Navio cruzador General Belgrano, a pique há 40 anos
O mês de maio de 1982 foi conflituoso na América do Sul. O navio cruzador General Belgrano, orgulho da Armada Argentina, navegava os mares do Sul fora da zona de exclusão das ilhas Falklands/Malvinas estabelecida pelo governo britânico. Além disso, o navio levava a bordo pouco mais de mil jovens. Inexperientes, e nervosos marinheiros. Mas, havia um inimigo oculto e um objetivo claro do Reino Unido: afundar o Belgrano e, finalmente, garantir a superioridade de suas forças. Enquanto isso o mundo, sobretudo perplexo, assistia a uma guerra pouco provável que no entanto aconteceu.
Antecedentes da Guerra das Falklands/Malvinas
O conflito militar de 10 semanas entre a Grã-Bretanha e Argentina em torno das Ilhas Falklands/Malvinas, além da Geórgia do Sul e Sandwich do Sul, teve inicio em 2 de abril de 1982. Portanto, há pouco mais de 40 anos.
A disputa começou pela soberania das ilhas Falklands/Malvinas. A Grã-Bretanha sustentou que a posse era sua em razão de uma colônia instalada desde 1841. Ao mesmo tempo, o governo argentino afirmava que eram seu território.
Assim, em abril de 1982 a Argentina invadiu as Malvinas. Consequentemente, a Marinha Britânica retaliou. O conflito durou 74 dias, pouco mais de 10 semanas. E terminou com a rendição argentina e o retorno do controle britânico.
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De antemão, em 12 de abril a Marinha Britânica estabeleceu uma Zona de Exclusão Marítima ao redor das Malvinas. A princípio o sinal era claro: qualquer navio argentino que entrasse na área seria alvejado.
Ou seja, aumentou a escalada.
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Nesse sentido, em 30 de abril isso foi intensificado para uma Zona de Exclusão Total. A Grã-Bretanha alertou que qualquer navio poderia seria atacado se igualmente desrespeitasse o bloqueio.
Segundo o www.nationalworld.com, ‘Ambas as ações eram duvidosamente legais. A Convenção do Direito do Mar não fazia provisões para tais zonas. Mesmo assim foram respeitadas pela comunidade internacional de nações neutras’.
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Nesse meio tempo, no início de maio a inteligência britânica interceptou comunicação argentina com planos de preparar um ataque.
Da mesma forma, a resposta não tardou. Margaret Thatcher concordou com os pedidos de seu Chefe de Estado-Maior de Defesa. E aprovou o ataque a navios fora da Zona de Exclusão Total.
Um submarino nuclear à espreita
Entretanto, mal sabiam os argentinos que o submarino nuclear britânico Conqueror estava à espreita. E tinha o navio em mira.
HMS Conqueror, da classe Churchill
Segundo o www.forum.worldofwarships.com, ‘O HMS Conqueror foi um submarino da frota nuclear da classe Churchill que serviu na Marinha Real de 1971 a 1990’.
‘E é o único movido a energia nuclear. Ficou conhecido por ter afundado um navio inimigo com torpedos, o cruzador General Belgrano na Guerra das Malvinas de 1982’.
O afundamento do navio General Belgrano
Assim, às 15h57 de 2 de maio de 1982, o submarino disparou três torpedos contra o ARA General Belgrano, localizado a aproximadamente 230 milhas das Ilhas Malvinas.
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Dois torpedos foram precisos. À frente e atrás do cinto de proteção, a bombordo. Como resultado, em menos de 30 minutos foi dada a ordem para…
‘Abandonem o navio’
O comandante Bonzo não teve opção. Mas, como nos relatou o leitor Guilhermo Moral, ‘um suboficial que viu o comandante disse vou ficar com ele‘.
Comandante Bonzo: “Vimos que tudo estava morto. O navio e os homens…então, tentei convencer o suboficial a sair. Mas, ele não aceitou. Ordenei-lhe que pulasse n’água. Então, ele me responde algo que, com o tempo, ainda penso:
Não, Comandante. Se você não pular, eu também não.
O Belgrano afundou levando 323 almas, cerca de 700 sobreviveram não antes de 24 horas agonizantes em mar gelado.
Héctor Bonzo faleceu em 22 de abril de 2009.
Momento frenético e desesperador
Naqueles minutos frenéticos, entretanto, enquanto os marinheiros tentavam enxergar em meio à fumaça e incêndios, o tenente Martín Sgut, de 30 anos, assumiu o comando de um bote salva-vidas e o abaixou na água.
