Baterias de carros elétricos e o dilema da mineração submarina
Em julho acontece na Jamaica uma reunião que pode definir o futuro da mineração submarina. A Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos é uma organização internacional criada sob a Convenção da ONU sobre o Direito do Mar com sede na Jamaica. O debate sobre a possibilidade de permitir que empresas extraiam metais preciosos do fundo do mar, usados em baterias de carros elétricos e outras tecnologias verdes, ocorre quando mais de uma dúzia de países pedem uma proibição ou moratória devido a preocupações ambientais. De um lado estão cientistas e ambientalistas preocupados com a vida marinha, do outro, os defensores do avanço da transição energética que precisa mais carros elétricos.
Zona Clarion-Clipperton, Pacífico
O principal foco da discussão é a mineração na zona Clarion-Clipperton. Ela se localiza no meio do Pacífico, entre o México e o Havaí. Para começar, a área de Clarion Clipperton é sua. Ela pertence à humanidade, já que fica no alto-mar. Ao mesmo tempo, esta parte dos oceanos acaba de receber proteção oficial da ONU depois de quase duas décadas de discussões.
Para piorar, à primeira vista, estudos recentes mostram que cientistas catalogaram mais de 5.500 espécies de águas profundas no CCZ. Destas, cerca de 90% eram desconhecidas da ciência.
Nesta área, a 4 mil metros abaixo da superfície, há mais de 27 bilhões de toneladas de nódulos polimetálicos. Em conjunto eles conteriam sete bilhões de toneladas de manganês, 340 milhões de toneladas de níquel, 290 milhões de toneladas de cobre, além de 78 milhões de toneladas de cobalto.
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Declínio do berçário da baleia-franca e alerta aos atuais locais de avistagemPirataria moderna, conheça alguns fatos e estatísticasMunicípio de São Sebastião e o crescimento desordenadoFrota de pesca de atum derruba economia de MoçambiqueSegundo Elizabeth Kolbert, geóloga e paleontóloga, pesquisadora do Williams College, Massachusetts, e autora do livro The Sixth Extinction: An Unnatural History, “Mal exploramos o reino mais escuro do oceano. Com a mineração de metais raros em ascensão, já o estamos destruindo”.
Ela explica o que são os procurados nódulos polimetálicos: ‘Espalhadas pela área estão grandes riquezas. Na maioria das vezes, elas tomam a forma de caroços que parecem batatas enegrecidas. Os caroços, ou nódulos polimetálicos, consistem em camadas de minério que se acumularam em torno de fragmentos marinhos, como dentes de tubarão antigos’.
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E prossegue Kolbert: ‘O processo pelo qual os metais se acumulam não é totalmente compreendido. No entanto, é considerado extremamente lento. Uma única pepita do tamanho de uma batata pode levar cerca de três milhões de anos para se formar’.
O que alegam os defensores da mineração submarina?
Elizabeth Kolbert não se furta de explicar: ‘Os defensores da mineração em alto mar argumentam que quanto mais cedo começar, melhor. A fabricação de turbinas eólicas, veículos elétricos, painéis solares e baterias para armazenamento de energia requer recursos, muitas vezes escassos. (Telúrio é um componente-chave em painéis solares de película fina.)’.
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Acidificação do oceano está à beira da transgressãoConheça o novo navio de carga híbridoBrasil pega fogo, espanta o mundo, e Lula confessa: ‘não estamos preparados’Kolbert ainda cita Gerard Barron, presidente da Metals Company, uma das empresas interessadas: “A realidade é que a transição de energia limpa não é possível sem extrair bilhões de toneladas de metal do planeta.”
Contudo, Elizabeth Kolbert alerta que ‘A mineração do fundo do mar apresenta riscos ambientais por si só. Quanto mais os cientistas aprendem sobre as profundezas, mais extraordinárias são as descobertas’.
Na mesma linha seguem dois especialistas. São eles Steven H.D. Haddock, cientista sênior do Monterey Bay Aquarium Research Institute; e C. Anela Choy, professor assistente da Scripps Institution of Oceanography.
