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Polo Turístico Cabo Branco, obra controversa em João Pessoa

Polo Turístico Cabo Branco, obra controversa em João Pessoa

Segundo o site do governo, ‘o Polo Turístico Cabo Branco é o projeto do Governo da Paraíba que destina 21 lotes para o desenvolvimento do maior complexo turístico planejado do Nordeste, que reunirá resorts, parque aquático, equipamentos de animação e estabelecimentos de comércio e serviços. Atualmente, o projeto já conta com o Centro de Convenções de João Pessoa, reconhecido e premiado nacionalmente’. O empreendimento da WAM Experience contará com investimentos de cerca de  R$ 500 milhões. ‘O projeto está inserido em uma área de 654 hectares, em uma região privilegiada de João Pessoa e próximo a diversos pontos turísticos’. 654 hectares de Mata Atlântica, diga-se, protegida por lei. Além disso, o projeto fica sobre uma falésia, também ‘protegida’.

Polo Turístico Cabo Branco
Imagem publicada pelo Brasil de Fato, com a seguinte legenda: Tauá Resort e foz do rio Cuiá. – Fonte: A insustentabilidade da “sustentabilidade”: algumas reflexões a respeito da implementação do Polo Turístico Cabo Branco(PB), artigo publicado na Revista Brasileira de Ecoturismo, em novembro de 2024.

Maior complexo turístico planejado do Nordeste

Esta história de turismo planejado parece estar pegando. No extremo oeste do litoral do Ceará há outro projeto destes, do Grupo Carnaúba, que visitamos recentemente. Embora o empresário paulista venda o sonho da “primeira praia planejada do Brasil”, o que aconteceu na região é um brutal processo de especulação imobiliária.

Agora temos este outro projeto em João Pessoa, idealizado na década de 1980. Contudo, o projeto sofreu diversas sanções devido aos  impactos socioambientais. Por exemplo, em 2023 o Portal T5 estampava em manchete: ‘Em um ano desmatamento da Mata Atlântica cresce 45% em João Pessoa’.

E, no corpo do texto, ‘Entre 2021 e 2022, a taxa de desmatamento na Mata Atlântica em João Pessoa cresceu 45%’.

A imagem publicada pelo Portal T5 não deixa dúvidas.

Área escolhida faz parte do Corredor de Biodiversidade da Mata Atlântica

Uma matéria do Mongabay, publicada em fevereiro de 2024, revela que a área escolhida para a construção integra o Corredor de Biodiversidade da Mata Atlântica do Nordeste e faz parte das Áreas Prioritárias para Conservação da Biodiversidade, devido à sua extrema importância biológica.

‘Os empreendimentos do polo turístico estão cercados por reservas ambientais. A maior delas é o Parque Estadual das Trilhas dos Cinco Rios, maior Unidade de Conservação urbana de João Pessoa, com uma área de 575 hectares, que abriga mais de 150 espécies da flora e 70 espécies da fauna’.

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Área de Proteção Ambiental (APA) de Jacarapé

‘Dentro, está a Área de Proteção Ambiental (APA) de Jacarapé, de remanescentes de manguezal que abriga uma comunidade pesqueira tradicional. Na parte marítima, está a APA Naufrágio Queimado, que tem aproximadamente 422 km² cuja criação tem o objetivo de proteger corais e tubarões’.

Imagem, http://www.cinep.pb.gov.br.

‘Mesmo sendo protegido por lei, o Parque Estadual das Trilhas sofrerá impactos pelas obras e pela fragmentação da mata. É o que argumenta a especialista em Ecologia e fundadora da Associação Paraibana Amigos da Natureza (Apan), Paula Frassinete, entidade que denunciou a supressão da Mata Atlântica na construção do Centro de Convenções em 2009.

Fragmentação e o isolamento dos remanescentes

Segundo o Mongabay, João de Deus Medeiros, coordenador-geral da Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA), destaca que a fragmentação e o isolamento dos remanescentes representam um dos maiores desafios para a preservação da Mata Atlântica. “Não faz o menor sentido que, enquanto existe uma campanha para restabelecer a conexão entre esses fragmentos, novos empreendimentos sejam autorizados para ampliar ainda mais a fragmentação.”

