Ilha Diego Garcia, última colônia britânica na África será devolvida
Diego Garcia, localizada a cerca de 1.600 km da massa terrestre mais próxima, sempre figura nas listas das ilhas mais remotas do mundo. Nos anos 70, as autoridades britânicas expulsaram os cerca de mil habitantes com a fleuma autoritária digna dos maiores impérios da Terra. Assim, Diego Garcia torna-se uma base conjunta do Reino Unido e dos militares dos EUA. Não existem voos comerciais, e chegar por mar também apresenta dificuldades; as licenças para barcos só se concedem para as ilhas exteriores do arquipélago de Chagos e para assegurar uma passagem segura pelo Oceano Índico. Embora integre o território britânico ultramarino, as Ilhas Maurício contestam sua posse.
Britânicos prometem devolver a ilha e manter a base militar
Desde a expulsão dos moradores a Inglaterra sofre pressões e enfrenta demandas jurídicas pelos desalojados. Segundo o New Straits Times, o governo britânico tem estado sob pressão há décadas para entregar as Ilhas Chagos à Maurícios, uma antiga colônia, mas tem resistido devido à base militar na ilha de Diego Garcia, que desempenha um papel fundamental nas operações dos EUA no Oceano Índico e no Golfo’.
‘O acordo surge após quase dois anos de negociações e marca uma reviravolta significativa após décadas de rejeições britânicas das reivindicações de soberania de Maurícios. Em 2019, o Tribunal Internacional de Justiça aconselhou o Reino Unido a entregar as ilhas. Durante as audiências, o Reino Unido pediu desculpas pela expulsão “vergonhosa” dos ilhéus, mas ignorou a decisão do TIJ.
Agora a situação mudou. No início das negociações em 2023, as duas partes concordaram que a base militar de Diego Garcia continuaria a funcionar independentemente do resultado. Em 2016, o Reino Unido prorrogou o contrato de arrendamento da base militar pelos EUA até 2036.
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Assim, mais de 50 anos depois a ‘última colônia britânica na África’ como Diego Garcia foi chamada, será finalmente entregue a seus legítimos donos.
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A BBC conseguiu entrar em Diego Garcia
É um feito para os civis conseguirem entrar na ilha supersecreta. Mas uma equipe da BBC entrou e relatou o que viu. Alice Cuddy, da BBC, ‘Queríamos cobrir um processo judicial histórico sobre o tratamento dos tâmeis do Sri Lanka, as primeiras pessoas a apresentarem pedidos de asilo na ilha, que estão presas há três anos. Houve algumas batalhas legais complexas sobre seu destino, e um julgamento em breve determinará se as detenções ocorreram ilegalmente.
Alice fala das dificuldades de acesso, ‘para entrar na ilha, você precisa de uma licença, apenas concedida a pessoas com conexões com a instalação militar ou a autoridade britânica que administra o território. Historicamente, os jornalistas foram barrados’.
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‘Advogados do governo do Reino Unido apresentaram um desafio legal para tentar impedir a BBC de participar da audiência. Mais tarde, os Estados Unidos também se opuseram alegando que não forneceriam comida, transporte ou acomodação para todos aqueles que tentam chegar à ilha para o caso – incluindo o juiz e os advogados’.
“Como discutido anteriormente, os Estados Unidos concordam com a posição do Governo de Sua Majestade que seria preferível que os membros da imprensa observassem a audiência virtualmente de Londres, para minimizar os riscos de segurança da instalação”, disse uma nota enviada do governo dos EUA a autoridades britânicas.
Mas, afinal, o que será que os militares escondem com tanto zelo? Por que proibirem até mesmo outro braço do governo, a icônica rede BBC, de entrar no território?
Vejamos o que diz Cuddy: ‘Quando a permissão foi finalmente concedida para eu passar cinco dias na ilha, ela veio com restrições rigorosas. E não cobriram apenas a reportagem do tribunal. Elas também estenderam-se aos meus movimentos na ilha e até mesmo uma proibição de relatar quais eram as reais restrições’.
