Lixo nos rios de Ubatuba; estância balneária até quando?
Ubatuba é um dos quinze municípios considerados estâncias balneárias pelo Estado de São Paulo por cumprirem determinados requisitos definidos por lei estadual, entre eles possuir atrativos de natureza histórica, artística ou religiosa, ou ainda recursos naturais e paisagísticos. Os municípios com esse status podem receber aportes financeiros específicos para incentivo ao turismo. E é disto que vive Ubatuba, do turismo, e de seus atrativos naturais como a serra do Mar, a Mata Atlântica, praias, rios e cachoeiras. Acontece que os rios de Ubatuba, e muitas de suas praias, andam pra lá de maltratados. Lixo nos rios de Ubatuba é o tema de hoje.
Lixo nos rios de Ubatuba: é muita imundície
Ubatuba, no litoral norte paulista, ocupa uma área de 708,105 km2, 83% dos quais localizados no Parque Estadual da Serra do Mar. A estimativa do IBGE para a população em 2021 era de 92 mil habitantes. O município é formado pela sede e o distrito de Picinguaba.
E os problemas envolvendo o turismo desordenado começam neste distrito. A ilha das Couves, localizada a poucos quilômetros de Picinguaba, quase foi destruída nestes últimos anos por hordas de turistas e, mais uma vez, contando com a omissão do município, e do Estado de São Paulo que demoraram para agir.
Um município que vive do turismo em razão de suas belezas naturais não pode se omitir como vem acontecendo em Ubatuba. Agora, problema muito maior ameaça alguns dos rios do município, entupidos de lixo (que vão parar nas praias) e sem ação do poder público.
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Mas os mais problemáticos do ponto de vista da poluição são, pela ordem, o rio Acaraú, o Tavares, o Grande e o Indaiá, todos na orla central de Ubatuba.
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O problema, entretanto, não se resume ao lixo. A especulação imobiliária, com ajuda dos prefeitos, detona a mata atlântica da região, como este site vem denunciando ao menos desde 2016.
Isto para não falar na famigerada vertticalização, mais uma ações de especuladores, parte do setor da construção civil, e o prefeito de plantão. Em 2021 tentaram mais uma vez alterar os gabaritos de construção, mas o povo disse não!
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Um relatório apresentado pelo Comitê de Bacias Hidrográficas do Litoral Norte (CBH-LN), classificou as condições do Rio Acaraú, em Ubatuba, como uma das mais graves da região.
Segundo o parecer, o Acaraú está na condição ‘ruim’ desde 2012, confirmando a omissão dos prefeitos anteriores, a saber, Maurício Moromizato (PT) de 2013 até 2016; seguido por Délcio Sato (PSD) de 2017 até 2020.
Ambos são severamente criticados em Ubatuba. Maurício Moromizato (PT) autorizou a construção de 140 prédios (de quatro andares), mesmo sem contarem com saneamento básico, e muitos deles à beira-mar, na praia da Enseada.
O ex-prefeito Sato (PSD) também alterou a lei Nº 711 que disciplina o uso e ocupação do solo, mais uma vez favorecendo interesses de construtoras e não a saúde da população, ou o meio ambiente de Ubatuba.
Sato foi também presidente do Comitê de Bacias Hidrográficas do Litoral Norte (CBH-LN) quando era prefeito, o que demonstra que fez muito pouco para mudar a situação vexaminosa dos rios de Ubatuba.
Atualmente, desde janeiro de 2021, a prefeitura é ocupada por Flávia Pascoal (PL). Apesar do pouco tempo no cargo, Flávia já começou errando ao propor a ‘revisão do plano diretor’ em novembro de 2021. Mais uma vez, o fantasma da verticalização deu as caras.
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Não fosse a mobilização da população, talvez os prédios tivessem sido aprovados no município. É assim que acontece. Mesmo sabendo que o município mal tem infraestrutura para suportar a população atual, e os turistas, cada novo prefeito tenta adensar ainda mais o município até torná-lo insustentável de vez.
A poluição dos rios de Ubatuba gerada pela população
O Mar Sem Fim entrou em contato com Augusto de Oliveira Neto, fundador da ONG APPRU-Amigos na Preservação, Proteção e Respeito a Ubatuba.
Augusto é morador de Ubatuba, tem 46 anos de idade, e diz que ‘nunca houve um prefeito que fizesse uma campanha para alertar moradores, estudantes, e população em geral, para o grave risco que correm ao usarem os rios como local de descarte de lixo.
