IPHAN nega ajuda à relíquia naval tombada

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IPHAN nega ajuda à relíquia naval tombada pelo órgão

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, criado em 1937 para preservar o patrimônio cultural nacional, nega ajuda à relíquia naval tombada pelo próprio órgão. E não pelo valor, considerado baixo para a grandeza do bem cultural em perigo, algo em torno de R$ 200 mil reais para salvar a última canoa de tolda ainda em atividade no ‘rio da integração nacional’, o São Francisco. IPHAN nega ajuda à relíquia naval tombada.

Negar, mesmo ‘obrigado’ pela Justiça

Ao negar, mesmo ‘obrigado’ pela Justiça, o órgão nega sua própria razão de existir. Nega igualmente sua missão precípua como define o site: ‘O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) é uma autarquia federal vinculada ao Ministério do Turismo que responde pela preservação do Patrimônio Cultural Brasileiro. Cabe ao Iphan proteger e promover os bens culturais do País, assegurando sua permanência e usufruto para as gerações presentes e futuras’. Repetimos: ‘proteger e promover os bens culturais, assegurando sua permanência e usufruto para as gerações presentes e futuras’.

Luzitânia, canoa tombada pelo IPHAN
As bolinas laterais foram a solução dos antigos carpinteiros navais do São Francisco depois da invasão holandesa ao Nordeste. A técnica é oriunda daquele país. Imagem, Nilton Souza.

O tombamento da última canoa de tolda em 2008

Em 2008 quando o IPHAN tinha quadros que conheciam nossa cultura e os bens culturais, entre eles Dalmo Vieira Filho então diretor do DEPAM – Departamento de Patrimônio Material do IPHAN, o órgão não só tombou algumas embarcações como a canoa de tolda Luzitânia, ao mesmo tempo em que lançou o Projeto Barcos do Brasil reconhecendo nosso rico e desconhecido (pelo público) acervo de embarcações típicas, com o objetivo de conscientizar o público, preservar e conservar o Patrimônio Naval brasileiro.

A canoa Luzitânia à época de seu tombamento pelo IPHAN
Luzitânia à época de seu tombamento pelo IPHAN.

IPHAN nega ajuda:  extinção se avizinha

Por ser dramático ao envolver a ‘extinção’ de um bem cultural de valor, vale esclarecer ao leigo, mas interessado, que por trás da decisão de ‘credenciá-las’ como bens culturais, repousa uma sugestão de técnicos, e da academia. Muito desta ‘proteção’ deve-se ao arquiteto Dalmo Vieira Filho, e seus muitos colegas, na longa e às vezes ingrata empreitada de mostrar aos brasileiros o que eles têm de bom, aquilo que os distingue de outros povos.

Dalmo, ex-presidente do Comitê Brasileiro do ICOMOS-UNESCO,  criou ainda o Museu Nacional do Mar, em São Francisco  do Sul, que tem um imenso e belíssimo acervo de embarcações, muitas das quais já extintas, em perfeitas condições ao tempo de nossa visita. Um espetáculo que este site passou a admirar e divulgar desde 2007, um orgulho para o País que deu as costas ao mar mas, ainda assim, um museu de nível dos melhores do exterior dentro de nossas possibilidades.

A mais bela e rara canoa do País

A mais bela e rara canoa do País é a derradeira canoa de tolda que foi achada imprestável por Carlos Eduardo Ribeiro. Ele fundou a ONG Sociedade Canoa de Tolda para comprá-la, restaurá-la, e mantê-la em atividade. Mas, desde janeiro de 2022, um acidente contribuiu para que a Luzitânia fosse alagada. A Chesf – Companhia Hidrelétrica do São Francisco – aumentou a vazão do São Francisco no momento em que a canoa estava aberta para reparos. Desde então ela repousa virada, deitada sobre o costado, às margens do rio.

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Canoa Luzitânia alagada
O estado da rara canoa. Imagem, Reprodução/TV Gazeta.

Como apregoa o site do projeto, ‘A manutenção da canoa de tolda Luzitânia ativa, além de preservar elemento afetivo da população das margens, também contribui para a preservação da cultura e história do Baixo São Francisco, com suas ramificações aos trechos médio e submédio do rio’.

Um apelo ao bom senso

Em 26 de janeiro, Dalmo fez um apelo ao bom senso e declarou em entrevista para uma TV:

Esta embarcação é um verdadeiro tesouro da cultura popular brasileira. Ela é um dicionário de soluções técnicas, de maneiras de construir barcos, e de navegar sobre um rio como o São Francisco. É de um valor inestimável. A perda de um bem cultural deste valor não pode se dar por mero capricho burocrático. Seria demais.

“Com o desaparecimento da Luzitânia a gente sente uma espécie de amputação cultural”

Estas foram as palavras do célebre navegador e conhecedor de nosso acervo naval, Amyr Klink, ao saber da situação da Luzitânia.

O sentimento do  Vice-Almirante Bernardo José Pierantoni Gambôa

Como homem do mar, patriota, e amante das nossas tradições navais, Gambôa, que também foi comandante do belíssimo navio-escola Cisne Branco, da Marinha do Brasil, fez questão de se manifestar:

Canoa de tolda Luzitânia é certamente uma das mais belas embarcações típicas brasileiras. Ela é parte da cultura e tradição do nosso País, fazendo parte do Baixo São Francisco, zona de grande interesse turístico nacional e internacional. A maritimidade de um povo tem bases sólidas nas suas tradições. Portanto, essa Canoa não pode ser abandonada. Salvemos a Luzitânia!!!

