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Licenciamento Ambiental Municipal, passada da boiada aprovada pelo CONSEMA

Licenciamento Ambiental Municipal, passada da boiada aprovada pelo CONSEMA

O governo do Estado acaba de jogar a pá de cal que faltava para enterrar o litoral. Por meio do CONSEMA – Conselho Estadual do Meio Ambiente – definido como ‘o principal órgão consultivo, normativo e recursal integrante do Sistema Ambiental Paulista,  e de fato é mesmo, que acaba de aprovar o Licenciamento Ambiental Municipal. Assim, ‘novos empreendimentos que possam causar impacto ambiental localizado poderão ser licenciados pelos próprios municípios do Estado de São Paulo, ou por consórcios intermunicipais’. Em outras palavras, isso significa que os prefeitos de municípios costeiros estão livres, leves, e soltos, para aprovarem qualquer obra que lhes dê na veneta, sem prestar contas ou necessitar de aval de uma entidade superior. Como a maioria dos alcaides são grandes aliados da especulação imobiliária, a perigosa decisão é, na visão deste site, o início do fim do litoral tal qual o conhecemos.

Favelização da serra do Mar.
Entre as consequências do projeto de Tarcísio de Freitas está o aumento  da favelização na serra do Mar. Acervo MSF.

Reserva da biosfera da Mata Atlântica se manifesta contrária

O atual governador busca há tempos se desfazer do que vê como um problema, um ‘abacaxi’ em suas mãos. Em fevereiro de 2022, divulgamos o alerta CONSEMA, e ato temerário sobre Licenciamento Ambiental. Essa discussão prenunciava o que agora se oficializa. A questão se resume a duas possibilidades: ou uma grande falta de conhecimento sobre o litoral paulista, ou uma escolha consciente e desonesta.

A ANAMA, Associação Nacional dos Órgãos Gestores Municipais de Meio Ambiente, comandou o processo de mudança nas reuniões do conselho. Alguns ambientalistas do conselho do CONSEMA, em menor número, denominaram essa ação como ‘rolo compressor’, e questionam a legitimidade e legalidade do Estado ter dado à ANAMA a coordenação do processo de licenciamento ambiental municipal, justamente uma  associação formada para defender os interesses dos gestores dos municípios. Existe claramente um conflito de interesses intrínsecos que impedem a imparcialidade na condução e  decisões.

Até agora, ‘à CETESB cabia o licenciamento ambiental. Empreendimentos em Unidade de Conservação ou em sua zona de amortecimento. A CETESB avalia tecnicamente os possíveis impactos da intervenção, considerando os atributos ambientais e normativas da respectiva Unidade de Conservação, instando a Fundação Florestal a se manifestar, a depender do caso concreto’, assim explica o site da SEMIL.

Má fé do governo do Estado

Só pode ser má fé, ou muita falta de lucidez, fazer isso em pleno descontrole global do aquecimento do planeta, que gera milhares de mortos por ano e prejuízos bilionários por conta dos eventos extremos, como já percebeu o governador paulista. E ainda por cima, quando a mais que anunciada tragédia do carnaval em São Sebastião, que matou 65 moradores soterrando-os, completa um ano!

Entre muitas propostas pertinentes os ambientalistas, que conhecem a realidade do litoral e as consequências das tragédias climáticas na região, solicitaram a inclusão de ao menos um parágrafo ou frase para que as autoridades municipais consultassem os mapas de risco durante novos licenciamentos. Esses mapas indicam áreas suscetíveis a alagamentos, deslizamentos, etc. Porém, nem essa medida mínima foi aceita. É um circo armado, dizem nossas fontes.

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O governador Tarcísio de Freitas simplesmente trocou  a negligência e a tolerância com as questões do litoral pelo apoio dos prefeitos a seus planos políticos. Em outras palavras, colocou a raposada insaciável para tomar conta do galinheiro. Para isso, comprometeu um bem ambiental, social e cultural valioso para os paulistas, demonstrando pouco interesse pelo bem-estar da população.

