Naufrágio do litoral brasileiro se avizinha por atos do governo
Primeiro um senador sem partido foi até as redes sociais para dizer que ‘estava destravando a legislação ambiental’, que provou desconhecer, para autorizar navios de cruzeiro a fundearem em Fernando de Noronha onde também pretende afundar 12 barcos para criar recifes artificiais. Ninguém, a não ser ele, entendeu. Ambas as ideias não fazem qualquer sentido. Fernando de Noronha é um parque nacional marinho que deveria ser protegido devido a sua biodiversidade. Ali, acaba de ser descoberto novo banco de corais naturais. Navios são máquinas de poluição imbatíveis. Os grandes, de cruzeiro, poluem tanto quanto cerca de 80 mil automóveis! E a grande maioria descarta lixo no mar, mesmo em áreas protegidas como já foi flagrado. Fora o excesso de turistas. Avizinha-se, por absoluta falta de bom senso, o naufrágio do litoral brasileiro já suficientemente maltratado.
Dias depois, novo ataque. Os jornais trouxeram a notícia que os naufrágios não se restringem apenas a Noronha. A nova ideia é provocar 73 naufrágios artificiais nos principais pontos turísticos do litoral brasileiro. Grande parte deles, em áreas de proteção ambiental pelo motivo já explicado. Enquanto as novidades se disseminam pelas redes sociais o ministro, encarregado da pasta por que fala o senador, não se manifesta. Afinal, quem determina as políticas do País, ministros de Estado, ou os filhos do presidente?
Ideias sem sentido
Elas povoam a cabeça não só do Presidente, mas especialmente, dos filhos. Alguns, como o senador, enrolados com acusações de crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Em vez de se preocuparem com os reais problemas brasileiros, como o desemprego de 12 milhões de brasileiros, um PIB insignificante após o primeiro ano de governo, ou as reformas que sequer foram enviadas ao Congresso, a família se deleita nas redes sociais. O pai diz em ‘live’ que a imprensa não o deixa trabalhar, e explica que é por isso que ainda não conseguiu aprovar proposta para ‘transformar a validade da carteira de habilitação de cinco para dez anos’. São ‘problemas’ deste porte que povoam a cabeça do Presidente.
Ao que parece, os filhos também não têm o que fazer. O senador, enrolado com milicianos que faz questão de premiar, decide por que decide, liberar navios de cruzeiro num arquipélago protegido. Será que o Senado está tão parado que não há nada mais útil a fazer? Não satisfeito, agora pretende torpedear de vez o litoral brasileiro. Com que autoridade ou instrução, não se sabe.
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O Estado de S. Paulo, 6 de março de 2020: “Sem ter qualquer tipo de norma ambiental estabelecida, o governo pretende fazer 73 naufrágios artificiais nos principais pontos turísticos do litoral brasileiro…A maior parte das localidades pretendidas é área de proteção ambiental, com regras rígidas de controle da biodiversidade.”
O jornal explica como conseguiu a informação: “O Estado teve acesso a um documento interno da Marinha, que analisou cada uma das localidades pretendidas pelo governo. O documento, de 11 de fevereiro, é uma resposta à Secretaria de Turismo do Ministério do Meio Ambiente. A análise da Marinha não passa pelo impacto ambiental, limitando-se a avaliar se esses recifes artificiais poderiam interferir na segurança da navegação, levando a riscos barcos que passem pelo caminho.
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‘Nenhum projeto tem licenciamento ambiental’
O jornal frisa que “as normas ambientais que regulavam a criação de recifes artificiais foram extintas pelo Ibama em junho de 2019 e, desde então, nada foi colocado no lugar. Na prática, portanto, não há hoje nenhum tipo de regulação sobre como esse tipo de iniciativa deve ser licenciada no País.”
