Pelo mar sem fim do Brasil

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Rita Alves

Quando criança, o jornalista João Lara Mesquita era companhia constante do pai nas pescarias. Detalhe: o menino não gostava de pescar. Para ele bom mesmo era estar naquele ambiente, rodeado pela natureza. Até hoje a sensação de prazer persiste. A visão de dentro de um barco, nem tanto. A diferença foi notada por ele com o passar dos anos, especialmente depois de viajar pela costa brasileira a bordo do veleiro Mar Sem Fim. A jornada durou dois anos e foi exibida em uma série de documentários pela TV Cultura de abril de 2005 até abril de 2007.

O término da viagem não foi sinônimo de assunto encerrado. “No final da viagem é que fui convidado para fazer o livro”, revela Mesquita. O Brasil Visto do Mar Sem Fim, lançado pelas editoras Albatroz, Loqüi e Terceiro Nome (dois volumes com 312 páginas cada, R$ 198), traz os diários de viagem do jornalista, além de fotos clicadas por ele.
Imagens fascinantes da costa brasileira recheiam o livro que também inclui as cenas chocantes. Tais achados estão entre os principais motivos que impulsionaram Mesquita a navegar do Oiapoque ao Chuí. “Tive a sorte, por exemplo, de pegar o litoral entre Santos e Rio de Janeiro, praticamente ileso”. Sorte que foi transformada em indignação com o passar dos anos. “Eu assisti a ocupação desse pedaço do litoral e foi muito rápida. As pessoas que hoje chegam lá não se dão conta de como foi rápida a degradação do litoral. Tudo aconteceu em torno de quatro ou cinco anos”. Apesar do desencanto, Mesquita conta que seu maior choque ocorreu em Santa Catarina. “Fiquei muito mal impressionado com Santa Catarina. Era um estado que eu conhecia pouco, mas ouvia muito falar sobre Bombas e Bombinhas, Porto Belo, Garopaba… Quando cheguei vi um outro Guarujá. Tem praias inteiras muradas! Achei que fosse encontrar um litoral preservado, mas está um horror”. Já na Paraíba a surpresa foi melhor. “Paraíba domou a construção civil. Não tem um prédio construído na orla. É um litoral deslumbrante, praticamente ileso. Na Paraíba eles estão fazendo valer o direito deles. Cheguei lá e fiquei de queixo caído.”

O contato com os nativos também o deixou admirado. “Nunca vi um caiçara fazer nada que agrida o meio ambiente. Eles sabem instintivamente que não podem. Não vi uma casa de nativo construída na areia.” Diz que sempre foi bem recebido pelos moradores encontrados pela costa. “Era sempre uma gente paupérrima, mas com uma dignidade e uma generosidade incríveis. As crianças eram as mais curiosas. Cada vez que a gente chegava parecia o circo. Elas até vinham a bordo.”
O medo também fez parte da embarcação em algumas situações. Ele conta que houve vários momentos de perigo, mas nenhum dramático. “No sul da Bahia, por exemplo, teve um acidente chato. Eu quase perdi o veleiro. Mas o máximo que poderia acontecer num acidente como esse era ter um prejuízo financeiro.” Os assaltos são rotina na costa do País. Mesquita e sua tripulação não ficaram livres deles. “Ninguém imagina que possa ter um assalto num barco, mas acontece diariamente. Eu mesmo fui assaltado duas vezes.” Susto maior passou em São Paulo, fora da jornada com o veleiro Mar Sem Fim. “Um dia três homens armados invadiram meu barco e o roubaram inteiro. Se eu tivesse tido qualquer reação poderia ter tomado um tiro e morrido. O maior sufoco que passei na viagem pela costa brasileira não se compara com os que eu passei fora dela”, garante.
E se engana quem imagina que os transtornos marítimos tenham desanimado o navegador. O autor revela que no futuro pretende refazer a viagem, além de seguir investindo na área. “Até hoje recebo mensagens pelo site do Mar sem Fim (www.marsemfim.com.br). É gostoso você perceber que está fazendo uma coisa que tem eco ou então descobrir que tem gente que pensa da mesma forma. É muito bacana essa comunhão.”

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