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Seaspiracy, documentário mostra realidade dos oceanos

Seaspiracy, documentário mostra realidade nua e crua dos oceanos

Finalmente os oceanos ganham as grandes plateias e, aos poucos, saem do gueto em que a mídia  internacional os colocou. Ainda recentemente fizemos um post para elogiar e dar visibilidade a um notável documentário que mostra a relação de um mergulhador com um polvo ao mesmo tempo em que desvenda para o público leigo um pouco mais sobre a exuberante vida marinha. Hoje, comentamos sobre um outro documentário apresentado pela Netflix, que mostra cruamente os maus usos aos oceanos e, além disso, ressalta as suas virtudes como sumidouro de dióxido de carbono. O trabalho mostra também a falta de regulamentação de quase tudo em relação à vida marinha, e a omissão de ONGs e ambientalistas: Seaspiracy, documentário mostra realidade dos oceanos.

Seaspiracy, documentário mostra realidade dos oceanos

O documentário é dirigido por um até agora desconhecido Ali Tabrizi.  Apesar do nome, ele cresceu na Inglaterra onde estudou no London College of Communication. Não se sabe muito sobre o diretor, apenas que ele é  vegano e que lançou seu primeiro trabalho, o filme Vegan, em 2018 para a Netflix. Agora, o mesmo canal está lançando o segundo documentário de Tabrizi, Seaspiracy.

Não espere grandes sacadas cinematográficas nos 90 minutos da obra. O que vale  é o conteúdo que mostra uma triste realidade que, para quem acompanha este site, não será novidade. A novidade é o cinema, que atinge  milhões de pessoas, abordar a escatológica indústria mundial da pesca.

Imagem, Netflix.

Temos certeza que, depois de assisti-lo,  quem come peixes e frutos do mar há de se lembrar das cenas macabras protagonizadas pela indústria da pesca.

Entre outros maus tratos o documentário destaca a infestação de plástico nos oceanos pela pesca industrial. Segundo a obra de Tabrizi, quase 50% do plástico que existe nos oceanos é, provavelmente, oriundo de apetrechos de pesca perdidos. Entre cabos, linhas, e redes, quase a metade da grande mancha de lixo do Pacífico seria formada por material de pesca.

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O documentário, entretanto, não fica só nestes problemas: a insustentável criação de peixes em cativeiro, a posição atrasada e desfocada de parte das ONGs e ‘ambientalistas‘- já criticados por este site, e a posição questionável de alguns países em sua relação com os oceanos são  pontos altos da obra.

A pesca industrial e suas loucuras na visão do Seaspiracy

O diretor narra o filme e explica o que o levou a investigar a pesca e, a partir de suas ações, o público pode acompanhar a sandice da indústria. Inicialmente, o Seaspiracy mostra corpos de baleias que morreram em praias inglesas, enquanto Tabrizi conta que a maioria foi intoxicada com plástico em seus estômagos.

Tabrizi comenta a proibição da caça da baleia a partir de 1986 e a posição do Japão, que deixa a Comissão Internacional da Baleia (IWC na sigla em inglês) em 2018 depois de passar anos boicotando as decisões do órgão. E continua descaradamente caçando baleias em suas águas territoriais e no oceano austral.

O jovem diretor explica que não tem como acompanhar os baleeiros japoneses na Antártica. Mas pode ir até o Japão para registrar o abate anual de golfinhos e cetáceos na baía de Taiji, também chamada ‘baía da vergonha’.

Todos os anos os pescadores da região encurralam golfinhos e outros cetáceos na baía de Taiji num ritual macabro que assusta os desavisados. Ali os pescadores japoneses escolhem alguns exemplares para vender a parques temáticos por alto valor.

E matam centenas de outros animais, até o ponto em que a água do mar fica tingida de vermelho do sangue que jorra dos mamíferos marinhos.

Por que matá-los?

Sobretudo porque golfinhos comem peixes e, desta forma, competem com os pescadores da baía de Taiji. Como resultado, mil animais, em média, são mortos por ano naquele local.

