Mortes de baleias em Santa Catarina e São Paulo preocupam: em menos de 50 dias, 87 morreram encalhadas
Estamos em plena temporada de migração das baleias. Todos os anos elas saem da Antártica no inverno e sobem a costa brasileira à procura de águas mais quentes para namorar, ter seus filhotes, ensiná-los nos primeiros mergulhos até que ganhem peso e confiança para, no início do verão, retornarem à Antártica. Se fôssemos um País que se interessa de fato pela conservação esta seria uma época de festa, de crescimento do turismo de observação dos cetáceos, e da geração de renda e empregos, como acontece em todo o mundo. Mas a temporada deste ano começa muito mal, com mortes de baleias e golfinhos em redes de pesca, ou encalhadas em praias.
São muitas mortes em apenas 50 dias!
O ecoturismo marinho é uma das melhores soluções para gerar empregos e renda de forma sustentável nos litorais do planeta. Esta é uma das atividades que mais crescem no mundo. No Brasil, o ecoturismo marinho anda aos trancos e barrancos.
Mas, vejamos como é lá fora. Em 2009, por exemplo, o turismo de observação de baleias gerou no mundo US$ 2 bilhões de dólares, e 13 mil empregos; na Nova Zelândia o número de visitantes aumentou de 3.400 para cerca de 870 mil em um período de dez anos, só para citar dois exemplos.
Enquanto isso, no Brasil a APA da Baleia Franca, criada em Santa Catarina no ano 2000 para a avistagem das Francas que escolheram o Estado para suas ‘férias de inverno’, ficou mais de 14 anos sem Plano de Manejo, instrumento obrigatório das unidades de conservação pela Lei do SNUC- Sistema Nacional de Unidades de Conservação.
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Por esta omissão, a avistagem ficou proibida pela Justiça por anos a fio até que recentemente foi retomada. Mas agora, em 2021, os encalhes seguidos por morte estão acontecendo num nível alarmante. O Mar Sem Fim encontrou números desencontrados na imprensa.
Ligamos então ao Projeto Baleia Jubarte e conversamos com Milton Marcondes, médico veterinário, coordenador de Pesquisa, que nos passou alguns dados, entre eles que só neste mês de julho estão ocorrendo 1,4 encalhes por dia!
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Até 27 de julho houve 87 encalhes
Milton Marcondes confirma o encalhe e morte de 87 jubartes, com a seguinte distribuição por Estado, Rio Grande do Sul, 8; Santa Catarina, 30; Paraná, 5; São Paulo, 21; Rio de Janeiro, 11; Espírito Santo, 5; Bahia, 6; e finalmente Sergipe, 1.
As Jubartes chegaram este ano em abril. Portanto em cerca de três meses 87 morreram. Parte delas foi pega por redes de pesca, outra parcela encalhou em praias (possivelmente com seus estômagos cheios de plástico), ou eram juvenis que se perderam das mães.
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A Educação Ambiental na Base Nacional Comum CurricularNavio de cruzeiro aporta em NY arrastando baleia na proaBaleia cinzenta, tida como extinta, foi vista no AtlânticoSegundo a Folha da Cidade (18/06/2021), ‘dados do Projeto Baleia Jubarte mostram que só neste ano foram 14 baleias emalhadas em redes de pesca no litoral brasileiro, nove registros ocorreram em Santa Catarina, das quais três baleias morreram, todas na águas de Florianópolis na última semana.
Possível distúrbio na Antártica
A Folha de S. Paulo cita Milton Marcondes, coordenador de pesquisa do Projeto Baleia Jubarte, que sugeriu mais um motivo para os encalhes e mortes. Milton explica que as baleias que sobem nosso litoral no inverno ‘se alimentam nas águas antárticas da Geórgia do Sul e vêm ao litoral brasileiro para se reproduzir e ter filhotes’.
Acontece que foram vistas ‘baleias magras se alimentando nos litorais de São Paulo e Santa Catarina – estados líderes nos encalhes’.
As jubartes se alimentam de krill e pequenos peixes. Elas filtram a água do mar e retém os alimentos que interessam. Marcondes sugere que este comportamento pode significar ‘uma diminuição da oferta recente de krill na Antártica em razão do aquecimento global’.
As jubartes já figuraram entre as espécies em extinção
Até os anos 80 do século passado as baleias eram impiedosamente caçadas mundo afora. Isso colocou várias espécies na lista de extinção. As jubartes foram uma delas. Felizmente, muitas populações se recuperaram depois da moratória internacional (1986).
O Projeto Baleia Jubarte calcula que hoje existem mais de 20 mil indivíduos da espécie. As baleias-azuis, o maior animal da Terra, não tiveram a mesma sorte. Os três mil indivíduos restantes correm risco de extinção.
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Golfinhos-nariz-de-garrafa a um passo da extinção em Laguna, SC
E não foram apenas as baleias os cetáceos mortos por apetrechos de pesca largados ao deus-dará por pescadores irresponsáveis.
Como comentamos recentemente, golfinhos-nariz-de-garrafa que se acostumaram a ajudar os pescadores de Laguna, estão a um passo da extinção pelos mesmos motivos: mortos por redes deixadas por aqueles que são ajudados pelos animais!
Políticos de Santa Catarina preocupados
Segundo o Portal Brasileiro de Turismo, ‘o presidente da Comissão de Turismo e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa de Santa Catarina, deputado Ivan Naatz (PL), manifestou preocupação pela morte de baleias presas em redes fixas de pesca, a maioria irregulares’.
