Manaus e Belém irradiam a covid-19 no sertão da Amazônia

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Manaus e Belém irradiam a covid-19 no sertão da Amazônia

A pandemia não é cruel só pela amplitude, mas por castigar com mais rigor os menos favorecidos. Num País desigual como o nosso, significa catástrofe. Há duas possibilidades de driblar a doença. Uma é o isolamento social, outra é lavar as mãos com água e sabão tantas vezes quantas necessárias. Mas nem todos têm como se isolar em suas casas. Famílias grandes dividem casebres minúsculos, especialmente na Amazônia. E segundo o Trata Brasil, “quase 35 milhões de brasileiros não têm acesso acesso à água.” Pior, “no Norte, (apenas) 57,05% da população é abastecida com água tratada.” E além disso, persiste a má gestão dos recursos públicos. Não por outro motivo, Manaus e Belém irradiam a covid-19 na Amazônia. (Antes de prosseguir, reforçamos, este é um post de opinião).

Manaus e Belém irradiam a covid-19 na Amazônia

As imagens do maior cemitério de Manaus abrindo valas comuns ganham manchetes mundo afora. E os  índices de letalidade nacionais mostram que os de Manaus chegam a 8,5%, dois pontos acima da média nacional.  Enquanto a prefeitura instala câmaras frigoríficas nos cemitérios, a tétrica contagem de mortos aumenta dia a dia.

O caos toma posse do seio da floresta.

imagem do cemitério de Manaus
Imagem, AFP.

Para piorar situação já grave, o Correio Braziliense informa  “a troca de servidores na Secretaria de Saúde em Manaus”.

Não basta ser ruim. Pode ser pior.

“No oitavo dia do mês, o secretário Rodrigo Tobias deixou a chefia substituído pela biomédica Simone Papariz,  o que desagradou  deputados. Oito deles, incluindo o presidente da Assembleia, assinaram requerimento a ser enviado ao presidente pedindo intervenção federal na Saúde do Amazonas citando  o colapso e má-gestão do sistema de saúde…”

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Nada de muito novo no Brasil da Pátria Amada. Assim como o ‘mito’ foi eleito em pleitos limpos, também o foram os profissionais da política, Arthur Virgílio (PSDB), para a prefeitura de Manaus; e Wilson Lima (PSC), que enfrenta processo de impeachment por má gestão na saúde, para governar o Estado.

O resultado, na região mais pobre do País, aí está para nos envergonhar mais uma vez.

Enquanto isso, em Belém…

Já em meados de abril, “os funcionários do Hospital de Campanha de Belém foram forçados a abrir as portas diante da gritaria de familiares que aguardavam notícias”, informou o jornalista Moisés Sarraf, do site apublica.org. O sistema de saúde de Belém já estava em colapso desde aquela data.

imagem de pronto-socorro fechado em Belém
O caos na saúde pública de Belém. Imagem, https://www.brasildefato.com.br/.

Naiza Sá, coordenadora do programa de Pós-Graduação em Saúde, Ambiente e Sociedade na Amazônia, da Universidade Federal do Pará (UFPA), alertava: “O número de leitos de UTI e de leitos para internação no Norte no geral é muito abaixo da média nacional. E a gente tem a situação que tem hoje (Manaus, por exemplo, tem apenas sete para cada cem mil habitantes, 40% abaixo da média nacional, fato conhecido desde a decretação da pandemia.).”

Assim como no Estado do Amazonas, o Pará também elegeu raposas velhas. Não admira que ‘a gente tem a situação que tem hoje’…

Helder Barbalho

Helder Barbalho (MDB), filho do deletério e corrupto cacique Jáder Barbalho, foi eleito para governar o Estado e, como prefeito de Belém, o controverso Zenaldo Coutinho (PSDB), que nas eleições de 2016  se envolveu em duas acusações relativas a abuso de poder econômico e político durante a campanha, resultantes no pedido de cassação de seu mandato pelo Ministério Público Eleitoral (MPE).

O prefeito, que decretou lockdown a partir de 7 de maio, declarou um dia antes que ‘o trabalho de empregada doméstica passa a ser essencial durante a pandemia covid-19, contrariando o entendimento nacional do que é considerado trabalho essencial’, em mais uma decisão que aturdiu o público.

Neste show de horrores promovido, entre outros motivos por degradação ambiental conforme disse a ONU e é consenso hoje, a floresta Amazônica e os 23 milhões que vivem na Amazônia Legal, são talvez os mais desprotegidos reféns desta pandemia que atormenta e ameaça nossas vidas.