O resultado é que o Acaraú sofre com rejeitos sólidos, e efluentes, e não recebe mais que um tratamento secundário, que apenas trata o esgoto.
Os efluentes vindos de produtos como sabão em pó, detergentes, óleos e graxas, entre outros, não recebem tratamento nenhum, o que provoca a eutrofização de suas águas, processo que deixa o rio com níveis baixíssimos de oxigênio para que haja vida.
18 toneladas de lixo em um ano
De acordo com informações da ambientalista Lidi Keche (Tamoio de Ubatuba), em 2020 foram retirados cerca de 18 toneladas de lixo só do rio Tavares.
Como as sucessivas prefeituras não agiram, os ambientalistas construíram três barreiras ao longo do curso do rio que nasce na Serra do Mar, passa pelos bairros Parque Guarani e Estufa 1 e deságua no canto esquerdo da praia do Itaguá.
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Para se ter uma ideia de outro triste recorde de Ubatuba, em 2017 a praia do Itaguá, um das praias centrais da cidade, foi considerada a mais poluída do litoral norte. Eis aí o ‘prêmio’ alcançado por prefeitos despreparados que só pensam em aumentar a arrecadação custe o que custar. Mesmo que seja a saúde da população.
As barreiras ‘seguram’ a sujeira, ou parte dela, até que mutirões providenciem a sua remoção. Já são mais de 100 pessoas que trabalham como voluntários, a cada 15 dias, na remoção do lixo do Tavares que, depois de recolhido, é exportado para fora do município.
O papel da prefeitura
Historicamente, a prefeitura pouco ajuda estes mutirões que nasceram de forma natural pela indignação dos próprios moradores.
Os bairros próximos aos rios não têm caçambas de lixo, nem mesmo lixeiras. E, isso, repetimos, acontece numa estância balneária a menos de 250 km da maior e mais rica cidade da América do Sul!
Todos os rejeitos são descartados direto no rio, de roupas velhas a garrafas de plástico, passando por fogões, geladeiras, animais mortos, etc.
Ubatuba até hoje não tem coleta seletiva.
Augusto de Oliveira, da APPRU, diz que a secretaria de Meio Ambiente não tem dinheiro para investir. Todo o orçamento, de acordo com ele, é usado na contratação de diversas empresas que transbordam o lixo de Ubatuba para outros municípios serra acima, já que no litoral não é mais possível a abertura de lixões.
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Balneabilidade das praias
O problema no lixo não impacta apenas os corpos d’água, mas as praias igualmente. Em 2019, por exemplo, das 26 praias monitoradas, 18 tiveram piora da qualidade da água segundo o site informarubatuba. O site diz que ‘a qualidade da água (balneabilidade) é classificada pela Cetesb de acordo com a medida da densidade de bactérias fecais, analisada em cinco semanas consecutivas’.
Em 2019,’entre os locais analisados pela Cetesb em Ubatuba, Picinguaba, Itaguá e Perequê-Mirim, além do rio Itamambuca, não são recomendados para banho. Nas regiões do Lázaro, Santa Rita, Tenório, Vermelha do Centro, Praia Grande, Toninhas e Enseada, a qualidade da água também decaiu’.
‘De acordo com a Sabesp, responsável pelo tratamento da água e esgoto na cidade (exceto na Praia Grande, em ocupações irregulares e comunidades isoladas), os problemas de balneabilidade não estão relacionados, exclusivamente, ao esgotamento sanitário. O lixo jogado nas ruas, nos córregos e canais de drenagem, além de dejetos de animais, também são carregados para o mar’.
Rio Itamambuca
‘No rio Itamambuca, a qualidade da água caiu de “regular” para “péssima” em apenas um ano. A Sabesp informou que o sistema de tratamento é feito pelo condomínio. Além disso, de acordo com a companhia, as ocupações irregulares contribuem para a poluição do rio’.
É curioso como o poder público usa a figura das ‘ocupações irregulares’ para justificar a poluição, mas elas só ocorrem por omissão do poder público. Resta saber quando estas ocupações foram de fato combatidas pelos sucessivos ex-prefeitos.
A má gestão do lixo
O site informaubatuba ouviu o professor de Ciências Biológicas Lucas Ramiro para quem ‘a má gestão dos resíduos na cidade, incluindo a falta de saneamento básico, tem consequências graves não só para os rios e mares, mas para o meio ambiente, biodiversidade e saúde pública’.
