Ubatuba aproveitará a oportunidade em outubro de 2024?
Este site já alertou outras vezes sobre a proximidade das eleições, destacando que os municípios do litoral paulista não suportam mais quatro anos de negligência, corrupção, especulação imobiliária e falta de ação na preparação das cidades para enfrentar o aquecimento global, a elevação do nível do mar e a crescente violência e frequência dos eventos extremos. Estas eleições em Ubatuba serão fundamentais para construir a resiliência climática. Ou os prefeitos iniciam as obras mais urgentes, ou seus cidadãos arcarão com as consequências como aconteceu em São Sebastião em 2023.
Prefeita cassada continua na prefeitura
Ubatuba enfrenta uma situação sui generis. Em maio de 2023, a prefeita Flávia Pascoal (PL) foi cassada pela Câmara de Vereadores após uma devastadora denúncia feita pela advogada Jaqueline Tupinambá, que apontou supostas irregularidades na compra de pães para a merenda da rede municipal de ensino.
A denúncia dava conta de que uma empresa contratada para fornecer pães para a prefeitura subcontratou a padaria da família de Flávia, a Pascopan, que receberia R$ 736 mil reais para fornecer os pães. Agora, nestas eleições, Jaqueline concorre a vereadora. É sua estréia na política. Por seu passado recente, ela tem tudo para fazer um excelente trabalho na Câmara de Vereadores.
Apesar de cassada, a Juíza que analisou o caso, Marta Andrea Matos Maranhão, considerou que ‘as várias alternâncias de gestores no cargo em curtos períodos (ou seja, cassação de mandatos) é crucial manter a autora no cargo de Prefeita Municipal para o qual foi reconduzida em 27/03/2024.
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Antes de continuar com Ubatuba vale lembrar que, após a tragédia do carnaval, a prefeitura de São Sebastião finalmente iniciou as obras que já deveriam ter sido feitas há décadas. Demorou, mas o trabalho está sendo bem executado como comentamos no post “São Sebastião e o Programa Cidades Resilientes.” Hoje, o município se encaminha para tornar-se um grande paradigma para o litoral.
E o que Ubatuba fez durante esse período? Dinheiro não é o problema. Os cofres públicos contam com cerca de R$ 50 milhões, arrecadados somente pela Taxa de Preservação Ambiental, instituída pela Lei Complementar nº 9, de 19 de dezembro de 2018, e regulamentada pelo Decreto 7.867, de 6 de abril de 2022.
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Ubatuba voltou às manchetes por mais um crime ambiental
Rigorosamente, nada, nenhuma grande obra saiu do papel até agora. Pelo contrário, em junho deste ano, Ubatuba voltou às manchetes por mais um crime ambiental. A prefeitura decidiu simplesmente extirpar a restinga da praia de Itaguá, gerando um escândalo imediato.
Na ocasião, procuramos o secretário de Meio Ambiente, Guilherme Arantes, e ficamos perplexos com sua justificativa: a prefeitura realizou o corte ‘por segurança pública’, alegando que naquele ‘mato’ se escondem vagabundos e ladrões.
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MP-SP pede suspensão de decreto que livrou Flávia Pascoal da cassaçãoLençóis Maranhenses, ameaçados por imenso condomínioProjeto de Lei do Governo do Paraná ameaça o licenciamento ambientalOu seja, eles sequer entendem a importância das restingas e manguezais, protegidos por lei devido aos serviços ecossistêmicos que incluem a proteção da linha costeira, a prevenção da erosão e a mitigação de eventos extremos.
Rios de Ubatuba: esgotos a céu aberto
O que pensar de uma estância balneária que permite que seus rios se tornem esgotos a céu aberto? Mesmo com cerca de R$ 50 milhões disponíveis para investimentos ambientais, Ubatuba não tomou nenhuma medida para melhorar a situação dos vergonhosos rios Tavares, Acaraú, Indaiá e Itamambuca, cuja qualidade da água passou de “regular” para “péssima” em apenas um ano.
Dois desses rios, o Tavares e o Acaraú, deságuam na praia de Itaguá, tornando-a constantemente ‘imprópria para banho’. Em 2017, Itaguá, uma das praias centrais de Ubatuba, foi considerada a mais poluída de todo o litoral norte.
