Vasa: Naufrágio na viagem inaugural

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Vasa: Naufrágio na viagem inaugural

A Suécia construiu o Vasa durante a Guerra dos Trinta Anos (1618–1648), um conflito que envolveu várias nações europeias por motivos religiosos, dinásticos, territoriais e comerciais.Apesar do saldo trágico de cerca de oito milhões de mortos, um episódio específico entrou para a história: o naufrágio do Vasa, o colossal navio de guerra sueco que afundou logo na viagem inaugural.

Imagem do navio Vasa
O Vasa hoje descansa no museu. Imagem, Wikimedia Commons.

O gigantesco navio que afundou na viagem inaugural

O Vasa era um navio imponente, ricamente decorado. Esculturas de madeira cobriam seu casco, narrando feitos da família real sueca, especialmente do rei Gustavo II Adolfo. A construção ocorreu no estaleiro Skeppsgården. O nome do navio também homenageava a dinastia que governava o país na época.

Mas, para o espanto da multidão reunida no porto de Estocolmo, em 11 de agosto de 1628, o Vasa mal conseguiu deixar o cais. Uma rajada de vento o fez adernar e afundar poucos minutos após zarpar.

Imagem do estaleiro onde foi construído o navio Vasa
Imagem, www.simscale.com.

O Vasa navegou menos de uma milha e, cerca de 20 minutos após a partida, afundou de forma desastrosa ao enfrentar uma rajada fraca de apenas 8 nós.

Na época, pouco se soube além de um inquérito que apontou o óbvio: o navio era instável. Mas por quê?

Só em 1961 os pesquisadores encontraram a resposta, quando resgataram o Vasa do fundo do mar, a 32 metros de profundidade. Estava surpreendentemente bem conservado, mesmo após mais de três séculos submerso.

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O responsável por essa preservação foi o próprio Mar Báltico. Suas águas frias e pobres em oxigênio impediram a ação de bactérias e vermes que costumam devorar madeira submersa.

O mesmo fenômeno ocorre no Mar Negro, onde pesquisadores encontraram em 2018 naufrágios  s em ótimo estado de conservação.

É o mesmo processo que acontece no Mar Negro, e que propiciou a descoberta  de naufrágios romanos, otomanos e bizantinos encontrados em ótimo estado em 2018.

Uma leve rajada de vento derrubou o navio de lado

Para entender o que realmente aconteceu, buscamos explicações de engenheiros que estudaram o caso. Encontramos uma análise clara no blog da SimScale. A seguir, o resumo da história.

Em 16 de janeiro de 1625, o rei Gustavo II Adolfo ordenou ao almirante Fleming que firmasse contrato com os construtores navais de Estocolmo, Hendrik e Arend Hybertsson. A missão: construir quatro navios de guerra.

Imagem do navio Vasa debaixo d'água
O Vasa ainda debaixo d’água. Imagem, Johan Bergling, National Maritime Museums.

Dois navios menores, com 36 metros de quilha, e dois maiores, com 45 metros, deveriam ser entregues em até quatro anos. Mas, nos meses seguintes, o rei Gustavo mudou as especificações várias vezes. As ordens confusas criaram um ambiente de caos para os construtores.

Navio com dois conveses

Depois que a construção começou, o rei Gustavo II Adolfo soube que os dinamarqueses estavam construindo um navio com dois conveses armados. Imediatamente, ordenou ao almirante Fleming que um dos navios maiores também tivesse dois conveses para canhões.

Até então, ninguém na Suécia havia construído um navio assim. E foi aí que os problemas começaram.

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Não há registros de um novo plano adaptado para essa versão maior e mais complexa do Vasa. Sob pressão para cumprir o prazo, Henrik Hybertsson parece ter apenas ampliado o projeto original, esticando comprimento e largura. O resultado foi desastroso: o centro de gravidade subiu demais.

Imagem dependura do navio Vasa adernando
O Vasa adernando. Pintura do Museu Vasa.

Para piorar, o mestre construtor Henrik Hybertsson adoeceu e morreu em 1627, quase um ano antes de o Vasa ficar pronto.

Segundo o blog da SimScale, o projeto era um caos: não havia planos documentados, faltavam especificações detalhadas e cinco equipes diferentes trabalharam no casco sem qualquer comunicação entre si. Foi um dos maiores projetos da Suécia na época — e um desastre completo.

O site do Museu Vasa explica que, entre os 400 operários do estaleiro, havia suecos, finlandeses, alemães, holandeses, dinamarqueses e trabalhadores dos países bálticos.

Essa mistura criou um ambiente de trabalho confuso. Os grupos falavam línguas diferentes, vinham de tradições navais distintas e, para complicar ainda mais, usavam dois sistemas de medição diferentes.

Testaram o Vasa?

Mesmo atracado no porto, o Vasa já parecia instável. Mas, no século 17, ainda não existiam métodos confiáveis para medir estabilidade, centro de gravidade ou risco de adernamento.

