Petróleo no mar, leilão da ANP e Abrolhos: campanha pelo perigo à biodiversidade do Atlântico Sul deu certo!!
O caso recente das manchas de óleo no Nordeste é um aviso. Um sinal sinistro do que pode acontecer depois da insistência do ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, que ignorou recomendações técnicas do Ibama, e autorizou o leilão da ANP – Agência Nacional do Petróleo de sete blocos de petróleo na região do Arquipélago de Abrolhos, o único banco de corais do Atlântico Sul. Teremos mais petróleo no mar?
Lição do derramamento no Nordeste
A lição do derramamento de petróleo no mar do Nordeste aí está, a mostrar a brutal dificuldade em lidar com estas questões. Desde 2 de setembro as manchas de borra de petróleo começaram a invadir as praias nordestinas.
Passados mais de um mês, e com mais de 100 toneladas de borra nas praias, supõe-se que o petróleo foi produzido na Venezuela. Mas, de onde veio, não se sabe. E não há nada que se possa fazer a não ser recolher a borra que chegou ao litoral provocando prejuízos econômicos e ambientais.
Campanha deu certo!!
Jornal O Globo, 10/10/2019: “Abrolhos: pressão dos ambientalistas surte efeito, as áreas na Bahia não atraem interessados.”
Mais lidos
Declínio do berçário da baleia-franca e alerta aos atuais locais de avistagemPirataria moderna, conheça alguns fatos e estatísticasMunicípio de São Sebastião e o crescimento desordenadoFrota de pesca de atum gera escândalo e derruba economia de MoçambiqueFolha de S. Paulo, no mesmo dia: “Sob pressão de ambientalistas, região de Abrolhos fica sem ofertas em leilão.”
O Estado de S. Paulo, idem anterior: “Sub judice, Abrolhos não recebe ofertas em leilão recorde da ANP.”
PUBLICIDADE
Os três davam conta da vitória da campanha ambiental que sensibilizou mais de um milhão de pessoas, além da disputa ambiental judicial, e fizeram com que o bloco de petróleo próximo ao santuário marinho não recebesse sequer um lance na décima sexta rodada de licitação de campos da ANP.
Uma rodada que teve recorde, arrecadou R$ 8,9 bilhões! Uma dupla vitória, então. O Estadão disse que, ” Na coletiva de imprensa pós-rodada, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, foi questionado se a falta de interesse das empresas estava relacionada ao risco ambiental. Ele desconversou e disse que outros campos também não levaram lances.”
Leia também
Leticia Carvalho, da ISA, conversa com o Mar Sem FimHouthis ameaçam Mar Vermelho com 1 milhão de barris de petróleoDesafios Ambientais: conheça boas ações, uma da sociedade, outra do governoEste foi o primeiro, dos três leilões previstos para 2019.
‘Nós também temos uma caneta’
Se não conseguimos sensibilizar o poder público, imune a qualquer crítica ou sugestão, sensibilizamos as grandes operadoras. E elas ignoraram Abrolhos. Uma belíssima vitória da opinião pública.
Dia feliz para a democracia. E muito bom para sinalizar aos poderosos de Brasília que ‘nós também temos uma caneta’. E das boas! Ao menos desta vez não prevaleceu a vontade do ministro do Meio Ambiente mas o bom senso.
Precedentes na foz do Amazonas
Felizmente, há precedentes que sinalizam não ser boa prática apostar na dúvida. Em 2018 a empresa francesa Total, e a inglesa BP, ganharam blocos na foz do Amazonas, onde foram descobertos recifes de corais. Até hoje não exploraram.
Em dezembro de 2018 o Ibama indeferiu licença para a Total pela terceira vez consecutiva. Porque ‘um eventual vazamento poderia impactar a biodiversidade marinha e os recifes do local, além de haver “profundas incertezas” sobre o plano de emergência da companhia’.
O Brasil e a exploração de petróleo no mar
Já escrevemos que ‘ninguém de bom senso seria contrário à exploração de petróleo. É uma bênção que um País cheio de desigualdades, como o nosso, não pode desperdiçar.
PUBLICIDADE
Mas, por que agora a exploração em Abrolhos? Por que não oferecer apenas as outras áreas?’ Esta desfeita ao corpo técnico do Ibama é mais uma prova dos equívocos do ministro Ricardo Salles.
Equívocos do passado não previnem os do presente
Já dissemos também, que não resta dúvida de que houve equívocos do MMA, e seus braços, Ibama e ICMBio, no passado. Fomos os primeiros a denunciar o descalabro em que se encontra o litoral brasileiro, entregue à especulação imobiliária, e comentamos a falta total de fiscalização mesmo nas unidades de conservação federais do bioma marinho.
Mas, daí a investir contra pareceres técnicos do Ibama, ou exonerar 21, dos 27 superintendentes regionais do órgão (fevereiro, 2019), vai um longo caminho.
