Vale ainda vai pagar pelo dano ambiental na costa do Maranhão
A Vale protagonizou dois desastres tão mortais e dantescos em Minas Gerais que o terceiro, em junho de 2020, quase passou despercebido. Foi o afundamento do navio MV Stellar Banner na costa do Maranhão. Como em quase tudo que envolve a mineradora nos últimos anos, o caso veio cercado de mistério, sigilo e pouca divulgação na grande mídia.

A embarcação MV Stellar Banner, operada pela empresa sul-coreana Polaris e registrada nas Ilhas Marshall era um destes navios que utilizam até hoje esta prática inominável conhecida como bandeiras de conveniência, e só isso já seria motivo para não contratá-la.

Ação civil pública por dano ambiental em razão da poluição
Antes de mais nada, vale lembrar que a Vale, por negligência de seus diretores, provocou a morte de centenas de pessoas nos desastres de Mariana e Brumadinho, ambos em Minas Gerais. Foram tragédias dantescas que marcaram o país. Talvez por isso o terceiro acidente em sequência, o afundamento do navio MV Stellar Banner na costa do Maranhão, em junho de 2020, tenha passado quase sem ser notado.
O cargueiro, fretado pela Vale, saiu do terminal de Ponta da Madeira, em Itaqui, rumo à China com 294,8 mil toneladas de minério de ferro. Mas o gigante de aço, com 340 metros de comprimento e 55 de largura, área equivalente a mais de três campos de futebol, não foi longe. A cerca de 100 quilômetros da costa do Maranhão encalhou em um banco de areia e adernou. Pouco depois, naufragou.
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Ilhabela em último lugar no ranking de turismo 2025Garopaba destrói vegetação de restinga na cara duraCores do Lagamar, um espectro de esperançaDe acordo com o site do Ministério Público, ‘o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a ação do Ministério Público Federal (MPF) que apura a responsabilidade da Vale pelos danos ambientais causados pelo naufrágio. O acórdão, publicado em 30 de outubro, confirma a mineradora como ré legítima e determina o retorno do caso à 1ª instância para perícia ambiental’.
‘Na ação civil pública, o MPF detalhou que o acidente liberou 432,4 litros de óleo combustível no mar, formando manchas visíveis na água. Um laudo do Ibama confirmou a poluição e alertou para os riscos tóxicos, mesmo em pequenos volumes. Segundo o órgão, a contaminação pode sufocar organismos marinhos e alterar toda a cadeia alimentar’.
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Processos antes do afundamento na costa do Maranhão
Em agosto, a Capitania dos Portos informou ao MPF a retirada de 3.872,5 m³ de óleo e 145 mil toneladas de minério, com monitoramento da Marinha e do Ibama. Mesmo assim, após o afundamento, houve vazamento de óleo que formou uma grande mancha no mar.

O relatório registrou uma mancha de 0,79 km², resultado do vazamento de 333,6 litros de óleo, depois ampliado em 5,3 litros. Sobrevoos entre 13 e 17 de junho detectaram mais 93,5 litros, totalizando 432,4 litros de óleo no mar durante o acidente.
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Estuário de São Vicente contaminado por cocaína e outras drogasPlásticos: perigo grave, crescente, para a saúdeTratado mundial do plástico não sai outra vezAssim, o MPF requer que a empresa Vale seja condenada ao pagamento de indenização pelo dano causado ao ambiente, a ser calculada por arbitramento, decorrente do lançamento de óleo e do alijamento do navio Stella Banner na costa do Maranhão, em valor não inferior a R$ 1,5 milhão.
É deste processo que a Vale tentou escapar, como fez com os anteriores, mas não conseguiu, conforme decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1).
Encalhe do navio no canal do porto de Itaqui
Encalhar um grande navio graneleiro dentro do canal de acesso ao Terminal Marítimo da Ponta da Madeira, sinalizado e balizado, é algo que não pode ser tolerado.
Na época relatamos o acidente aos nossos leitores desta forma:
‘O monstro de ferro não foi muito longe. A cerca de 100 quilômetros da costa do Maranhão encalhou em um banco de areia e adernou, ameaçando naufragar. Além das quase 300 mil toneladas de minério de ferro, ele carrega em seus porões quatro milhões de litros de óleo combustível. Segundo o site jus.com.br “O acidente ocorreu após o navio ter sofrido uma colisão em um banco de areia com profundidade 20 metros.” E mais: “Com o elevado risco ambiental presente, o Comandante decidiu encalhar o navio em um ponto distante cerca de 65 milhas náuticas a fim de melhor avaliar o ocorrido, salvaguardar a tripulação, o navio e planejar as ações futuras’.
Marinha do Brasil afunda navios
Em 30 de março de 2020, a Marinha do Brasil anunciou a conclusão da retirada do óleo combustível. A etapa seguinte seria remover parte da carga. Pouco depois, em uma sucessão de decisões sem explicações convincentes, a Marinha decidiu afundar o navio na costa do Maranhão. Segundo o órgão, a medida se baseou em relatórios técnicos. Antes do afundamento, equipes removeram óleo e resíduos. A carga restante, cerca de 250 mil toneladas de minério de ferro, foi considerada sem risco ambiental.
Assim, após três meses encalhado, o navio foi rebocado para 70 milhas da costa do Estado e afundado em 12 de junho de 2020, com autorização da Marinha e anuência do Ibama.
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É curioso ver uma força naval se especializar em afundar navios, mas a Marinha do Brasil parece ter adotado esse ofício. Em 2023, surpreendeu o mundo ao mandar para o fundo o porta-aviões São Paulo, ex-nau capitânia, após um périplo patético pelo Atlântico Sul. No mesmo ano, considerou adequado afundar o MV Stellar Banner com cerca de 200 mil toneladas de minério de ferro na costa do Maranhão.
Como tudo que acontece com a Vale, não houve explicação
Na época este site acompanhou o desastre passo a passo, procuramos esclarecer dúvidas sem sucesso. Desde o acidente, nem a Vale nem a Marinha se manifestaram. Não houve clareza sobre a remoção completa dos fluidos do navio, além do óleo combustível. O Mar Sem Fim tentou ouvir o 4º Distrito Naval, mas não obteve resposta. Até hoje, ninguém sabe o que causou o encalhe e o desastre ambiental na costa do Maranhão.
A decisão da MB que determinou sabe-se lá com quais critérios que ‘a carga restante, cerca de 250 mil toneladas de minério de ferro, foi considerada sem risco ambiental’ não tem pé nem cabeça. É mais um mistério deste acidente mal explicado.
Em 2023 entrevistamos o oceanógrafo Alexander Turra, da USP, responsável pela Cátedra da UNESCO. Perguntamos sobre possíveis danos à vida marinha do afundamento de milhares de toneladas de minério de ferro. Eis a resposta:
minérios de ferro são um tipo de rocha semi processada. Um tipo de sedimento enriquecido de ferro, ‘que destoa do ambiente marinho’ e que tem alto grau de toxidade. Se o material for para o fundo do mar ‘haverá decantação, como se fosse um aterro, provocando morte instantânea da vida marinha porventura atingida
Viva a Vale, a Marinha do Brasil, e viva a falta de transparência!









