A bioinvasão do Mexilhão dourado do Prata à Amazônia
Ele chegou no anos 90, cerca de 30 anos atrás, na água de lastro de algum navio vindo da Ásia para o rio da Prata, na Argentina. Na mesma década, em 1998, foi visto no Pantanal Mato-Grossense e na Lagoa dos Patos. Em sua marcha inexorável pelas bacias hidrográficas da América do Sul, subiu os rios Paraná e Paraguai. Em poucos anos, estabeleceu-se com densidades que superam 150 mil indivíduos por metro quadrado. A invasão seguiu rapidamente pelos rios do Sul, Sudeste e Centro‑Oeste brasileiros, alcançando grandes bacias, usinas hidrelétricas e sistemas de captação de água. Logo chegou nas hidrelétricas de Itaipu, Porto Primavera e Sérgio Motta. Em 2015, cientistas confirmaram sua presença no rio São Francisco, na barragem de Sobradinho. Agora, a bioinvasão do mexilhão dourado (Limnoperna fortune) chegou onde todos temiam: a Amazônia.

Prejuízos na Usina de Itaipu
O mexilhão se espalha rapidamente porque tem grande capacidade de reprodução e dispersão e quase não encontra predadores na fauna brasileira. Por isso, a espécie é considerada invasora. Pesquisas apontam que as invasões biológicas representam a segunda maior causa de extinção de espécies, ficando atrás apenas da destruição de habitats.

A larva do mexilhão-dourado é tão pequena que não se vê a olho nu. Embora consiga nadar, a maior parte do deslocamento ocorre de forma passiva: ela se espalha pelas correntes aquáticas, grudada em cascos, redes, conchas ou qualquer objeto molhado, e até mesmo pela água do esgoto. Assim, pode alcançar e contaminar áreas antes livres da espécie. Depois que as colônias estão instaladas, é impossível erradicá-las com os recursos e os conhecimentos atuais.
Segundo informações do governo, em 2003 cada metro quadrado de água do lago de Itaipu, o auge da proliferação, tinha nada menos que 184 mil indivíduos. Atualmente, o molusco já está presente em pelo menos 50 hidrelétricas brasileiras. De acordo com matéria do g1, uma usina de pequeno porte afetada tem prejuízo diário de cerca de R$ 40 mil a cada dia de paralisação. A Usina de Itaipu, que está na lista de atingidas, aumentou o volume de manutenção das turbinas após a chegada da espécie invasora, gerando custos diários extras de cerca de US$ 1 milhão por dia de limpeza.
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Segundo o Correio de Carajás pesquisadores do Instituto Evandro Chagas, de Belém, encontraram larvas do famigerado mexilhão dourado no rio Itacaiunas, Lago Vermelho, Lago de Tucuruí e Pedral do Lourenção.
A equipe do Evandro Chagas, que veio de Belém para a segunda expedição e coleta de água dos rios e lagos da região, repassou a preocupação e o alerta ao Ministério Público Estadual.
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As promotoras Josélia Leontina de Barros (Meio Ambiente) e Alexssandra Mardegan (Agrária) foram as responsáveis por acionar o IEC no segundo semestre do ano passado quando tiveram notícia, via Correio de Carajás, do avanço dos mexilhões no Pedral do Lourenço e na represa de Tucuruí.
Em outubro do ano passado, durante a “Operação água limpa”, realizada a pedido do Ministério Público do Estado do Pará, uma equipe do Instituto Evandro Chagas esteve em Marabá, Itupiranga e Tucuruí para coletar amostras da água dos rios Itacaiunas e Tocantins e verificar o aparecimento de mexilhões dourados na região do Pedral do Lourenção.
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Invasão da tilápia no mar brasileiro, do Maranhão até Santa CatarinaCamarão azul gigante, mais um perigoso invasor na AmazôniaExterminar eucaliptos e pínus do litoral é dever de todosDurante o período de seca do rio, os pesquisadores, em parceria com a Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), realizaram amostragens em três pontos do Pedral e constataram a colonização recente da espécie. “Os indivíduos encontrados eram pequenos, indicando o início da fase reprodutiva desses invasores. A confirmação da presença deles nos levou a questionar o possível impacto na qualidade da água e, se as condições ambientes influenciavam a permanência na região”, explica a bióloga Eliane Brabo.
Os prejuízos da bioinvasão do mexilhão dourado na Amazônia ainda são desconhecidos
Durante a cheia, os pesquisadores notaram a drástica redução da transparência da água. Eliane Brabo explicou: na primeira coleta a visibilidade chegava a dois metros de profundidade; agora, apenas sessenta centímetros.
Ela alertou que essa mudança pode afetar a reprodução e a sobrevivência dos mexilhões. A pesquisa também analisou o impacto inicial do mexilhão-dourado sobre a comunidade de bioindicadores. Esses microrganismos sustentam a cadeia alimentar aquática.
Na primeira coleta, a quantidade desses organismos já era baixa, mesmo em uma água que parecia produtiva pela transparência. A hipótese é que o mexilhão, ao filtrar a água, tenha consumido parte desses bioindicadores. Isso pode ter alterado a qualidade da água, reduzido a diversidade do ambiente e ameaçado os estoques pesqueiros.
Brabo reforçou que é necessário realizar coletas trimestrais para avaliar todos esses parâmetros.
A Amazônia, que já tem problemas de sobra, acaba de ganhar mais um, e combatê-lo não será nada fácil. Desde a constatação de que estavam na Bacia do São Francisco pesquisadores temiam a chegada na Amazônia, que já conta com outras espécies como o camarão gigante da malásia, por exemplo.