Fizeram alguns testes, mas de forma rudimentar. Segundo nossa fonte, o almirante Fleming e o capitão Hannson mandaram 30 homens correr de um lado ao outro do convés. No terceiro percurso, o navio balançou tanto que interromperam o teste às pressas. Temiam que ele tombasse ali mesmo, ainda no porto.

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Imagem da popa do navio Vasa
A popa do navio e suas esculturas. Imagem, Peter Isotalo.

Além de alto demais, o Vasa carregava um peso absurdo para a época: 64 canhões de bronze. Cada bala pesava cerca de dez quilos, segundo o site do Museu Vasa.

A intenção era criar o navio mais imponente da Europa. Nenhum gasto foi poupado. O casco recebeu centenas de esculturas entalhadas, douradas e pintadas, com cenas bíblicas, mitológicas e históricas.

Mesmo com sinais claros de instabilidade, a pressa e a ignorância do rei falaram mais alto. O sinal verde foi dado. O Vasa seguiria para o teste de mar.

Vento fraco deita o navio

De acordo com a SimScale, em 10 de agosto de 1628, o Vasa — o navio mais poderoso do Báltico — deixou o porto de Estocolmo. Mal percorreu duas milhas náuticas quando foi atingido por uma rajada de vento de apenas oito nós.

O vento era tão fraco que as velas precisaram ser estendidas à mão. Bastava uma pessoa para segurá-las.

Imagem do Vasa no museu
A incrível proporção dos turistas observando o imenso navio no museu.

Mesmo com um vento tão fraco, o Vasa adernou. A água entrou pelos portais dos canhões e o navio afundou ali mesmo, no porto. Cinquenta e três pessoas morreram.

No início, culparam o capitão, que sobreviveu e foi preso por suposta incompetência.

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Mas, em setembro daquele ano, uma audiência revisou o caso. O capitão e a tripulação foram libertados, e as acusações retiradas. Ninguém conseguiu apontar uma causa exata para o desastre.

Três séculos depois, o Vasa vira atração de museu

Foram necessários 333 anos até que o Vasa voltasse à tona. Segundo a SimScale, ele foi içado do fundo do mar em 1961. Após bombear a água e a lama, e selar os portais dos canhões, o navio flutuou novamente.

Hoje, o Vasa está preservado em um museu exclusivo: o Museu Vasa, em Estocolmo. É o navio do século XVII mais bem conservado do mundo.

Assista ao vídeo e veja como o Vasa veio à tona

Imagem de abertura: Pintura do Vasa adernando, https://www.stockholmfreetour.com/vasa-museum-stockholm/

Alta do nível do mar na previsão do relatório do IPCC

Comentários

15 COMENTÁRIOS

  1. Estive no museu Wasa em 2008. Foi comentado pelos guias que o naufrágio não foi
    devido apenas ao vento de oito nós. Disseram que foi dada uma salva de canhões, por ser viagem inaugural, com todos os tiros do mesmo lado, fazendo que se somasse o impulso da salva de canhões ao vento vindo do norte. Com duas forças somadas impulsionando para o mesmo lado, fez com que o navio que já era instável, por projeto mal feito, adernasse imediatamente, entrando água pelas portinholas dos canhões.

  2. Visitei o museu Vasa em 2010, um dos mais interessantes que conheci. Há inclusive cadáveres encontrados no navio, que foram estudados por várias técnicas forenses. Mas é necessário quase um dia inteiro para percorrer todas as instalações, muito didáticas em inglês. Para isso, é preciso evitar as excursões turísticas, que permanecem por duas horas no museu.

  3. Isso me lembra uma tal caravela feita em comemoração dos 150 anos …..
    As tragicomédias da vida palaciana se repetindo indefinidamente na história…

    • Agora lembrei da história: Um ex-prefeito de Curitiba/PR (agora novamente Rafael Greca), quando era Ministro do Esporte e Turismo, mandou construir uma réplica da caravela para comemoração dos 500 anos de “descobrimento” do Brasil. Nem bem foi lançada ao mar e começou vazar água. Jaz abandonada e emborcada na cidade de Vila Velha (-20.326236204896635, -40.30595272918538).

  4. Imaginando se hoje fosse recalculado tudo novamente e construíssem um “Vasa 2” nas dimensões e pormenores corretos, para comparar com o original.
    Triste incidente, e vidas perdidas inutilmente.. mas bom saber da qualidade construtiva naval dos suecos…

  5. E realmente impressionante, visitei este museu e apreciei esta imponente obra de arte de um navio que estava no fundo do mar por trezentos anos

  6. De fato, interessante, como ademais tem sido a coluna em suas atualizações. Vi este navio reconstruído no Vasamuseet em Estocolmo, que exibe inclusive as ossadas dos tripulantes. Parabéns pela pauta.

  7. Em 2014, num grupo de empresários em Estocolmo, não só visitamos o museu do extraordinário Vasa, em vários andares no entorno do navio, como também para a nossa surpresa, jantamos todos literalmente ao pé da relíquia! Era surreal levantar os olhos do prato e ver aquela quilha na frente. Os suecos acham que seus espaços públicos devem ser compartilhados! É museu e espaço de eventos ao mesmo tempo.

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