Ocupação de dunas cobra alto preço ao litoral do RS
Neste post você vai saber as consequências da ocupação de dunas, entre outros sistemas importantes. Para começar, praias são ecossistemas sensíveis. E também vitais. No litoral começa a cadeia de vida marinha de cerca de 90% das espécies.
Esse espaço sofre ação constante de ventos, correntes, marés e ressacas. Agora, enfrenta também eventos extremos mais frequentes.

As praias não existem sozinhas. Elas dependem de um mosaico de ecossistemas associados. Dunas, restingas e manguezais garantem estabilidade. Esses ambientes formam a primeira barreira entre o mar e o continente. Sem eles, a praia perde proteção. Tudo que estiver atrás, ou ao redor delas, estará ao alcance do mar.

Do ponto de vista da geografia e da geologia, praias são móveis por natureza. Essa mobilidade sustenta o que os especialistas chamam de ‘estabilidade dinâmica’. A praia perde areia com ondas e ressacas. As dunas, restingas, e manguezais, repõem ou protegem esse material. Assim, a orla muda de posição o tempo todo, mesmo quando a mudança parece imperceptível. E quando acontece uma ocupação que desrespeita estas leis da natureza, como aconteceu no litoral norte do Rio Grande do Sul, as consequências são desastrosas.

Balneário Costa do Sol, Cidreiras, está sendo soterrado
Matéria do g1 já abre mostrando que as questões básicas, acima descritas, ainda são uma incógnita para muita gente inclusive jornalistas: ‘Uma situação curiosa vem incomodando moradores de cidades do Litoral Norte do Rio Grande do Sul: as dunas, que normalmente separam as áreas residenciais da orla, vêm avançando sobre as casas e cobrindo ruas de areia’.
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No segundo parágrafo do texto do g1 a verdade começa a aparecer, com os próprios moradores dando indicação que ao menos parte deles sabe que a ‘culpa’ é deles mesmos, e do quase sempre omisso poder público.
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Problema é de todo o litoral norte
‘A situação já foi registrada por moradores de Imbé, onde a situação preocupa às vésperas da temporada de veraneio; Tramandaí, onde o avanço levou a prefeitura a buscar autorização para obras de contenção; e Xangri-Lá, onde a passarela que liga a calçada à faixa de areia voltou a ser tomada pelas dunas. Com isso, moradores da região e internautas nas redes sociais se perguntam: a areia está invadindo as casas ou apenas voltando ao seu lugar de origem?’
Duas constatações se impõem. A primeira: a ocupação avançou apesar de todos os alertas. Hoje, uma grande área do litoral norte gaúcho sofre soterramento. O problema não atinge apenas o balneário Costa do Sol, a ocupação de dunas cobra um alto preço em toda a região.
A segunda surge na pergunta que moradores e internautas repetem. A areia não erra. A ocupação, sim.
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“As pessoas se arriscam. Constroem onde não deveriam. As dunas não prejudicam ninguém. O problema vem das pessoas que prejudicam as dunas.”
Bingo!

A dimensão do problema
Em seguida, a Folha de S. Paulo mostra a dimensão do problema. ‘A movimentação da areia ocorre há décadas em várias cidades do litoral gaúcho. O fenômeno já afeta Balneário Pinhal, Osório e Palmares do Sul’.
‘Em trechos da orla de Tramandaí, as dunas já alcançam o segundo andar de casas. A areia também soterra parcialmente imóveis próximos à praia’.
Faltou apenas explicar que ‘a movimentação de areia ocorre há décadas’ porque a ocupação irregular de campos de dunas aconteceu décadas atrás, como demonstram as imagens do Google Earth. Além disso, no litoral do Rio Grande do Sul um dos ventos predominantes é o Nordestão, que tem o nome no aumentativo para reforçar a força deste vento constante. É este conhecido dos gaúchos que, com sua violência tradicional, empurra a areia que soterra casas, ruas, e avenidas, que jamais deveriam ter sido construídas onde foram.
Para piorar uma situação já suficientemente ruim, a Folha informa que ‘o litoral norte teve um aumento populacional de 32% entre 2010 e 2022, segundo o IBGE, com crescimento acentuado após a pandemia de Covid-19’.
Balenário Quintão, Palmares do Sul
O Jornal gaúcho Zero Hora também repercutiu o caso e, mais uma vez, foi impreciso: ‘Vagarosamente e em silêncio, as dunas móveis ocupam espaços imprevistos (grifo nosso) pelos veranistas em partes do litoral norte gaúcho. Dependendo da intensidade e da contribuição do vento, da noite para o dia, acabam cobrindo ruas, calçadas e pátios. Em casos extremos, como no Balneário Quintão, pertencente a Palmares do Sul, impedem a entrada e a saída das casas e a circulação por ruas e avenidas’.

Faltou dizer que as dunas móveis ocupam de volta seu espaço natural já que muito antes destes balneários serem construídos toda a vasta área era formada por campos de dunas conforme o Google Earth.
Para encerrar, as três matérias prosseguem explicando as ações das prefeituras que aguardam licenças para mexer nas dunas tentando contê-las uma vez que são Áreas de Proteção Ambiental, APPs, proibidas de serem ocupadas pela legislação e com severas restrições de serem alteradas sem estudos prévios que justifiquem e assegurem as suas funções.
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Problemas comuns no litoral do Brasil
As matérias ignoram os problemas reais do litoral. A especulação imobiliária lidera a lista. Em muitos casos, os próprios prefeitos comandam esse processo.
O superadensamento avança de forma criminosa por quase toda a zona costeira. Cidades sem infraestrutura mínima incham de modo violento. O quadro lembra uma epidemia de obesidade mórbida.
Esse avanço nasce de mudanças escusas nos Planos Diretores. Elas surgem logo após a posse de prefeitos. Muitos recebem apoio financeiro da indústria da construção civil e do turismo.
A conta aparece rápido. Eles alteram regras de uso e ocupação do solo. Essas mudanças liberam todo tipo de crime ambiental. Entre eles, a ocupação de dunas.
O próprio Estado também participa. Ele ocupa dunas, restingas e mangues para abrir ruas, estradas e avenidas. A iniciativa privada segue o mesmo caminho. O litoral paga o preço.
A solução das inúteis engordas de praias e outras aberrações
Em geral a grande mídia também não comenta as Notas Técnicas da UFSC, por exemplo, quando elas mostram os absurdos erros, grotescos, cometidos nas inúteis engordas especialmente, mas não apenas, em Santa Catarina. Por estes motivos, ignorância de muitos, e perversão de certos mandatários, que a agressão está tomando conta de praias nordestinas como recentemente na Ponta Negra, em Natal, onde o mar invadiu a praia três meses depois da primeira engorda. E muito menos, do massacre cometido em toda a orla brasileira, despreparada e sem infraestrutura, que recebe milhões de pessoas na virada do ano, por exemplo.
Para encerrar, as matérias quase nunca abordam as soluções baseadas na natureza, as únicas que realmente funcionam, muito menos sobre as medidas possíveis para conter o excesso de turistas num local frágil por natureza como o litoral, e um problema hoje discutido mundialmente. Ao contrário, a cada nova aberração de Balneário Camboriú, quase toda a imprensa abre páginas e mais páginas para comentar uma nova engorda de praia, Piçarras está a caminho da quarta, sempre a custos milionários e sem questionamentos.
Como sempre dissemos, o litoral brasileiro está ao deus-dará, como sempre esteve.