Embora a responsabilidade pela situação dos rios não recaia exclusivamente sobre a atual gestão, já que o problema persiste há pelo menos 10 a 15 anos, nenhuma administração, incluindo a atual e a anterior, liderada por Délcio José Sato — eleito em 2016 e novamente candidato nas eleições de outubro —, tomou medidas significativas para resolver a questão.
Será possível que fizemos um pacto com a mediocridade?
Especulação imobiliária em Ubatuba
Enquanto o poder público se omite, a especulação imobiliária, que é a maior chaga do litoral, continua a destruir a paisagem, ocupando áreas irregulares como encostas de morros, restingas, mangues e até mesmo a faixa de areia das praias, praticamente sem fiscalização. Esse processo não é novo. Desde pelo menos 2016, este site denuncia os constantes cortes ilegais de Mata Atlântica para abrir espaço a condomínios, hotéis, residências e outros empreendimentos.
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Como mostram as imagens acima, a mancha urbana continua a se expandir sem que serviços básicos, como saneamento, coleta de lixo, moradias populares, etc, acompanhem o aumento populacional. Isso resulta em uma perda contínua de qualidade de vida ao longo das décadas. E, com o passar do tempo, a situação só piora, porque a ocupação avança sempre mais rápido do que as obras de infraestrutura.
A ligeireza da especulação
Para ilustrar a rapidez da especulação imobiliária, a advogada Jaqueline Tupinambá, responsável pela cassação da prefeita, conseguiu embargar mais de 80 prédios irregulares apenas durante a gestão de Flávia Pascoal. Quantos outros passaram despercebidos?
Toninhas e Praia Grande
Ubatuba carrega cicatrizes da especulação imobiliária que jamais serão curadas ou desfeitas. Basta olhar para o que se tornaram as praias das Toninhas e Praia Grande.
No passado, maracutaias na prefeitura permitiram a construção de um primeiro prédio, e a partir daí, a “boiada passou” — foi apenas uma questão de tempo. É assim que a especulação imobiliária opera; a rapidez da ação é uma de suas principais estratégias, porque aqueles que estão por trás desses crimes sabem que, uma vez construído, dificilmente alguém vai alterar.
Posso contar nos dedos as demolições de empreendimentos no litoral, por mais absurdos que sejam.
A malfadada verticalização
Mesmo com toda a carência de infraestrutura, em 2021, durante a revisão do Plano Diretor, a prefeitura tentou mais uma vez aprovar a verticalização do município, um vício recorrente entre prefeitos do litoral paulista. Se não fosse pela forte reação contrária da população, o projeto teria sido aprovado, acelerando o desaparecimento do que resta da beleza natural da região.
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É lamentável, porque Ubatuba, com suas 102 praias — muitas ainda desocupadas —, cercada pelos contornos da Serra do Mar e pelas diferentes colorações do mar, continua sendo uma joia do litoral brasileiro. Por isso, é essencial não permitir que “o inimigo avance um metro sequer”.
Falta de transparência do portal da prefeitura
Enquanto faz vista grossa à especulação imobiliária, a prefeitura de Ubatuba também peca pela falta de transparência. Em julho de 2022, a situação chegou a tal ponto que, a pedido do Ministério Público Federal, a Justiça determinou que a Prefeitura adotasse medidas efetivas para corrigir as irregularidades do Portal do município.
Enquanto a transparência não avança, a prefeitura aproveita para “exportar” forçosamente pessoas em situação de rua para outras cidades. Em setembro de 2021, o site agoravale.com.br informou que uma van da Prefeitura de Ubatuba desembarcou moradores em situação de rua em estrada de Taubaté.
Resort ‘pé na areia’ Enseada Palms
Além dos loteamentos irregulares em áreas de Mata Atlântica e da transformação da paisagem com a construção de casas, condomínios e hotéis em encostas de morros e na beira da praia, Ubatuba enfrentou um caso emblemático do poder da especulação imobiliária: a construção de um resort ‘pé na areia’ na praia da Enseada, conhecido como Enseada Palms.
