200 a 400 mil marítimos ainda presos a bordo devido à covid-19
São variados os setores da economia mundial que colapsaram devido à pandemia. O turismo, a aviação, bares e restaurantes, os shoppings, a indústria, e muitos outros. Mas um deles tem passado o ‘pão que o diabo amassou’. Trata-se da indústria naval em suas variadas modalidades. 200 a 400 mil marítimos ainda presos a bordo.
200 a 400 mil marítimos ainda presos a bordo
Ainda no final de julho publicamos o post Navios de cruzeiro, a pandemia e a tempestade perfeita onde comentávamos os problemas do setor. Os 338 navios de cruzeiro que levam passageiros pelos mares do planeta foram obrigados a parar.
Mas os ‘monstros do mar’ não foram feitos para parar. E não há ‘garagens’ para guardá-los. Os navios de cruzeiro foram obrigados a esperar em pleno mar, próximos a alguns portos, e não podem ser totalmente desligados. Quando ficam fundeados, eles têm que ficar funcionando.
Segundo o Financial Times, de junho de 2020: “A Carnival, a maior empresa de cruzeiros do mundo, está com hemorragia de US$ 1 bilhão por mês para manter sua frota.”
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O estresse e a fadiga de 200 a 400 mil pessoas embarcadas
De acordo com a Forbes, “O estresse e a fadiga estão aumentando entre a tripulação. A indústria já tinha 2.815 incidentes de navegação em julho de 2020, com certas categorias de navios vendo problemas de segurança dispararem 20% este ano.”
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Ainda mais acidentes virão? Parece que sim.
A Forbes diz que “a gigante dos seguros de transporte, Allianz, destacou esse risco. “A seguradora prevê cortes de custos em todas as companhias que, juntas, transportam cerca de 90% do comércio mundial. Para a Allianz, a longo prazo isso significa um aumento nas perdas com medidas de corte de custos, tripulação cansada, navios ociosos e resposta de emergência enfraquecida.”
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Deste total, ‘mais de 200 mil estão presos em navios há meses desde a última troca de tripulação. Empresas de saúde que tratam este pessoal informaram que ‘a ajuda aumentou em 700% em 2020, comparado ao mesmo período do ano anterior’.
A Forbes cita o editor da publicação marítima líder, a gCaptain, John Konrad que fez um apelo em nome da indústria. O editor citou quatro aspectos que não foram observados por muito tempo: ‘a segurança dos navios, a sustentabilidade, paridade de gênero, e diversidade racial’.
O apelo do editor foi feito em vídeo, onde ele enumera 26 acidentes que o site da publicação está cobrindo. “Uma série de exemplos de navios explodindo, afundando e batendo.”
Para John Konrad “estes incidentes foram uma combinação de anos de enfraquecimento dos padrões de segurança em navios que agora foram acentuados com COVID-19.”
Entre os acidentes citados está o desastre ecológico nas Ilhas Maurício, que já comentamos, quando um enorme cargueiro subiu em recifes a poucos metros das praias. E pergunta “o quanto disso teria sido provocado pelo subinvestimento em processos de sistemas de segurança, treinamento e tecnologia?”
Navios de Bandeiras de Conveniência
A matéria também comenta um dos procedimentos da indústria marítima mundial, os navios com Bandeiras de Conveniência, quando embarcações de um determinado país são registradas em outros com regras mais frouxas sobre condições de navegação e de trabalho, “onde 50% de todos os grandes navios oceânicos estão registrados.”
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Em geral estes países de registro são o Panamá, as Ilhas Marshall e a Libéria, entre outros. E diz que “esses três países são conhecidos por terem um regime de fiscalização inferior ao de outras jurisdições.”
A Forbes sugere que “pode ser mais do que uma coincidência que três dos maiores desastres marítimos dos últimos dois meses, o Wakashio em Maurício, o Gulf Livestock na costa do Japão e o MT New Diamond no Sri Lanka, foram todos registrados no Panamá.”
