Tamara Klink, velejadora solitária, retorna ao Brasil
Ela é a mais nova integrante da seleta galeria das grandes navegadoras brasileiras — com “N” maiúsculo. Filha de peixe, peixinho é, diz o ditado. E Tamara Klink provou estar à altura da linhagem. Filha da também velejadora Marina Bandeira Klink e do mais renomado navegador do Brasil, Amyr Klink, Tamara decidiu escrever sua própria história no mar.
Segundo relato de Marina nas redes sociais, tudo começou dois anos antes da travessia. Tamara pediu emprestado o barco do pai. Amyr recusou. Tentou então outra abordagem: pediu ajuda financeira para comprar seu próprio veleiro. Nova negativa. O pai, no entanto, se ofereceu para orientá-la — desde que ela fizesse tudo por conta própria. “Se quer mesmo partir, precisa construir sua própria história”, disse ele.
E foi exatamente isso que Tamara fez. Dois anos depois, depois de enfrentar sozinha o Atlântico, Tamara Klink, velejadora solitária, está de volta ao Brasil.
Tamara cruza o Atlântico sozinha e chega ao Brasil com o veleiro Sardinha
Estudante de arquitetura na USP, Tamara partiu para um intercâmbio na École Supérieure d’Architecture, em Nantes, França, onde se especializou em arquitetura naval.
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Ilhabela em último lugar no ranking de turismo 2025Garopaba destrói vegetação de restinga na cara duraCores do Lagamar, um espectro de esperançaDepois, rumou para a Noruega — e foi lá que encontrou o barco ideal: um pequeno veleiro de apenas oito metros de comprimento, batizado de Sardinha, por conta do tamanho diminuto. Trata-se de um Maxi Magic, modelo de 1984, assinado pelo projetista sueco Pelle Petterson. Tamara o comprou com suas economias e a ajuda de um amigo. E com ele enfrentaria o Atlântico.
O início da grande navegada
Tamara deixou a Noruega e seguiu para a Dinamarca. Depois, passou pela costa francesa — em pleno verão europeu — e, em agosto, chegou a Portugal. Foi em Lisboa, diante da histórica Torre de Belém, que se preparou para sua maior travessia: cruzar o Atlântico sozinha. Partiu rumo a Cabo Verde, onde fez escala, antes de enfrentar as 1.700 milhas finais em direção ao Brasil. Tudo isso aos 24 anos.
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E antes dos estudos no exterior…
Em 2019, este site já saudava outra faceta da jovem navegadora que hoje nos conquista com sua coragem e talento. Naquele ano, Tamara estreava na televisão com o programa Mar Brasil, exibido semanalmente na BandNews TV. Ainda muito jovem, ela já mostrava maturidade ao abordar temas como a poluição dos oceanos, a preservação da vida marinha e os desafios ambientais do nosso litoral.
5.600 milhas e 17 dias no mar: a travessia solo de Tamara Klink
Desde a saída na Noruega até a chegada ao Brasil, em Pernambuco, no dia 1º de novembro, Tamara percorreu cerca de 5.600 milhas náuticas. A etapa final — a travessia do Atlântico — foi a mais longa e exaustiva. Durante os 17 dias em alto-mar, entre Cabo Verde (de onde partiu em 15 de outubro) e a costa brasileira, ela contou com o apoio remoto do velejador Murilo Novaes, que, de terra firme, enviava previsões meteorológicas e informações estratégicas para a rota.
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Ao pisar no Brasil, exausta e emocionada, Tamara declarou:
Estou bem feliz de ter chegado aqui e contente que o barco está agora em segurança e que eu vou finalmente poder dormir numa cama que não se mexe, sem ter que me preocupar com o tamanho das ondas ou a força do vento. Eu só tenho a agradecer a recepção
“Meu Deus do céu, como esta menina fez um negócio tão extraordinário?”, pergunta Amyr
Na chegada a Pernambuco, Tamara foi recebida com emoção pela família inteira. Entre os que a aguardavam estava Amyr — um dos navegadores mais experientes do mundo. Ao ver de perto o pequeno veleiro Sardinha, não escondeu a surpresa:
“O barco é precário”, admitiu.