Esse exemplo do que não se deve fazer foi denunciado em 2023 pelo Instituto Ubatuba Sim. Na época, abraçamos a causa e publicamos um post comemorando o fato de que o Ministério Público de São Paulo havia acabado de barrar mais um empreendimento irregular, fruto da especulação imobiliária, na praia da Enseada.
Ministério Público anula o processo
O MP anulou o processo administrativo bem como o alvará de construção ‘dada a ilegalidade destas aprovações, uma vez que emanadas de órgão incompetente e no bojo de procedimento administrativo repleto de vícios formais e materiais.’ Trata-se do Enseada Palms, da construtora RUA DONA PAULINA EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO SPE LTDA.
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Acredite se quiser, o Ministério Público perdeu a ação, mesmo sabendo que o terreno abriga uma nascente! Assim, a construção continua prestes a alterar para sempre uma paisagem que levou eras para se formar. Observe no desenho abaixo a agressão ao cenário: o arquiteto não se preocupou em preservar o encanto da praia, nem em adaptar o projeto para minimizar o impacto visual. Existem muitos resorts e hotéis ao longo da costa que mal são vistos do mar, mas ainda oferecem aos hóspedes a tão desejada vista para o mar. Isso é uma questão de inteligência e, principalmente, de ética.
Mais uma vez a Justiça vai ter que decidir o futuro do Enseada Palms
A praia da Enseada é mais um exemplo de ocupação que começou décadas atrás com a construção de casas de segunda residência, sobre a restinga que existia atrás da praia. Esse erro é comum no litoral, devido à mania do brasileiro por ‘casas pé na areia’.
Apesar disso, a maioria das casas na Enseada são de um único andar, o que ajuda a minimizar o impacto visual na paisagem. No entanto, se esse novo prédio for realmente liberado, não há dúvidas de que a Enseada seguirá o caminho de Toninhas e Praia Grande. Se uma pessoa pode erguer um “caixotão de concreto”, o que você acha que os outros proprietários farão? A ‘boiada’ vai passar mais uma vez…
‘Destruição Da Orla Da Praia Da Enseada No Município De Ubatuba’
O título acima foi emprestado do laudo de autoria da APGAM – Associação Paulista dos Gestores Ambientais Coordenadoria da Bacia Hidrográfica do Litoral Norte.
Esta, é a última tentativa de pessoas de bem, com espírito púbico, para parar definitivamente a agressão que ameaça a praia da Enseada.
O laudo afirma que o tema ‘refere-se à crimes ambientais como a intervenção na área de praia, intervenção em APP de curso hídrico, e desacato às imposições da secretaria de Meio Ambiente’. E informa que o empreendimento visa a construção de edifícios residenciais. ‘A comunidade caiçara da praia da Enseada e a APGAM estão indignadas com a ação, e cobram do poder público a paralização’.
O documento faz um resumo do processo informando que ‘a prefeitura deu o alvará de construção mas um documento de suma importância solicitado de CETESB não foi apresentado. Portanto, o canteiro de obras não poderia ter sido construído‘. Além disso, destaca que é ‘gravíssimo ocultar recurso hídrico existente no local’.
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Por fim, o laudo solicita que o Ministério Público apure os fatos. O documento é acompanhado de uma série de fotos que mostram claramente que a obra está prevista para ser construída em terreno de praia, diretamente sobre a areia, o que é expressamente proibido.
Assina o documento Rafael Pinheiro dos Santos, vice-presidente da APGAM.
Jaqueline Tupinambá evita pregão virtual de R$ 43 milhões de reais para comprar ‘gradil para shows’
Mesmo depois da cassação, a prefeita Flávia Pascoal parece não ter aprendido a lição e continua agindo da mesma maneira. Mais uma vez, graças à intervenção de Jaqueline Tupinambá, agora candidata a vereadora pelo Republicanos, o pregão foi suspenso.