A tragédia de São Sebastião em 2023 se repetirá

Os ambientalistas salientaram que no recente caso da tragédia de São Sebastião  existiam cartas de suscetibilidade a riscos fornecidas pelo próprio governo do Estado alertando sobre os perigos geológicos. Acontece que elas foram ignoradas pelos prefeitos que preferem incentivar a urbanização irresponsável e desordenada, se não criminosa. A tragédia e a perda de vidas poderiam ter sido evitadas. Infelizmente o Estado, através do CONSEMA, pretende acentuar e perpetuar essa irresponsabilidade com o licenciamento ambiental municipal.

Rio Tavares, Ubatuba, um esgoto a céu aberto que deságua na praia de Itaguá que nunca tem condições mínimas de balneabilidade. Acervo MSF.

Ilhabela está prestes a receber uma nova carta de suscetibilidade a riscos, atualizada e com maior precisão, mas com o andar da carruagem o prefeito vai ignorá-la como já fez anteriormente, e agora com a conivência do CONSEMA chancelado pelo Estado.

Maioria do conselho vota com o governo

A verdade é que a maioria dos membros do conselho do CONSEMA vota com o governo estadual. Isso leva à conclusão de que interesses políticos influenciam a aprovação dessa nova e contestada medida, só isso justificaria impor tal risco ao litoral.

Os defensores da zona costeira no conselho do CONSEMA, particularmente aqueles ligados em questões ambientais, previram a liberalização excessiva das regras. Eles já haviam expressado essa preocupação três meses antes, durante um encontro do conselho mundial da Reserva Mundial da Biosfera, em Natal, RN. Lá, apresentaram uma moção contra o modelo de licenciamento em discussão,  unanimemente aprovada.

A Reserva, uma iniciativa da UNESCO, atua como um polo de monitoramento, pesquisa, educação ambiental e gestão de ecossistemas, como o da Mata Atlântica, que se estende pelo litoral de São Paulo. Funciona também como um centro para a informação e o aprimoramento profissional dos técnicos responsáveis por seu manejo. Além disso, é como um ‘selo’ da UNESCO para biomas de importância crucial para o planeta.

Quem paga a conta é a população nativa que perde qualidade de vida

A decisão estapafúrdia de Tarcísio de Freitas (Republicanos) não atinge os ambientalistas. Mas ela afetará ainda mais a qualidade de vida das populações nativas do litoral, os cidadãos comuns que sofrerão mais uma perda na decrescente qualidade de vida. É igualmente possível que  a novidade traga outra consequência, a desvalorização dos imóveis em razão da degradação social e ambiental inevitável.

Encontrar um profissional qualificado para licenciamentos já é um desafio na CETESB. Agora, pense na qualidade dos licenciamentos feitos pelas prefeituras, muitas vezes influenciadas pela indústria da construção civil e por prefeitos envolvidos em especulação imobiliária.

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Ao fomentar a indústria da construção civil, e liberar os prefeitos ao vale-tudo, condomínios sobre restingas, como este na praia da Baleia, vão proliferar. Acervo MSF.

Licenciamentos tendenciosos e conflitos de interesse ameaçam ecossistemas vitais como mangues e restingas. Estes, são essenciais para proteger a costa mas sempre são os primeiros a sofrerem com a especulação. Estamos convictos de que esta nova medida aumentará a erosão no litoral paulista.

“A maior passada da boiada da história do litoral”

Esta decisão significa a “maior passada da boiada” que já aconteceu na história do litoral. Tarcísio de Freitas aprendeu bem a lição de seu ex-colega de ministério, Ricardo Salles. Não à toa, o Brasil da gestão anterior era tido como um país pária.

E note, leitor, que ainda falta uma reunião de conselho do CONSEMA para o martelo bater definitivamente, reunião prevista para 8 de fevereiro, no auditório da SEMIL – Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística. Estas duas audiências públicas trabalham para normatizar a decisão que já foi tomada. Porém, mesmo com o ‘rito’ ainda não concluído, a própria SEMIL  confirmou o Licenciamento Ambiental Municipal.

Conselho do CONSEMA: atribuição e formação, segundo o governo

De acordo com o governo, o CONSEMA conta com 36 membros. Metade vem de órgãos governamentais e a outra metade, da sociedade civil. Cada membro serve por dois anos, com a possibilidade de renovação por mais dois.

