Lei do SNUC faz 14 anos com pouco a comemorar
Lei do SNUC: estudos demonstram a intrínseca relação entre a disponibilização de serviços ambientais – tais como qualidade da água, fertilidade do solo, polinização e manutenção de microclima – e o potencial econômico de uma sociedade. Por isso, as Unidades de Conservação (UCs) desempenham um papel essencial. São as maiores responsáveis pela preservação e manutenção do nosso patrimônio natural. O Brasil, no entanto, tem investido pouco em suas UCs.
Parque Nacional da Serra da Canastra. Foto: Angela Kuczach
Lei do Snuc: 18 de julho de 2000
Em 18 de julho de 2000 o país assinou a Lei 9.9985, a lei do SNUC (Sistema Brasileiro de Unidades de Conservação), que regulamenta suas áreas protegidas. No total são cerca de 17% do território nacional. Embora esse número pareça grande, um olhar mais profundo mostra que na prática a situação é diferente.
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Temos hoje 313 UCs federais. Elas protegem pouco mais de 75 milhões de hectares. Porém, mais de 50% desse total são Unidades de Conservação de Uso Sustentável. Ou seja, pertencem a categorias menos restritivas que permitem o uso de seus recursos. Em um sistema de conservação, áreas protegidas de uso menos restritivo são essenciais, em especial quando funcionam como zonas de proteção em torno de Unidades de Conservação que não permitem qualquer tipo de uso além de visitação, educação ambiental e pesquisa.
Lei do Snuc: dificuldades no caminho
Para que em longo prazo cumpram seu papel os dois grupos precisam ser bem manejados e adequadamente implementados. Atualmente há uma enorme dificuldade. O orçamento do Ministério do Meio Ambiente é o segundo menor da União. Em 2013 o orçamento destinado ao ICMBio foi de R$211 milhões: 0,012% do PIB Nacional, ou cerca de R$3,00 por cada hectare de área protegida. Uma fração do necessário.
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Parque Nacional das Sempre Vivas. Foto: Alex Bager
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O Brasil é signatário da Convenção da Biodiversidade (CDB), que estipula que pelo menos 10% de cada bioma deve ser protegido por Unidades de Conservação. Também assinou as Metas de Aishi, que diz que o percentual a ser protegido por bioma é de 17%. Vale aqui um esclarecimento. Enquanto pela Convenção de Biodiversidade a porcentagem a ser protegida refere-se exclusivamente a Unidades de Conservação, para o segundo caso, das Metas de Aishi, a porcentagem maior abrange também outras formas de proteção, como Terras Indígenas, Áreas de Proteção Permanente, e até mesmo Reservas Legais.
A Caatinga e o bioma marinho
Se analisarmos a Caatinga, a constatação é de que há menos de 8% em áreas protegidas, das quais somente 2% se enquadram em categorias mais restritivas. Para o Bioma Marinho, esse valor não chega a 1,5%. Isso significa que o Brasil pode atingir as Metas de Aichi, sem de fato ter Unidades de Conservação que protejam os 10% exigidos pela Convenção da Biodiversidade em cada bioma.
Parque Nacional do Itatiaia, criado em 1937
O governo Dilma foi o que menos criou áreas protegidas na história do País. A primeira Unidade de Conservação do Brasil foi o Parque Nacional do Itatiaia, criado em 1937. Dezenas de outras foram criadas nas décadas seguintes, em especial nos governos militares.
Lula e FHC
Com a promulgação da Lei do SNUC, em 18 de julho de 2000, os governos seguintes, FHC e LULA, aceleraram e criaram mais de dois terços do que temos hoje em Unidades de Conservação federais: em torno de 25 milhões de hectares em cada uma das gestões. Esse bom desempenho, no entanto, sofreu uma abrupta estagnação no governo Dilma, que criou apenas 3 Unidades de Conservação, cobrindo ao todo apenas 44 mil hectares.
Parque Nacional do Superagui. Foto: Angela Kuczach
Enfraquecimento político do tema
O enfraquecimento político do tema refletiu-se também no Legislativo. Atualmente há no Congresso Nacional uma divisão entre os setores ambientalista e ruralista, exacerbada a partir do novo Código Florestal. Embora a área ambiental busque um caminho do meio, em que a conservação seja incorporada ao desenvolvimento do país, os 162 deputados da bancada ruralista favorecem o uso de territórios no país por setores como o de mineração e agropecuária.
Projetos contra as UCs
Prova disso é a tramitação de centenas de Projetos de Lei na Câmara que impactam as Unidades de Conservação, sejam em áreas específicas ou, de forma generalizada, atacando a própria Lei do SNUC.
Mineração dentro de UCs
Um dos projetos com consequências mais graves é o PL 3682/2012, que propõem a utilização de 10% das UCs de proteção integral pela mineração. Esse Projeto de Lei também subverte os objetivos do SNUC, ao propor que Unidades de Conservação sejam criadas apenas a partir de Projetos de Lei e não por Decretos, como hoje acontece, enquanto a desafetação ou recategorização seria feita por Decreto. Caso seja aprovado, o PL 3682/2012 é uma fragilização sem precedentes na legislação que resguarda as áreas protegidas.
Regularização fundiária
Outro ponto de destaque é a regularização fundiária, questão essencial no fortalecimento e implementação das Unidades de Conservação nacionais. Ela recebe pouca atenção e um orçamento menor ainda. Estima-se que dos 75 milhões de hectares das Unidades de Conservação federais certa de 7%, ou 5,44 milhões de hectares, estejam ocupados.
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Verba necessária para regularizar
A verba necessária para regularizar esta área é de R$7,13 bilhões, 100 vezes mais do que os R$70 milhões que o governo investiu nos últimos anos. Se a quantia necessária parece grande, uma estimativa recente do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) diz que o Brasil perde todos os anos R$200 bilhões para a corrupção. Ou seja, menos de 4% do desvio anual dos cofres públicos seria o suficiente para resolver o problema que gera os maiores conflitos e descontentamento sobre as Unidades de Conservação.
É necessário que o governo invista mais
Se quisermos ter nossas áreas naturais realmente protegidas, é necessário que o governo invista mais e reduza a burocracia dos processos de regularização. Enquanto isso, a sociedade brasileira precisa entender que sem conservação adequada dos ambientes naturais cenas como falta de água em grandes centros, desertificação de áreas agrícolas, escassez de chuva e empobrecimento do solo se tornarão cada vez mais corriqueiras.
De qualquer forma, feliz 14º aniversário, SNUC. Tomara que os próximos sejam melhores.
Angela Kuczach é bióloga e diretora-executiva da Rede Nacional Pró-UCs
Fonte: O Eco.org.br