Tragédia em Brumadinho, devastadora e pré-anunciada; 270 mortes desta vez
O Mar Sem Fim continua perplexo, e de olho. A tragédia em Brumadinho é o maior acidente do mundo, entre mineradoras, em número de mortes. Foram encontrados 259 corpos, e outros 11 continuam desaparecidos até hoje. E a Vale S.A. é reincidente. A empresa é responsável pela maior tragédia ambiental do Brasil, em novembro de 2015, em Mariana, quando 19 pessoas morreram soterradas e o distrito de Bento Rodrigues foi riscado do mapa. Desta vez, a Vale repete a dose macabra, matando centenas. A empresa também é responsável pela morte de dois rios: O Doce, e o Paraopeba.
Agência Nacional de Mineração (ANM) divulga relatório em novembro de 2019
Relatório da Agência Nacional de Mineração (ANM) divulgado em novembro afirma que a Vale omitiu informações sobre a barragem que rompeu em Brumadinho. A informação é de O Estado de S. Paulo.”O relatório, de 194 páginas, mostra, segundo a agência, evidências que podem ter levado ao rompimento da barragem e aponta “detalhadamente as inconsistências do que foi oficialmente relatado à agência via sistema, o que os técnicos da própria Vale colocaram em documentos de vistoria de campo e, posteriormente, no sistema da empresa”.
Discrepâncias do caso Brumadinho
“As discrepâncias no caso de Brumadinho, segundo a ANM, começaram a ser detectadas logo depois do rompimento da barragem. “Algumas informações importantes que constavam no sistema interno e nas fichas de inspeção em campo da Vale não eram as mesmas inseridas no SIGBM, o que impediu que o sistema alertasse os técnicos de situação com potencial comprometimento da segurança da estrutura”, diz a ANM.” Isso apenas prova que a empresa agiu de forma irresponsável durante todo o processo.
Polícia Federal indicia funcionários da Vale e da Tüv Süd
Setembro de 2019, O Estado de S. Paulo: “A Polícia Federal indiciou sete funcionários da Vale e seis da empresa de consultoria Tüv Süd por falsidade ideológica e produção de documentos falsos, por três vezes, em processo que investiga o rompimento da barragem em Brumadinho. Entre os indiciados por falsidade ideológica e apresentação de documento falso está o executivo da Tüv Süd na sede da empresa na Alemanha, Chris Peter Mayer, responsável pelas operações da companhia no Brasil. A Tüv Süd atua na área de consultoria e é a responsável pela emissão de laudo de estabilidade da barragem.”
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O Estado: “Nenhum integrante do alto escalão da Vale está entre os indiciados. O grupo é formado por responsáveis ou funcionários dos setores de geotecnia de gestão de riscos e geotecnia operacional da empresa.” Ao todo, sete funcionários da Vale foram indiciados. E prossegue o jornal: “Na Tüv Süd, os indiciados são, além de Mayer, Makoto Namba, André Yassuda, que assinam os documentos de estabilidade da barragem, Marlísio Cecílio de Oliveira, Arsênio Negro Júnior e Ana Paula Toledo Ruiz.”
Tragédia em Brumadinho: funcionários da Vale sabiam dos problemas
A tragédia em Brumadinho aconteceu devido a uma sucessão de erros que incluem, desde o funcionamento precário dos órgãos competentes, como o Ibama (leia abaixo), até o total descaso da empresa que sabia que corria riscos e nada fez, ao contrário, fingiu não saber. Agora a Polícia Federal confirma as suspeitas.
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Estadão: “As investigações apontaram que todos os funcionários da Vale indiciados tinham conhecimento sobre problemas de estabilidade da barragem e, ainda assim, não fizeram nada para evitar a tragédia. “Os setores sabiam identificar riscos, mas não sabiam o que fazer depois disso”, afirmou delegado Pessoa. “A tragédia humana poderia ter sido evitada. Tenho convicção disso”, disse o responsável pela investigação.”
Falsidade ideológica e produção de documento falso na tragédia em Brumadinho
Estadão, setembro de 2019: “Os crimes foram cometidos, conforme as investigações, em junho e por duas vezes em setembro de 2018, durante envio de documentos a autoridades da Agência Nacional de Produção Mineral (DNPM) e a Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam). O crime de falsidade ideológica e produção de documento falso, dentro da Lei Ambiental, é punido com prisão de três a seis anos. No caso, multiplicado por três.”