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O sushi e os atuns em risco de extinção

Como ele está no Japão, aproveita para mostrar o que ocorre com a espécie mais ‘apreciada’  para se fazer sushi, o atum. E mostra que a espécie mais procurada por sua gordura, a do atum azul do Pacífico, também chamado atum rabilho, entrou em colapso restando pouco mais de 3% dos estoques mundiais.

Diga adeus aos atuns. Imagem, Netflix.

Ainda assim não há trégua na indústria da pesca que, apesar de tudo, segue caçando o animal até que seja exterminado. Um exemplar de atum ameaçado de extinção já foi vendido por mais de US$ 3 milhões de dólares no mercado de peixes de Tóquio!

Além disso, o diretor deixa claro que a indústria da pesca do atum no Japão, que fatura US$ 42 bilhões de dólares ao ano, não se incomoda de tirar a espécie do mar mesmo que ela atinja a extinção, desde que continue faturando.

Seaspiracy,  os tubarões e a indústria da pesca

Ainda pelos lados do Japão, o documentário de Tabrizi aborda outro aspecto escatológico da indústria da pesca, a morte de algo entre 70 a 100 milhões de tubarões por ano, em razão de puro esnobismo e costume arraigado. Em muitos países asiáticos é sinal de status, de riqueza, oferecer  sopa de barbatana de tubarão aos convidados, mesmo que o caldo seja insípido, uma vez que tem como base a cartilagem das barbatanas.

O diretor Tabrizi com uma câmera escondida conseguiu filmar as barbatanas de tubarão em lojas de Honk Kong. Imagem Netflix.

Em razão deste ‘costume’  diversas espécies de tubarões hoje estão em risco de extinção com o declínio de mais de 90% de suas  populações.

Consequência do extermínio de predadores do topo da cadeia

Na sequência, o documentário mostra as consequências do extermínio de predadores do topo da cadeia alimentar e, enquanto o telespectador se horroriza com as cenas que mostram como os pescadores decepam barbatanas e depois atiram o corpo do animal de volta ao mar para morrer de forma dolorosa, Tabrizi questiona por que algumas ONGs e ambientalistas ainda têm a petulância de falar em ‘pesca sustentável’, uma das falácias que correm no meio.

Pesca sustentável, a mentira que colou

Ele mostra também a mentira dos selos que garantem ‘pesca sustentável’,  especialmente na Europa e Estados Unidos. E demonstra claramente a fraude em que se tornaram, apoiadas por ONGs de grande porte.

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Um dos mais famosos é o selo azul da MSC, Marine Stewardship Council, que foi criado em 1995 pela Unilever, uma das maiores varejistas de frutos do mar. A intenção era  influenciar consumidores a acreditarem na falácia da pesca sustentável.

Imagem, Netflix.

Abro um parênteses para explicar ao leitor que foi pela insistência em trabalhar com a ‘pesca sustentável’ no Brasil que pedi demissão do conselho da ONG Conservação Internacional. Ela é apenas mais uma a insistir nesta mentira que  só confunde o público leigo.

10 mil golfinhos morrem por ano na costa atlântica francesa

O documentário também foi feliz ao contextualizar os problemas mostrando que não são apenas os países asiáticos a cometerem desatinos no mar.

E, minutos depois da cena que mostra a morte de golfinhos em Taiji, o telespectador fica sabendo que na costa atlântica francesa os pescadores matam 10 mil golfinhos por ano em redes de arrasto. A pesca incidental de que já falamos muitas vezes.

Os franceses conseguem a proeza de superar  o massacre japonês em dez vezes todos os anos! O documentário  sugere que este é um segredo que os presidentes da França escondem há muito tempo. E mostra que há pelo menos 30 anos o massacre acontece na costa atlântica do país. Em silêncio, na sombra, sem denúncias bombásticas das ONGs.

E torna a perguntar como é possível que alguém sério insista em ‘pesca sustentável’.

Capturas globais da indústria da pesca: cerca de 2.7 trilhões de unidades

O documentário é feliz em demonstrar que a saúde dos oceanos depende da saúde da vida marinha, e mostra que alguns dos ecossistemas mais importantes, como os corais, dependem da saúde dos peixes que os habitam. No entanto, a pesca industrial tira do mar quase três trilhões de peixes por ano, contribuindo, nesse sentido, para a morte dos corais.