Não bastou o exemplo e Brumadinho
A tragédia em Brumadinho é o maior acidente do mundo, entre mineradoras, em número de mortes. Foram encontrados 251 corpos, e outros 19 continuam desaparecidos até hoje. Foi uma tragédia devastadora, mas pré-anunciada. O delegado da Polícia Federal responsável pelo caso, Luiz Augusto Pessoa Nogueira declarou:
Os setores (da Vale) sabiam identificar riscos, mas não sabiam o que fazer depois disso. A tragédia humana poderia ter sido evitada. Tenho convicção disso
José Goldenberg: ‘governo Bolsonaro não ajudou nada’
Já o professor emérito da USP, e ex- ministro do Meio Ambiente, o físico José Goldenberg, foi além. Na época, publicou artigo no Estadão sob o título, ‘Licenciamento e desastres ambientais‘:
Estamos pagando hoje o preço com os desastres de Mariana e Brumadinho. E o governo Bolsonaro não ajudou nada, até agora, a resolver os problemas reais do setor ao reduzir o status do Ministério do Meio Ambiente (que até cogitou de extinguir) e tolerar entrevistas e declarações de membros de sua administração desqualificando a defesa do meio ambiente.
PUBLICIDADE
Petróleo no mar: leilão da 16ª Rodada de Licitações da ANP
O leilão é a maior ameaça ao único banco de corais, o mais importante ecossistema marinho, do Atlântico Sul. O Ministério do Meio Ambiente, antes da atual gestão, classificou Abrolhos como ‘Área de Extrema Importância Biológica’.
Mesmo assim, ou talvez por isso mesmo, e contra a opinião de cientistas, ambientalistas, e o Ministério Público, o onipotente ministro do Meio Ambiente decidiu: áreas adjacentes a Abrolhos vão a leilão!
Não bastaram Brumadinho, ou trapalhadas em relação às queimadas da Amazônia para desbastar a imagem do Brasil no exterior. A atual administração quer mais. E agora investe contra o Global Environment Facility, o GEF Mar.
Global Environment Facility, o GEF Mar, e Abrolhos
‘O GEF é um fundo global para o meio ambiente. Um mecanismo de cooperação internacional cuja finalidade é prover recursos para auxiliar países em desenvolvimento na implementação de projetos que tragam soluções para as preocupações globais em relação à proteção dos ecossistemas e à biodiversidade’.
‘Foi apresentado na reunião de Paris, em novembro de 1990, como um Programa Piloto. O Brasil aderiu ao fundo em 1994.’ Abrolhos passou a contar com este apoio. O GEF mar ‘prevê aporte de US$ 40 milhões para fomentar o desenvolvimento sustentável.’
Projeto Terramar
É outro que inclui Abrolhos, e que tem previstos ‘investimentos de 12 milhões de euros numa parceria Alemanha-Brasil.’ Este projeto “tem por objetivo apoiar a gestão ambiental territorial integrada do espaço continental e marinho, contribuindo para a conservação da biodiversidade”, diz o site do MMA. Teremos outro imbroglio internacional como aconteceu com o Fundo Amazônia?
Petróleo no mar e o devastador potencial de acidentes
Os acidentes com petróleo no mar são devastadores. Não esqueçamos o segundo maior acidente com petróleo do mundo, em 2010 no Golfo do México, com explosão da plataforma Deepwater Horizon, da British Petrolium.
PUBLICIDADE
Este acidente é considerado o maior derramamento de óleo marinho na história da indústria do petróleo. O óleo fluiu por 87 dias. O governo dos Estados Unidos estimou em 4,9 milhões de barris derramados.
De quebra, provocou a morte de onze pessoas. No verão de 2010, aproximadamente 47.000 pessoas e 7.000 embarcações estavam envolvidas no projeto de limpeza. Sete mil embarcações! Para efeito de comparação, a frota da Marinha do Brasil não chega a 200 navios.
MPF entra com ação contra prospecção em Abrolhos
O Estado de S. Paulo, em 20 de setembro de 2019,”O Ministério Público Federal (MPF) propôs em 18/09/2019, uma ação civil pública, para pedir a retirada de sete blocos situados no litoral baiano em área próxima do Parque Nacional Marinho de Abrolhos.
“Na ação, o MPF na Bahia sustenta que esses blocos não deveriam ir a leilão sem os devidos estudos ambientais prévios, principalmente por estarem em áreas sensíveis do ponto de vista ambiental. Respondem à ação a União, a ANP e o Ibama.”
“Mas o MPF não foi o único a contestar a inclusão de Abrolhos. Estadão, “Em julho, os senadores Fabiano Contarato (Rede-ES) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP) entraram com uma ação popular na Justiça Federal do Distrito Federal, para requerer a exclusão dos blocos de petróleo próximos do Parque Nacional de Abrolhos, que o governo pretende leiloar em outubro.”
Conheça Abrolhos, e saiba o que está em risco
Petição contra a prospecção em Abrolhos deu certo!!
Como nada resolveu a questão, nem a palavra de cientistas, pesquisadores ou ambientalistas, muito menos o pessoal técnico do próprio Ibama, ou o Ministério Público e os senadores, nos resta aderir ao abaixo-assinado que corre nas redes sociais.
PUBLICIDADE
Foi o que aconteceu. Deu certo!! Milhões de pessoas assinaram. Não houve lances para os blocos de Abrolhos na primeira rodada dos leilões da ANP. Vitória da sociedade.
Imagem de abertura: governo da Bahia
Fontes: https://www.mma.gov.br/gestao-territorial/projeto-terramar.html; https://www.mma.gov.br/areas-protegidas/programas-e-projetos/projeto-gef-mar; https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2019/10/petroleo-em-abrolhos-ameaca-em-ondas-pode-virar-tsunami.shtml; https://www.mma.gov.br/gestao-territorial/projeto-terramar.html; https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,mpf-entra-com-acao-para-impedir-leilao-de-petroleo-ao-lado-de-abrolhos,70003018417.