Proteção de ilhas brasileiras em edital do BNDES, ótima notícia!
Antes de mais nada, lembremos que este site sempre criticou o descaso do poder público com o mar e o litoral. Nesse sentido, é justo reconhecer quando algo positivo acontece. O BNDES acaba de anunciar um investimento de R$ 40 milhões na proteção de ilhas brasileiras — uma excelente notícia que merece ampla divulgação para alcançar todos os interessados. A iniciativa faz parte do projeto BNDES Azul que já destinou verbas para os corais em 2024, conforme comentamos. Agora chegou a vez de nossas ilhas que têm muitos problemas em razão da sua ocupação desde que os nautas lusitanos aqui desembarcaram.

“BNDES Biodiversidade – Ilhas do Futuro, Ninhos Protegidos”
O lançamento do programa foi em 2 de junho, na Ilha das Cobras (RJ), com a presença da Marinha do Brasil e dirigentes do banco. O orçamentos total do programa para as ilhas é de R$ 80 milhões, dos quais R$ 40 milhões são recursos do Fundo Socioambiental do BNDES.


Segundo o site do banco, o foco da chamada é a restauração de habitats reprodutivos de aves marinhas ameaçadas ou migratórias, em nove conjuntos de ilhas e arquipélagos que integram Unidades de Conservação Federais (UCs), sob gestão do ICMBio: São Pedro, São Paulo e Fernando de Noronha; Atol das Rocas, Abrolhos, Cagarras, Alcatrazes, Tupiniquins, Ilhas dos Currais, Arvoredo, Trindade.
Conhecemos todas essas ilhas bem como seus muitos problemas. Um dos principais começou no século 16, com a chegada dos nautas e a introdução de espécies invasoras. Essas ilhas abrigam ninhais fabulosos de aves nativas e migratórias. Mas ratos, e outros animais como gatos— levados por moradores de Fernando de Noronha — mudaram tudo. Quem paga a conta são as milhares de aves que usam essas ilhas para reproduzir, se alimentar e descansar.
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De acordo com o site do BNDES, entre os objetivos da iniciativa estão o controle de espécies invasoras, o monitoramento ambiental e o desenvolvimento de bases para créditos de biodiversidade. A chamada reforça a atuação do Banco em alinhamento com compromissos internacionais e políticas públicas como o PAN Aves Marinhas e a Estratégia Nacional para Espécies Exóticas Invasoras.
A importância da proteção de ilhas para a biodiversidade
Em primeiro lugar, parabenizamos o banco porque ilhas são importantíssimas para a biodiversidade mundial. Já mostramos aqui que existem 465.000 ilhas no mundo. Juntas, elas cobrem 5,3% da área do planeta. Contudo, as ilhas representam a maior concentração de biodiversidade e, ao mesmo tempo, extinções de espécies.
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Um estudo publicado na Proceedings of the National Academy of Sciences reconhece que existe uma “ligação crucial entre as ilhas e os ecossistemas marinhos”. Assim, defende nova abordagem à conservação focada no eixo terra-mar, em vez de considerar um e outro separadamente.

Segundo esse trabalho, ‘As ilhas sustentam plantas, animais e sociedades humanas únicas que não são encontradas em nenhum outro lugar da Terra. Entretanto, as pressões locais e globais ameaçam a resiliência dos ecossistemas insulares, com as espécies invasoras entre as mais prejudiciais, porém, solucionáveis.’
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O edital, no entanto, cria uma saia justa com o ICMBio em Fernando de Noronha. Nos anos 1950, quando o arquipélago ainda não era uma unidade de conservação — o parque só foi criado em 1988 —, já existia uma superpopulação de ratos. São milhões até hoje. Na época, uma tentativa desastrada de erradicação agravou o problema.
Na esperança de controlar os ratos, levaram para a ilha principal o maior lagarto do Brasil: o teiú. Mas o plano fracassou. Ratos têm hábitos noturnos; teiús, diurnos. Provavelmente, nunca se encontraram. Resultado? Os lagartos se multiplicaram como pragas. Segundo o analista ambiental Carlos Roberto Abrahão, em estudo de doutorado na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP (2019), a ilha principal abriga entre 7 e 12 mil teiús adultos.
Todos os envolvidos com conservação conhecem os danos causados pelos teiús. Eles devoram ovos de tartarugas-marinhas e de aves que desovam ou nidificam na ilha. Segundo o estudo de Abrahão, “na ilha principal, os atobás não fazem mais ninhos no solo.” Mesmo assim — pasme — o ICMBio trata o teiú como espécie “nativa e protegida”.
Este é apenas um dos motivos pelos quais este site afirma que, em geral, o poder público não leva a sério o mar e o litoral. Já provocamos o Ministério de Meio Ambiente inúmeras vezes mas, até hoje, não recebemos qualquer explicação que pudesse mudar nossa opinião sobre este descaso.
A ver, agora, se o MMA aproveita o edital e muda o modo de tratar o bioma marinho.
Quem pode se inscrever neste projeto do BNDES?
Podem se inscrever instituições sem fins lucrativos que apresentem projetos com valor mínimo de R$ 5 milhões. O BNDES poderá financiar até 50% de cada proposta aprovada. As inscrições estarão abertas no site BNDES até 17 de outubro de 2025.
Ampliação da iniciativa BNDES Corais e outros projetos
No mesmo evento o BNDES também anunciou a ampliação da iniciativa BNDES Corais, que dobra de escala, e passa a contar com R$ 176 milhões em investimentos (dos quais R$ 88 milhões são do Fundo Socioambiental do BNDES) voltados à recuperação de recifes em diferentes regiões do país. A nova etapa contempla projetos do WWF, Funbio, Fundação José Bonifácio, RedeMar, Projeto de Conservação Recifal e AEPTEC-BA, com investimento total de R$ 86 milhões, dos quais R$ 43 milhões são do BNDES.
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PEM Norte e Sudeste – Durante a cerimônia, ocorreu o anúncio do consórcio vencedor que será responsável pelo Planejamento Espacial Marítimo (PEM) da região Norte do Brasil. A parceria será conduzida pelo grupo formado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Environpac Sustentabilidade e Codex Remote, selecionado em edital lançado em novembro de 2024. O estudo, que abrange as áreas costeiras dos estados do Maranhão, Pará e Amapá, contará com aporte de R$ 13,3 milhões em recursos não reembolsáveis do BNDES, por meio do Fundo de Estruturação de Projetos (BNDES FEP).
Assista ao vídeo do biólogo Fausto Pires de Souza anilhando aves em Alcatrazes

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