Já criticamos o ministro do Meio Ambiente que até ser ungido ao cargo jamais teve curiosidade de conhecer a Amazônia. Por aí se vê o quão preparado Ricardo Salles é para o cargo que já foi de titãs como Paulo Nogueira Neto, José Goldemberg, e Zequinha Sarney, entre outros. Salles desmonta a legislação sem oferecer alternativa. Por isso ‘as normas que regulavam a criação de recifes artificiais foram extintas’ e, em seu lugar, nada foi sugerido. É o deus-dará total para o litoral.
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O País tem excelentes profissionais públicos, professores da academia que passam a vida estudando estas, e outras questões relacionadas ao bioma marinho. Gente respeitada mundo afora. Mas não pela atual administração que, ciente de sua pequenez intelectual, em vez de procurá-los e pedir auxílio, prefere demonizar e exonerar os que mais se destacaram. Caso do cientista Ricardo Galvão, posto na rua de forma covarde ao avisar que o inevitável aconteceria: as queimadas na Amazônia iriam crescer, alertou.
Galvão saiu. Como prêmio por seu belo trabalho, e solidariedade internacional, meses depois foi eleito como um dos dez mais importantes cientistas do mundo por nada menos que a revista Nature, um ícone mundial da ciência. E o que ele dizia se concretizou. O desmatamento subiu quase 30% na comparação de 2019 com 2018. Como resultado, o meio ambiente foi o tema preponderante na reunião do Fórum Econômico Mundial, de Davos, onde se reúnem os maiores investidores mundiais. O premeditado descaso com a Amazônia reforçou a decisão dos maiores fundos de investimentos que deixaram claro: ou o Brasil muda a política de meio ambiente, ou não haverá investimentos no País.
Recifes artificiais na costa brasileira
Em princípio, a ideia de criar recifes artificiais com afundamentos de navios é bem-vinda. Mas desde que haja suporte técnico às decisões. Coisa que parece não haver neste caso a julgar pela matéria do Estadão, e de outros importantes veículos de comunicação que noticiaram a nova ideia oriunda não se sabe se da cabeça do senador, ou do ministro do Meio Ambiente que anda calado.
Naufrágio do litoral brasileiro: Instrução Normativa do Ibama Nº 125, de Outubro de 2006
A instrução é bem feita, e considerada boa pelos principais acadêmicos do tema, como Frederico Brandini, ex-diretor do Instituto de Oceanografia da USP, e primeiro pesquisador brasileiro a provocar um afundamento estudado (de barras de concreto) no litoral do Paraná, na década de 2000. Foi por causa deste afundamento que surgiu a instrução normativa do Ibama, Nº 125.
Recifes artificiais também impedem a malfadada pesca de arrasto que o presidente, sem qualquer conhecimento das coisas do mar, defendeu quando o Estado do Rio Grande do Sul a restringiu a menos de 12 milhas da costa no ano de 2019.
Acontece que, como sempre tem feito, o arrogante ministro que anda calado detonou a instrução normativa Nº 125 e nada colocou em seu lugar. Fica portanto a dúvida, como, com quais critérios, serão feitos estes afundamentos?
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Os perigos do afundamento de navios
O artigo três da norma que Ricardo Salles detonou dizia: “A implantação de recifes artificiais no interior ou zona de amortecimento de Unidades de Conservação estará condicionada à anuência do órgão responsável por sua administração e da chefia da unidade afetada, respeitando as diretrizes estabelecidas no plano de manejo.”
Os afundamentos divulgados pelo senador serão dentro do Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha que, como dissemos, acaba de ter um novo banco de corais naturais descoberto. Os outros 73 divulgados pelo Estado, muitos deles também estão previstos para acontecerem em áreas de proteção ambiental, e possivelmente, próximos dos recifes naturais do Nordeste. A pergunta que fica é, quem dará “anuência do órgão responsável por sua administração e da chefia da unidade afetada, respeitando as diretrizes estabelecidas no plano de manejo” já que a norma que estabelecia as regras foi detonada pelo sabe-tudo que anda calado?
