Navio Prof. W. Besnard que deveria tornar-se museu flutuante está próximo de naufragar
O sonho do professor Wladimir Besnard, primeiro diretor do Instituto de Oceanografia da USP, estava prestes a tornar-se realidade. Apesar do professor ter morrido em 1960, antes do navio Prof. W. Besnard ser entregue ao Brasil, a ideia e concepção foi dele. Mal sabe que depois de encerrar sua brilhante carreira, entre a luta para torná-lo museu, ou um naufrágio, a última alternativa está mais próxima de se tornar realidade (Post de 2019, atualizado em julho de 2020).
Navio Prof. W. Besnard: para o fundo do mar, ou museu em Ilhabela?
Nunca naveguei no navio Prof. W. Besnard, bem que gostaria. Aquilo não é um barco, é uma lenda náutica. Um ícone da oceanografia nacional. O navio foi batizado em homenagem ao russo-francês, Wladimir Besnard, cientista trazido ao Brasil pelos fundadores da USP, para organizar e dirigir o Instituto Oceanográfico em seus primeiros 14 anos.
Tarefa que executou com brilho. Desde que foi aposentado, em 2008, persistia uma disputa inglória: afundá-lo, e transformá-lo em atração submarina; ou transformá-lo no primeiro museu flutuante nacional?
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Por sua notoriedade, a precária situação do navio foi abordada por toda grande mídia, jornais e TVs mostraram o estado de penúria do Prof. W. Besnard. No início do mês o Santos Port Authority (SPA) e o Ibama fizeram uma vistoria e tiveram que montar uma rápida operação de salvatagem.
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Adernado e cheio d’água – atualização
O navio, adernado e cheio d’água e óleo em seus porões, poderia tombar de vez prejudicando as operações do maior porto do País. As autoridades convocaram o Instituto do Mar, atual proprietário, que informou não ter recursos. Ambos, então, prosseguiram com a operação retirando 130 mil litros de água, uma prova do abandono da embarcação.
Desde o início de julho o Mar Sem Fim envia e-mails para Fernando Liberalli, presidente da ONG Instituto do Mar, com quem falamos desde que houve a cessão do navio pela USP e a ideia de transformá-lo, do naufrágio para um recife artificial nas águas de Ilhabela, para a luta de transformá-lo em museu flutuante estacionado na mesma região.
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Infelizmente para nós que torcíamos pela perenidade do navio Prof. W. Besnard. Torcida grande, como se pode ver pelos inúmeros comentários ao pé desta página.
A seguir, a cronologia do caso.
Venceu a esperança para o navio Prof. W. Besnard?
A boa nova, do início de 2019, veio por meio do site do jornal A Tribuna, de Santos. “O navio oceanográfico ‘Professor Wladimir Besnard’ deve içar âncora ainda neste ano e deixar o Porto de Santos, onde está atracado desde 2008…Um entendimento sobre seu futuro foi encaminhado em reunião na sede do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico (Condephaat), entre a ONG Instituto do Mar (Imar), e a Prefeitura de Ilhabela”.
Na verdade, o advogado paulista Fernando Liberalli, amante do navio e suas histórias, queria transformá-lo em museu flutuante. E conseguiu a doação em 2019, depois de muita luta.
Prefeitura de Ilhabela doou navio para advogado paulista
Tão logo foi descomissionado, o Prof. W. Besnard, foi doado para Ilhabela que queria afundá-lo, e transformá-lo em recife artificial. Para evitar, Liberalli recorreu ao Condephaat. O site historiasdomar ouviu Liberalli:
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Quando eu soube que o navio seria afundado, fiquei indignado, fui ao Condephaat e consegui que fosse iniciado um processo de tombamento histórico, o que inviabilizou o naufrágio e forçou a Prefeitura de Ilhabela a desistir. Daí, no final de maio, a atual prefeita substituta da ilha repassou a doação do Professor W. Besnard para o instituto que eu presido. Só assim consegui salvar o navio
O problemão de Fernando Liberalli e seu Instituto do Mar
Primeiro, Liberalli tem que tirá-lo do porto de Santos, em seguida, recuperá-lo. As duas fases são caríssimas. Liberalli declarou ao site historiasdomar,
O Professor W. Besnard não é um simples navio. É um monumento histórico, tanto que está sendo tombado pelo Condephaat. É isso que estou tentando preservar, mesmo ao preço de assumir despesas altíssimas, que, a princípio, ninguém teria como pagar…Só para retirá-lo da água para ser reformado custará cerca de R$ 3 milhões.
