Vitória contra especulação imobiliária em São Francisco do Sul!

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Vitória contra especulação imobiliária em São Francisco do Sul!

No dia 6 de dezembro, discutimos novamente a polêmica revisão do Plano Diretor de São Francisco do Sul. Este plano, voltado para o setor imobiliário, já havia sido suspenso pela Justiça em 2022. A suspensão ocorreu pelos mesmos problemas de antes: falta de divulgação pela prefeitura e pouca participação popular. Esse padrão é comum no litoral brasileiro, violentado pela especulação imobiliária. Em Santa Catarina, a situação é tão grave quanto uma epidemia, pior que a Covid-19. Especuladores dominam a zona costeira do Estado, com apoio da maioria dos prefeitos dos municípios litorâneos. A imensa banda podre da indústria da construção civil, juntamente com uma parte significativa do setor de turismo, equivale à metástase de um câncer mortal. Em outras palavras, se espalha rapidamente pelo litoral catarinense. Por isso, celebrar as vitórias contra especulação imobiliária em São Francisco do Sul é essencial.

Audiência em S Francisco do Sul
Audiência em 8/12, São Francisco do Sul.

Primeira vitória contra a especulação por parte da população com apoio da Justiça

Conforme mostramos no post Praia do Ervino, SC, especulação e verticalização, o  Plano Diretor de São Francisco do Sul foi desengavetado em 2022 (plano original do ex-prefeito Renato Gama Lobo – PSD, 2019) pelo atual chefe do Executivo, Godofredo Gomes Moreira Filho (MDB).

A parte lúcida da população protestou pela falta de participação popular e justificativas técnicas, alertando o MP e MPF dos riscos ao meio ambiente, com diversas alterações de ZEPAs (zonas de preservação ambiental), e da inexistência de infraestrutura.

Desse modo, o Juiz João Carlos Franco atendeu ao pedido e suspendeu a tramitação do projeto de lei complementar, impedindo que a Câmara de Vereadores votasse o projeto até uma decisão final do mandado de segurança. Foi a primeira vitória contra a especulação no município.

A farsesca volta da revisão do Plano Diretor em 2023

Com a falta de vergonha que caracteriza os vereadores de São Francisco do Sul, o processo viciado retornou neste ano. Durante o período em que ficou parado, em vez de mudar as propostas de verticalização e superadensamento contestadas; ou incluir justificativas técnicas e contemplar  a prevenção de enchentes, inundações, enxurradas, ou deslizamentos, que foram esquecidos, os vereadores apenas ‘maquiaram’ o PD.

Para se ter ideia da falta de infraestrutura do município, saiba que o tratamento de esgotos só começou em 2021. Mesmo assim, os vereadores pretendiam mudar áreas rurais para urbanas e, muito pior, aprovar a  construção de prédios de até 6 andares ao longo de 7km da orla da Praia do Ervino, uma das últimas ainda virgens do Estado. Além disso, o PD prevê prédios de 10 andares em cinco vias transversais. Na parte interna, o gabarito permite até 18 andares! Contudo, o Ervino ainda não tem sequer saneamento básico, cujas obras estão previstas para começarem apenas em 2030!

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População do Ervino na Vitória contra especulação imobiliária em São Francisco do Sul.
A população participou em massa da audiência, desmascarando os vereadores.

Acontece que a praia do Ervino tem centenas de admiradores em São Francisco do Sul que se uniram em grupos para defenderem seus pontos de vista. Um deles, os Cuidadores do Ervino, prega que o Plano Diretor para o bairro do Ervino é uma mistura do primeiro, de 2019, com modificações propostas pelo vereador Alan Vizoto (PL), curiosamente também proprietário do Grupo Vizoto Imóveis.

Modelo de ‘ocupação’ de Balneário de Camboriú se dissemina

Ou seja, os vereadores do município pretendem prosseguir a destruição da orla do Estado tal qual aconteceu em Jurerê Internacional, prosseguiu na ‘Dubai brasileira’, e depois migrou para Balneário Perequê e Itajaí, numa afronta à população.

salvem o Ervino
A população praticou cidadania e ganhou!

Mas se estreparam mais uma vez. Durante a audiência pública, em 8 de dezembro, havia cerca de 200 moradores acompanhando o trabalho, dos quais 19 se inscreveram para criticar e demonstrar a falta de ação durante o tempo em que o PD esteve parado. Do lado dos apoiadores, apenas uma pessoa do ramo imobiliário da praia do Ervino, Daniel Azevedo, da Sidão Imóveis, se inscreveu.

