Destruir mananciais pode ser pior do que se imagina
Mananciais são extremamente importantes, não somente para o provimento de água para as populações, mas também para a manutenção da qualidade do meio ambiente que depende destes reservatórios de água. De acordo com a ONU, cerca de 25% da população mundial sofre com falta de água. Já em 1973 o mergulhador e grande divulgador dos oceanos Jacques Yves Cousteau estabeleceu em Norfolk (EUA) a Cousteau Society, uma associação dedicada à preservação dos ambientes aquáticos para as gerações futuras. Destruir mananciais pode ser pior do que se imagina, é um artigo especial para este site de Roberto G.S.Berlinck*.
Defesa dos Direitos das Gerações Futuras
Entre 1991 e 1992 Cousteau lançou uma petição de Defesa dos Direitos das Gerações Futuras. Ela foi assinada por mais de 7 milhões e 500 mil pessoas no mundo todo. Em 1997, a UNESCO promulgou a Declaração das Responsabilidades das Gerações Atuais para com as Gerações Futuras. Dentre as responsabilidades desta declaração, foram incluídas as de preservação dos recursos naturais, que inclui ambientes aquáticos e recursos aquíferos, sem os quais é impossível viver.
Destruir mananciais e a responsabilidade dos políticos e gestores
Políticos e administradores são diretamente responsáveis pela boa manutenção dos mananciais de água, em benefício das populações e do meio ambiente. A negligência no cuidado dos reservatórios de água pode levar a perdas irreparáveis no suprimento de água de boa qualidade para populações locais e regionais. Além disso, a manutenção de áreas de preservação em torno dos mananciais é absolutamente essencial para que lagos, rios e represas sejam bem conservados.
A boa manutenção é importantíssima também para o bom funcionamento de diversos “serviços do ecossistema”. Estes são “serviços” que o ambiente oferece ao homem: polinização, dispersão de espécies, reprodução da vida que afetam diretamente a qualidade da água e da atmosfera, essenciais para nós, humanos.
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O descaso com a manutenção dos mananciais pode causar inúmeros problemas. O primeiro e mais direto é a falta de água. Depois, a perda da qualidade de água, se esta for contaminada com resíduos e dejetos resultantes da atividade humana. Isso inclui lixo, esgoto, resíduos industriais, restos de material de construção e outros dejetos. Porém, um problema ainda pouco conhecido da população em geral é a eutrofização do ambiente aquático, que resulta do acúmulo de substâncias utilizadas principalmente em atividades agrícolas, que causa aumento de nutrientes em reservatórios de água.
Uma das piores consequências da eutrofização é a proliferação de algas de maneira descontrolada, que acaba por cobrir a superfície da água, impedindo a luz e o oxigênio se difundir para o ambiente aquífero, causando a morte de peixes e outros seres aquáticos. Associado à proliferação das algas ocorre um problema muito mais sério: a contaminação da água por toxinas extremamente tóxicas, produzidas por diferentes algas de água doce.
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Toxinas de algas de água doce são mortíferas
Nos anos 1980 pesquisadores dos Estados Unidos e da Austrália começaram a investigar casos de envenenamento de gado pelo consumo de água de reservatórios. Descobriram que algas chamadas de cianobactérias, ou bactérias fotossintetizantes, eram capazes de produzir toxinas extremamente nocivas. Principalmente as cianobactérias Microcystis e Cylindrospermopsis, mas também Anabaena e muitas outras, produzem toxinas que afetam irreversivelmente o fígado, tecidos nervosos, causam câncer e levam à morte.
Um dos casos mais famosos de envenenamento por toxinas produzidas por Microcystis ocorreu em Caruaru (PE) em 1996, quando água contaminada não foi descontaminada antes de ser utilizada em uma clínica de hemodiálise. Resultado: TODOS os pacientes que então faziam hemodiálise morreram. Alguns em pouco tempo. Outros de câncer, tempos depois.
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As toxinas de cianobactérias de água doce são, na sua maioria, pequenas proteínas modificadas, chamadas de peptídeos não-ribossomais. Normalmente as proteínas de todos os organismos vivos são “fabricadas” nas organelas celulares chamadas de ribossomos. Os peptídeos não-ribossomais são “fabricados” por aglomerados de enzimas, que “fabricam” estes peptídeos de maneira diferente, modificando-os e tornando-os muito distintos das proteínas “normais”.