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Enquanto Martín e 11 companheiros (um morrendo em seus braços) se afastavam, ele tirou uma série de fotos que se tornariam o centro de um turbilhão jurídico e político. Em síntese, eram imagens icônicas da Guerra das Malvinas.
Conheça o navio cruzador General Belgrano
Construído em 1938 como o cruzador leve USS Phoenix (CL-46) da classe Brooklyn, teve amplo serviço no Pacífico durante a Segunda Guerra Mundial.
Ao término da guerra, os Estados Unidos tinham um arsenal militar gigantesco. Assim, a Lei de Assistência à Defesa Mútua de 1949 foi aprovada para transferir as armas para países amigos.
A maior parte do equipamento foi para membros da recém-criada OTAN. Mas também para nações que foram fundamentais para a estratégia de contenção americana, especialmente na Ásia e América Latina.
Como resultado, seis cruzadores leves da era da Segunda Guerra Mundial foram selecionados para transferência para o Brasil, Chile e Argentina em 1951.
O Brasil ficou com Filadélfia e St. Louis; Chile com o Boise e o Brooklyn Navy Yard; enquanto a Argentina recebeu Nashville e Phoenix.
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Nos 25 anos seguintes, os EUA transfeririam 10 destróieres, 11 navios de desembarque de tanques, quatro submarinos e muitos outros navios de apoio para a Marinha Argentina.
O USS Phoenix, depois ARA General Belgrano, no ataque à Pearl Harbor
O USS Phoenix esteve no ataque a Pearl Harbor sobrevivendo ileso. Dessa forma passou a maior parte da guerra operando no Sudoeste do Pacífico, ao redor da Nova Guiné e Filipinas.
A compra do General Belgrano pela Argentina
Depois de um período no Estaleiro da Marinha da Filadélfia, o Belgrano foi convertido para venda. A Argentina pagou cerca de US$ 2 milhões, ou 10% do custo de construção original, conforme estipulado no MDAA.
Segundo o www.turnstiletours.com, ‘A transferência foi concluída em 17 de outubro de 1951. A data não era aleatória uma vez que coincidia com o novo nome ARA 17 de Octobre, comemorando o início do peronismo em 1945.
Mudança de nome: de ARA 17 de Octobre, para ARA General Belgrano
Esse nome, entretanto, teria vida curta. Depois da deposição de Perón em 1955, foi renomeado em homenagem ao marinheiro e líder da independência, Manuel Belgrano.
A carreira do cruzador General Belgrano seria bem tranquila pelos próximos 27 anos, até a eclosão da Guerra das Malvinas.
O erro da junta militar da Argentina
Contudo, a junta militar Argentina assumiu incorretamente que a Grã-Bretanha não tentaria uma solução militar.
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Mas, as forças armadas britânicas reuniram às pressas uma força-tarefa que incluía navios, aeronaves e tropas terrestres enviadas por 8.000 milhas para o Atlântico Sul para retomar as ilhas.
Uma foto na capa do New York Times, e de lá para o mundo
Em 2 de maio, quando o tenente Sgut se dirigia ao convés principal, viu um marinheiro deitado imóvel com queimaduras graves, o cabo Orlando Escobar. Então, o pegou e o carregou para o bote salva-vidas.
Começava um suplício à deriva em mar gelado
Pouco depois, Sgut lembrou que conseguiu resgatar a câmera e tirou algumas fotos na meia hora seguinte enquanto o navio desaparecia no mar.
Ele, e outros sobreviventes, estavam à deriva no gelado Atlântico Sul. Mas, Sgut sentia um sabor especial por ter registrado o afundamento. Contudo, os outros navios fugiram sob a ameaça de novo ataque do Conqueror.
Agora, seriam mais 24 horas de espera em temperaturas abaixo de zero além de mares com ondas de 6 metros de altura antes que o resgate chegasse.
Finalmente, ao retornar à base de Ushuaia, Sgut entregou o filme ao Serviço de Inteligência Naval da Argentina, afinal, acreditava que era material altamente sensível.
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Contudo, para sua surpresa as fotos apareceriam na primeira página do New York Times de domingo 9 de maio. Como resultado foram transmitidas para todo o mundo chegando de volta aos jornais argentinos em 13 de maio.
Afundamento do General Belgrano, um golpe devastador
O naufrágio do Belgrano foi um golpe devastador. A Argentina retirou sua Armada para os portos de origem, incluindo as forças-tarefa do norte.
