Mudança climática, oceanos e as três verdades de Bill Gates

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Mudança climática, oceanos e as três verdades de Bill Gates

Raras vezes um artigo sobre a mudança climática teve tanta repercussão na imprensa mundial quanto Three Tough Truths About Climate (“Três duras verdades sobre o clima”), que Bill Gates publicou em seu site às vésperas da COP30.  Não há jornal ou site informativo, nos quatro cantos do mundo — literalmente — que não repercuta as ideias expostas  e que, certamente, serão tema de debates em Belém. Em nossa opinião é provável que os “ambientalistas”, entre aspas, como nós os chamamos (porque há os ambientalistas sem aspas também), questionem as ideias do co-fundador da Microsoft.

Bill Gates mudança climática
Imagem, Fundação Bill Gates.

“A mudança climática, a doença e a pobreza são grandes problemas”, escreveu. “Devemos lidar com eles em proporção ao sofrimento que causam.”

‘A mudança climática não vai acabar com a humanidade’

‘A mudança climática é um problema sério, mas não o fim da civilização’, é a primeira verdade de Bill Gates. A outra, ‘a temperatura não é o melhor meio de medir nosso progresso sobre o clima’, finalmente, ‘saúde e prosperidade são a melhor defesa contra a mudança climática‘, completa o trio de advertências.

Antes de prosseguir, um pequeno parêntese. Quem acompanha este site sabe que temos dois “gurus” na área ambiental: Sylvia Earle, maior referência mundial sobre os oceanos, que veio a São Paulo em 2018 para lançar seu livro depois que convencemos a editora SESI-SP a publicar A Terra é Azul na FIESP, e o outro é o titã do ambientalismo tupiniquim, como sempre nos referimos a ele, Paulo Nogueira Neto.

Pois bem, quando entrevistei Nogueira Neto para o canal do Mar Sem Fim no Youtube  — acredito que tenha sido sua última entrevista antes da morte, com 50 minutos de muita sabedoria — ele disse mais ou menos o mesmo que o norte-americano em seu ensaio, numa mudança de posição que surpreendeu o mundo. Depois da entrevista, fiz um perfil do Dr. Paulo para este site, onde escrevi: “Para este homem culto e sensível, um dos mais importantes problemas ambientais é a erradicação da miséria.”

É pelo imenso respeito que tenho por essas singulares personagens que considerei apropriado que os leitores deste site conheçam os argumentos de Bill Gates, um filantropo que investe em questões relacionadas às  mudanças climáticas através da Breakthrough Energy. De 2015 até hoje foram  mais de US$ 2 bilhões em tecnologias de emissão zero.

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‘O que eu quero que todos na COP30 saibam’

Logo abaixo do título de seu artigo Bill Gates escreveu o que está acima entre aspas. O que Bill quer que todos saibam é que ‘há uma visão apocalíptica da mudança climática que é assim’:

Em poucas décadas, a mudança climática cataclísmica dizimará a civilização. A evidência está ao nosso redor – basta olhar para todas as ondas de calor e tempestades causadas pelo aumento das temperaturas globais. Nada importa mais do que limitar o aumento da temperatura’.

Eis o que ele disse sobre o evento de Belém: ‘A cúpula climática global  no Brasil, conhecida como COP30, é um excelente lugar para começar, especialmente porque a liderança brasileira da cúpula está colocando a adaptação climática e o desenvolvimento humano no topo da agenda’.

Gates afirma que esta é a oportunidade de mudar o foco: ‘mais importante que reduzir emissões ou temperaturas é melhorar vidas’. ‘O objetivo central deve ser diminuir o sofrimento humano, especialmente o das populações mais vulneráveis dos países pobres’.

‘Os maiores problemas são a pobreza e a doença, assim como sempre foram. Entender isso nos permitirá concentrar nossos recursos limitados em intervenções que terão o maior impacto para as pessoas mais vulneráveis’.