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O Ibama declarou que a tragédia de Mariana despejou 50 milhões de metros cúbicos de rejeitos, contra 13 milhões de Brumadinho. Foram detonados cerca de 270 hectares de terreno, que equivalem a 270 campos de futebol.
A seguir, outras informações sobre a tragédia em Brumadinho e o que aconteceu até hoje sobre o acidente da barragem de Mariana.
A licença da barragem, empresa sabia do risco
Segundo a Folha de S. Paulo, ” a Ata da reunião extraordinária do órgão ambiental de Minas Gerais que aprovou em dezembro, de forma acelerada, a ampliação das atividades do complexo Paraopeba, que inclui a Córrego do Feijão, mostra que o risco de rompimento, que acabou acontecendo foi objeto de discussão.” Ou seja, a empresa sabia do risco e não agiu porque não quis.
A Vale, em Minas Gerais, tem sido uma empresa irresponsável
No primeiro acidente a empresa matou um curso d’água, o Rio Doce. No segundo, foi a vez do Paraopeba. Mais um recorde sinistro da companhia.
Alguns dados da ex-Vale do Rio Doce
A vale é a “31ª maior empresa do mundo, atingindo um valor de mercado de 298 bilhões de reais. Em novembro de 2007, a marca e o nome de fantasia da empresa passaram a ser apenas Vale S.A. Foi privatizada em maio de 1997- durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Em janeiro de 2012 foi eleita como a pior empresa do mundo, no que refere-se a direitos humanos e meio ambiente, pelo “Public Eye People´s”, premiação realizada desde o ano 2000 pelas ONG’s Greenpeace e Declaração de Berna.
O caso da Barragem do Fundão, de 2015, não evoluiu
No caso da tragédia de Mariana, os pescadores artesanais continuam sem ter onde pescar; as indenizações ainda não foram pagas; a construção do novo povoado ainda não saiu do papel. Esta é a Vale do Rio Doce.
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Rio Doce: inquérito não levou a nada
Em Outubro de 2016, quase um ano depois da tragédia, finalmente o inquérito chegou ao seu final. O “MPF denunciou 21 gestores e conselheiros, por homicídio doloso”. Mas, mais uma vez passados vários anos, nenhum diretor foi preso.
Na época a dúvida era se a lama tóxica atingiria Abrolhos, o único banco de corais do Atlântico Sul. Hoje, sabe-se que sim. E mesmo assim, nada aconteceu para a Vale até agora. “Heitor Evangelista, geocientista da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, mostra que o pior cenário se tornou realidade. O colapso dos resíduos da barragem de Fundão, instalação operada pela Samarco, joint venture entre Vale e BHP- contaminou os recifes de coral do Parque Nacional Marinho de Abrolhos, uma reserva natural no Nordeste do Brasil. A pasta tóxica causou a contaminação de exoesqueletos de coral por metais pesados - substâncias que podem ter sérios efeitos sobre a saúde em muitos organismos.”
Ibama não aceitou plano de recuperação Ambiental do Rio Doce
Veja a cara-de-pau, e a impunidade imperando apesar dos pesares. Uma das obrigações da Samarco, depois da tragédia, foi apresentar um plano de recuperação ambiental para todo o vale do Rio Doce. A empresa mostrou plano tão ruim que não foi aceito. Segundo o Ibama, o que a Samarco apresentou era…
…de caráter genérico e superficial, sem considerar o imenso volume de informações produzidas e disponíveis até o momento, além de apresentar pouca fundamentação metodológica e científica…
Por estas e outras, aconteceu Brumadinho. Só que agora não são apenas 19 mortos, mas centenas. O Mar Sem Fim considera que, tudo a seu tempo, os gestores da Vale merecem cadeia.
Brilhante artigo de José Goldenberg sobre a Tragédia em Brumadinho
De tudo que se publicou até agora sobre este negro episódio da nossa história recente, que pegou mal no mundo inteiro, foi o recente artigo de José Golbenberg no Estadão. Como se sabe, Goldenberg, PROFESSOR EMÉRITO DA USP, FOI MINISTRO DO MEIO AMBIENTE E SECRETÁRIO DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO. O título, muito apropriado em épocas de Bolsonaro, foi, ‘Licenciamento e desastres ambientais‘.
