Litoral de Santa Catarina afunda em inúteis engordas de praias
O litoral de Santa Catarina afunda por mau uso do solo e pela gestão irresponsável da maioria dos prefeitos de municípios costeiros. Ali, corrupção e incompetência se misturam. A maioria dos prefeitos ignorou os alertas da ciência. O litoral está em risco por causa do aumento do nível do mar e de eventos extremos cada vez mais fortes e frequentes. Agora, com as engordas de praias — inúteis, improvisadas e milionárias — eles ampliam ainda mais os danos.

Saiba que, aproximadamente, três em cada quatro habitantes do Estado vivem no litoral — cerca de 5,7 milhões de pessoas, segundo o IBGE. Isso aponta para um iminente problema social com o inexorável deslocamento de parte destes moradores. Ainda assim, insistem nas engordas que custam fortunas, são feitas às pressas, sem estudos adequados, e não resolvem nada. Em muitos casos, servem apenas para alimentar esquemas de superfaturamento.


A ocupação do litoral catarinense
O litoral de Santa Catarina não merecia a devastação que o poder público promove. Tampouco a população merece pagar esse preço.
A ocupação avançou demais sobre a areia. O Estado ergueu infraestrutura onde não devia. A iniciativa privada repetiu o erro com casas, condomínios, prédios, hotéis e resorts.
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Ilhabela em último lugar no ranking de turismo 2025Garopaba destrói vegetação de restinga na cara duraCores do Lagamar, um espectro de esperançaQuase sempre, a expansão ocorreu sobre restingas e dunas. Também eliminou manguezais que protegiam a linha da costa contra a erosão. Restingas e dunas serviam como reserva de areia para repor o que o mar levava em ressacas, marés e eventos extremos. Sem essa reposição natural, a erosão costeira se agravou.
A reposta do poder público: estímulo à especulação e banquetes de areia
Em Santa Catarina, a resposta para o desmanche da orla tem sido engordas de praias. Feitas no improviso, não resolvem e muitas vezes agravam o problema. O caso mais emblemático ocorreu em Balneário Camboriú: a praia Central foi deformada no segundo banquete de areia, que custou R$ 31 milhões em 2021.
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A primeira engorda ocorreu em 2002 quando professores da Universidade do Vale do Itajaí criticaram duramente a obra. Eles publicaram o estudo Environmental Impacts of the Nourishment of Balneário Camboriú Beach, SC, Brazil (Impactos Ambientais da Nutrição da Praia de Balneário Camboriú, SC, Brasil). O trabalho denunciou que o projeto ignorou estudos de viabilidade técnica e impactos ambientais na praia e nas áreas próximas.
Mais recentemente, professores da UFSC publicaram a Nota Técnica PES n°05/2025: Os Aterros de Praia e a Saúde da População e do Ambiente. O documento aponta que os aterros de praia em Santa Catarina ‘não cumprem seus objetivos nem seguem os próprios projetos licenciados’.
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Cores do Lagamar, um espectro de esperançaBelém faz história: COP30 celebra o oceanoMudança climática, oceanos e as três verdades de Bill GatesEntre outras, a Nota Técnica afirma que ‘as perspectivas mais evidentes e definidoras da implementação dos aterros parecem ser decisões individualizadas por municípios, de estímulo econômico e aquecimento do mercado imobiliário, não uma solução que trate da mitigação e adaptação às mudanças em curso’.
Poder público catarinense promove e estimula a especulação
Como sempre dissemos, o poder público catarinense promove e estimula a especulação imobiliária gabando-se do metro quadrado mais caro do País. O resultado são monstrengos como Jurerê Internacional (que alguém explique o motivo do ‘internacional’), Balneário Camboriú, Perequê, Itajaí, Piçarras – que segue para a quarta engorda ao custo de R$ 38,2 milhões -, Itapema, Governador Celso Ramos, entre outros.
Outra ação que poderia ser adequada para o litoral de Santa Catarina é a criação de recifes de ostras que dispersam a intensidade das ondas em até 90%, como mostram estudos. Seria uma das possíveis soluções baseadas na natureza, assim como o replantio de restingas, mangues, e a reconstrução de dunas. Além do mais, o Estado já é o maior produtor de aquicultura do País, ou seja, os nativos já estão acostumados com o cultivo de moluscos.
O mar avança sobre a faixa de areia alargada nos Ingleses
Sobre a engorda nos Ingleses diz a Nota Técnica: ‘Recente publicação que analisa as etapas do processo de licenciamento para obtenção das licenças ambientais e os monitoramentos ambientais nas praias de Canasvieiras e Ingleses, aponta que a situação é ainda mais grave’.
‘Até setembro de 2023, os programas ambientais referentes ao monitoramento da linha de costa, à evolução morfodinâmica e batimétrica da praia dos Ingleses, bem como as ações concretas para a restauração de dunas frontais embrionárias e a respectiva vegetação de restinga, ainda não foram apresentados ao IMA’.
Assim, por pura arrogância, o poder público jogou no lixo R$ 18 milhões de reais, custo do banquete indigesto de 2023 que não durou sequer dois anos. E ainda colocou em risco os frequentadores da praia como explicam os professores da UFSC.
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A Nota Técnica da UFSC aponta vários erros e omissões das atuais engordas que acabam gerando outros problemas entre os quais ‘todas as praias aterradas apresentaram um significativo aumento no número de ocorrências de salvamento pelos guarda-vidas’.
‘Canasvieiras apresentou um aumento de 400%, Balneário Camboriú de ~120%, Ingleses de ~170% e Jurerê de 100% no número de salvamentos após o aterro’.
Orla de Itapema
Segundo o site NSCTotal, a próxima vítima da ‘engorda’ será a orla de Itapema: ‘Um trecho de 500 metros da orla do bairro Meia Praia, em Itapema, será reurbanizado e ganhará ciclovia, passeio público e cabeamento subterrâneo’.
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‘A requalificação funcionará como uma espécie de “test-drive” para o modelo de urbanização que será aplicado após o futuro alargamento da faixa de areia, que deve ter início ao longo de 2026’.