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Tabrizi ressalta que ‘nenhuma outra indústria mata tantos animais como a pesca’. E este site acrescenta, são os últimos animais selvagens do planeta.

Apesar disso, não há comoção do público. Pelas redes sociais vê-se uma discussão sobre a morte de bois nos abatedouros públicos ou, ainda, se pintinhos machos devem ser mortos nas granjas,  não havendo, entretanto, qualquer manifestação pelo disparate da pesca mundial.

Baleias piloto mortas nas Ilhas Faroe. Imagem, Netflix.

Em meio às cenas, algumas dramáticas, como a caça de espécies de baleias na Ilhas Faroe – território da Dinamarca no Mar do Norte, há depoimentos de especialistas como Sylvia Earle, e Paul Watson, o mitológico criador da Sea Sheperd, que comentam as artes da pesca e dão mais consistência às denúncias.

Oceanos, o maior reservatório de carbono do planeta

O filme de Tabrizi chega num bom momento.  A eleição de Joe Biden nos Estados Unidos trouxe de novo à tona o combate ao aquecimento global. Desde os debates com Trump, o negacionista, já estava claro que com Biden o tema  voltaria a ser a bola da vez nas reuniões internacionais.

Ainda este ano teremos duas reuniões importantes; a primeira delas é preparatória e virtual, e foi convocada pelo próprio Biden. Neste evento que acontecerá em 22 de abril, e para o qual o ‘nosso negacionista’, Jair Bolsonaro, foi convidado, Biden pretende conseguir compromissos das lideranças mundiais antes da reunião marcada pela ONU, a COP 26, que será em Glasgow, Escócia, em novembro.

O ciclo do carbono e seus benefícios. Ilustração, https://blueocean.net/.

Na ocasião, a questão da descarbonização das economias será objeto de debates. Um bom momento, assim, para o lançamento desse documentário, já que ele mostra claramente o poder dos oceanos como sumidouro de carbono.

Proteger os oceanos significa menos gases de efeito estufa

Paul Watson foi feliz ao falar sobre a questão. Ele foi curto e grosso: “se quiserem combater o aquecimento a primeira coisa a fazer é proteger os oceanos.”

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Em seguida, o trabalho mostra que as plantas marinhas como manguezais, gramas marinhas, e florestas de algas, absorvem 20 vezes mais carbono que as florestas tropicais.

Para dar o peso que estas informações merecem, o documentário mostra que por ano cerca de 10,1 milhões de hectares de florestas tropicais são destruídos. No mesmo período, o arrasto de fundo destrói 1,58 bilhão de hectares do subsolo marinho, o equivalente a 4.316 campos de futebol por minuto.

O Seaspiracy informa que 38% dos manguezais do mundo foram destruídos para a criação de camarões em cativeiro. Esta é outra verdade que todos os ambientalistas conhecem, no entanto, quase nenhum deles se expõe para criticar o que o Mar Sem Fim vem fazendo praticamente só, desde o ano 2005, a carcinicultura no Nordeste do Brasil.

Poucas ONGs, e raríssimos ambientalistas mencionam estes fatos conhecidos por todos que estudam a questão. E nisso reside outra crítica indireta do trabalho de Tabrizi.

Ele ainda lembra que a grande maioria das ‘áreas marinhas protegidas’ anunciadas frequentemente por ONGs e governos não proíbem a pesca. Além disso, questiona o fato delas serem chamadas de ‘áreas protegidas’, se nelas nem ocorre a interdição do flagelo da pesca.

É quase como perguntar, protegidas de quê?

Pesca ilegal

O Seaspiracy também aborda esta barbaridade. Ele mostra como os litorais africanos foram destruídos pela pesca ilegal com a cumplicidade da comunidade mundial que finge que não vê, do mesmo modo com que a mídia privilegia assuntos em continentes ‘mais importantes’ que a pobre África.

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Os famosos piratas da Somália eram pescadores antes da guerra civil que destruiu o país. Aproveitando-se da guerra, as frotas ilegais depredaram o litoral da Somália, não deixando outra opção aos pescadores que acabaram tornando-se terroristas que sequestram navios para receber resgate.

Assista ao trailer de Seaspiracy

Imagem de abertura: NetFlix

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