Declaração de Paz pelo Oceano
Em um mundo cada vez mais consciente da urgência climática, é difícil não receber com entusiasmo qualquer encontro internacional dedicado à proteção dos oceanos. No entanto, por trás da recente Cúpula pelo Oceano e sua grandiloquente Declaração de Paz pelo Oceano, esconde-se uma realidade incômoda: estamos apostando na diplomacia simbólica quando a casa — o planeta — já está em chamas e o mar, à beira do colapso. Este artigo é de autoria de Jorge Serendero Hülssner, representante da For the Oceans Foundation, e foi publicado originalmente no site www.delfino.cr, em 26 de junho de 2025 — que autorizou sua reprodução.
Pré-cúpula para o oceano da Costa Rica
A declaração foi recebida com aplausos pelos representantes de governos, instituições científicas e atores do setor marítimo na pré-cúpula para o oceano da Costa Rica, realizada em junho de 2024. Todos concordaram com a importância de alcançar uma “paz azul”: deter a sobrepesca, restaurar os ecossistemas marinhos e proteger pelo menos 30% do oceano até 2030, além de acabar com a agressão humana ao oceano. Mas a pergunta inevitável seria:
Uma declaração de paz poderá ter algum impacto quando a guerra já está perdida em muitas frentes?
Isso só será possível revisando os antecedentes de cada uma das cúpulas realizadas pelos oceanos, incluindo a realizada em junho de 2025 em Nice, França.
Entre as boas intenções e a inércia institucional
Esta não é a primeira vez que se faz uma promessa global para os oceanos. Desde o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 14 (ODS 14) da ONU até o Tratado do Alto-Mar aprovado em 2023, os compromissos se multiplicam, enquanto a saúde dos mares se deteriora com a mesma velocidade com que os comunicados são redigidos.
Declaração de Paz para o Oceano soa bem no papel
A Declaração de Paz para o Oceano soa bem no papel. Mas, como já aconteceu tantas vezes, fica aquém dos interesses econômicos que continuam promovendo atividades extrativistas, subsídios pesqueiros prejudiciais e uma impunidade quase total para as frotas industriais que devastam ecossistemas inteiros.
‘Apelos desesperados de ONGs, comunidade científica e alguns Estados insulares’
É preciso lembrar que ONGs, a comunidade científica e alguns Estados insulares têm feito apelos desesperados. Mas, ao que parece, a dinâmica das cúpulas — reuniões polidas, frases motivadoras e promessas voluntárias — não consegue se traduzir em mecanismos vinculativos, fiscalizáveis e, acima de tudo, eficazes. A resposta é simples: as vontades políticas são levadas pelos grandes interesses da indústria e do narcotráfico.

Será que em 2030 teremos alcançado a década perdida para os oceanos? De repente, 2030 surge como um horizonte de esperança. Um prazo político e climático que marca a data para reverter tendências destrutivas. Mas, no ritmo atual, não só não cumpriremos as metas, como é possível que enfrentemos um ponto de não retorno em alguns sistemas oceânicos essenciais.
‘Recifes de coral estão morrendo’
Os recifes de coral estão morrendo mais rápido do que podemos salvá-los. A acidificação e o aquecimento dos oceanos estão alterando cadeias tróficas inteiras. E a biodiversidade marinha — esse mundo invisível e vasto — está sendo encurralada pela poluição, pela mineração em águas profundas e pela expansão das zonas mortas.
“Paz para o Oceano”, na verdade, não pode ser declarada; deve ser conquistada.
“A paz para o oceano não se declara — conquista-se.” E para isso é preciso coragem política, justiça ambiental e uma ruptura real com os modelos econômicos atuais. O contrário é fazer poesia diplomática enquanto o mar se afoga em silêncio.
O que é uma verdadeira paz com o oceano? Entre outras coisas, deveria significar parar imediatamente as práticas mais destrutivas, como a pesca de arrasto em águas profundas, acabar com a agressão humana ao oceano e à sua vida marinha. Acabar com os subsídios que incentivam a superexploração. Criar Áreas Marinhas Protegidas eficazes, controladas, salvaguardadas e respeitadas e, acima de tudo, ouvir as comunidades costeiras e os povos originários, que vivem em harmonia com o mar muito antes de os Estados terem assinado tratados.
Também deve significar enfrentar corajosamente as grandes empresas poluidoras, regulamentar rigorosamente o transporte marítimo e proibir a mineração submarina antes que ela comece. Essas são as condições mínimas para falar, com legitimidade, de paz para o oceano.
Junho de 2024, Costa Rica
Em junho de 2024, a Costa Rica sediou o fórum “Imersos na mudança”, onde mais de 28 países assinaram a Declaração de Paz para o Oceano promovida pela Costa Rica, que pretende um compromisso que, em teoria, busca restaurar a saúde dos oceanos e garantir seu uso sustentável. No entanto, ao analisar os compromissos concretos e as ações anteriores, surge uma pergunta inevitável: estamos diante de uma verdadeira transformação ou de uma nova camada de tinta sobre um sistema que continua se deteriorando?
O apoio à Declaração de Paz para o Oceano
A Declaração de Paz para o Oceano, embora apoiada por países como Chile, Alemanha, Espanha, França, Colômbia, Costa Rica e outros, não tem caráter vinculativo. Em vez de estabelecer obrigações claras, limita-se a expressar intenções e bons desejos, num contexto em que os oceanos enfrentam ameaças alarmantes, onde palavras vazias não são suficientes.
Em cada uma dessas cúpulas, firmamos compromissos que não se cumprem. Um dos principais, destacado na declaração, é a ratificação do Tratado de Proteção do Alto Mar, assinado em 2023 por mais de 70 países. Este acordo visa proteger áreas do oceano fora das jurisdições nacionais, que representam aproximadamente 64% dos mares do mundo. No entanto, até o momento, apenas 16 países ratificaram o tratado, e são necessárias no mínimo 60 ratificações para que ele entre em vigor.
Além disso, vale ressaltar que a implementação efetiva do tratado enfrenta desafios significativos. A criação de zonas marinhas protegidas em alto mar é uma ferramenta fundamental, mas atualmente apenas cerca de 1% dessas áreas estão sob medidas de conservação.
Mais preocupante — e frustrante — é ver bilhões sendo investidos sem gerar resultados concretos
Na conferência “Our Ocean 2023”, no Panamá, governos e entidades anunciaram mais de 300 compromissos, somando mais de 22 bilhões de dólares para a proteção do oceano. No entanto, a falta de transparência e acompanhamento eficaz levantam dúvidas sobre a utilização real desses fundos. Esses recursos realmente financiam projetos com impacto tangível na conservação marinha? Definitivamente NÃO, a desconexão entre o discurso e a ação é evidente, o discurso oficial enfatiza a urgência de proteger os oceanos, mas as ações concretas continuam a ser insuficientes. A pesca ilegal e não regulamentada continua a ser uma ameaça latente.
Da perspectiva da grande maioria das pessoas no planeta intimamente ligadas aos oceanos, exigimos menos cúpulas com mais ação e menos pompa.
Realizar cúpulas sem compromissos vinculativos é como lançar fogos de artifício para o céu esperando que a maré mude. Enquanto os líderes se congratulam por seu compromisso simbólico, os oceanos continuam aquecendo, perdendo oxigênio e vida. A esperança não pode se sustentar em palavras. Precisamos de ação, e precisamos dela agora.
Se a Declaração de Paz para o Oceano for apenas mais um documento bem-intencionado, sem consequências reais, então não estaremos assinando um tratado de paz, mas um epitáfio antecipado para o nosso oceano.

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