Conversei com Jaqueline: ‘Nós não temos show aqui faz mil anos, gradil para pôr aonde?’ Ela conta que estava na delegacia quando soube do pregão de R$ 43 milhões através de ligações de amigos. No ato, fez um vídeo ameaçando entrar na Justiça para embargar o absurdo e o colocou em suas redes sociais. ‘Ameacei, nem cheguei a entrar na Justiça, cinco dias depois a prefeita retirou o pregão em razão da imensa repercussão’.
Perguntei se, a exemplo de São Sebastião, Ubatuba fez alguma obra para mitigar eventos extremos depois da tragédia de 2023. Nada, Ubatuba está de costas para este tipo de ação. A cidade não faz limpeza de rios, não fazem plantio de mudas nativas, pelo contrário, Ubatuba tira jundu (referindo-se à restinga da praia de Itaguá). ‘A gestão dela é um retrato da ignorância quanto às mudanças do clima’.
Ubatuba não tem programa de construção de casas populares
Ubatuba é mais um município costeiro que nunca teve um programa de construção de casas populares. Como resultado, os desvalidos acabam desrespeitando a lei, construindo nas margens dos rios, nas encostas da Serra do Mar ou em áreas proibidas, como os manguezais. A ausência de alternativas oferecidas pelo governo municipal força essas pessoas a buscarem soluções precárias e arriscadas.
O mesmo processo de ocupação de áreas de risco que ocorreu em São Sebastião está agora se repetindo em Ubatuba. Pior ainda, os sertões desses municípios têm se tornado refúgio para muitos membros do PCC. Embora o governo do Estado esteja ciente do problema, ainda não agiu. Se essa negligência continuar, em breve esses grupos estarão vendendo drogas e cobrando taxas de proteção dos comerciantes locais.
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Ubatuba na rabeira do Ranking de Competitividade dos Municípios
Em 2011 o Centro de Liderança Pública, organização suprapartidária que busca engajar a sociedade e desenvolver líderes públicos para enfrentar os problemas mais urgentes, lançou o Ranking de Competitividade dos Municípios, uma ferramenta de relevância e que visa apoiar os líderes públicos nas tomadas de decisão, com foco na melhoria da gestão das cidades.
A quinta edição, de 2024, analisou um total de 411 municípios (7,45% do universo de municípios), representando os municípios com população acima de 80 mil, divididos em quatro categorias: Ambiental, Social, Governança e ESG. São Sebastião está em 1º lugar na Governança, enquanto Ubatuba ocupa o 175º. Em ESG, São Sebastião está em 5º, enquanto Ubatuba mais uma vez está na rabeira, na 133ª colocação.
O Mar Sem Fim tentou ouvir Flávia Pascoal mas não foi atendido
Desde 30 de agosto temos ligado para a prefeitura e deixado recados com diversos assessores, informando que gostaríamos de ouvir a prefeita sobre a nova denúncia de Jaqueline Tupinambá referente ao pregão virtual para a compra de gradis. Apesar de anotarem meu nome e telefone, não recebemos retorno, mesmo depois de avisar que sairia no Portal do Estadão.
Outubro: eleições municipais
Considere isso nas eleições deste domingo. Está em nossas mãos nos livrarmos desses aproveitadores que buscam o cargo para benefício próprio, e não para servir à população. Votar com consciência e escolher líderes comprometidos com o bem comum e a proteção ao meio ambiente é crucial para transformar a realidade insustentável que domina o litoral.
Desafios Ambientais: conheça boas ações, uma da sociedade, outra do governo
O come tarista foi perfeito em syas colocolocações.
Falando restritamente de Ubatuba, que é o meu território, é chocante o desleixo das autoridades locais em relação aos cuidados que DEVEM (de dever, mesmo, obrigação) ter com a cidade e seus munícipes.
Até quando vamos nos calar, trocar nossa voz e verdade por um par de chinelos???
É passada a hora de acordar e EXIGIR dos nossos representantes que cumpram seu papel com respeito e dignidade, OU SUMAM DO CENÁRIO, para termos um pouco de paz.
Lamentável tudo isso. Estive em outubro de 2023 em Praia Grande de Ubatuba e visitei outras praias. Não volto mais. O que vi e vivenciei foi um pesadelo como turista. Muito triste. Há 20/30 anos atrás era outra coisa, bem melhor.