Naufrágio do litoral brasileiro: recifes artificiais próximos aos naturais
Segundo o Estadão, “Em Alagoas, foi dado aval para naufrágios em Maragogi (8) e São Miguel dos Milagres (6). Na Bahia, os alvos são as praias de Salvador (8) e Praia do Forte (1). Na Paraíba, o plano é fazer 10 naufrágios no litoral de João Pessoa. Pernambuco, Porto de Galinhas (9 naufrágios) e Paulista (8 naufrágios)”
Maragogipe é local de recifes naturais, assim com a praia do Forte, na Bahia, ou Porto de Galinhas, em Pernambuco. No litoral de João Pessoa o jornal não identifica os locais, portanto ainda não se sabe se estão próximos, ou não, dos naturais.
Os barcos a serem afundados devem ser pré-preparados, e os locais, estudados
Segundo a instrução normativa detonada, os barcos devem ser minuciosamente preparados antes do afundamento, sob o risco de causarem mais problemas que soluções. É preciso limpá-los cuidadosamente, abrir furos de tamanhos diversos no caso para a entrada de luz e oxigenação, fundamentais para o crescimento de recifes, etc. Além disso, o local do afundamento também exige estudos sobre as correntes marinhas, e a posição em que o naufrágio ficará. Mas o senador falastrão nada disse a este respeito. Portanto, são mais perguntas sem respostas.
Outra questão que preocupa, é o afundamento de outros suportes que não navios, os únicos indicados para a criação de recifes artificiais, desde que a preparação, e os estudos sejam feitos, e bem feitos. Mas, diz o jornal, “O Estado apurou que o Exército foi consultado pela Embratur sobre o tipo de maquinário que teria à disposição, para ser depositado no fundo do mar. Em resposta, declarou que possuía uma viatura com lança-míssil e dez canhões antiaéreos que poderiam ser naufragados.”
Permita o bom senso que o senador não se encante com ‘viaturas com lança-míssil e dez canhões antiaéreos’. Seria um absoluto desastre se acontecer. Entre outros, estes afundamentos podem ser altamente tóxicos para o meio ambiente, e inócuos para a criação de recifes.
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Naufrágio do litoral brasileiro: espécies invasivas atraídas
Como este site já alertou, o plano do governo federal de fazer 12 “naufrágios artificiais” de embarcações no mar de Fernando de Noronha, traz riscos de levar para a região uma espécie invasiva que afeta completamente a biodiversidade por onde passa. O alerta é de especialistas que estudam a proliferação no Brasil do chamado “coral-sol”, uma praga do mar que acaba com tudo o que encontra ao redor.”
Por que o detentor da cadeira de meio ambiente anda calado?
Talvez porque sua cabeça tenha sido pedida ao presidente, e não pelas demonizadas ONGs, mas pelo detentor da cadeira de economia, Paulo Guedes. O ministro da Economia voltou de Davos horrorizado com o que ouviu dos responsáveis pelos maiores fundos de investimentos que deixaram claro que não porão um centavo de dólar no Brasil enquanto perdurar a política de desmonte do MMA e consequente aumento das queimadas como se viu no período 2019 comparado a 2018, com aumento de cerca de 30%. E imediatamente ao chegar ao Brasil, esteve com Jair Bolsonaro quando sugeriu a demissão do neófito criador de crises internacionais.
Desde então, um senador ‘enrolado com milicianos’ avança sobre o ministério de Meio Ambiente e solta a verve sobre questões ambientais. Com quais direitos, ou conhecimento de causa, não se sabe.
Até quando persistirá o samba do crioulo doido no Poder Executivo?
Imagem de abertura: https://hdclump.com/.
Fontes: https://sustentabilidade.estadao.com.br/noticias/geral,sem-regra-ambiental-plano-de-bolsonaro-e-fazer-73-naufragios-artificiais-no-litoral,70003222475.