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Enquanto Manaus e Belém irradiam a covid-19 para o seio da floresta, em Brasília…

Uma ‘usina de crises’ à caça de votos para a reeleição desde que assumiu,  desdenha a pandemia a partir do dia em que foi decretada. Exercendo  sua  burrice com desenvoltura, ora diz tratar-se de ‘gripezinha’, ora sai à rua promovendo aglomerações com a tropa de brucutus, desmoralizando diretrizes da Organização Mundial da Saúde e de seu ministério. E deixando a população atônita.

imagem Bolsonaro em aglomeração pública
Imagem, https://www.dw.com/.

O choque, é sabido, resultou na exoneração do ministro da Saúde. E, em plena crise, ‘o símbolo do sistema político falido’ achou tempo para, enciumado pela percepção de sua inépcia, bater de frente com outro ministro, o da Justiça, até exonerá-lo.

Pra quê, já não temos problemas demais?

Enquanto o País angustiado se intimida com  milhares de mortos, quase dez mil até agora  muitos por falta de simples respiradores, o atrevido e malcriado  declara: ‘E daí?” Manda a imprensa ‘calar a boca’; constrange um grupo de lobistas industriais que foi lhe visitar (em 7 de maio) para mais uma vez aglomerar pessoas e pressionar o STF, com o mesquinho e escamoteado propósito de fazer uma transmissão ao vivo e assim prosseguir sua missão de semear a cizânia entre o povo que devia unir.

Encerra o festival  com a parvoíce característica  prometendo ‘um churrasco no próximo sábado, para uns 30 convidados’.

Um obstinado imbecil anônimo

Se fossem declarações de um obstinado imbecil  anônimo, já não fariam bem pro nosso humor. Mas são do Presidente da República!

Os resultados trágicos da pandemia no Brasil, não só em Manaus ou Belém, são em grande parte consequência dos desatinos de quem disse ser ‘a própria Constituição’.

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Mas, se as duas capitais ainda têm serviços de saúde embora paupérrimos e maltratados, os povos tradicionais e a comunidade indígena não têm qualquer proteção. Zero, embora a região norte tenha a maior população indígena do País.

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que no Brasil, 324.834 índios vivem na zona urbana. O número equivale a 36,2% do número de indígenas no País, que totalizam 896.917 pessoas. Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), são 225 povos indígenas, além de referências de 70 tribos vivendo isolados e ainda não contatadas.

E que, em vez de serem protegidas, assistem incrédulas o governo promover…

…Queimadas ilegais na Amazônia em 2020

Depois de um primeiro ano de mandato em que a Amazônia roubou a cena pela alta recorde de desmatamentos em razão da política genocida do tosco pescador, executada por um neófito que não fez senão desmontar o sistema de fiscalização e conservação do Ibama e ICMBio, viramos a página e entramos em 2020.

Neste segundo ano, agora sob ataque da mais severa pandemia dos últimos séculos, o desmatamento ilegal tornou a subir.

Estadão, abril de 2020,  “A extração ilegal de madeira corre em ritmo acelerado na Amazônia, fazendo com que o volume do desmatamento acumulado de agosto de 2019 a março deste ano já chegue ao dobro do verificado no mesmo intervalo anterior, quando a derrubada recorde da floresta virou alerta global. Área superior a três vezes a cidade de São Paulo foi abaixo no período.”

Mas não foi só. Em maio de 2020 o ministro neófito, expulso do Partido Novo por decisão da Comissão de Ética Partidária e fiel seguidor do ‘admirador do torturador Brilhante Ustra’, demitiu o Diretor de Proteção Ambiental do Ibama, Olivaldi Azevedo, e exonerou o coordenador de operações de fiscalização do Ibama, Hugo Loss, e o coordenador-geral de fiscalização ambiental, Renê Luiz de Oliveira.

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As demissões aconteceram depois que o programa ‘Fantástico mostrou uma megaoperação do Ibama para tirar madeireiros e garimpeiros ilegais de terras indígenas no sul Pará. O objetivo era proteger os cerca de 1700 indígenas que moram nas localidades do contágio pelo coronavírus’.

Este foi o título da reportagem do New York Times em 19 de abril de 2020. Selecionamos alguns trechos da longa matéria.

‘O presidente Jair Bolsonaro atua de forma agressiva para abrir a floresta amazônica ao desenvolvimento comercial e representa uma ameaça existencial para as tribos da região’.

‘Enquanto a presença federal encolhe (pelas demissões do neófito), por um lado mais forasteiros invadem as terras, ansiosos pela exploração ilegal dos recursos da floresta, e o coronavírus fecha o cerco por outro, tendo já alcançado algumas aldeias remotas com sua ameaça mortal’.

