Trinta e três toninhas mortas no litoral de São Paulo em apenas duas semanas
De acordo com o Projeto Toninhas, o animal (Pontoporia blainvillei) é um pequeno golfinho que vive apenas nas águas costeiras do Brasil, Uruguai e Argentina. Acredita-se que essa espécie latina esteja entre os menores golfinhos do mundo. Seu tamanho máximo é de 1,60 m e o peso de um adulto varia entre 30kg e 50kg. A toninha costuma viver próxima à linha de costa, o que a deixa ainda mais vulnerável às atividades humanas. Entretanto, a captura incidental em redes de emalhe é a principal ameaça à sua sobrevivência. Isso, somado ao ciclo reprodutivo lento, com um filhote a cada dois anos, coloca a espécie em uma situação de grande risco. E foi exatamente o que aconteceu no litoral de São Paulo: trinta e três toninhas mortas em apenas duas semanas.
Perigo de extinção que se avizinha
Segundo a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) no Brasil a toninha está listada como “criticamente em perigo” e, em nível mundial, como “vulnerável”.
Ainda recentemente publicamos o post Toninhas do norte do Espírito Santo quase extintas. Nele, informávamos que O Instituto Baleia Jubarte (IBJ), por meio de Nota Técnica encaminhada aos órgãos ambientais e aos ministérios públicos Federal e Estadual (MPF/ES e MPES), alertou para a extinção iminente das Toninhas do norte do Espírito Santo; restam apenas 600 animais.
Antes de mais nada, os pesquisadores ressaltaram que, no litoral capixaba, as toninhas se concentram apenas na porção norte entre Santa Cruz/Aracruz e a divisa com a Bahia. Contudo, a maior presença está na região da Foz do Rio Doce, em Linhares.
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As toninhas no Brasil
Se ainda existem toninhas no Brasil, isso se deve à bióloga Marta Cremer. Ela iniciou o trabalho de proteção e conscientização com bolsa da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, e até hoje está à frente do Projeto Toninhas na ameaçada baía da Babitonga (o outro habitat destes animais no País), ao norte de Santa Catarina.
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Contudo, se continuar a omissão quanto às artes de pesca tradicionais o futuro é incerto para estes animais. Ainda em outubro de 2022 o Estadão anunciava que uma toninha foi achada morta na praia de Massaguaçu, Caraguatatuba.
Segundo o jornal, depois de ser examinada os pesquisadores do Instituto Argonauta revelaram que possivelmente o animal morreu por ter ficado preso em uma rede de pesca, mas também aparentava estar debilitado, pois tinha algumas lesões internas, sinais de infecção e um tumor.
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A notícia saiu na Folha de S. Paulo, no Globo e Estadão. Segundo a Folha, O instituto paulista de proteção da vida marinha Gremar, por meio do Projeto de Monitoramento de Praias da Bacia de Santos, registrou, em duas semanas, 15 mortes de golfinhos da espécie Pontoporia blainvillei, popularmente chamados de toninhas.
Os animais estavam em praias entre os municípios de São Vicente e Bertioga, diz a Folha; de 30 de setembro a 15 de outubro.
Já, O Globo discorda no número. Segundo o jornal carioca, em 15 dias, um total de 24 golfinhos da espécie Pontoporia blainvillei, mais conhecida como toninha, foram encontrados mortos em praias de cidades da Baixada Santista, no litoral de São Paulo. O levantamento é do Instituto Gremar e do Instituto Biopesca.
Enquanto isso, o Estadão cita a morte de 33 animais. Os três coincidem ao citar o período das mortes: duas semanas, ‘de 30 de setembro a 15 de outubro.’ O Estado ainda acrescenta que ‘No ano, já são 183 animais mortos na região, segundo dados do Programa de Monitoramento das Praias da Bacia de Santos (PMP-BS).’
O Estado ainda dá o número de mortes de toninhas nos dois anos anteriores: ‘em 2021 morreram 235 toninhas. Em 2020, foram 173 óbitos.’
Se somarmos os três anos são, no total, 591 animais mortos pela contagem do Estadão. Para um animal ameaçado de extinção é um montante extremamente alto. Demonstra que as toninhas estão com os dias contados no litoral do País.
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Discrepância explicada pela assessoria de imprensa
Dada à disparidade no número de mortes o Mar Sem Fim entrou em contato com a assessoria de imprensa do Gremar que explicou: “Estes números vão variar de acordo com o recorte que cada repórter solicitar. Quando o Instituto Gremar me avisou que em duas semanas haviam sido contabilizados 15 encalhes no nosso trecho (São Vicente, Santos, Guarujá e Bertioga), produzi um release e distribuí com essas informações.”
“Quando o G1 publicou 24 encalhes, por exemplo, somou os 15 do Gremar com os 9 que ocorreram, no mesmo período, no trecho do Instituto Biopesca (Praia Grande, Mongaguá, Peruíbe, Itanhaém)”
“Já o Estadão divulgou 33 porque, além dos 24 somados do Gremar e do Biopesca, contabilizou também os números do Instituto Argonauta para o mesmo período (que monitora o Litoral Norte, Ubatuba, Caraguatatuba, Ilhabela e São Sebastião).”
Portanto, no total foram 33 mortes em 15 dias.
Causa mortis
Contudo, os três acertam na causa mortis: Das 15 toninhas encontradas pelo Gremar, seis apresentavam interações evidentes com redes de pesca, sendo que sete eram filhotes ou juvenis e oito adultas. Sete eram fêmeas e duas estavam prenhas. Já os animais encontrados pelo Instituto Biopesca estavam em avançado estado de decomposição, o que impossibilitou a identificação.
Entre as outras causas figuram igualmente a poluição da água, e a poluição sonora dos oceanos, especialmente pelo fato de que as toninhas vivem próximas à costa, local de passagem de grande quantidade de barcos e navios.
Rio Grande do Sul, 300 animais mortos em 2021
Enquanto isso, no Sul do País, 300 toninhas morreram em 2021. A matéria é de autoria de Marcos Furtado, publicada pelo O ECO em 12 de janeiro de 2021.
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‘Descumprimento do tamanho de rede permitido e desrespeito às restrições de determinadas áreas de pesca são fatores que têm contribuído com o aumento da mortalidade do mamífero aquático mais ameaçado do país’, informa O ECO.
A imensa quantidade de óbitos aconteceu apenas no litoral Sul do Rio Grande do Sul.
A pesca artesanal e mito do bom selvagem
Pelo menos num ponto todas as matérias coincidem: um dos motivos, talvez o que levou ao maior número de óbitos, são as redes de pesca usadas pelos pescadores artesanais.
Infelizmente, o tema é ‘tabu’ no meio acadêmico e até mesmo entre ambientalistas. O mito do bom selvagem persiste apesar das provas dos malefícios da pesca artesanal desordenada e sem critérios.
É por estas e outras que dizemos que a pesca no Brasil é uma esculhambação total. Até quando?