Os responsáveis precisam ter a humildade de refletir sobre o que ocorreu: a destruição provocada pela ressaca. Em vez de obras de concreto as praias do Estado mereciam soluções baseadas na natureza com apoio da ciência.
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Barra Velha decreta estado de emergência
Em vez de alertar sobre os erros da ocupação que privilegiou as casas-pé-na-areia construídas sobre dunas, restingas, etc, ou fazer o ‘mea-culpa’ reconhecendo que o Estado fez o mesmo ao instalar infraestrutura onde não deveria, o poder público parte para a engorda sem antes fazer os estudos necessários.
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Em Barra Velha os pontos mais críticos são a Praia da Península e a Praia das Pedras Brancas e Negras, que apresentam risco muito alto.
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E atenção, Estado de Emergência significa que a administração municipal pode mobilizar recursos mais facilmente para implementar ações emergenciais. A ver o que farão.
Praia Central, BC, a cada ressaca novas crateras se abrem
Desta vez a calçada e a ciclovia afundaram na orla da Praia Central devido à maré alta em Balneário Camboriú em 29 de agosto. Mas, quem instalou a calçada e a ciclovia?
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Pode parecer incrível, e é sem dúvida, mas além de calçada e ciclovia fora de lugar a prefeitura de BC decidiu construir um muro de concreto sob as areias da praia Central com 1,5 km de extensão e 2 metros de profundidade para ‘funcionar como contenção e barreira contra a erosão’. Trata-se de uma obra sem critério técnico, de custo injustificável, e que aprofunda a crise.
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Agressão à praia em Porto Belo
Todos sabem que as praias precisam permanecer livres de obstáculos para manter o equilíbrio natural e assim ter condições de resistir a ressacas e eventos extremos. Em Porto Belo, o poder público decidiu ignorar essa regra. Resta ver quanto tempo levará para a erosão costeira se agravar também nessa orla.
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Projeto de expansão do Costão do Santinho e a nova Beira-mar nos Ingleses
Em amarelo aparece o traçado da nova Beira-mar, literalmente. Se o projeto avançar, como promete Topázio Neto, será mais uma obra candidata a ser tragada pelo mar. Os gestores ainda não entenderam que o que acontece hoje é só um ‘aperitivo’ do que está por vir.

Projeto de expansão do Costão do Santinho
Segundo o site JÁ ON LINE, o que estaria por trás desta nova via pública seria o projeto de expansão do Costão do Santinho cujo dono, o empresário Fernando Marcondes de Matos, encomendou o projeto e ‘doou’ à prefeitura. O empreendimento prevê a construção de um conjunto de torres de cinco andares, com um total de 351 apartamentos, numa área de 26 mil metros quadrados, ao lado do atual complexo, junto ao morro das Aranhas.
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O principal obstáculo para o licenciamento desse novo projeto, revela o JÁ ON LINE, é a questão da mobilidade na confluência da Praia do Santinho e os Ingleses, onde a avenida D. João Becker é estreita e forma o principal ponto de estrangulamento do trânsito na região. É esse gargalo que a projetada beira-mar dos ingleses promete resolver.
Contudo, esqueceram que Ingleses é mais uma das muitas praias maltratadas pelo poder público. Ela acaba de ser mais uma vez arruinada pela ressaca. Ainda assim, pensam numa avenida em cima dos escombros que sobram.
R$ 20 milhões de reais via emenda parlamentar
A nova Beira-mar, mesmo sem licenciamento, contou com o apoio da senadora Ivete Appel da Silveira (MDB) que em 26 de junho, através de emenda parlamentar, destinou R$ 20 milhões de reais para a obra.
A nova comunidade em crescimento acelerado, como diz JÁ ON LINE, supera os quatro mil moradores com sérios problemas urbanos e ambientais. Não tem esgoto. A implantação da rede, iniciada em 2018, com financiamento externo, consumiu mais de R$ 100 milhões e parou, sem concluir sequer a tubulação principal.

Mas, para saneamento básico não há verbas, nem emendas parlamentares, não é estranho?
Quando este post foi publicado em 7 de outubro a nova Beira-mar ainda aguardava o licenciamento ambiental.