Iniciativa privada
Ainda o site historiadomar:
Há muito trabalho a ser feito e isso exige uma grande quantidade de dinheiro, que não temos. Mas tenho certeza que vamos conseguir sensibilizar empresas patrocinadoras a nos ajudar a transformar o Professor W. Besnard num museu vivo sobre a relevância das pesquisas marinhas e das expedições brasileiras à Antártica.
Navio Prof W. Besnard – a história
O cientista que assumiu a USP, desde sempre não abriu mão de um navio de pesquisas. Para dar forma ao modelo escolhido pela Universidade de São Paulo, definiram o estaleiro A/S Mjellem Karlsen, em Bergen, Noruega, a quem coube o projeto final da embarcação.
Navio foi entregue em 1967
Em 1967, já batizado em homenagem ao seu idealizador, morto pouco antes, ele foi entregue e trazido para Santos.
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23 anos navegando ininterruptamente, mais de 150 viagens, e 50 mil amostras de organismos marinhos
O navio Prof. W. Besnard navegou mais de 3.000 dias. Durante os primeiros 23 anos navegou sem interrupções! Foram centenas de viagens científicas. Só de Antártica ele acumula seis.
A primeira expedição polar brasileira aconteceu graças ao Besnard. Ao todo, o navio fez mais de 150 viagens!, 68 diários de bordo para contar a história, e cerca de 50 mil amostras de organismos marinhos coletados, alguns não catalogados até hoje.
Navio Prof. W. Besnard escreveu lindos capítulos da história náutica brasileira
Com a aproximação da aposentadoria, anunciada no início de 2016, o navio Prof. W. Besnard deixa de ser um simples navio. Torna-se um nostálgico capítulo de nossa história náutica.
Um incêndio em 2008 põe fim à carreira do ‘bravo guerreiro’
Numa tarde de novembro de 2008, um incêndio irrompeu num dos camarotes do navio fundeado na Baía de Guanabara. Não houve vítimas, e os próprios tripulantes controlaram a situação. Mas o incêndio pôs o ponto final em sua história. Mesmo assim ele continua vivo. De acordo com informações, e fotos de amigos que o visitaram recentemente (se não me falha a memória são fotos ao redor do ano de 2010),
a casa de máquinas está em perfeito estado. Motores, geradores, tudo funcionando. E nem uma gota de água nos porões do navio.
O Besnard está no porto de Santos…
Como demonstram as fotos, apesar da idade o “coração do Besnard”, a casa de máquinas, parece em bom estado apesar de, externamente, ele estar muito mal tratado.
As duas opções: um museu, ou afundá-lo?
E esta, por acaso, não seria a melhor oportunidade para contar nossa bonita história na Antártica? Transformando o Besnard em museu flutuante ele continuaria vivo, servindo ao Brasil e ensinando às futuras gerações como foram nossos primeiros passos no Continente Gelado.
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Ilhabela tem 23 naufrágios naturais
Ilhabela já tem vários naufrágios naturais. Ao todo, 23 navios afundaram na região. O mais famoso é o Príncipe de Astúrias que naufragou em 1916, na Ponta do Boi. É um dos naufrágios mais emblemáticos do Brasil. Constantemente visitado por mergulhadores.
Navio foi doado à prefeitura da Ilhabela em 2016
Em 2016, durante o mandato do então prefeito Toninho Colucci (2009 – 2016), o Besnard foi doado à prefeitura de Ilhabela. Dois anos depois, em 2018, Ilhabela decidiu que o afundaria para que se tornasse um recife artificial. Pouco depois, o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico (Condephaat), acionado por Fernando, abriu um estudo de tombamento que paralisou os planos dando lugar à ‘papelocracia’.
Liberalli, com apoio deste site, de professores da USP, e de muitas outras pessoas a julgar pelos comentários dos internautas, finalmente parece que tinha ganhado a causa. Mas já em 2018 a imprensa alertava para a iminência do que agora foi registrado, como prova a sequência de fotos abaixo.
Abaixo foto do Mar Sem Fim de 2006.
E outra foto recente de Rafael Arbex.
‘O Besnard é história e mais que história da oceanografia, ele é história da ciência brasileira’
Foi o que disse o professor da USP Michel Mahiques. Mais um que fica órfão. Veja a situação calamitosa deste ícone naval.