Além das regras para a supressão da vegetação, manutenção dos corredores ecológicos e o resgate da fauna, a Resolução nº 303/02 do Conama e o artigo 4º do Código Florestal determinam a preservação de no mínimo 100 metros a partir da borda da falésia em áreas com essa formação.

‘Fizeram intervenções até o limite da barreira’

Em uma vistoria realizada às obras em dezembro do ano passado, o procurador Renan Felix verificou o descumprimento dessa regra. “Existe uma rua, onde será um boulevard com acesso aos empreendimentos, em que fizeram intervenções até o limite da barreira”, relata.

De acordo com Pedro Henrique Cesar, em artigo no Brasil de Fato,  ‘o projeto prevê a destruição de uma área considerável de Mata Atlântica, o bioma mais ameaçado do Brasil. Segundo o Instituto SOS Atlântica (2023), João Pessoa possui 1.525 hectares de mata conservada (equivalente a 2.137 campos de futebol). O Polo Cabo Branco abrange uma área de 654 hectares (916 campos de futebol), ou seja, 43% da área de mata da cidade será destruída.  Esse impacto gerará graves consequências, como o assoreamento de rios, a erosão de falésias, o desaparecimento da fauna silvestre, o aumento da temperatura e da poluição, principalmente, para a área urbana, entre outros problemas’.

Governo da Paraíba dá incentivos para as obras

Procurei nos sites do governo do Estado alguma explicação sobre o corte da vegetação, mas não encontrei.

Por outro lado, descobri que a Paraíba dá incentivos para estas obras. O site oficial afirma que ‘o Governo da Paraíba, em constante atividade na promoção de políticas destinadas à atração de investimentos nacionais e estrangeiros, concede incentivos relacionados a aquisição dos imóveis, através do Programa de Incentivo Locacional, assim como incentivos fiscais para a implantação dos empreendimentos’.

‘Além disso, o Polo Turístico Cabo Branco possui uma legislação específica no que diz respeito aos tributos municipais (ISS), com incentivos da ordem de 60%‘.

É a primeira vez que vejo um governo incentivar o corte de mata nativa. O mais chocante, entretanto, é que isso acontece num Estado que até agora era referência por impedir espigões na orla, como já mostramos.

O pior é que os disparates não vêm apenas do governo, mas também da prefeitura. O prefeito de João Pessoa, ex-presidente do Sinduscon (Sindicato da Indústria da Construção e do Mobiliário do Estado da Paraíba), Cícero Lucena (PP), pretende iniciar obras de alargamento  da orla. Lucena propõe uma pista viária ligando o Cabo Branco à Ponta do Seixas por baixo, contornando a falésia.

Veja bem, Lucena quer construir uma pista de tráfego em cima da orla, contornando uma falésia ativa!! Em outras palavras, uma falésia que está desmoronando pela ação das ondas, ressacas e marés, ao custo de R$ 200 milhões de reais!

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O que diz o Governo da Paraíba

Segundo o governador do Estado, João Azevedo (PSD), “Nós temos uma gestão fiscal eficiente que tem promovido o ambiente de negócios, atraindo novos empreendimentos, a exemplo do Polo Turístico Cabo Branco, que tiramos do papel após mais de 40 anos’.

‘Somos rating A pela Secretaria do Tesouro Nacional pelo quarto ano consecutivo, geramos um milhão de empregos formais entre 2019 e 2024 e esse anúncio de hoje demonstra mais uma vez que é bom investir na Paraíba. Nós agradecemos ao grupo WAM por acreditar no nosso estado que acolhe os empresários”, frisou. , em dezembro de 2024, ‘o projeto anunciado para a Paraíba tem um valor de R$ 480 milhões de investimentos’.

O presidente da Companhia de Desenvolvimento da Paraíba (Cinep), Rômulo Polari Filho, evidenciou o impacto social e econômico do empreendimento. “Com o anúncio de hoje, são mais de R$ 2,2 bilhões injetados no Polo Cabo Branco, mais de 12 mil leitos em construção e cerca de 18 mil empregos gerados na fase de construção”, explicou.

O empreendimento estima receber cerca de 2 milhões de clientes por ano a partir de 2029, gerando faturamento estimado de mais de R$ 2,5 bilhões nos próximos 12 anos.

Entretanto, sobre o corte de vegetação em época de aquecimento global fora de controle, nem uma palavra. A ver como ficará.

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