‘Um dos locais mais restritos do mundo’
Alice Cuddy diz que apesar das dificuldades, ‘eu ainda era capaz de observar detalhes esclarecedores, o que ajudou a pintar um quadro de um dos locais mais restritos do mundo’.
‘Diego Garcia é uma das cerca de 60 ilhas que compõem o arquipélago de Chagos ou o território britânico do Oceano Índico (Biot) – a última colônia estabelecida pelo Reino Unido, separando-a das Ilhas Maurício em 1965. Ela está localizado a meio caminho entre a África Oriental e a Indonésia’.
Os acordos assinados em 1966 alugaram a ilha para os EUA por 50 anos inicialmente, com uma possível extensão por mais 20 anos. Acabaram por ampliar o acordo que vai até 2036.
‘A ilha tem uma beleza natural surpreendente, desde a vegetação exuberante até suas praias brancas intocadas, e também abriga o maior artrópode terrestre do mundo – o caranguejo de coco. Militares alertam para os perigos dos tubarões nas águas circundantes’.
Detalhes da imensa base militar
As agruras pelas quais a jornalista da BBC passou decorrem da ilha ser uma imensa base militar. Matthew Savill, diretor de ciências militares do principal think tank de defesa do Reino Unido, Rusi, diz que Diego Garcia é uma base “enormemente importante”, “por causa de sua posição no Oceano Indico e das instalações que tem: porto, armazenamento e aeródromo”.
Ela já foi usada durante a guerra entre os Estados Unidos e o Afeganistão, como revela a repórter. ‘Os petroleiros que operavam a partir de Diego Garcia reabasteceram bombardeiros B-2 dos EUA, que haviam voado dos EUA para realizar os primeiros ataques aéreos no Afeganistão após os ataques de 11 de setembro. E, durante a subsequente “guerra ao terror”, aeronaves também foram enviadas diretamente da própria ilha para o Afeganistão e o Iraque’.
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A base também é um dos “números extremamente limitados de lugares em todo o mundo disponíveis para recarregar submarinos” com armas como mísseis Tomahawk, diz Savill, e os EUA têm uma grande quantidade de equipamentos e lojas lá para contingências.
Alice Cuddy revela que a monitoraram de perto em todos os momentos. “Minha acomodação recebe vigilância 24 horas por dia, e os homens do lado de fora anotam quando eu saio e volto – sempre sob escolta.”
Uma Guantánamo no Índico?
Esse excesso de zelo levanta suspeitas. E a jornalista confirma: “Há muito tempo circulam rumores sobre os usos de Diego Garcia, incluindo que ela tem sido um local negro da CIA – uma instalação usada para abrigar e interrogar suspeitos de terrorismo.”
‘O governo do Reino Unido confirmou em 2008 que os voos de rendição que transportavam suspeitos de terrorismo haviam desembarcado na ilha em 2002, após anos de garantias de que não tinham’.
Depois disso, várias partes do governo desmentiram as informações, até que anos mais tarde, Lawrence Wilkerson, chefe de gabinete do ex-secretário de Estado dos EUA Colin Powell, contou ao Vice News que fontes de inteligência lhe disseram que Diego Garcia servia como local “onde as pessoas estavam temporariamente alojadas e interrogadas de tempos em tempos.”
A BBC encerra com a promessa de que, ‘o processo judicial sobre o tratamento dos temeis, julgamento que ocorrerá em breve, iremos reportá-lo’.
Na verdade, o valor de Diego Garcia está na sua localização. Para o Foreign Policy o oceano Índico é um teatro crítico para o comércio global e competição geopolítica. É o lar de 33 países, representando 2,9 bilhões de pessoas, mais de um terço do tráfego de carga a granel do mundo e dois terços dos embarques de petróleo do mundo. Sem surpresa, tornou-se um foco crescente da estratégia do oceano Indico de Washington, no centro da qual está a disputada ilha de Diego Garcia.
Há referencias de que os B52 partiram da ilha para bombardear o Iraque na Operação Tempestade no Deserto. Será?