Acostumado a projetar embarcações robustas e seguras para enfrentar os mares do sul e a Antártica, Amyr ficou impressionado com a façanha da filha: “Meu Deus do céu, como esta menina fez um negócio tão extraordinário com recursos tão mínimos! O barquinho é muito valente, e a Tamara foi muito valente, porque essa precariedade faz com que o navegador tenha que colocar em prática todas as suas habilidades.”
E outros quando as ondas subiam…
Sem atalhos, só mar: Tamara completa jornada de autoconhecimento
Em entrevista ao Canal 13 no YouTube, Amyr resumiu com orgulho a transformação da filha:
“Ela saiu relativamente ignorante, como eu fui no começo, e voltou uma expert. Fico muito feliz por esse processo de aprendizado, que é um processo que não tem como cortar o caminho.”
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Com coragem, disciplina e sensibilidade, Tamara Klink reafirma seu lugar entre as grandes navegadoras — e prova que os oceanos também se conquistam com delicadeza.
Quebra dos pilotos automáticos: mar parado, desafio dobrado
Durante a travessia, nem tudo correu como planejado. Em uma das mensagens enviadas via telefone satelital para sua mãe — e depois compartilhadas nas redes sociais — Tamara relatou um dos momentos mais difíceis da jornada:
Não sei se te disse, mas os dois pilotos automáticos queimaram. E o leme de vento não funciona sem vento. Ontem, brisa fraca e instável, tive que passar a noite e o dia todo de castigo, colocada na barra. Fiquei me sentindo naquelas provas de resistência de programa de auditório, pra ver quem fica mais tempo com a mão no carro
Sem piloto automático e com vento fraco, ela precisou ficar horas a fio no comando manual do leme — uma exaustão física e mental que só quem já navegou sozinho entende.
Uma hora pendurada no mastro
Segundo o g1, em outro momento da travessia, Tamara enfrentou uma situação ainda mais arriscada: precisou passar mais de uma hora pendurada no mastro, tentando desfazer os nós que se formaram no cabo de aço de uma das velas — tudo isso enquanto o veleiro balançava no mar.
Ela mesma relatou à mãe, via SMS satelital:
Tentei de tudo. Não houve jeito de desfazer os nós apertados daqui de baixo. Eu não posso ir até o Brasil assim. O caminho ainda é longo. Era assustador, mas a única opção era subir
Enquanto escalava o mastro, o barco adernava.
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Os pés balançavam em cima d’água, o corpo suspenso num fio. Me estico pra alcançar a borda do pano e desfazer uma volta por uma. Pouco mais de uma hora depois, desço com a vela no braço. Solta, inteira
A viagem ainda não terminou
Os lançamentos dos livros terão que esperar um pouco mais. Segundo a revista Náutica, depois de descansar da travessia, Tamara pretende seguir viagem até Paraty, no litoral do Rio de Janeiro — refúgio da família Klink. Só então começará, com calma, o processo de publicação das obras.
Por enquanto, o mais importante foi cumprido: a travessia, o aprendizado, e o retorno em segurança.
Parabéns à jovem — e já testada — marinheira!
Imagem e abertura: Reprodução/Instagram
Fontes: Instagram; Canal 13, You Tube; e https://g1.globo.com/pe/pernambuco/noticia/2021/11/02/velejadora-solitaria-tamara-klink-chega-ao-recife-apos-tres-meses-atravessando-o-atlantico-em-barco-de-8-metros-foi-muito-emocionante-diz.ghtml?utm_source=Facebook&utm_medium=social&utm_campaign=g1pe&fbclid=IwAR2vS28js8WhmGkoad6KJu0TJk8VmOHq5azWx8wd331usJJEr1Z1_qbvZKM; https://www.nautica.com.br/tamara-klink-atlantico-veleiro-sardinha/?fbclid=IwAR1s7lex5I3vyYOeh0uRWGTZrcr1IKGqPVEsy21ch3hW8j9F7r_8CBPflX4.
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