‘Já de início agiu para desmantelar o sistema de proteção para as comunidades indígenas consagrado pela Constituição brasileira, efetuando cortes no financiamento da Fundação Nacional do Índio, a agência federal responsável por defender os direitos indígenas’.

Imagem de índios na amazônia
Imagem, New York Times.

Legalizando empreendimentos clandestinos..

‘Ainda em fevereiro, Bolsonaro apresentou um projeto de lei ao Congresso que, na prática, poderia legalizar os empreendimentos clandestinos de mineração que poluíram rios e destruíram grandes áreas da Amazônia’.

‘No ano passado, Bolsonaro exultou ter “acabado” com o que chamou de “multas astronômicas” contra empresas que violam as leis ambientais da Amazônia, removendo um dos poucos elementos de dissuasão que os grileiros enfrentam’.

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‘O presidente do Brasil cumpre suas promessas de expansão do desenvolvimento na Amazônia. E para muitos dos povos indígenas que lá vivem, a era Bolsonaro se tornou uma ameaça existencial’.

A reportagem segue neste tom.

A covid-19 vai alcançar os índios e outros excluídos

A covid-19 vai alcançar os índios e outros excluídos da Amazônia, presidente, questão de tempo. A doença se espalha com vagar porque o vírus é transmitido por barcos, as infovias de lá. Mas vai atingir a todos. E não vai sobrar pedra sobre pedra.

Sua gestão  irresponsável será responsabilizada.

A tragédia da covid-19 vai passar, então…

Internamente, seus eleitores lembrarão suas promessas de campanha quanto ao modo de fazer política. Se hoje a quase totalidade está paralisada pela pandemia, quando ela se for ficará o gosto amargo de lembrar que, em abril de 2020, o presidente decidiu fazer política do mesmo jeito que seus antecessores: oferecendo cargos em troca de apoio.

A nomeação de Fernando Marcondes de Araújo Leão do ‘Centrão’, por obra do PP, para dirigir o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), ‘um dos cargos mais cobiçados por parlamentares do Nordeste por causa das dimensões do orçamento e abrangência de atuação é’, como frisou editorial do Estadão, ‘uma aliança despudorada e ruinosa que premia o fisiologismo, o populismo e o corporativismo’.

Mais problemas

Quando a tragédia da covid-19 silenciar teremos ainda mais problemas. A economia mundial estará em recessão enquanto a do Brasil,  graças também ao corporativismo do capitão que estimulou a “blindagem” de diversas categorias no reajuste a servidores públicos investindo contra seu ministro da Economia, estará em frangalhos.

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Vamos buscar investimentos onde, senão no exterior?

O mundo civilizado haverá de lembrar seus desatinos durante a pandemia que já é um marco deste século, presidente. E de seu absoluto descaso em relação a maior floresta úmida do planeta e seus milhares de excluídos.

Como disse editorial de uma das mais prestigiosas publicações médicas do mundo, a revista Lancet, (em 7 de maio) ‘a maior ameaça à resposta do Brasil aos desafios da covid-19 é o presidente Jair Bolsonaro’.

Quem investirá num País governado por um boçal deste quilate?

Imagem de abertura: Alex Pazuello / Semcom Prefeitura de Manaus

Fontes: http://www.tratabrasil.org.br/saneamento/principais-estatisticas/no-brasil/agua; https://apublica.org/2020/04/colapso-da-saude-em-belem-contrasta-com-numero-oficial-de-casos/; https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2020/04/23/interna-brasil,847395/saiba-por-que-manaus-entrou-em-rapido-colapso-com-os-casos-de-covid-19.shtml; https://sustentabilidade.estadao.com.br/noticias/geral,desmatamento-explode-na-amazonia-e-ja-e-quase-dobro-do-ano-anterior,70003265328; https://climainfo.org.br/2020/05/03/o-desmonte-dos-orgaos-de-meio-ambiente-e-seu-aparelhamento-pela-pm-de-sao-paulo/?fbclid=IwAR0YIo8rVVh4vi3rRpk64KXG9JxltqEjWQYVCUlGIW0Ub0qJL4BO_JPt4Oo; https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/04/14/governo-exonera-diretor-de-protecao-ambiental-do-ibama-olivaldi-azevedo.ghtml; https://opiniao.estadao.com.br/noticias/notas-e-informacoes,alianca-despudorada-e-ruinosa,70003294834; https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,bolsonaro-diz-que-fara-churrasco-para-uns-30-convidados-no-sabado,70003296035.

Uma breve história da pesca, saiba como começou

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