A segunda vitória em 2023

Em 5 de dezembro, antes ainda da primeira audiência, a ONG AMECAAssociação Movimento Ecológico Carijó -, a AMPIU-Associação de Moradores e Proprietários de Itamirin de Ubatuba -, a Associação Cuidadores do Ervino, e outros cidadãos, impetraram Mandado de Segurança, objetivando a suspensão das audiências públicas agendadas, tendo em vista as inúmeras irregularidades no trâmite legislativo.

Assim, em 11 de dezembro o Juiz João Carlos Franco da 2ª Vara Cível da Comarca de São Francisco do Sul, amparado por intervenção do MP/SC, com apoio Técnico, e anexação de manifestação do MPF, acatou o pedido e concedeu nova liminar suspendendo mais uma vez a tramitação da farsa. Foi a segunda vitória contra a especulação no município.

Audiência pública
Faltou espaço para todo mundo.

“Adoto essa solução ciente de que esta cidade necessita com urgência encerrar esse processo de revisão do plano diretor, pois nele se encontram modificações necessárias ao desenvolvimento urbanístico, ambiental e econômico da região. O Poder Legislativo, se desejar, poderá observar os critérios legais para a futura e eventual reforma pontual do plano elaborado e aprovado pela comunidade. O que não se mostra viável, neste momento, é simplesmente admitir a votação às pressas de emendas que, obscura e nitidamente, descaracterizam o projeto aprovado pela população local sem a observância dos procedimentos democráticos necessários a essas alterações.”

Agora cabe aos vereadores ouvir a opinião contrária sobre a verticalização do Ervino, uma praia sem infraestrutura. Como comentou um dos moradores do Ervino na audiência: “Está bem fácil para eles decidirem, informação eles têm. Fica ao critério deles escolher a solução correta ou, mais uma vez, trair a confiança de seus eleitores, como meros burocratas que compactuam com interesses velados.”

O que acontece no litoral do Estado de Santa Catarina?

Em 2 de dezembro de 2023, horrorizado com a desordem urbanística que se alastra pelas belas paisagens costeiras brasileiras, publicamos o post Algumas questões sobre arquitetos e seus projetos no litoral.

No texto, chamávamos a atenção para as muitas ‘aberrações arquitetônicas’ erguidas ao longo do litoral do País, destacando como sempre as perversões da orla de Santa Catarina, mas não apenas. E comentamos sobre o nosso espanto ante ‘o egoísmo de arquitetos focados apenas no lucro’, entre outras questões.

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O post teve ampla repercussão nas redes sociais, com diversos comentários por parte de leitores. Um deles, o arquiteto e urbanista Eduardo, que ‘cresceu em Floripa’ como informou, nos comoveu pela ética, e diagnóstico sobre o que se passa no Estado. Desse modo, encerramos com o texto por ele enviado.

‘Distopia doentia, egocêntrica e criminosa’

Eduardo

Lá vem textão! Parabéns, João. Sempre acompanho teu excelente trabalho. Sou arquiteto E urbanista, crescido em Floripa, apaixonado pela vivência do mar; e exatamente por não concordar em jogar esse jogo perverso, do mercado imobiliário, acabei migrando da iniciativa privada ao setor público. Tento contribuir um pouco com projetos mais simples e sustentáveis e busco viver com mínimo de dignidade e com ética. Infelizmente muitos colegas, incluso professores, não tiveram a mesma “sorte”, sendo cooptados e corrompidos por essa distopia doentia, egocêntrica e criminosa.

‘Lavagem de dinheiro’

Apesar do arbítrio de cada um, os percebo como “peixes pequenos”. Há muitas questões envolvidas, e uma das mais relevantes que vejo é o uso do mercado imobiliário (bem como hoteleiro/turístico) para a lavagem de dinheiro, inclusive de origem internacional. No caso do litoral brasileiro isso fica claríssimo e caríssimo. Enquanto houver corrupção e impunidade; carências sociais e educacionais, esse ciclo se retroalimentará e muito pouco conseguiremos fazer por meio de projetos arquitetônicos e urbanos. Quem mais projeta nossas cidades é o Legislativo, que os financiam e os elegem (referência aos vereadores)!
Mas, como dizem no Rio Grande: “Não podemo se entregá, pois não tá morto quem peleia!”
( Apesar que no fundo, acredito mesmo que a solução será dada pelo Planeta, ao expurgar os invasores…) Grande abraço, marujo!

Conheça os projetos de restauração de corais no Brasil

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