O Marzão veio à tona!!!!!!!!!!!!!!!! 31/1/13

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31/1/13

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Pontualmente, às O7hs da manhã ouvi silvo da alvorada. Eu já estava acordado.

Desde às O5h3O, quando o despertador de don Francisco tocou, não consegui mais dormir. Esperava apenas o apito para descer e tomar o café da manhã.

Pois é, não foi ontem, afinal, apesar das oito horas e meia de trabalho contínuo.

Começou às 13hs e só parou por volta das 21hs3O.

Sim, houve problemas.

A faixa da popa foi passada de forma errada e não agüentou o primeiro esforço. Teve que ser recolocada. E aqui, quando as coisas dão errado, o retrabalho é muito demorado. Todo o processo é suspenso, os mergulhadores saem da água, há conversas com don Francisco e o supervisor de mergulho, até que tudo comece outra vez leva tempo.

Depois, uma das boias da lateral do barco também teve que ser retirada da água, consertada no convés da balsa, para depois ser instalada outra vez. De novo, a parada foi grande.

Cada uma das boias leva meia hora para encher. Eram cinco. Duas horas e meia só pra saber se cinco são suficientes, ou se será preciso injetar ar comprimido nos tanques de água, ou no compartimento estanque da proa…

Mesmo quando tudo dá certo, é demorado. Quando não dá, então, já viu.

Estava gelado. Na balsa não existe proteção. Ou você fica exposto aos elementos, ou trancado na pequena cabine, sem calefação. Não sei o que é pior. Aos poucos o frio vai minando as forças. Os pés, por mais grossas que sejam as meias e botas, ficam duros de frio. As mãos também. O nariz escorre sem parar. O corpo começa a doer. A paciência diminui, por maior que seja a esperança e a torcida pra faina dar certo.

Chega um momento que você torce pra coisa acabar. Mesmo que o barco ainda esteja lá embaixo, inerte, grudado no assoalho do mar.

Com tristeza, desapontamento, e uma ponta de alívio, voltamos para o Felinto Perry.

“Fué un dia negro, Joao,” sem til mesmo. É assim que ele me chama: Jô-áo.

Não houve comemoração pro aniversário de don Francisco.

Logo depois do jantar o Comandante Luiz Felipe desceu e, com sua equipe, analisou o trabalho.

É preciso mais agilidade, ainda que don Francisco só tenha trazido quatro mergulhadores para o complexo trabalho em ambiente tão hostil.

Ficou decidido que alguns oficiais da Marinha vão mergulhar hoje. E que o trabalho deveria começar tão logo houvesse luz. Há mais uma frente chegando esta noite. Não há tempo a perder.

Por isto às 5h3O a primeira equipe acordou e foi à luta.

A nossa, de jornalistas, segue logo mais, pra registrar seja o que for. Torço furiosamente para que seja o Marzão levantando.

Meu relógio marca 8hs5O, agora, quando preparo este texto. Vou descansar um pouco. Ao chegar na balsa atualizo as novidades, e mando de lá mesmo.

11hs4O – locais.

A última boia acaba de ser enchida.

Caramba, o Marzão tá subindo!!!!!!!!

Ele vem vindo….a chaminé está saindo da água!!

Puta que o pariu! Conseguimos!!!!!!!

Caramba, é o dia mais feliz dos últimos nove meses. Desde abril do ano passado espero por este momento.

Estou mandando o texto da bacaça russa.

Mais tarde mando fotos e mais informações.

Até já.

SourceURL:file://localhost/Users/joao/Desktop/texto%2031:1%20.doc

15hO4

De volta ao Felinto Perry.

Acabamos de chegar-estou postando às 16hs1O locias. A faina de encalhar o Mar Sem Fim, depois que ele flutuou ajudado pelas bóias, aconteceu até às 14hs3O.

Em uma hora ele navegou, puxado e empurrado por outros barcos, do ponto que estava até encalhar  um pouco longe da praia.

Quando vi que não havia mais nada a fazer, corri até a Base Fildes para tentar passar alguma fotos. Justo naquele momento a rede chilena saiu do ar. Pode? Todos estes dias funcionou legal, permitindo que eu atualize o site. Hoje, na hora mais importante, deu pra trás.

Ainda tentei passar fotos pelo celular, mas não consegui.

O importante é que não houve dano ambiental severo. Não houve, praticamente, vazamento de óleo. Filmamos e fotografamos. Não só nós, mas os russos e chilenos, também.

Gozado: o Marzão encalhou na praia e a frente fria, que estava prevista, despencou. Até então havia calmaria total.

Primeiro, o vento começou a aumentar. Depois, uma forte nevasca despencou. Em seguida ventania e ondas.

Ondas. Este é o maior perigo que barco enfrenta neste momento. Muito pesado, cheio de água, com a quilha e casco encostados em pedras, o Mar Sem Fim, se for sacudido pela tempestade que começou, pode sofrer sérios danos estruturais. E até partir ao meio.