Crítica às políticas de Donald Trump

Apesar da polarização que deixou de ser um problema brasileiro para se tornar mundial, Gates criticou o presidente norte-americano, argumentando que os cortes do presidente na USAID ameaçam um problema mais urgente, causando danos globais potencialmente duradouros à luta contra a fome e a doença evitável com risco de vida.

O jornal inglês The Guardian destacou que Gates criticou o que ele descreveu como uma “visão apocalíptica da mudança climática” que está se concentrando “muito em metas de emissões de curto prazo”. E destacou que este ponto de vista está em desacordo com o do secretário-geral da ONU, António Guterres, que disse ao Guardian  que era hora de “reconhecer nosso fracasso” na crise climática.

Para o New York Times, a última visão de Bill Gates sobre a mudança climática pode irritar alguns ativistas. Mas também pode incendiar empreendedores que há muito tempo pedem que mais capital seja investido em ideias inovadoras que abordem o desafio.

O jornal sugere uma incoerência: Vale a pena notar que seu livro best-seller de 2021, “How to Avoid a Climate Disaster”, estabeleceu um plano para reduzir as emissões. Agora, ele escreve: “As projeções de emissões diminuíram e, com as políticas e investimentos certos, a inovação nos permitirá reduzir muito mais as emissões”.

Bill Gates antecipou que seria criticado

Em seu texto Bill Gates antecipou que a cobrança aconteceria: ‘Eu sei que alguns defensores do clima discordarão de mim. Eles me chamarão de hipócrita por causa da minha própria pegada de carbono (que eu compensei totalmente com créditos de carbono legítimos), ou ver isso como uma maneira sorrateira de argumentar que não devemos levar a mudança climática a sério’.

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‘Tenho aprendido sobre aquecimento – e investido bilhões em inovações para reduzi-lo – por mais de 20 anos. Trabalho com cientistas e inovadores que estão comprometidos em prevenir um desastre climático e disponibilizar energia limpa barata e confiável para todos. Dez anos atrás, alguns deles se juntaram a mim na criação da Breakthrough Energy, uma plataforma de investimento cujo único propósito é acelerar a inovação e a implantação de energia limpa. Apoiamos mais de 150 empresas até agora, muitas das quais floresceram em grandes empresas. Estamos ajudando a construir um ecossistema crescente de milhares de inovadores trabalhando em todos os aspectos do problema’.

‘A alternativa não é desistir do clima, mas trocar a retórica utópica pela ação realista’

A frase acima é do editorial do Estadão – (3/11), que também comentou o ensaio.

‘Os fariseus ambientais pregam que o crescimento é pecado, e a indústria, uma ameaça existencial. Mas os fatos são teimosos. Poluição? Só nos EUA, por exemplo, caiu 78% desde 1970. Desmatamento global? Diminui continuamente desde os anos 1980. Mortes por desastres naturais? Despencaram 96% em um século. Pobreza extrema? De 90% da população mundial para 9%. A humanidade vive mais, come melhor e educa mais crianças do que nunca. O planeta não está em colapso: está em conserto – que pode ser consumado pela força da ciência e da tecnologia’.

‘A alternativa não é desistir do clima, mas trocar a retórica utópica pela ação realista. O ambientalismo responsável mede custos e benefícios, não intenções. Ele sabe que descarbonizar exige aprimorar novos combustíveis até que sejam tão baratos e confiáveis quanto os fósseis. Isso não se faz com passeatas e cúpulas, mas com investimento em pesquisa, inovação e infraestrutura, energia nuclear, hidrogênio verde, fertilizantes limpos, biocombustíveis, baterias de longa duração. É preciso mais engenharia e menos histeria’.

Para nós, o artigo de Bill Gates sobre a mudança climática — cuja íntegra está neste link — não tem nada de hipócrita, nem de incoerente. Ele expõe suas ideias com clareza e apresenta dados sólidos que sustentam seus argumentos. É ótimo que tenha causado tanto barulho: assim, a COP30 ganha novas premissas para debate. Nosso modo insustentável de viver só terá um final feliz se todos os argumentos consistentes forem levados em conta — e os de Bill Gates têm essa qualidade.

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