‘Licenciamento e desastres ambientais‘.
O artigo começava assim: “É possível ser mais rigoroso e proteger a população sem impedir o desenvolvimento.” O professor explica: “Os desastres ambientais de Mariana e Brumadinho põem na ordem do dia, com alta prioridade, o problema do licenciamento ambiental. Isso significa uma séria inversão de prioridades do governo federal. A reorganização administrativa promovida em janeiro (de 2019) levou à extinção e realocação de várias áreas ligadas a questões ambientais, o que indicava uma visão desenvolvimentista em que o licenciamento ambiental parece ser um obstáculo ao desenvolvimento.”
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Observação: O Mar Sem Fim já alertou sobre a importância do licenciamento ambiental e as tentativas de abortar este importante instrumento da política ambiental brasileira.
“Pagamos o preço”
José Goldenberg: “Estamos pagando hoje o preço com os desastres de Mariana e Brumadinho. E o governo Bolsonaro não ajudou nada, até agora, a resolver os problemas reais do setor ao reduzir o status do Ministério do Meio Ambiente (que até cogitou de extinguir) e tolerar entrevistas e declarações de membros de sua administração desqualificando a defesa do meio ambiente (O Mar Sem Fim concorda em gênero, número, e grau, veja).
“Semelhança com Operação Lava-jato”
José Goldenberg: “Esta é uma situação parecida com a Operação Lava Jato e o papel do juiz Sergio Moro. A legislação anticorrupção, com delação premiada e outros dispositivos legais, já existia, mas foi a coragem do juiz em aplicá-la que fez toda a diferença.”
“Isso não significa que a legislação ambiental não possa ser aperfeiçoada e simplificada – sem perder o rigor -, sobretudo definindo melhor as características específicas dos empreendimentos. Licenciar uma pequena central hidrelétrica numa fazenda no interior não precisa ter a complexidade de licenciamento de uma grande usina hidrelétrica.”
Receita para evitar desastres como o de Mariana
José Goldenberg: “Para evitar novos desastres, como em Mariana e Brumadinho, o governo federal precisa demonstrar claramente que vai aplicar as leis vigentes, “doa a quem doer”. Somente assim os técnicos e engenheiros responsáveis pelos projetos e pela fiscalização ambiental se sentirão respaldados para propor a interdição de projetos inadequados e não conceder novas licenças sem a permissão de medidas protetoras da população.”
“Licenciar uma barragem como a de Brumadinho, permitindo que abaixo dela fossem instalados uma pousada e um refeitório da Vale, ultrapassa as raias do absurdo na sua irresponsabilidade. E poderia ter sido evitado por uma simples medida administrativa.”
Nova barragem da Vale se rompe. Tragédia em Brumadinho.
Veja abaixo o caminho da lama na tragédia de Brumadinho.
Fontes: https://gauchazh.clicrbs.com.br/; https://valeinformar.valeglobal.net/BR/MG/Paginas/Home-14-03-18.aspx?pdf=1; https://exame.abril.com.br/brasil/bombeiros-rompimento-de-barragem-em-brumadinho-deixa-200-desaparecidos/; https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2019/01/risco-de-rompimento-foi-citado-na-tensa-reuniao-que-aprovou-licenca-da-barragem.shtml; https://www.pontosbr.com/mina-de-ferro-carajas-vale-do-rio-doce-parauapebas-pa-21.html; https://pt.wikipedia.org/wiki/Vale_S.A; https://g1.globo.com/natureza/noticia/em-cinco-anos-orcamento-do-ministerio-do-meio-ambiente-cai-r-13-bilhao-diz-estudo.ghtml; https://www.hakaimagazine.com/news/research-unveils-new-damage-caused-brazils-failed-fundao-dam/; https://sustentabilidade.estadao.com.br/noticias/geral,pf-indicia-13-funcionarios-da-vale-e-da-tuv-sud-por-producao-de-documentos-falsos,70003018057; https://sustentabilidade.estadao.com.br/noticias/geral,vale-omitiu-informacoes-sobre-problemas-em-brumadinho-diz-anm,70003076895; https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,licenciamento-e-desastres-ambientais,70002725558.