Brasil de Bolsonaro: imagem externa nunca esteve tão ruim. Motivo? ‘Por que não te calas?’
Experimente googar a expressão ‘amazon deforestation’. Você verá uma chuva de matérias. “Sob o líder de extrema-direita do Brasil, diminui a proteção Amazônica e as florestas caem“, do mais prestigioso jornal do mundo, o New York Times. “Desmatamento na Amazônia está aumentando, mas o presidente do Brasil chama os dados de ‘mentira“, da Science. “Ele quer nos destruir”: Bolsonaro representa ameaça mais grave em décadas, dizem as tribos amazônicas“, estampado acima de uma foto de líderes indígenas, pelo inglês, The Guardian. São três páginas seguidas de matérias. Nunca, a imagem do Brasil de Bolsonaro esteve tão ruim. E tudo culpa dele.

‘Por que não te calas?’
Irritado com a montanha de bobagens ditas por Hugo Chaves durante a XVII Conferência Ibero-Americana, na cidade de Santiago do Chile, em 2007, o rei da Espanha, Juan Carlos, não se conteve:
Por que não te calas?
Alguém do círculo de poder bem que poderia repetir a frase para o capitão. De tanto ouvir, quem sabe maneire? É inacreditável a quantidade de vezes que ele arranja problemas para o País. Sua limitadíssima capacidade intelectual o impede de perceber que um presidente da República não pode agir como ‘se estivesse governando num churrasco’.
Mais lidos
Declínio do berçário da baleia-franca e alerta aos atuais locais de avistagemPesca ilegal de atum ligada à corrupção, lavagem de dinheiro, e tráfico humanoZheng He: O Almirante Eunuco que Fez da China uma Potência Marítima no Século XVPraia do Buracão, BA, e a chaga do litoral: especulação imobiliáriaPor que não te calas Bolsonaro?
Ouça o conselho, presidente. Antes que seja tarde demais. Até os moderados do agronegócio temem suas bravatas. Essa do Inpe, então, francamente…Elas prejudicam o País. Foi assim quando o Sr. disse que acabaria com o Ministério do Meio Ambiente. Também, quando ameaçou tirar o Brasil do Acordo de Paris. E mais um sem-número de vezes. Todas seguidas de retaliações, ou ameaças de, por parte de nossos parceiros comerciais. ‘Por que não te calas’, Presidente? Suas bravatas são a alegria dos que temem concorrer com o agronegócio.
O Brasil de Bolsonaro, o que está acontecendo afinal?
Quem melhor explicou foi Carlos Rittl, ambientalista e cientista, em artigo para o Monde Diplomatique, posteriormente repicado pelo O Eco. O primeiro parágrafo diz tudo: “Quando Dilma Rousseff assumiu a Presidência, em 2011, ela ouviu do padrinho político, o ex-presidente Lula, um único conselho sobre a área ambiental: “Dilma, só não pode deixar o desmatamento subir”. Lula sabia o quanto a imagem internacional do Brasil e a avaliação do ocupante do Planalto dependiam de um controle efetivo da devastação, principalmente na Amazônia.”
PUBLICIDADE
Vingança pessoal contra a natureza?
Mais adiante, escreve Rittl, “Oito anos depois, temos uma situação inédita na história. O gabinete presidencial é ocupado por uma pessoa que, mais do que desprezar a área ambiental, faz-lhe oposição ativa. Como se exercitasse contra a natureza uma vingança pessoal.” E explica: “Os movimentos da cruzada de Bolsonaro e de seu subministro da Agricultura, Ricardo Salles, são conhecidos. Salles seccionou a medula da governança ambiental. Desarticulou políticas construídas desde a Rio-92. Acabou com as áreas de mudanças climáticas (justamente quando é divulgada mais uma prova incontestável de sua existência) e a responsável pelos planos de prevenção e controle do desmatamento. Deixou o Ibama acéfalo. Amarrado em Brasília. Persegue e desautoriza seus agentes – que acusa de “ideológicos” e “ineficientes”.
Resultados das bravatas de Bolsonaro
“Os resultados têm sido o espraiamento da sensação de impunidade na ponta e o franco descontrole sobre o crime ambiental. O número de multas por desmatamento até maio deste ano foi o menor em uma década. E o número de operações do Ibama na Amazônia caiu 70% de janeiro a abril deste ano em relação ao mesmo período ano passado. Bolsonaro foi eleito prometendo “tirar o Estado do cangote de quem produz”. O efeito real foi tirar o Estado do cangote de quem depreda.”
