Companhias de navegação recusam plástico do ocidente
Em 2020, o caso de uma viagem de mais de um ano de 141 contêineres contendo resíduos de plástico lançou luz sobre o comércio global oculto de resíduos plásticos. A cada dia que passa mais pessoas se conscientizam das mazelas que o plástico também produz. O uso do ‘também’ deixa claro que o material não é apenas vilão. A descoberta do plástico, nos anos 50 do século passado, ajudou a revolucionar grandes cadeias produtivas. Mas, o uso indiscriminado, o desperdício, e a dificuldade em reciclar o material, deram o troco. Hoje, algumas nações ricas exportam seus resíduos, como se o problema não fosse delas. Acontece que é. O plástico é um grave problema mundial. Por isto, algumas companhias de navegação se recusam a transportar plástico do Ocidente rico para nações do Oriente pobre.
O caso do ‘colonialismo de resíduos’ que chamou a atenção em 2021
Tudo começou em 2018, quando a China proibiu a importação de resíduos plásticos, um divisor de águas para o comércio global. Para fugir do problema, países ricos como a Alemanha, França, Reino Unido, Estados Unidos e outros, fizeram como o avestruz que enfia a cabeça na terra quando assustado: o ‘colonialismo do lixo’, como disse The Guardian, decidindo-se pela exportação do lixo para países pobres como se o problema não existisse.
A saga de um ano dos 141 contêineres mostrou uma pequena fatia do comércio internacional de resíduos plásticos, e chamou a atenção para o ponto fraco da reciclagem do plástico em todo o mundo. Como este site já mostrou inúmeras vezes, é quase impossível reciclar os variados tipos de plástico.
Os 141 contêineres contendo resíduos saíram da Alemanha e ficaram um ano em viagem. A cada novo porto recebiam nova recusa, sempre de países pobres ou em desenvolvimento, como a Turquia, a Grécia e o Vietnã, entre muitos outros. O escândalo apenas atrasou a única solução possível: um tratado do plástico para combater a poluição global nos moldes do Acordo de Paris para as emissões de gases de efeito estufa.
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Companhias de navegação recusam plástico do ocidente
Em fevereiro de 2022 a CMA CGM, uma das maiores empresas de contêineres, a terceira do mundo, avisou que deixará de transportar resíduos plásticos em 1º de junho. A companhia de navegação francesa transporta cerca de 50.000 contêineres cheios de resíduos plásticos todos os anos. Mas avisou que a festa vai acabar.
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A novidade bem-vinda faz parte da bem-sucedida Campanha Global Shipping Lines.
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A campanha começou em 2021, quando 52 organizações ambientais e sociais em todo o mundo pediram às principais companhias marítimas que comprovassem seus compromissos de sustentabilidade e cumprissem suas promessas de proteger o meio ambiente marinho e terrestre, comprometendo-se a não transportar resíduos plásticos para países mal equipados em lidar com isso de forma ambientalmente correta.
Em outras palavras, quase todos os países. Alguns conseguem reciclar mais que outros. Mas, mesmo os mais bem sucedidos mal conseguem dar conta de 20% do total descartado.
De acordo com o site da campanha, somente em outubro de 2020 a Malásia recebeu 16.740 contêineres TEU (89 milhões de kg) de resíduos plásticos de todo o mundo. São 558 contêineres por dia chegando a um pequeno país.
Enquanto isso, a Comissão Europeia trabalha em novas regras para o transporte de resíduos, mas sua posição é que a exportação é permitida quando os países receptores garantem o processamento responsável (que, insistimos, não existe).
E as outras companhias de navegação?
Conseguimos uma avanço, um primeiro passo com a decisão da francesa CMA CGM. Mas, e quanto às outras? Para o site Plastic Soup a questão é se outros players da indústria mundial de transporte de contêineres seguirão o exemplo.
Hapag-Lloyd (Alemanha), Maersk (Dinamarca), MSC (Suíça), Hamburg Sud (Alemanha), Hyundai Merchant Marine (Coreia), Evergreen (Taiwan), COSCO (China) e Orient Shipping (Jordânia) receberam o chamado à ação que mudou o rumo da CMA CGM.
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Se essas companhias seguirem a liderança da CMA CGM, uma proibição de fato do transporte de resíduos plásticos dentro de meses pode estar à vista, diz o Plastic Soup. Isso forçaria os países a processar seus próprios resíduos e aumentaria a pressão para o uso de menos plástico, o que os países já estão dizendo que desejam alcançar.
Tomara que o Plastic Soup esteja certo, e mais companhias abracem a causa. Mas temos dúvidas. Como já explicamos, a indústria de navegação mundial é extremamente poluidora, muito pouco fiscalizada, e bastante esperta nas maneiras que utiliza para fugir das regras trabalhistas, ou de poluição. O crescimento dos navios que usam as bandeiras de conveniência são apenas mais uma evidência.
A ver…
Imagem de abertura: www.myemail.constantcontact.com.
Fontes: https://www.ban.org/plastic-waste-transparency-project-hub/shipping-lines-campaign; https://myemail.constantcontact.com/Shipping-Line-CMA-CGM-to-Halt-Global-Trade-of-Plastic-Waste.html?soid=1114999858498&aid=kZTj2WI_1PA; https://www.theguardian.com/environment/2021/dec/31/waste-colonialism-countries-grapple-with-wests-unwanted-plastic.
É abjeta a hipocrisia dos países ricos nas cobranças ambientais que fazem aos países pobres e em desenvolvimento. Não que não devam cobrar: acho que todos devemos cobrar providências uns dos outros, porque partilhamos a mesma casa; mas há países que se fazem passar por muito ecologicamente conscientes e que se mantêm limpos sujando outros mais pobres.