A decisão da Justiça

O alagamento da Luzitânia aconteceu em 18 de janeiro. Desde então Carlos Eduardo pede verbas ao IPHAN para mais uma vez salvá-la. Como não foi ouvido, decidiu acionar a Justiça.

Carlos Eduardo declarou ao g1, “Desde o início das operações da CHESF, temos alertado o IPHAN, com envio de ofícios formais, protocolados à sua presidência que, lamentavelmente, não respondeu a qualquer documento. Foi atingido o limite físico e de recursos, que não temos suficientes. Sem qualquer outra opção para o salvamento da Luzitânia, que significa um esforço de mais de vinte anos, tivemos que acionar a Justiça.”

Canoa de Tolda Luzitânia
Imagem, www.institutomarcelodeda.com.br.

Segundo o g1, “A advogada Jane Tereza Vieira da Fonseca, que coordena a equipe que moveu a ação contra o IPHAN na 3ª Vara da Justiça Federal em Sergipe, explicou que a expectativa é de que uma liminar favorável pela Justiça o mais breve possível.”

E ela não tardou. Por decisão do Juiz Edmilson da Silva Pimenta, em Ação Civil Pública ajuizada pela Sociedade Socioambiental do Baixo São Francisco, Canoa de Tolda, tendo como réu o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, IPHAN, decidiu que o órgão seja condenado a:

“Efetuar em caráter de urgência, até o dia 31/01 através de pessoal qualificado e medidas seguras, a remoção da Canoa de Tolda Luzitânia do local em que se encontra para outro seguro (inclusive de saques de terceiros), para que a mesma seja retirada da água e possa permanecer em total segurança para que ocorra processo de secagem até que ocorram as indispensáveis ações de conservação…”

IPHAN nega ajuda  e investe em advogados

O documento a que o Mar Sem Fim teve acesso é o processo Nº: 0800503-51.2022.4.05.8500. O Juiz obriga ainda que o IPHAN armazene a canoa e todo o seu equipamento em local apropriado; que realize a recuperação, por pessoal especializado e comprovadamente qualificado, a recuperação necessária; e fixou “uma multa por descumprimento das obrigações de fazer antes mencionadas, de R$ 1.000,00 por dia e por obrigação.”

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Miniatura da canoa Luzitânia
Ela também inspirou artesãos a fazerem miniaturas.  Imagem, www.westwing.com.br.

Apesar da decisão, o IPHAN decidiu contratar advogados e recorrer da decisão do Juiz Edmilson da Silva Pimenta…

Com apoio da Marinha do Brasil será que salvam a Luzitânia?

Como a situação fica cada dia mais crítica, numa derradeira tentativa a entidade Sociedade Canoa de Tolda sensibilizou a Marinha do Brasil que, através do agente fluvial da Capitania dos Portos de Alagoas lotado na cidade de Penedo, o comandante  Otávio, se dispôs a ajudar.

Oxalá a Marinha do Brasil salve a derradeira canoa que o órgão que a tombou se recusou a fazê-lo, sabe lá por quais motivos. A outra novidade é que o especialista Dalmo Vieira Filho está se dirigindo para o São Francisco para ajudar na recuperação da  embarcação.

Ele disse ao pessoal da Sociedade Canoa de Tolda que não podemos, nem devemos desistir da Luzitânia’. Saiba mais sobre as embarcações típicas da costa brasileira.

Assista ao depoimento de especialistas sobre o valor cultural da Luzitânia

A importância da canoa Luzitânia

Imagem de abertura: Sociedade Canoa de Tolda

A última orca em cativeiro do Seaquarium

Comentários

12 COMENTÁRIOS

  1. Saibamos votar melhor. Infelizmente esse não é um assunto de interesse para o atual governo. Os reflexos tomam conta de todos os seus órgãos e institutos. Paciência, que outubro é logo ali.

  2. Em 2018 e 2019, o Iphan já havia alocado recursos para manutenção da embarcação. Contudo, a responsabilidade por sua conservação, uso e gestão continua sendo do proprietário, que, nesse caso, é a Sociedade Socioambiental do Baixo São Francisco – Canoa de Tolda. Isso vale para qualquer bem tombado, seja de uso público ou privado. O tombamento também não interfere nas competências institucionais de outras esferas, como as prefeituras, governos estaduais e outras áreas do governo federal.

  3. Absurdo esse despreso pala nossa CULTURA…A Direção atual do IPHAN é uma calamidade pública. Espero que vcs consigam salvar esse Patrimonio Nacional…Espero q o Arqto Dalmo com sua experiência e conhecimento resolva essa situação…q consiga resgastar o barco e levar p o Museu do Mar.

  4. Salvo engano, o órgão é para impor restrições, não tem verba para direta para ações diretas. Como só tem “voto e veto”, sem ação, realmente cabe a pergunta – serve pra quê então?

  5. Quem conhece um pouco de Brasil e um pouco de história sabe quantos prédios e pontos históricos foram derrubados e descaracterizados em todos território nacional.

  6. Restauro é uma coisa, despesas de manutenção e/ou acidentes com a embarcação é outra coisa.
    Acho que o IPHAN deveria comprar a embarcação e preservar parada em seco em local apropriado e a disposição de interessados na história naval nacional. Isto seria mais justo para todos os lados interessados. Reformar uma barco para o proprietário continuar navegando resulta em eternos custos de manutenção que deveriam ser arcados por que faz uso do bem.
    Quem sabe uma proposta de compra no estado em que se encontra e depois o IPHAN recupera?

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