São dez da noite de quinta- feira, dia 24 de novembro. Começo agora meu relato sobre esta perna de 350 milhas.
Saímos ontem de tarde, de Puerto Deseado, e já estamos a uma distância de 50 milhas da entrada do estreito de Magalhães.
Às vezes é difícil dar conta de todo o trabalho que temos no barco. Parece pouco, mas não é.
Uma viagem como a nossa é diferente de um cruzeiro de lazer.
Navegamos por mares que não conhecemos, onde as forças da natureza não são brincadeira. Já estamos nos 50º de latitude Sul. É preciso ter muito respeito com a meteorologia. Um erro apenas, pode comprometer o trabalho de mais de dois anos de planejamento.
Felizmente temos a bordo uma arma secreta. Ele atende pelo nome de Pedrão. Não há quem não o conheça no meio naútico. Ele merece a fama que tem. “Pedrão é o cara”.
Sabe interpretar como ninguém as informacões da meteorologia. Navegamos quando o tempo permite. Então adiantamos o máximo possível. Se existe qualquer chance do tempo mudar, não arriscamos. Ficamos abrigados.
Os equipamentos de bordo, dezenas deles, cada um com sua ‘balda
seu modo de operar, suas manhas, necessidades específicas de manutenção, Pedrão conhece como se fosse construtor.
Assim, acompanho de longe a navegação e manutenção do barco, e posso me dedicar cem por cento aos programas, ao site, às fotos, aos boletins que passo para a Bandsports e Bandnews TV, aos contatos com a equipe de apoio em terra, etc.
Plinio Romeiro estuda os sites de meteorologia, e envia previsões diárias para a área em que navegamos.
Regina, minha assistente desde o tempo da Eldorado, além de cuidar das obrigações cotidianas ( contas e que tais), intermedia contatos com a imprensa, alimenta o site com os relatos que mando, compra peças que estão faltando, etc.
Paulina Chamorro, companheira da viagem pela costa brasileira, ajuda na produção, marcando entrevistas nos portos em que paramos.
Além disto, a bordo, a cada dia novas imagens são feitas. Apesar de termos um bom editor, Adriano Pessoa, na hora de fechar as cenas, eu e Cardozo, o cinegrafista, temos que nos reunir, discutir os acertos e erros, participar da montagem.
Enquanto isto, os marinherios Alonso e Manoel, coordenados pelo Pedrão, levam o barco.
Quando percebemos mais um dia acabou.
No tempo livre checo a navegação, e converso muito com o Pedrão. Não quero perder a chande de aprender. O cara é uma enciclopédia náutica, um expert em marinharia.
Durante as travessias (em terra nunca temos tempo livre), quando dá, assisto algum documentário, temos vários DVDs a bordo. Procuro aprimorar nosso trabalho. Aprender algum truque, ter uma ideia nova. Não quero desapontar.
Fazer televisão tem seus macetes e técnicas. É uma linguagem que ainda não domino. Pode parecer banal pra quem assiste, ver a figura de um repórter, com um microfone na mão, passando informações. Mas estar do outro lado, atuando, é diferente.
A nossa travessia não poderia ser mais tranquila. Mar calmo, sem ventos, do começo ao fim.
Na madrugada do dia 25, dobramos o cabo Virgines, e entramos estreito adentro. Duas mil milhas navegadas desde Santos. Terminamos a primeira perna da viagem sem um problema sequer.
E finalizamos o primeiro episódio, da série de oito documentários que estamos fazendo.
Ainda é cedo para comemorar, mas estamos no bom caminho.
Na noite do dia 25 atracamos em Punta Arenas.
Amanhã começamos mais um programa. Vamos mostrar o trajeto de Punta Arenas para Puerto Natales, outra cidade chilena, mais pro lado do Pacífico. Depois desceremos até Ushuaia, onde termina o segundo episódio da série.
Então teremos que esperar uma janela de tempo, longa o suficiente, para atravessarmos o Drake em segurança. Mais na frente conto sobre a nossa estratégia.
No momento minha preocupação é a dificuldade que tenho encontrado para alimentar o site. Consigo mandar o texto do barco, mas colocar as fotos dá um trabalhão, mesmo nas cidades. As conexões aqui embaixo são fracas. Mudo de lan house um par de vezes, entro em hotéis, e mesmo assim é um sufoco até conseguir uma linha boa.
Torço para que esta parte melhore.
Havia outro incômodo, que parece resolvido: o problema do frio. O Mar Sem Fim não é um barco polar, mas tomei algumas providências que têm ajudado. Foram boas dicas do Thierry Stump, construtor de barcos, e muitos outros navegadores.
Entre elas estava colocar um tipo de isopor especial, em todos os forros, para evitar condensação. Pelo mesmo motivo, Thierry sugeriu que eu levasse placas de acrílico, para fechar todas as janelas por dentro. Acabamos de fazer isto. A sala e o comando ficaram bem mais aconchegantes.
Nas cabines e na sala, o sistema de calefação é duplo: nas horas em que o gerador está ligado, usamos aparelhos elétricos, que trouxe do Brasil. Funcionam bem. Mas faltava um equipamento para usar quando desligamos o gerador. Resolvemos com aquecedores a gás, comprados aqui.
Testaremos nesta próxima etapa. Frio é o que não falta. Está gelado em Punta Arenas. Alguns moradores, com quem conversamos, nos disseram que este ano está “atípico”. Mais frio. Eles esperam neve para o Natal, o que é muito raro.
Na próxima postagem conto se deu certo.