Artigo do New York Times alerta sobre os perigos da mineração
Em agosto de 2020 o New York Times publicou artigo assinado por ambos. “A exploração nas últimas décadas revelou corais com milhares de anos, mas não apenas. Micróbios que podem tratar câncer e doenças infecciosas e campos de fontes hidrotermais de proporções monumentais, a partir dos quais criaturas vivas convertem enxofre e metano em energia, oferecendo um vislumbre das origens da vida na Terra.”
Os autores alertam: “Mas, como nós e nossos colegas observamos recentemente na revista Proceedings of the National Academy of Science, os impactos da mineração submarina serão pronunciados e debilitantes. E não apenas no fundo do mar. Mas também em toda a coluna de água profunda que se estende por cerca de 600 pés abaixo da superfície até o fundo, onde ocorre a extração.”
O Mar Sem Fim entrevistou o oceanógrafo da USP, Alexander Turra. Já faz tempo que mostramos que o Brasil está prestes a conseguir autorização da ISA – Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos – para iniciar operações na Elevação do Rio Grande.
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Um teste problemático em 1989
A livescience lembra que ‘em 1989, uma equipe de cientistas tentou imitar os efeitos da mineração do fundo do mar, arando uma área do fundo do mar no Peru. Ela media aproximadamente 10,1 quilômetros quadrados a cerca de 4,2 quilômetros de profundidade. Muitas das espécies nesta área ainda não haviam retornado mais de 25 anos depois. Entretanto, os rastros do arado ainda eram visíveis, de acordo com um estudo de 2019 publicado na Scientific Reports.
Poluição sonora na procura dos nódulos polimetálicos
A matéria levanta outro dos problemas, a poluição sonora: ‘máquinas podem causar poluição sonora que se estende por centenas de quilômetros através do oceano. Esse ruído pode atrapalhar a capacidade dos animais de navegar, localizar presas ou encontrar um companheiro.’
Plumas de sedimentos e a pesca
Enquanto isso, há outros problemas, muito mais graves. ‘ Talvez um dos subprodutos mais destrutivos da mineração do fundo do mar sejam as plumas de sedimentos que os veículos submarinos deixam em seu rastro. Elas podem agir como tempestades de poeiras submarinas que sufocaram a vida marinha.’
Desse modo, ‘Essas plumas de sedimentos podem prejudicar os habitats do atum que estão mudando à medida que as temperaturas do oceano esquentam e se sobrepõem cada vez mais a áreas da CCZ, de acordo com um estudo de coautoria de McCaule, publicado em 11 de julho na revista Ocean Sustainalility.
O fato de os atuns estarem se deslocando para a área de Clarion-Clipperton pode ser uma boa ajuda aos defensores da moratória. Trata-se do principal lobby de pesca mundial, uma indústria que fatura US$ 40 bilhões por ano.
Antes de mais nada, ela já começou a influenciar a reunião. Segundo o www.insideclimatenews.org, ‘A principal indústria de frutos do mar e grupos de conservação marinha pedem uma “pausa preventiva” na corrida global para extrair minerais do fundo do mar.’
‘Os grupos disseram que enviarão apelo à Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA), pedindo que prossiga com cautela extra no desenvolvimento de regulamentos. E que os conclua antes de conceder quaisquer licenças para minerar fundos marinhos a milhares de pés sob a superfície do oceano.
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Movimento pela moratória ganha adesão
Mesmo sendo importantes para baterias de carros elétricos, e outros equipamentos de alta tecnologia, gigantes como as montadoras BMW e Volvo, e ainda a Samsung, e o Google anunciaram em março de 2021 que apoiam uma moratória para a mineração submarina.
“É fundamental que a comunidade internacional reconheça sua responsabilidade coletiva de salvaguardar a saúde e a integridade de nosso oceano global compartilhado para as gerações futuras”, afirmou o governo.
A mesma fonte diz que há grande divisão na discussão: ‘O conselho de 36 membros da Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos deve debater a questão na sexta-feira. Mas não está claro quando ou se ele realmente votará a permissão da mineração em águas internacionais profundas, dadas as fortes divisões sobre o assunto.’
A novidade neste imbroglio internacional é que a nova manda-chuva da ISA é a brasileira Leticia Carvalho, eleita para o período 2025-2028.