Novo porto em São Francisco do Sul gera polêmica
Portos são essenciais para a economia, criam empregos e renda, e o Brasil precisa deles. Mas a construção do Porto Brasil Sul na Baía da Babitonga gera polêmica. A região, um hotspot de biodiversidade, já tem dois portos: o Porto de São Francisco do Sul e o Porto Itapoá. A disputa envolve a comunidade, ambientalistas, políticos locais e empresários. O novo porto será o maior do Sul do Brasil e o quinto maior de cargas do País, com sete terminais e oito berços, planejando movimentar 20 milhões de toneladas por ano. A crítica principal é a sua localização nas praias do Forte e Sumidouro, áreas de grande biodiversidade e beleza natural, consideradas para se tornarem um Parque Natural Municipal.
Quatro empreendimentos portuários na Babitonga
Além do Porto Brasil Sul, a Baía da Babitonga pode ganhar mais três portos: Terminal Graneleiro da Babitonga, Terminal Marítimo Mar Azul e Terminal de Granéis de Santa Catarina. Segundo o NSC Total, apesar de alguns projetos serem antigos, ainda não há datas confirmadas para o início das operações. Análises detalhadas são necessárias, e a aprovação dos órgãos ambientais é crucial. Essa etapa é vital para proteger o ecossistema da baía, evitando impactos negativos na vida e reprodução de espécies ameaçadas.
Se todos de fato saírem do papel, a Babitonga contará com seis portos, um recorde para qualquer baía do País. Além disso, São Francisco do Sul é uma ilha, e ilhas são ambientes frágeis por natureza, da mesma forma que são importantíssimas para a biodiversidade em razão, entre outras, do endemismo.
Os opositores do projeto destacam que o prefeito Godofredo Gomes Moreira Filho (MDB) prometeu se opor ao projeto durante sua campanha e mantém essa posição. Eles defendem que a área do Sumidouro deve ser preservada para as atuais e futuras gerações. O Conselho Municipal expressou oposição ao projeto e a população, durante a revisão do Plano Diretor, votou contra a construção de mais portos no município.
Os delegados das localidades, escolhidos para revisar o Plano Diretor, votaram em sua maioria contra o zoneamento favorável ao Porto Brasil Sul. Argumentam ainda que o Plano Municipal da Mata Atlântica designou a área como de Preservação Ambiental, segundo a Lei 763 de 1981, artigos 2º e 23º. Isso cria um fundamento forte para negar a Certidão de Viabilidade, já recusada anteriormente.
O que dizem os contrários
Eles alegam que a construção do porto vai implicar na terraplanagem de uma área de 115ha, sendo que 114,43ha são cobertos por Mata Atlântica, protegida por lei, formada por manguezais e restingas, ambas igualmente protegidas pela legislação ambiental, consideradas Áreas de Preservação Permanente.
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No momento em que o mundo sofre graves problemas pelo descontrole do aquecimento global é bom lembrar que 1 ha de manguezal sequestra quatro vezes mais dióxido de carbono do que a mesma porção de floresta tropical. Manguezais são ainda a principal fonte de subsistência das comunidades costeiras.
Aquecimento global, eventos extremos, e manguezais e restingas
Para além disso, mangues são o segundo mais valioso berçário marinho depois dos corais. Entre seus serviços ecossistêmicos, estão a prevenção à erosão e a contribuição para melhorar a qualidade da água do mar. Mangues e restingas são fundamentais como estabilizadores da linha da costa, protegendo-a contra a erosão acirrada por eventos extremos e a subida do nível do mar. Foi por decepar ambas que hoje Florianópolis enfrenta um severo problema de erosão costeira, deixando centenas de desabrigados e provocando prejuízos milionários aos cofres públicos.
Além disso, a área escolhida para a construção do porto é uma das mais belas do litoral catarinense e ainda prístina, ou seja, sem ocupação humana. Todos esses atributos fazem com que esta parcela da população, com apoio do prefeito Godofredo Gomes Moreira Filho (MDB), prefira transformá-la em Parque Municipal Natural. Nesse sentido, o prefeito já enviou um ofício ao Superintendente do Patrimônio da União, requerendo a área em disputa “para a criação de Unidade de Conservação denominada Sumidouro”.
Esta parcela da população reitera em suas publicações que “não são contrários ao progresso de São Francisco do Sul. Queremos a sustentabilidade e o desenvolvimento social sem prejuízo ao meio ambiente e seus moradores”.
Ofícios também foram enviados ao Presidente do Conselho Municipal de Meio Ambiente, pedindo a criação da Unidade de Conservação. Além da AMECA – Associação Movimento Ecológico Carijós -, assinaram o documento a AMPIU – Associação de Moradores da praia de Itamirim de Ubatuba, Instituto Restinga, ACEA – Associação Comunitária da Enseada de Acaraí, AMOEF – Associação de Moradores da estrada do Forte, e Instituto Babaétoungá.
A falta de infraestrutura de São Francisco do Sul
Além de todas as questões ambientais envolvidas, os contrários alegam que ‘já têm graves problemas de acesso na federal BR 280, aliás há uns 20 anos não temos o direito de ir e vir a hora que necessitamos’. Dizem ainda que ‘o atual tráfego de acesso ao porto público’, que será aumentado, ‘bloqueia toda a cidade e acesso aos balneários’.
