Parque Nacional da Lagoa do Peixe (RS), tragédia anunciada
Neste fevereiro a mídia anunciou o que já era esperado há muito tempo. ‘Estiagem faz Lagoa do Peixe secar pelo segundo ano consecutivo’, título de matéria da gauchazh.clicrbs.com.br. Títulos semelhantes foram escolhidos pelo g1, Correio do Povo, Metsul.com, etc. Antes, vale explicar ao leigo onde fica a Lagoa do Peixe. Ela faz parte do Parque Nacional da Lagoa do Peixe (RS), criado por decreto em 1986. O parque localiza-se na restinga que separa a Lagoa dos Patos do Atlântico. Trata-se de um santuário de aves nativas e migratórias. Um dos locais mais espetaculares da costa brasileira. Contudo, por que dissemos que era uma tragédia anunciada? Porque, como quase a totalidade das unidades de conservação do bioma marinho, existe apenas no papel.
A tragédia anunciada
No passado, ali pelos anos 70, o governo federal promoveu uma série de incentivos fiscais para o reflorestamento com pinus e eucaliptos sem, entretanto, estudar as áreas onde o plantio deveria ser incentivado.
Problemas gerados pela drenagem da planície costeira
O primeiro e mais importante foi que, com a drenagem, a vegetação que segurava as dunas frontais, morreu. Com isso, quando entra o vento Nordeste, comum na costa gaúcha, suas areias voam para o interior assoreando as muitas lagoas da região.
Ao mesmo tempo, um sem-número de animais, especialmente mamíferos, anfíbios e répteis que habitavam as áreas úmidas, diminuiu drasticamente.
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Por outro lado, acirrou-se o processo erosivo na costa gaúcha. As dunas, entre outras funções importantes, atuam como um repositório de areia para abastecer às perdidas nas praias durante ressacas.
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‘A natureza é sábia’
Como diz o ditado, a natureza é sábia. Em cada ecossistema há uma enorme teia de interligações que se retroalimentam naturalmente. Cada mínimo detalhe tem a sua função e importância na manutenção dos predicados da região. Quando a arrogância do ser humano mete a mão neste espaço e impede alguma destas funções, começa um processo de degeneração que não para mais.
Assim, hoje a costa do Rio Grande do Sul tem vários hotspots de erosão. A cidade de Torres é um deles, onde os processos erosivos em razão de tempestades são capazes de destruir os calçadões e provocar alagamentos nas áreas urbanizadas.
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Entre um extremo e outro, fica o parque da Lagoa do Peixe. Não por acaso, outro hotspot erosivo do litoral. No local, o mar vem avançando entre 3m e 4m ao ano. Com isso, o Balneário Mostardense será o Hermenegildo no futuro próximo.
A decadência do Parque Nacional da Lagoa do Peixe (RS)
Ela começou em 1986 quando o parque foi criado por decreto federal que desapropriou toda a sua área de 36.722 ha. São partes dos municípios de Mostardas, Tavares (83%), e São José do Norte.
Contudo, até hoje, passados mais de 36 anos, os antigos ocupantes, entre eles criadores de gado, pescadores, agricultores e silvicultores, não foram indenizados. Com isso, o parque criou conflitos com os municípios que perderam áreas produtivas e nada ganharam com visitantes. Porque o parque não é conhecido, nunca foi divulgado, assim, como turistas poderiam aparecer?
Parque Nacionais, unidades de conservação de proteção integral
Vale lembrar que um parque nacional é uma das unidades de conservação de proteção integral, as mais eficientes. Segundo definição do ICMBio que administra as UCs federais, os parques têm como objetivo básico a preservação de ecossistemas de grande relevância ecológica e beleza cênica, sendo admitido o uso indireto dos seus recursos naturais, e/ ou, pesquisas e a visitação.
Como ‘preservar o ecossistema’ se dentro do parque pescadores continuam a atuar, assim como agricultores, pecuaristas, silvicultores, etc. Em outras palavras, o parque é uma mentira assim como o são a maioria das UCs federais do bioma marinho.