Em vez disso, confiaria em ataques aéreos de bases no continente para repelir os desembarques britânicos.
Porém, a Grã-Bretanha sofreria suas próprias perdas, incluindo dois destróieres e duas fragatas, embora nenhum tenha sofrido a mesma perda de vidas que o Belgrano.
Mas, o aparecimento dessas imagens em público seria outro golpe na confiança pública da Argentina na guerra e no regime que a estava processando.
Quando perguntado pelo Times para corroborar a autenticidade das fotos o governo argentino tentou impedir ou atrasar a publicação. Enquanto isso, a imprensa alardeava vitória iminente.
A Guerra das Malvinas, como todas as outras foi uma guerra estúpida, e de propaganda. Finalmente, quando a censura não era mais possível, o regime girou para a vitimização pedindo condenação internacional do naufrágio.
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Enquanto isso, a Grã-Bretanha reivindicou seu direito de interceptar ameaças fora da zona de exclusão. Evidências, incluindo comunicações interceptadas e admissões posteriores pelo capitão do navio Héctor Bonzo, provariam que o curso de volta para casa era simulação. Consequentemente, o Belgrano tinha a intenção de tomar medidas agressivas.
US$ 1.000 por foto
Então, como as fotos foram parar na imprensa estrangeira?
Nesse meio tempo, Silvio Zuccheri fotógrafo da ILA, afiliada da agência de notícias Gamma, foi enviado à cidade costeira de Bahia Blanco para fotografar sobreviventes.
Ali, conheceu o oficial de inteligência tenente-comandante José Garimaldi, que alegou ter uma “bomba”: quatro fotos do naufrágio real, disponíveis pelo preço de US$ 1.000 por foto.
O resto se sabe. A Grã-Bretanha retomou as Malvinas, enquanto a junta militar foi derrubada. Martín Sgut abriu um processo em Nova York .
Posteriormente, o processo alegou que os meios de comunicação incluindo o Times, Newsweek, Associated Press e Gamma, publicaram trabalhos sem atribuição. E lucraram. Sgut pediu US$ 2,75 milhões em danos.
Deixando a marinha, a vida segue
Depois de deixar a Marinha, Sgut passou a ter uma carreira de sucesso como engenheiro marítimo. Trabalhou em projetos portuários em 34 países diferentes. Morreu de câncer em 2010, aos 58 anos.
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José Garimaldi, processado por vender ilegalmente as fotos, morreu em 1994. Mas, Silvio Zuccheri continua trabalhando como fotógrafo. Você pode segui-lo no Instagram.
Antes de encerrar
Se você gostou, e quer se aprofundar, a sugestão é o livro indicado pelo leitor Guilhermo Moral: ‘1093 tripulantes del Crucero A.R.A General Belgrano’, de autoria do Comandante Héctor Bonzo.
Relembre momentos da Guerra
Assista a este vídeo no YouTube
Imagem de abertura: www.turnstiletours.com
Fontes: https://www.nationalworld.com/news/world/belgrano-when-was-ship-sunk-how-many-died-when-is-falklands-war-anniversary-3638090; https://turnstiletours.com/ara-general-belgrano-a-lost-ship-a-stolen-photograph/; https://www.puentedemando.com/se-cumplen-40-anos-del-ataque-al-destructor-hms-sheffield/?fbclid=IwAR0wGc323Dy6r2Zupm4jPDPtGZ8Wsoqvv6sLnItQPqB8xTNioYnb8z3vWz4; https://issuu.com/quilmes/docs/gente13mayo1982.
Me lembro bem desta guerra. E fiquei bestificado de ver como em nome de um suposto patriotismo, ditadores assassinos conseguiram angariar o apoio incondicional da população argentina. Como tanta gente pode embarcar numa aventura estúpida, só porque teve seus brios soprados. Lembro do primeiro navio que deixou a Inglaterra rumo à batalha. Portava uma faixa dizendo “don´t cry for me Argentina”…
Recentemente, atravessando a Patagônia pela Ruta 3 a caminho de Ushuaia, me deparei com placas lembrando que “Las Malvinas son Argentinas”. E, ao longo dessa jornada pude refletir um pouco sobre esse samba do gaúcho doido que é a história de Los Hermanos. Conclui que “Kátia Flávia, a godiva do Irajá, amante do general Galtiéri de triste memória, pilotando um caça Mirage, afundou com seu exocet não somente o HMS ‘Sheffield’ como também a tenebrosa e incompetente ditadura militar argentina. Que isso, pelo menos, nos sirva de lembrete.