Entre os 18 membros da sociedade civil, seis representam ONGs ambientais registradas na Secretaria de Meio Ambiente. A cada dois anos, essas ONGs se juntam para eleger seus seis representantes e seis suplentes.

Ilhabela que se prepare para novas ‘urbanizações’ como a da foto. Acervo MSF.

Ainda segundo o site do governo, ‘as atribuições vão desde a avaliação e acompanhamento da política ambiental, no que se refere à preservação, conservação, recuperação e defesa do meio ambiente, passando pelo estabelecimento de normas e padrões ambientais, até a convocação e condução de audiências públicas e, sob determinadas circunstâncias, a apreciação de EIAs/RIMAs – Estudos e Relatórios de Impacto sobre o Meio Ambiente’.

50% dos votos para cada lado, uma meia verdade

Dizer que ‘metade (dos conselheiros) vem de órgãos governamentais e a outra metade, da sociedade civil’, como faz o site do CONSEMA, é uma meia verdade. A maioria acaba sendo o mesmo que ‘do governo’, porque são participações de empresas, autarquias, e outras estruturas como CETESB, USP, ANAMA, UNESP, etc, todos com vínculo com o Estado.

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Mais uma prova da esculhambação é o que nos dizem os ambientalistas: que a cada proposta que fazem há uma encenação de discussão, mas de fato não há interesse nem aceitação. Há os votos favoráveis de ambientalistas e do Ministério Público, e quase todos  os outros são contrários. Assim aconteceu em TODAS as sugestões que fizeram!

Quem são os prefeitos do litoral paulista e quais os seus interesses

O governo estadual está ciente, assim como qualquer jornalista especializado, de que muitos prefeitos do litoral não priorizam o bem comum de seus cidadãos. Ao contrário, buscam vantagens pessoais. Acusações como nepotismo, dispensa indevida de licitações, prejuízos ao erário, suspeitas de superfaturamento, corrupção, lavagem de dinheiro e desvio de verbas são frequentes entre esses prefeitos.

Em 2023, Flávia Pascoal (PL)  prefeita de Ubatuba teve seu mandado cassado por envolvimento em corrupção. A cidade tem mais de 80% de sua área dentro do Parque Estadual da Serra do Mar. Seus principais atrativos são a Mata Atlântica e as 102 praias ao longo de quase 100 km de litoral, fundamentais para a economia local baseada no turismo.

Prefeitos querem verticalização como na Riviera de São Lourenço. Acervo MSF.

Falta de infraestrutura é generalizada no litoral

A infraestrutura em Ubatuba, entretanto, enfrenta graves deficiências. O saneamento básico e a coleta de lixo não atendem às necessidades. Rios que fluem da Serra do Mar para a cidade agora funcionam como esgotos a céu aberto. Os últimos três ou quatro prefeitos permitiram que bairros se expandissem perto desses rios, cortando a vegetação protetora para construir casas que jogam seus dejetos nos rios, violando o Código Florestal. Mesmo com esses desafios, os prefeitos continuam apostando na verticalização, buscando atrair ainda mais pessoas para cidades que já sofrem com escolas em más condições, trânsito pesado, sujeira, falta de saneamento e hospitais inadequados. Esta é a realidade das estâncias balneárias paulistas.

Apesar disso, em 2023 a verticalização figurou entre as propostas de revisão dos Planos Diretores de diversas delas, exceto Guarujá. Prefeitos de Ilhabela, Ubatuba, São Sebastião, Caraguatatuba e Ilha Comprida aspiram a seguir o exemplo de Guarujá!!

A regra da corrupção nos municípios costeiros paulistas

A corrupção é a regra entre os prefeitos das estâncias balneárias paulistas em especial Ilhabela, cujo gestor pela terceira vez é Antônio Colucci (PL). Ele tem 253 processos indexados pelo Jusbrasil; São Sebastião, do prefeito Felipe Augusto (PSDB),  tem   267 processos, segundo o mesmo site; Caraguatatuba é feudo da família do prefeito Aguilar Júnior sem partido, com filho e pai se alternando no poder há décadas, e ele tem 195 processos, segundo o jusbrasil.  Guarujá, do prefeito Válter Suman (PSDB), vive uma guerra civil que aterroriza a população, mas não cede. E Suman, segundo o Jusbrasil, também tem a sua coleção de processos indexados. Já o prefeito de Ilha Comprida, Geraldino Júnior (PSDB), também indexado pelo Jusbrasil, é outro dos recordistas em processos judiciais.