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O leigo pode estranhar porque esta simples constatação é muito rara por parte dos envolvidos na questão ambiental, ou a mídia. Como já disse inúmeras vezes, grande parte dos que se dizem ambientalistas, são ‘ambientalistas’ entre aspas. Estão mais preocupados com seus empregos e patrocínios do que em informar o público o que acontece nos bastidores.
Nem mesmo a mídia esclarece estes importantes ‘detalhes’. Tanto é assim que a maioria das matérias citadas na abertura destacam que ‘os pescadores ficaram a ver navios’. Ora, eles sequer deveriam estar ali se as UCs fossem de fato unidades de conservação.
‘Pescador recolhe as 45 redes da família’
Vejamos o que diz a gauchazh.clicrbs.com.br, ‘É o segundo ano consecutivo em que a estiagem afeta a fonte de sustento para 201 pescadores da região’
Mais adiante, ‘Com água pelo tornozelo, o pescador Cleiton Lopes Riquinho, 35 anos, decidiu recolher as 45 redes da família, que haviam sido instaladas no setor Costa. Em dezembro, ele ainda conseguiu retirar quase 200 quilos de camarão por dia. Mas, desde o final de janeiro, quando reuniu oito quilos de camarão, não conseguiu mais pescar.’
‘Indo na direção Sul, o setor Lagamarzinho mais parece um deserto com restos de milhares de crustáceos e tainhas em formação, que poderiam ser pescadas no inverno. Em meio ao cheiro de putrefação, as redes de camarão seguem penduradas no nada.’
Crustáceos e tainhas em formação que, se a conservação existisse no País, seriam motivo do gozo de visitantes. Ou seja, não se explica o contrassenso de um parque nacional abrigar pescadores, ao contrário. A mídia mais uma vez perdeu a oportunidade de esclarecer seus consumidores.
O show de desinformação
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Segundo a gauchazh.clicrbs.com.br, ‘Vendo que a lagoa secaria quase que por completo, o ICMBio antecipou a abertura da safra do camarão-rosa para o início de dezembro (o comum seria abrir em janeiro), na tentativa de ajudar os pescadores.’
Pulamos para o g1: ‘Em pleno período da safra do camarão, que começou em dezembro, os 200 pescadores autorizados a trabalhar na lagoa só acumulam prejuízos. A Prefeitura de Mostardas afirma que o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) solicitou ao governo federal apoio à comunidade.’
Área do parque é uma berçário de vida animal
Mais adiante diz o g1, ‘Segundo o ICMBio, a área é considerada um berçário de espécies marinhas, como o camarão-rosa, a tainha e o linguado. A lagoa também atrai variadas espécies de aves, encontrando farta alimentação no local.’
Mas não há uma palavra sobre a esculhambação do ‘berçário de espécies marinhas’ dentro de um parque nacional.
É desesperador. E talvez seja pelas sucessivas mancadas da imprensa que hoje vivemos o período glorioso das fake news, com pessoas acreditando que a Terra é plana, que devemos acreditar no ‘Messias’, que um presidente pode andar de Jet Sky enquanto milhares morriam por atraso das vacinas conta a covid, entre outras sandices.
Destacamos mais uma fonte, desta vez o Correio do Povo: ‘Em 2022, as estimativas eram de que, somente no camarão, os prejuízos alcançaram quase R$ 5 milhões para as 201 famílias autorizadas a explorar a atividade pesqueira na Lagoa do Peixe.’
Mas sobre o prejuízo da biodiversidade em unidades de conservação de ‘proteção integral’, nem uma linha sequer.
Pobres pescadores artesanais…E sobre a conservação avacalhada de Pindorama, nada? Por estas e outras, ‘o destruidor ambiental do presente’, Ricardo Salles, foi o quarto candidato a deputado federal mais votado em São Paulo
Ótima informação. Parabéns.
Alerto que a frase seguinte não é legível com sua virgulação:
“O leigo pode estranhar porque, esta simples constatação, é muito rara por parte dos envolvidos na questão ambiental, ou a mídia.”
Deve ser virgulada assim:
O leigo pode estranhar, porque esta simples constatação é muito rara por parte dos envolvidos na questão ambiental, ou a mídia.
Deslise ainda no subtítulo:
“Área do parque é uma berçário de vida animal”
Correto: é um berçário …
Obrigado, amigo corrigida a virgulação.