Perda de um a dois grandes navios por semana
Esta é a média de perdas de grandes navios oceanos afora. Como são imensos, em geral estes acidentes provocam sérios desastres ecológicos, salvo quando afundam em alto-mar. Ainda assim, longe dos litorais, não deixam de ser desastres ecológicos apesar de, pela distância da costa, não provocarem o alvoroço que o desastre de Maurício causou.
Ainda em junho o Secretário-Geral da ONU, Antonio Gutteres, disse que estava “preocupado com a crescente crise humanitária e de segurança que os marítimos enfrentam em todo o mundo”. Gutteres se preocupava com os milhares de marítimos presos por meses, incapazes de desembarcar (em razão da pandemia), e classificou o assunto como “crise humanitária insustentável.”
E, lembra a Forbes, “as famílias de 40 tripulantes desaparecidos do Gulf Livestock 1 continuam a apelar ao Japão para não encerrar sua missão de busca e resgate, depois que o navio navegou direto para o centro de um poderoso tufão no início deste mês.”
A Forbes diz que estes acidentes são típicos de navios panamenhos, ou os de bandeiras de Conveniência, mas ‘isto está se estendendo para navios de países mais rígidos, como os Estados Unidos’.
E lembrou que “em agosto, quatro tripulantes morreram e muitos outros ficaram feridos quando um navio de dragagem americano, o Waymon L. Boyd, explodiu no porto de Corpus Christi, no Texas.”
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Sustentabilidade questionada
Como já levantamos neste site, a indústria marítima mundial é altamente poluente. “Se fosse um país, o transporte marítimo seria o 6º maior em termos de emissões de carbono.”
Atualmente a frota mundial de grandes navios é calculada em 60 mil pela Forbes, que diz que “desde 1950 o tamanho do transporte marítimo global cresceu 1.500%, embora a quantidade de navios permaneça mais ou menos igual. É que muitos saíram de linha e outros, maiores, entraram como substitutos.
Subsídios
A Forbes estima em 500 bilhões de dólares anuais, vindos da indústria mundial de petróleo pelo fato dos navios usarem um combustível pesado “que, de outra forma, exigiria que a indústria do petróleo pagasse por um descarte caro e seguro.”
Enquanto isso, estudos mostram que o primeiro grande navio de carga só sairá dos estaleiros em 2030. Há muitas novidades no setor naval como este site já demonstrou. Mas, por enquanto, se limitam a navios menores.
Outros problemas da indústria marítima mundial
A Forbes lembra que os problemas acima não são os únicos. Trata-se de uma indústria quase 100% masculina, seja entre tripulantes, inspetores de acidentes, ou mesmo nos quadros da IMO – Organização Marítima Mundial (agência controlada pelo Japão na ONU). Ao que parece, a indústria naval não dá muita pelota para a paridade de gêneros, o que provoca incômodo e eleva as críticas ao setor.
Quanto à diversidade racial, que avança em todas as partes do mundo, seja em empresas ou o setor de serviços, parece igualmente ‘encalhada’ na indústria naval.
A conclusão da Forbes é que a indústria marítima mundial ‘envia-nos um SOS’. E diz que ‘apesar da ONU, do Papa, e de líderes empresariais como Sir Richard Branson pedirem uma urgente mudança nos padrões, nada acontece. Segundo a Forbes, nem mesmo a a IMO, mostrou-se capaz de se sensibilizar.
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Prepare-se, acidentes como o do cargueiro da Vale na saída do porto no Maranhão provavelmente vão acontecer com mais frequência também em nosso litoral.
Para a Forbes, o transporte marítimo global é de longe o maior retardatário de todas as indústrias de transporte. E conclui: “O mundo está ficando sem tempo para evitar uma mudança climática descontrolada. O mesmo acontece com a indústria naval.”
Imagem de abertura: https://www.orfonline.org/
Fonte: https://www.forbes.com/sites/nishandegnarain/2020/09/27/global-shipping-in-crisis-world-leaders-ignoring-the-sos/?fbclid=IwAR1W759qGciQRGWrOLBuAG5ziRLxOSvdc8V4Iw8AOwQaMfcJ_Hpqob3TNBw#42db3786258f.
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