Viagem da Kika, Reserva Ecológica da Juatinga/Cairuçu – relato Nº 20
Após um belo verão nórdico em Lofonten retornamos para Brest, na França. Devido às restrições relacionadas ao Covid nossa temporada de charters ficou prejudicada. Reserva Ecológica da Juatinga/Cairuçu.
Nestes tempos de pandemia o mar é um lugar seguro, sem risco de contágio, no entanto, as fronteiras terrestres passaram a ser uma questão cada vez mais complexa.
Desde a França voei para São Paulo para resolver assuntos familiares enquanto Georges cruzou o Atlântico com o Antarctic, e a partir de João Pessoa seguimos juntos até Paraty.
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Passamos o verão do hemisfério sul com base no Saco do Mamanguá, no município de Paraty. Gostamos tanto deste lugar que decidimos colocar um pé em terra firme.
O Saco do Mamanguá é um profundo fiorde, ladeado por montanhas rochosas cobertas de mata atlântica, com abundante agua doce e um extenso manguezal ao final, berço de inúmeras espécies.
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Comunidades caiçaras
As comunidades caiçaras desta região resistem graças ao isolamento, mas principalmente `a Reserva Ecológica Estadual da Juatinga e à Área de Proteção Ambiental de Cairuçu, que preservam um extraordinário patrimônio natural e social. Nossa anfitriã Adriana Mattoso coordenou o plano de manejo da APA Cairuçu em 2005.
Porto de Paraty Mirim
O pequeno porto de Paraty Mirim é a porta de entrada para quem chega por terra, a estrada está passando por obras mas mesmo assim, pode alagar quando chove muito e o rio Carapitanga sobe. Daí para diante só de barco ou a pé. Logo em frente fica a Ilha da Cotia, a ancoragem preferida dos velejadores.
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Dentro do Saco do Mamanguá as ondas do mar aberto não entram, no entanto o vento sudoeste pode canalizar. No vilarejo do Cruzeiro é possível comprar peixe e camarão diretamente dos pescadores locais, salvo na época do defeso, quando a pesca do camarão é proibida.
Subir remando o Rio Grande no manguezal na maré cheia e depois tomar banho de cachoeira é um programa delicioso. Mas bom mesmo é ficar imerso na beleza e tranquilidade que esta natureza oferece, e entrar em sintonia com a vida caiçara que oscila entre tradição e desejo de modernidade, mas ainda respeita as relações humanas e o ritmo natural do tempo.
Reserva Ecológica da Juatinga/Cairuçu e a Ponta da Cajaíba
Saindo do Mamanguá rumo ao mar aberto passamos pela Ponta da Cajaíba, ali a Ilha Deserta oferece uma ancoragem relativamente abrigada, na costeira sempre há gente pescando com vara. Aberta para o leste, a Enseada do Pouso tem várias praias, sendo a principal a Praia do Pouso, com longa história e vários barcos pesqueiros ainda ativos.
Praia Grande da Cajaíba
Na Praia Grande da Cajaíba, onde os caiçaras resistiram à pressão de vender suas terras, um cerco fornece peixe para consumo próprio e para dois restaurantes pé na areia, um da Dona Dica e outro da Dona Jandira, recomendo o passeio até a cachoeira antes do almoço. A Ilha Itaoca fornece um bom abrigo para pernoitar.
Baía da Ilha Grande
Seguindo para fora da baía da Ilha Grande vamos ladeando uma costeira com ocupação caiçara esparsa, entremeada de cultivo de mandioca, banana, milho e outros cultivos de subsistência.
Quando mais nos distanciamos mais a auto suficiência se faz necessária. Acima, a majestosa Pedra da Arara compõe o cenário dominado pela mata atlântica.
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Ponta da Juatinga
Na comunidade da Ponta da Juatinga mal chega o turismo, a não ser os poucos aventureiros que decidem encarar a trilha desde o Pouso. Lá é um lugar certeiro para encontrar lula, pescada na linha.
Sobre a comunidade paira o imponente farol, sinalizando um ponto importante para a navegação costeira.
No mar aberto
Ao contornar a Ponta da Juatinga estamos no mar aberto, sem muito abrigo ao longo de uma costeira de 7 milhas até a Ponta Negra.
Logo no início está a Praia da Sumaca, minúscula e rara na sua singularidade, vale a pena visitar se as condições meteorológicas permitirem.
Do lado esquerdo, atrás das pedras, é possível chegar com o bote e experimentar uma mariscada fresca preparada pelo Manequinho, outro caiçara determinado a deixar suas terras de herança para os filhos.
Praia Martim de Sá
Mais adiante, a bela praia Martim de Sá oferece melhor abrigo para ancoragem e para os mochileiros que fazem a trilha do Pouso até o Sono. A moçada que ali acampa deve respeitar as regras de convívio da reduzida comunidade.
Ponta Negra
Seguindo adiante, e após contornar a Ponta Negra, encontramos a pequena praia de mesmo nome. As embarcações que aqui chegam vem do porto de Laranjeiras, pudemos ver uma incipiente infraestrutura de turismo.
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Minha amiga Ciça Wey de Brito fez sua dissertação de mestrado nesta comunidade e me contou que existe uma extensa área de ocupação caiçara no interior, onde praticam sua agricultura e onde precisamos retornar para conhecer.
Praia dos Antigos
Passando a Ponta do Furado chegamos na Praia dos Antigos, onde dormimos duas noites. A trilha passa por ali mas não é permitido acampar, não existem casas e à noite nada interfere no silencio da mata.
De manhã cedo e no por do sol pescadores vem inspecionar o cerco com suas canoas e podemos comprar o peixe do dia fresquinho.
Praia do Sono
Finalmente chegamos na Praia do Sono, com seus chapéus de sol sombreando a orla. Campings, pequenas pousadas e restaurantes oferecem uma despojada estrutura para os visitantes que ali chegam de barco, a partir de Laranjeiras, ou a pé pela trilha que sai da vila Oratório localizada ao final da estrada que liga o condomínio de Laranjeiras à BR 101.
A distância entre a Praia do Sono e o manguezal do Mamanguá é curta e o terreno relativamente plano, no passado caiçaras do Sono se estabeleceram no Saco do Mamanguá. Até hoje são fortes os laços de parentesco que unem os caiçaras desta grande península.
Zarpando do Brasil
Em maio tivemos que zarpar do Brasil pois venceu o visto de turista do Georges, assim como a admissão temporária do Antarctic. Quando dei um grande bordo na minha vida quatro anos atrás pensei que iria para um sabático, mal sabia eu que o mar passaria a ser minha morada.
Histórias fantásticas que nos permite conhecer lugares maravilhosos desconhecidos de muita gente. Obrigado.