Por isso, muitos peptídeos não-ribossomais apresentam atividade tóxica, para células, outras bactérias e são potentes inibidores enzimáticos. Causam inúmeros problemas, como ação tóxica no fígado, nos nervos, no sistema circulatório, insuficiência renal e até câncer. Estudos mais recentes demonstram que estas toxinas também afetam o aprendizado e a memória, podendo causar a terrível doença de Alzheimer.
Quais são as principais toxinas de cianobactérias de água doce?
A microcistina, produzida por cianobactérias do gênero Microcystis, a cylindrospermopsina, produzida pela cianobactéria Cylindrospermopsis raciborskii, a anatoxina produzida por cianobactérias do gênero Anabaena, e a saxitoxina, produzida por diferentes cianobactérias, são algumas das cianotoxinas mais comuns e perigosas. Estima-se que quase metade dos reservatórios de água doce do mundo todo apresentem cianotoxinas tóxicas para o consumo humano e animal. E no Brasil não é diferente.
O que fazer para evitar a proliferação de algas tóxicas?
Várias ações são possíveis para se evitar a eutrofização e contaminação de mananciais de água por algas venenosas. Evitar que as atividades agrícolas contaminem estes reservatórios é extremamente importante. As populações que habitam o entorno de regiões com mananciais devem estar sempre atentas às atividades agrícolas ali sendo desenvolvidas.
Além disso, o despejo de resíduos e dejetos não deve ocorrer nunca. Para isso, não pode haver habitações nos arredores de mananciais e reservatórios, para se evitar que as atividades humanas causem danos a estes ambientes (Bem diferente do ocorre nos mananciais de São Paulo).
Ação consciente e gestão responsável
A população diretamente afetada pela qualidade da água de reservatórios e mananciais deve atuar de maneira a cobrar de gestores e políticos uma legislação e atuação responsável, que preserve os ambientes aquíferos, extremamente preciosos para a garantia da qualidade de vida. É necessário se informar sempre sobre o que políticos e administradores realizam para proteger estes ambientes de água doce, para que a qualidade da água esteja sempre muito boa (Saiba o que fez o indicado ao PT para a prefeitura de São Paulo, Jilmar Tatto).
É necessário estar sempre muito atento. Senão, muitos problemas podem ocorrer, principalmente sérios problemas de saúde. Água boa é sinônimo de saúde e meio ambiente preservado.
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O autor de Destruir mananciais pode ser pior do que se imagina
Roberto G.S. Berlinck: Bacharel em Química pela Universidade Estadual de Campinas (1987), doutor em Ciências (Química Orgânica) pela Université Libre de Bruxelles (1992). Professor Doutor (1993-2001), Associado Livre Docente (2001-2010) e Titular (desde 2011) junto ao Instituto de Química de São Carlos (IQSC) da Universidade de São Paulo (USP).
Foi professor visitante no Departamento de Química e de Ciências da Terra e dos Oceanos da University of British Columbia (Vancouver, Canadá) entre 1997 e 1998, no Departamento de Química Medicinal da University of Utah (Salt Lake City) em 2002 e no Life Sciences Institute da University of Michigan (2012 e 2014-2515).
Atua como docente e pesquisador em química orgânica, e coordenador do Grupo de Química Orgânica de Sistemas Biológicos (QOSBio).
Imagem de abertura: Felipe Rau / Estadão
Total falta de ações imediatas e profundas; provavelmente medo por ter que confrontar determinados interesses e por em risco o cacife eleitoral. Assim são nossos políticos, permitindo a perpetuação deste crime contra a população, que seguem sem qualquer determinação das altas esferas da justiça para que os danos sejam combatidos e revertidos com prioridade e estabelecimento de prazos mínimos. Ao que parece não dá holofotes como os temas que andam frequentando as atuais manchetes.
A represa do Guarapiranga – Zona Sul, sempre esteve em risco, seja pelo clima ou atuação de Jilmar Tatto que se fez deputado do PT ao facilitar a ocupação da margens da represa.