Fontes: Folha de S. Paulo; https://ciencia.estadao.com.br/noticias/geral,o-triste-fim-do-navio-pioneiro-na-antartida,70002647908; https://www.atribuna.com.br/noticias/portoemar/ilhabela-vai-doar-navio-professor-besnard-a-instituto-1.45770?fbclid=IwAR1jHtsfpYJM05vIwGOUblNoe5GNe-zeuARkPpXmYzqAj_ZpBu8QGyF4cfM; https://historiasdomar.blogosfera.uol.com.br/2019/07/17/o-advogado-paulista-que-ganhou-um-navio-e-um-problema-maior-ainda/?fbclid=IwAR3DJndfYNfrhe1zy3iHdI1Ty93bF3ScVQj8iLI6Bf0ozQGjPuI2H-v36O0; https://g1.globo.com/sp/santos-regiao/porto-mar/noticia/2020/07/16/equipes-tiram-130-mil-litros-de-agua-de-navio-historico-abandonado-em-sp.ghtml?fbclid=IwAR0Q0z92NUQMx93rUEHTDKKJ2YqP2sQPsEr6a72MEsNWtIYAdxCbDZLKCh8.
Foto de abertura: Rafael Arbex, Estadão.
Gostaria de contatar muito o Fernando e me juntar a causa. Sou engenheiro naval formado pela Poli/87 fiz estágio no IO, participei de vistorias, reparos e até realizei pequeno projeto no N/Oc Prof W Besnard. Quero muito ajudar nesta causa que só com esforço conjunto chegaremos a um bom final.
Eng Naval Helcio Andrade
[email protected]
Achei a reportagem muito interessante!
Sugiro contatar o donatário do navio e propor uma campanha de arrecadação de fundos para o propósito noticiado.
é de chorar, ver um navio em que meu pai trabalhou e sempre visitava, não só nas festas de fim de ano. se acabar desse jeito ;-;
inclusive, o incendio começou no camarote do meu pai, minutos antes dele acordar para tomar cafe, um dos tripulantes veio correndo para o refeitorio e disse para o meu pai que o camarote dele estava pegando fogo…
Uma bela história, mais bela seria se trabalhássemos para ver este ícone nacional recuperado, seja através de doações particulares ou empresariais. Seria interessante o trabalho conjunto para que fosse montado um plano de recuperação e mecanismos de contribuição. Imagino inicialmente verbas para mantê-lo no pier e lentamente sua recuperação para quem sabe, com muita sorte, conseguir transportá-lo até nossa querida Ilhabela e lá torná-lo disponível para visitação pública e acervo histórico.
Ficaria contente de poder contribuir para o início desse longo trabalho.
Sempre que passava pela Rio Santos e o via fundeado naquela Baia, me enchia de orgulho de tantas histórias que li sobre ele e equipe. Mas esse é o Brasil que “ajudamos a destruir”. Espero que as autoridades tenham um pouco de vergonha na cara e o salvem.
“QUE PAÍS É ESTE” CANTAVA CAZUZA. PAÍS SEM MEMÓRIA ESTÁ FADADO A COMETER OS MESMOS ERROS CONTINUADAMENTE. VIDE ATUALIDADE TENEBROSA QUE VIVEMOS.
Infelizmente o nosso país não dá valor a sua própria história, tanto e que agora em 2020 esse navio está totalmente abandonado tendo quase todos os seus equipamentos a bordo saqueados e só não afundou aonde está ancorado por que o IBAMA tomou a frente na situação e fez alguns reparos no seu casco mas isso não garante que a curto prazo ele não vá a pique a qualquer momento.
Sugiro que depois de reformado ele seja exposto em Ilhabela em um dique seco para evitar o enferrujamento do casco
O Prof W Besnard é para o brasil o que o Calypso do Jacques Cousteau é para a França que foi recentemente restaurado.
Agora sim!!!
Ótima e pertinente reportagem!
Uma contribuição para a causa e história oceanográfica.
A sugestão é que pare de escrever asneiras criminalizando a pesca e os pescadores artesanais pelos descalabros ambientais do nosso País.
E foque sua atenção, tempo e recursos para fazer reportagens que contribuam para a disseminação desse importante tema – como o retratado – em um momento que acompanhamos o desmonte do SISNAMA por um grupo de aventureiros.
Pois, eu sei que muitos marinheiros operaram este ícone dos mares, não seria possível homenageá-los todos, mas nenhuma citação de um marinheiro, de um capitão sequer, ainda que apenas de uma ou duas missões mais relevantes, não esta correto. Homenagear um navio e não os marinheiros que tornaram possíveis as missões definitivamente é uma falha gritante da reportagem, faltou pesquisa e sobrou preguiça. Pelo menos são boas notícias, algumas toneladas de metal velho foram salvas, a história das pessoas que tornaram isto útil ainda não.
Preservar a nossa história é permitir que tenhamos futuro.