Ilhabela já teve um prefeito que foi cassado por abrir, 43 dias depois de tomar posse, uma imobiliária em nome de laranjas da família, para comercializar lotes dentro da área do Parque Estadual.

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Loteamentos e prédios comerciais em Áreas de Proteção Permanente na revisão de Planos Diretores

Mais que isto. Na revisão dos Planos Diretores, em 2023, muitos municípios propuseram construções em encostas e áreas alagadiças. O prefeito de Caraguatatuba, Aguilar Júnior do MDB, chegou a sugerir loteamentos e prédios comerciais em Áreas de Proteção Permanente, defendendo a verticalização. Aguilar Júnior, conhecido por misturar o público e o privado em negócios com ‘amigos’ como Wilson Gobetti, é um mais exemplo da ‘confusão entre o público e o privado’.

Mais praias como a da Toninhas, em Ubatuba, serão estupradas por aberrações como esta. E apesar disso, desde a Constituição de 1934, até a de 1988, todas tratam a proteção da paisagem com princípio básico.Acervo MSF.

Um problema recorrente nas revisões foi a falta de comunicação sobre audiências públicas, levando a muitas ações do Ministério Público. As prefeituras tiveram que parar os processos. Essas não eram meras revisões, mas sim incentivos à especulação imobiliária, um grande problema no litoral paulista.

Mesmo que o governador Tarcísio de Freitas, do partido Republicanos, possa não estar ciente por não morar no estado, sua equipe está informada. Mário Mantovani, presidente da Fundação Florestal, e Rodrigo Pimentel Pinto Ravena, secretário municipal do Verde e do Meio Ambiente, certamente conhecem a situação.

O crime organizado toma conta do litoral

Outra prova que demonstra o abandono do poder público é o crime organizado que aos poucos assume o local e o papel de ente superior. Guarujá, ex-pérola do Atlântico, por exemplo, é ‘governada’ por Válter Suman (PSDB), acusado de peculato, advocacia administrativa, fraude em licitação e extensão irregular de contrato. Ao mesmo tempo, as facções assumem o papel do Estado. Guarujá  vive uma guerra civil. Simultaneamente, facções do PCC, e CV, mudam-se para os sertões das praias do litoral norte. O governo sabe disso, mais ainda, não agiu. Em pouco tempo estarão ‘cobrando proteção’ aos comerciantes.

Haverá judicialização?

O governador de São Paulo merece duras críticas por mais uma medida controversa, similar à sua proposta de substituir livros físicos por material digital nas escolas. Uma proposta descabida, que previa a eliminação de livros físicos a partir de 2024, que só foi recuada devido à reação negativa e ações judiciais.

Tarcísio pretendia que, já neste ano, os alunos usassem material produzido e impresso pela Secretaria Estadual da Educação. A iniciativa foi mal recebida por educadores e setores da sociedade.

Além disso, o governador planejava adquirir 200 milhões de livros digitais por mais de R$ 15,2 milhões, sem processo de licitação. A Multilaser Industrial, empresa que foi escolhida, tem como um dos sócios, por meio de uma offshore, o secretário Estadual da Educação Renato Feder. Isso levou o Ministério Público de São Paulo a investigar Feder por possível conflito de interesse nos contratos assinados pela secretaria com uma empresa da qual é acionista.

A reação à ideia de eliminação de livros, forçou o retorno à utilização tradicional dos mesmos. Da mesma forma, somos da opinião que a decisão controversa do CONSEMA, que só favorece interesses obscuros de prefeitos e da indústria da construção civil, em detrimento da perda de qualidade de vida e prejuízos ambientais, enfrentará a mesma resistência e, possivelmente, ações judiciais para correção de rumos.

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