Leia também
Diocese de Sobral envolvida na especulação no litoral oesteDepravação moral da Câmara de Vereadores de UbatubaCaiçaras do Lagamar emitem nota aos Governos de SP e PR‘A navalha de Occam’
“A navalha de Occam – princípio que afirma que, se um fenômeno tem várias explicações, a mais simples costuma ser a correta – faria supor que tudo isso levaria a um aumento do desmatamento. É o que se verifica. Após um primeiro trimestre de redução expressiva…,provavelmente devido à grande cobertura de nuvens…, os meses secos de maio e junho mostraram aceleração. Maio teve o pior índice desde que o sistema do Inpe passou a operar com satélites mais precisos, em 2016. É cedo para dizer qual será o impacto na taxa oficial de 2019, que será conhecida após agosto. A depressão econômica pode frear o desmatamento especulativo. E deixar o índice mais ou menos empatado com o trágico 2018, na casa dos 8 mil km2. Ou, pouco provável, até reduzi-lo um pouco. Mas um eventual crescimento terá nome e sobrenome: Jair Messias Bolsonaro.”
Brasil de Bolsonaro, projetos do presidente e seu pupilo
Em seguida, Rittl, elenca alguns projetos: “Bolsonaro briga com o STF pelo direito de violar a Constituição. Ele quer empurrar a demarcação de terras indígenas para o Ministério da Agricultura. Salles anuncia a revisão de todas as áreas protegidas federais. E o filho 01, o senador Flávio Bolsonaro, tenta aprovar no Senado o fim da reserva legal. Isso abriria uma área equivalente a quatro estados de São Paulo ao desmatamento. Como se para provar uma aliança de sangue com o setor mais atrasado do ruralismo, o senador ainda propôs – em afronta direta a pelo menos dois artigos da Constituição – eliminar a função social da propriedade rural. É uma espécie de fetiche de certa facção do ruralismo. Esta facção nunca engoliu a Carta de 1988. E talvez ainda tenha problemas em aceitar as leis de 1888.”
‘Um prato cheio para quem quer impor barreiras não tarifárias’
“A leitura que os mercados internacionais e os clientes das commodities brasileiras fazem disso tudo é simples. O agronegócio não pode prescindir de desmatamento. Nem de acesso livre a terra barata. Para quem quer impor barreiras não tarifárias às commodities brasileiras e adiar acordos comerciais, trata-se de um prato cheio. Para o ministro da Economia, Paulo Guedes, mais um motivo de preocupação. A destruição ambiental pode ser o maior tiro no pé da economia nacional.”
Por que a floresta é importante para a efetivação do Acordo de Paris
“Embora o Brasil tenha permanecido formalmente no Acordo de Paris, alguém já deveria ter dito a Bolsonaro que também é preciso cumpri-lo. E isso vai de encontro à sua cruzada contra a floresta. Cientistas brasileiros estimaram que um cenário de descontrole sobre o desmatamento causaria emissões anuais só na Amazônia de 1,3 bilhão de toneladas de gás carbônico, ou 3% do que o mundo emite por queima de combustíveis. Nesse cenário, não apenas o Brasil não cumpriria suas metas. O País também poderia colocar fora de alcance o objetivo global de estabilizar o aquecimento global em 1,5 °C, preconizado pelo Acordo de Paris.”
Brasil de Bolsonaro, proposta do 01 e outras de mudanças no Código Florestal
Rittl finaliza: “Talvez os indícios mais claros de que a situação está indo longe demais sejam manifestações recentes de representantes do setor agroexportador contra, por exemplo, o projeto de Flávio Bolsonaro. E outras propostas de mudanças no Código Florestal. Mas defender a lei florestal e a segurança jurídica que ela traz não vai salvar a imagem. E os mercados das commodities brasileiras. Se o agro que quer ser pop quer se diferenciar do ogro que não se importa de não o ser, tem de levantar a voz contra todo o desmonte ambiental de Bolsonaro. E também contra quem faz lobby pela terra arrasada, que não respeita limites, que acha ser possível destruir leis e florestas e engabelar a comunidade internacional vendendo uma sustentabilidade que não existe.”
Recado pra Bolsonaro
“Se o agro que quer ser pop quer se diferenciar do ogro que não se importa de não o ser, tem de levantar a voz contra todo o desmonte ambiental de Bolsonaro.”
Por que não te calas, Bolsonaro?
Imagem de abertura para Brasil de Bolsonaro: Alliance Wildlife
Fontes: https://www.sciencemag.org/news/2019/07/deforestation-amazon-shooting-brazil-s-president-calls-data-lie?fbclid=IwAR3n5Qi6KHCcAPBEwwHRbWI08NzCZW6wXohl_ehjoNIPgyltN38d4gCWgxo; https://www.theguardian.com/world/2019/jul/26/bolsonaro-amazon-tribes-indigenous-brazil-dictatorship?CMP=twt_a-environment_b-gdneco&fbclid=IwAR35ZNqSJYV7QvxNkpBjZf7Gv1Y9XjstZXsFnRbF710-IAmKCKNoHkYvFAo; https://www.nytimes.com/2019/07/28/world/americas/brazil-deforestation-amazon-bolsonaro.html; https://www.oeco.org.br/colunas/colunistas-convidados/a-insustentavel-agenda-ambiental-do-presidente/.