferar

Ou isso, ou os ‘paraísos intocados’ de Bali vão se proliferar como a pandemia que colocou de joelhos a humanidade. Não há no horizonte outro caminho. Nem mesmo baixar os preços dos hotéis como Bali, em desespero, fez. Claro, não é apenas pela imundície de suas praias, mas também pelo flagelo da pandemia.

De acordo com o independent.co.uk, “encontramos quartos disponíveis por £ 14 a noite. Outro hotel, Yoga Amertham Retreat and Resort em Ubud, disse que os quartos estavam disponíveis por menos de £ 9 e as refeições estavam sendo vendidas por 5.000 rúpias indonésias – apenas 27p.”

Alguém se habilita a banhar-se no lixo?

Assista ao vídeo e saiba mais

Bali islanders swap plastic waste for rice under green scheme to help tourism sector amid pandemic

Fontes: https://www.nationalgeographicbrasil.com/meio-ambiente/2019/11/bali-luta-para-conservar-suas-lindas-praias-repensando-o-lixo-plastico?fbclid=IwAR1OsjO4ZiW5_IuC-RaI4ADsVB8bwnYneq0ibt8pV_qFV7OvNqvlGGdiozQ; https://www.independent.co.uk/travel/news-and-advice/bali-hotels-cheap-rooms-tourists-b1762241.html?utm_content=Echobox&utm_medium=Social&utm_source=Twitter#Echobox=1606392606.

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Comentários

6 COMENTÁRIOS

  1. Matéria muito necessária. Me bateu uma desesperança e uma pena pelos habitantes dessas belas ilhas do Pacífico, mas sem esquecer que em breve a pandemia de lixo plástico também irá assolar nosso litoral

  2. Tema super importante. Mas grande parte do plástico que chega ao litoral da Indonésia não foi gerado naquele país. Esse é um problema mundial, que precisa ser gerido globalmente. E não venha a Europa fazer cara de paisagem nessa história…

  3. O único jeito é quando dói no bolso… Aumentar cútis pras empresas geralmente vim impostos mais altos que induzam a troca de plástico por vidro, metal ou papelão… Especialmente de bens supérfluos como garrafas pet… Uma taxação diferenciada por produto… Não conseguiremos nos livrar do plástico mas devemos incentivar o isso correto…e, talvez, até queimar o plástico irrecuperável em troca de energia… Mesmo com poluição ruim ainda seria menos pernicioso… Ficar assim não dá… Estou cansado de ver garrafas pet no Tietê, nas praias, nos jardins e nada ser feito…

  4. João, a reportagem, como sempre, está excelente, mas a questão do uso do plástico é mais profunda do que simplesmente proibir. A solução passa primeiro pela destinação correta dos resíduos e consequente classificação dos tipos de resina com as quais as embalagens são produzidas. O passo seguinte possibilita produzir uma série de outras embalagens ou mesmo novas destinações aos materiais reciclados. Assim é possível manter a cadeia do plástico funcionando, sem no entanto, poluir o meio ambiente. É possível e nem tão caro, basta ter vontade política e pôr pra funcionar.

    • Olá, João, obrigado pela mensagem. Como diz o texto, o plástico é quase impossível de ser reciclado.Leia mais na parte que traz um link: “Pior, a reciclagem de plástico é quase impossível como já demonstramos.”
      Clique no post em ‘reciclagem de plástico’ e saberá porquê.

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