E concluiu o Portal: ‘Naatz anunciou que já protocolou requerimento na Comissão de Turismo e Meio Ambiente da Alesc no sentido de oficializar convite ao Comando da Polícia Militar Ambiental do Estado, para prestar informações sobre como está sendo feita a fiscalização quanto às redes de pesca ilegais, que têm causado sofrimento e, na maioria dos casos, a morte dos animais’.
Mas até o momento esta foi a única intervenção oficial. O diligente Ministério do Meio Ambiente, semidestruído pelo neófito Ricardo Salles, hoje dirigido por um sumido e omisso Joaquim Álvaro Pereira Leite, não se dignou a manifestar-se até o momento.
O fato da APA da Baleia Franca ser um fracasso desde sua criação não é exceção. Esta é quase a regra ao menos entre as unidades de conservação federais do bioma marinho, conforme já cansamos de denunciar.
Omissão da APA da Baleia Franca
A omissão é generalizada e sem desculpas. No ano passado foram mais de 70 cetáceos mortos. Era preciso ação ANTES do início da migração. Mas os burocratas nada fizeram.
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A APA da Baleia Franca se superou ao publicar uma nota onde dizia que “a atividade pesqueira é essencial para o território e que o enredamento é incidental, não intencional. Desta forma é imprescindível encontrar meios para que tanto a pesca como a baleia possam ocorrer no território sem prejuízo para ambos”.
Ora, raios, se sabem disso, porque não encontraram meios para que tanto a pesca como a baleia possam ocorrer sem prejuízos?
É duro tirar a bunda da cadeira…
Omissão do MMA e Secretaria de Aquicultura e Pesca
A omissão federal é absoluta. Além do MMA, a Secretaria de Aquicultura e Pesca dirigida pelo amigo do presidente, Jorge Seif Jr., é outro escárnio do desgoverno que vivemos. Ela deveria se manifestar, afinal, estamos falando dos malefícios da pesca.
Jorge Seif Jr. é oriundo de uma família dona de empresa de pesca em Itajaí, o maior polo pesqueiro do Brasil, a JM Seif Transportes foi multada diversas vezes por infringir as leis da pesca!
Como era de se esperar, o secretário não se manifestou até o momento.
Omissão do Governo de Santa Catarina
Os políticos, e a sociedade esclarecida de Santa Catarina, sabem que o problema existe. Não é de hoje que cetáceos morrem às carradas no litoral do Estado. E sempre que isso acontece a imprensa cobre.
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Em 2020, por exemplo, entre os meses de setembro e outubro cerca de 73 cetáceos apareceram mortos no litoral do Estado com ampla cobertura da televisão.
Além de não tomarem providências, fica a pergunta: alguém já viu, ouviu, ou leu sobre o governo de Santa Catarina promover o Estado via o turismo de observação de baleias como faz o governo da Bahia (ainda que timidamente ao nosso ver).
Em vez de investir para criar a infraestrutura necessária para uma saudável observação de baleias, e assim trazer turistas, uma excelente fonte de renda, o Estado se omite, não percebe o potencial imenso que está perdendo.
Sucessivos governos não se manifestam, não tomam conhecimento, apesar da realidade mundo afora mostrar o potencial da atividade que, além de gerar emprego e renda, é absolutamente sustentável.
Era tudo que precisávamos no momento em que o planeta corre sério risco pela rapidez da perda de biodiversidade animal e vegetal.
Infelizmente, nossos gestores políticos com poucas exceções, vivem em outro mundo. O mundo das trevas, da terra plana, o mundo obscurantista do sistema que nega a instrução e a ciência.
Assista ao vídeo que mostra algumas das mortes de baleias
Assista a este vídeo no YouTube
Imagem de abertura: Emanuel Ferreira/R3 Animal
Fontes: https://www.nsctotal.com.br/colunistas/raphael-faraco/mais-uma-baleia-e-encontrada-morta-em-florianopolis-sao-26-no-estado-so; https://www.mercadoeeventos.com.br/noticias/destinos/morte-de-baleias-ameaca-temporada-de-observacao-em-santa-catarina/?l&t&fbclid=IwAR2FtWzC4xyxKAAr4IA0IwD5DygUkPv_oQ9_jg8juusrLrszF0Xj3eVfv_0; https://folhacidade.com.br/2021/06/17/pf-e-icmbio-vao-investigar-versoes-desencontradas-sobre-morte-de-jubartes-nas-redes-de-pesca-em-florianopolis/; https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2021/07/brasil-tem-recorde-de-baleias-jubarte-encalhadas-no-primeiro-semestre.shtml.
O problema não é bolsonarismo ou lulismo. Sempre faltou vergonha a nossos governantes para quem os interesses financeiros se sobrepõe ao amor e ao respeito à natureza. É uma questão de educação e humanidade!
Santa Catarina é Estado mais bolsonarista do Brasil, mais de 80% votou em Bolsonaro em 2018. Desse pessoal não vau sair nada em prol de turismo ecológico, o negócio dessa turma e agronegócio e pesca de arrasto sem limitações. E a natureza ( e nós juntos no fututo ) que se dane…
Infelizmente, esse assunto nunca na história brasileira gerou ínfimo interesse, por parte de todo e qualquer governante, população ou até locais que se beneficiariam direta ou indiretamente da preservação ecossistema fauna/flora. Graças à poucos esclarecidos a situação seria ainda muito agravada.