Não seria justo acontecer isto depois de tanto trabalho. O pior é que não há nada que a gente possa fazer. Temos que esperar a maré subir, dentro de mais cinco horas, para voltarmos à praia, esgotar a água dentro do barco ao mesmo tempo em que o puxamos mais para fora do mar, com um trator da base russa, até que ele fique safo dos humores do clima.

Tivemos que sair às pressas da praia, e voltar de bote ao navio, sob o risco de termos que passar a noite por lá.

Quase fiquei. Poderia dormir com os chilenos, ou os russos, e assim continuar ligado a alguma rede pra poder informar.

Mas dei bobeira e voltei. Tomamos um banho de mar gelado. O vento era contra nosso trajeto.

Resta torcer que a rede chilena tenha voltado. Se isto acontecer, mesmo demorando um tempão, eu consigo contato através do modem telefônico que comprei em Punta Arenas.

Estou com medo.

O Felinto Perry está jogando neste momento -15hs46- sinal que há ondas por aqui, a duas ou três milhas da praia onde está meu barco.

Que merda, quase no fim, mais um problemão no caminho.

Se passar por esta, amanhã mesmo, ou assim que a frente for embora, o Mar Sem Fim  começa a ser reparado para atravessar o Drake, rebocado.

Só quando ele chegar lá, o epílogo, que começou há pouco, terá terminado.

Não vejo a hora de fechar esta história.

Atualizado novamente às 18hs 29 – hora local.

17hsO8

Acabo de voltar de nova reunião convocada pelo Comandante Luiz Felipe. Participaram Plínio, don Francisco Ayarza, um dos oficiais de bordo, Capitão de Corveta Kristoscheck, que também foi um dos que mergulhou hoje, e uma representante do Ibama, Fernanda, que embarcou poucos dias atrás.

O Comandante tomou a palavra para explicar que a Marinha do Brasil está aqui apenas para colaborar, não sendo responsável por qualquer dano, ou problema ecológico que aconteceu, ou venha a acontecer.

Não é preciso reforçar que qualquer problema causado pelo acidente do Mar Sem Fim é de minha inteira responsabilidade.

Logo depois do acidente, em abril do ano passado, estive com o gerente do programa antártico brasileiro, Contra-Almirante Silva Rodrigues. Naquela ocasião falei de meu constrangimento pelo acidente, e reafirmei que não fugiria às minhas responsabilidades.

A reunião a bordo prosseguiu: a funcionaria do Ibama explicou “que houve vazamento de óleo, sendo que parte dele chegou à praia, do lado de Fildes, mas não do lado russo”.

Já expliquei em matérias anteriores que, na mesma praia que dá face para a baía onde aconteceu o naufrágio, há duas bases. De um lado os chilenos de Fildes, de outro os russos de Bellingshausen.

Fernanda completou dizendo que será preciso fazer algo para minimizar o impacto.

Para encerrar, os oficiais brasileiros pediram que eu conversasse com don Francisco, que não entende o português falado nas reuniões, para que, quando formos à praia de novo, hoje ou amanhã, o barco seja cercado com a barreira de contenção pelos funcionários dele.

De volta à cabine traduzi o ocorrido para meu companheiro de quarto. E assim, pelo bem da verdade, fica registrado em minha cobertura mais este evento.

Faço, entretanto a ressalva: do meu ponto de vista, sem querer com isto contestar outros, honestamente,  “o importante é que não houve dano ambiental severo. Não houve praticamente vazamento de óleo.”

Ao menos até este momento.

Agora são 17hs56 – hora local.

O vento, que já chegou aos 3O nós, baixou agora para 2O.

Outra boa notícia: 15 minutos atrás falamos, via rádio, com a Capitania dos Portos Bahia Fildes, do Chile, que tem contato visual com o Mar Sem Fim.

Até aquele momento não constava nenhum novo dano ao barco.

Mas tudo pode mudar. Tanto pode vir um vento fortíssimo como, de repente, calmaria.

Esta vai ser uma longa noite de vigília, ao menos para mim.

Tendo novas informações aviso.

 

Comentários

94 COMENTÁRIOS

  1. Que felicidade! Que bom, ufa! Vc falando do frio e eu lembrei que a Ana me contou do Plininho e vcs brigando por causa da mala do Lidio que era muito grande… safo seu melhor amigo. Depois leio o que vem depois. Bj e boa sorte no resto do resgate
    ]

  2. é isso aí, João. É isso aí, nunca tive dúvida que daria certo. Yes, yes, yes. você merece. Tem gente pra quem a vida anda fácil, outros têm que tirar a saca-rolhas. No fim, o esforço compensa. Parabéns a você, ao Plínio, ao D. Francisco e sua equipe, aos chilenos, aos russos, aos chineses e, especialmente, ao comandante e à tripulação do Felinto Perry.
    Abraço,
    Nico

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