Depois de 40 dias espetaculares na Antártica, suspendemos às 05hs da manhã, do dia 1º de fevereiro. Deixamos a enseada Martel, e iniciamos a travessia de 500 milhas até o Cabo Horn.
Navegamos para fora da baía do Almirantado, dobramos o cabo Melville, extremidade da ilha Rei George, e entramos no Drake.
As ondas de Oeste tinham 2 metros de altura. Eram vagalhões com períodos grandes entre eles. O Mar Sem Fim subia lentamente, balançando um pouco de lado, depois embalava e descia surfando. O vento Sul, de 15 nós, vinha pela popa. O rumo era quase Norte puro: 305º. O barco navegava a mais de sete nós.
A primeira singradura, 24 horas depois, marcou 184 milhas. Média de 7.6 nós. Nada mau.
A segunda, às 05hs da manhã de quarta-feira, dia 3, mostrava melhoras: 190 milhas. A média subiu para 7.9 nós, mantida a velocidade de cruzeiro de 1400 giros em cada motor.
No terceiro dia o sol apareceu, e também os albatrozes. E eles nos acompanharam até o Horn. Foi maravilhoso navegar ao lado deles tanto tempo.
Eram dez e meia da noite quando fundeamos na caleta Leon, “ao pé” do farol da ilha de Hornos, para passar a noite. Demoramos 65 horas e meia nesta perna.
Este é o epílogo da viagem. Foi um sonho incrível que deu certo. O único senão, a pane na ida, se trasformou em mais aprendizado. O choque está se apagando da memória aos poucos, ofuscado por um turbilhão de descobertas fascinantes.
Esta manhã, às 9hs30, o Mar Sem Fim cruzou o mítico cabo Horn. Era preciso gravar a imagem para os documentários.
Não descemos em terra. As autoridades chilenas inisistiram para que fôssemos até Puerto Williams, distante 70 milhas, “dar entrada no país”, para só depois desembarcarmos.
Voltamos à burocracia, e à “civilização”. Paciência. O encanto já se quebrou mesmo. Foi só ver a fila de turistas subindo as escadas da ilha de Hornos, com seus coletes salva-vidas cor de laranja, para percebermos que a aventura, e o que ainda resta de uma aura de romantismo, ficaram na outra ponta do Drake. Lá para trás.
A viagem acabou. Falta atracar em Ushuaia.
O Mar Sem Fim segue escrevendo uma história bacana. É isto que importa e me deixa feliz. Depois de uma década navegando pelo Hemisfério Norte com o antigo proprietário (quando tinha outro nome), um expert neste tipo de barco, ele acrescenta ao currículo alguns capítulos bem interessantes: uma noite ao sabor do vento no Drake, ter chegado aos 65º de latitude Sul, quase atingindo o círculo polar, ser o menor barco a motor a ir para a Antártica, e dormir ao abrigo dos paredões da ilha de Hornos, entre outros.
Foram cinco mil milhas de muitas emoções.
Depois das filmagens subimos pela baía Nassau até passarmos entre as ilhas Lennox e Ilha Nueva. Onde decidimos fundear para almoçar com tranquilidade, e dormir.
Durante o trajeto abri uma champagne, sentei na poltrona ao lado do comando, e curti cada milha navegada. Ventava sudoeste. Trinta nós. As ondas subiram para 2 metros e meio, a três metros. E os períodos desta vez eram curtos. O barco jogava. No comando Alonso, Manoel e Edgar não davam bola.
Disputavam uma partida de dominó. Eu ouvia música, tomava uns goles, e olhava a paisagem. Às vezes percebia que divagava: os olhos fixos num canto, a cabeça em outro. Era mais um flash, uma recordação. As sensações ainda estão frescas na memória. Milhares delas. Agora, passado aquele momento, procuro uma palavra que possa descrever o que sentia. É difícil escolher. Uma mistura de orgulho e felicidade, maravilhosa.
No dia seguinte, 5 de fevereiro, dormi até o meio-dia. Quando acordei faltavam poucas milhas para Puerto Williams.
Fiquei feliz ao chegar. O bar, no convés do navio/iate clube, já está reformado e voltou a abrir. Esta tarde fizemos os papéis de entrada.
Agora de noite vamos provar o famoso Pisco Sauer, e comemorar o final da viagem.
Às 11hs30, da manhã, de 6 de fevereiro, fundeamos em Ushuaia.
Fecho este capítulo agradecendo aos que nos acompanharam. E deixo o convite: a partir de 14 de março de 2010, pela Rede Bandeirantes de Televisão, nossa história vai ao ar. “Mar Sem Fim: uma viagem à Antártica”. Não perca.