Prefeitura faz acordo com Inpe para conter ocupações irregulares
Segundo o jornal Tamoios News, a prefeita Flávia Pascoal (PL) estabeleceu em 2021 um acordo com o Inpe para ter acesso a fotos de satélites monitorando as áreas mais visadas. A cada cinco dias a prefeita terá novas fotos e poderá agir. A ver se de fato o fará.
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Na maiorias dos casos os prefeitos acabam por aceitar as ocupações irregulares, uma vez que são habitadas por futuros eleitores. No entanto, Flávia Pascoal diz na matéria que “Nós fomos o governo que mais promoveu demolições (de casas irregulares), foram mais de 70, mais do que as duas últimas gestões, nesse período de 8 meses. Ontem [28/09/2021, terça-feira] foram duas demolições no bairro do Taquaral.”
Augusto de Oliveira, da APPRU, confirma as demolições e diz que nunca antes o processo de grilagem de terras esteve tão amplo em Ubatuba. A baderna obrigou o Ministério Público a entrar na luta para pôr ordem na casa.
O litoral norte está em baixa, Ubatuba não é exceção
Antes a situação de Ubatuba fosse exceção. Não é. É a regra no litoral norte, o que mostra o fracasso paulista no trato do mais importante ecossistema do planeta.
Uma das provas é a colocação alcançada pelos municípios costeiros da região no Programa Município VerdeAzul – PMVA, lançado em 2007 pelo Governo do Estado de São Paulo cujo site diz que ‘tem o inovador propósito de medir e apoiar a eficiência da gestão ambiental com a descentralização e valorização da agenda ambiental nos municípios’.
Em 2019, Ilhabela, a melhor classificada ficou na 95ª colocação, nota 79,56; São Sebastião ficou na 127ª colocação, nota 68,68; Ubatuba arrematou a 305ª colocação, nota 21,98; e, Caraguatatuba, fechou o bloco na 390ª colocação, nota 10,35.
A gestão dos últimos 20 anos das cidades do litoral norte do Estado demonstraram omissão criminosa na resolução de problemas que são comuns.
Ao contrário. Em geral os prefeitos estão envolvidos com corrupção através principalmente de duas vias em todos os municípios costeiros: a especulação imobiliária e as empresas de construção civil; e a pressão ambiental, e as empresas que prestam serviços para exportarem o lixo dos municípios do litoral norte.
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Até as areias das praias sabem das maracutaias. Falta, entretanto, vontade política e pressão do eleitor para acabar com as baixarias. Enquanto persistir este tipo de gestão, amadora, despreparada para gerir uma cidade e suas complexidades, estaremos enxugando gelo, o que temos feito nas últimas décadas.
Assista ao vídeo do Tamoio Ubatuba que mostra o maltratado rio Tavares
Assista a este vídeo no YouTube
Imagem de abertura: Tamoio Ubatuba
Fontes: http://informarubatuba.com.br/das-26-praias-monitoradas-em-ubatuba-18-tiveram-piora-da-qualidade-da-agua/; https://tamoiosnews.com.br/noticias/prefeita-e-secretaria-de-habitacao-de-ubatuba-falam-sobre-acoes-contra-ocupacoes-irregulares/; https://www.tamoiosnews.com.br/carnaval/ubatuba-carnaval/moradores-lamentam-poluicao-na-praia-do-itagua/.
Sou a Raissa De Araujo , gostei muito do seu artigo tem
muito conteúdo de valor, parabéns nota 10.
Infelizmente o brasileiro ainda é muito pobre no quisito educação. A 20/30 anos atrás o nosso trânsito era uma catástrofe, e com novas legislações melhorou “muuuito”!
Acredito q investimentos, insentivos, publicidade, ações de órgão competente, e tbm cada ser fazer sua parte e até mesmo fazermos vigília aos outros e aos próximos, assim com certeza voltaremos a ter um ambiente saudável.
Sou do condomínio Salga Lagoinha Ubatuba, aq somos totalmente defensores desse paraíso!!
Isso porque ainda não está pronta a duplicação da rodovia dos Tamoios! Falta o trecho de serra. Que tristeza o que o ser humano faz por ganância esses prefeitos com certeza são agraciados com dinheiro para ceder a especulação imobiliária e também fazem vistas grossas as invasões de áreas da mata atlântica.