Afirmam ainda que ‘o acesso ao porto público não tem acostamentos, ou via para passagem dos moradores’. Além disso, demonstram a pouca infraestrutura de São Francisco do Sul, ‘sem água para todos, sem sistema de tratamento de esgoto’, denunciam ‘a contaminação do solo e subsolo de alguns balneários’. Por fim, dizem que ‘o sistema de transportes é de péssima qualidade, há problemas no sistema de saúde para atender a população flutuante; a via de acesso para o terreno proposto para o Porto Brasil Sul é de via simples sem acostamento ou calçadas, não há outra via a não ser se fizerem atravessando grandes áreas de mangue’.
Atrativos ambientais da Baía da Babitonga
Antes de mais nada, a Baía da Babitonga é a única no mundo a registrar um grupo de toninhas residentes. Esta espécie de golfinho, a menor delas, vive apenas na costa leste da América do Sul, entre o Espírito Santo, no Brasil, e o Golfo San Matias, na Argentina, e está ameaçada de extinção.
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O estuário da Babitonga abrange 14 ilhas, onde rios encontram o mar, estendendo-se por cerca de 160 km² de superfície aquática. Serve de habitat para várias espécies ameaçadas de extinção e representa o principal estuário de Santa Catarina para a reprodução de 70% das espécies alvos da pesca comercial e recreativa. Além disso, abriga 75% dos manguezais do estado.
Na região, os manguezais favorecem a vida de crustáceos e também de aves, como o colhereiro e o guará. “Muitos animais entram aqui na baía para ter os seus filhotes”, comenta a bióloga Annelise Colin Holz.
Baía da Babitonga é habitat de espécies ameaçadas de extinção
Para piorar, a baía também é habitat de outro animal ameaçado de extinção, o mero. O peixe é a maior espécie de garoupa do Oceano Atlântico, e, devido à destruição de seus habitats, sobrepesca e poluição, sofreu um declínio muito significativo nos últimos 65 anos. Trata-se de uma das maiores espécies de peixes ósseos. Pode atingir cerca de 400 kg e 2,5 m de comprimento. Mas o mero não é o único habitante ameaçado da Babitonga, o boto-cinza e a tartaruga-verde são outros dois.
Na Baía de Babitonga, os sambaquis surgiram entre cerca de 6.000 mil e 1.000 anos atrás. O legado arqueológico deixado, no entanto, é grande. São mais de 170 sítios de sambaquis na região. A baía tem a maior concentração de montes de conchas e intermediários pré-colombianos. A comparação é com o restante do litoral brasileiro.
O que dizem os favoráveis ao porto
Em 2020, o Porto Brasil Sul não conseguiu a Licença Ambiental Prévia do IMA. Marcus Barbosa, CEO do porto, afirmou que o projeto é crucial para a competitividade de Santa Catarina e o desenvolvimento de São Francisco do Sul. Ele mencionou que o parecer técnico é passível de recurso devido à sua base técnica e legal sólida.
Barbosa se surpreendeu com a decisão do Estado de Santa Catarina de barrar um projeto de R$ 5 bilhões que criaria 3 mil empregos diretos. A BIOECO descreveu o projeto como um Hub Port do Mercosul, pronto para receber grandes navios Post Panamax, as maiores embarcações de carga do mundo, com capacidades para até 18 mil TEUs e 220 mil toneladas, após obras de adaptação.
Segundo a consultoria e engenharia ambiental, BIOECO, durante a construção, de cinco a seis anos, o projeto criará 2,4 mil empregos diretos. A KPMG prevê 36 mil empregos diretos e indiretos até 2030, com o porto operando plenamente. A BIOECO destaca que o Porto Brasil Sul será o primeiro green port da América Latina, comprometido com a preservação dos ecossistemas locais.
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Primeiro green port da América Latina?
O Mar Sem Fim faz uma observação: dizer que este porto será o primeiro Green Port da América Latina soa como greenwashing, em outras palavras, não corresponde à verdade. Pode até ser um desejo da empresa, mas daí a dizer que será um Green Port vai um longo caminho. Como dissemos no início, portos são importantíssimos para a economia, contudo, são obras que geram grande impacto ambiental. Não há como construir um porto sem uma grande perda ambiental.
Para receber as maiores embarcações de carga do mundo haverá a necessidade de dragagem, por exemplo. E as dragagens geram erosão, escorregamento, assoreamento, adensamento, inundações e contaminação das águas.
Navios, bioinvasão, poluição do mar e do ar e sonora
Além disso, mais navios numa baía significam maior perigo de bioinvasão por água de lastro, mas não apenas. Despejo de efluentes é outro problema, além da poluição sonora extremamente prejudicial à vida marinha. Outro problema inevitável é a poluição do ar, já que navios usam como combustível uma espécie de borra do refino do petróleo tão poluente que vários países da Europa restringiram a entrada de navios de cruzeiro.
‘O transporte marítimo mundial tem um segredinho sujo’, disse a revista Forbes. ‘Ele subsidia toda a indústria do petróleo. O óleo queimado nos navios é aquilo que a indústria do petróleo não sabe o que fazer. É o lodo do final do processo de refino’.
Portanto, mesmo que as empresas envolvidas queiram ser verdes, não o serão porque simplesmente é impossível em se tratando de mais navios. Por último, basta olhar a ilustração da imensa obra para perceber que um local ainda prístino, e de uma beleza sem igual, será parcialmente destruído pela obras.