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Navios de pesca chineses: abuso, corrupção e morte

Navios de pesca chineses: abuso, corrupção e morte

A China é frequentemente apontada como uma das nações que mais predam os oceanos. Contudo, o país não apenas preda a vida marinha como, junto com Tailândia, Taiwan, Vietnã, pratica o tráfico humano e a pesca ilegal. Não faz muito que publicamos o post O oceano sem lei, na visão de um jornalista especializado. A matéria tem como base o livro de mesmo nome do jornalista norte-americano do New York Times, Ian Urbina, vencedor do prêmio Pulitzer. Ele publicou investigações que cobriram desastres de petróleo e mineração, pesca ilegal combinada com tráfico humano e trabalho forçado, comércio ilícito de frutos do mar, piratas e mercenários, ladrões de naufrágios, mostrando que em alto-mar impera a lei do mais forte. Agora, a BBC mostra o que acontece nos navios de pesca chineses que operam na África. O enredo é de filme de terror.

Navios de pesca chineses.
Os navios de pesca chineses exploram a pobreza no mundo. Impunemente. Imagem, Environmental Justice Foundation.

‘Pesca em Gana: abuso, corrupção e morte em embarcações chinesas’

O subtítulo acima está entre aspas porque é o título da matéria da BBC de janeiro de 2023. É mais uma que confirma o descalabro que acontece em navios de pesca daquele país, a exemplo do que fez o impressionante documentário Seaspiracy, que já comentamos.

‘Quando se trata de abuso e corrupção em navios de pesca chineses em Gana, Bright Tsai Kweku já viu de tudo. Especialmente a tripulação chinesa tratando os pescadores locais como escravos.’

“Eles os espancaram, cuspiram neles e os chutaram”, disse Kweku. “Eu já passei por isso antes.”

Kweku trabalha como contramestre – oficial encarregado do equipamento e da tripulação, portanto, sabe do que fala. Kweku teve que trabalhar três dias sem dormir, sem comida, e bebendo água suja.

Entre outros suplícios comuns, a posição intransigente dos comandantes que agem como se a servidão humana estivesse em vigência. Por exemplo, um de seus colegas adoeceu com cólera a bordo de um navio chinês. Contudo, a tripulação se recusou a trazê-lo de volta à costa para tratamento.

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Viu outro colega ser gravemente queimado em uma embarcação depois que um incêndio começou. Um terceiro foi pego por uma hélice. Nenhum dos três sobreviveu e, além disso, as famílias não receberam a devida indenização, diz ele.

Estes são apenas alguns exemplos de supostos abusos generalizados e negligências relacionados a navios de pesca chineses que operam na costa de Gana, diz a BBC.

Environmental Justice Foundation: pesca ilegal e abuso dos direitos humanos

A BBC comentou um relatório da Environmental Justice Foundation (EJF), com sede no Reino Unido. O documento mostra que ‘pelo menos 90% dos arrastões industriais que operam em Gana são de propriedade de empresas chinesas, contrariando as leis do país sobre a propriedade de embarcações que pescam sob a bandeira local.’

Além disso, o relatório ‘investiga o que diz ser pesca ilegal, não declarada e não regulamentada, e abusos dos direitos humanos por parte da frota chinesa de pesca em águas distantes em Gana. A propriedade e o controle operacional da frota da China são complexos e opacos, entretanto, são os maiores do mundo.

Antes de mais nada, a China pesca nas águas de outros países, especialmente os mais pobres, em razão de já ter dilapidado os cardumes de sua Zona Econômica Exclusiva.

Contudo, o mais surpreendente para este site é que todo o mundo envolvido com a pesca sabe destes problemas. As denúncias já são uma rotina, e sempre por fontes confiáveis como o jornalista do New York Times, o documentário que escandalizou o mundo leigo, ou a própria BBC. A pergunta que fica é por que não são abertas investigações para obrigar o gigante asiático a cessar estas práticas medievais?

Esta omissão, sim, é inacreditável. Relatórios como o citado também são comuns. Mesmo assim a comunidade mundial finge que não vê.

Naufrágio de pesqueiro chinês em Gana

Para ilustrar, a BBC conta a história do naufrágio do MV Comforter 2, em maio de 2022. O navio afundou devido a uma tempestade. Quatorze tripulantes foram resgatados, mas 11 desapareceram, presumivelmente mortos, incluindo o observador nomeado pelo estado. O corpo do capitão chinês foi encontrado.

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O mundo assiste aos crimes e a exploração sem mais que relatórios. Quando, afinal, agirão? Imagem, Environmental Justice Foundation.

Um dos sobreviventes, que pediu anonimato e chamaremos Michael, diz a BBC, relembra os horrores que aconteceram naquele dia.

Apesar das tempestades ficarem cada vez piores, ele diz que a tripulação chinesa ordenou aos pescadores que fizessem uma pescaria excessiva de uma só vez. O barco já estava com muitos peixes a bordo e perdeu o controle, virando com o peso da carga e águas agitadas.

Michael não se recuperou física ou mentalmente do desastre e diz que a empresa ganense oficialmente responsável pela embarcação, a Boatacom, não lhe pagou nenhuma indenização.

Kojo Ampratwum, diretor-gerente da Boatacom, disse à BBC que a empresa apresentou seus relatórios à seguradora e está esperando uma resposta. A propriedade estrangeira de embarcações industriais de arrasto operando sob a bandeira de Gana é ilegal, mas algumas empresas chinesas contornam isso por meio de empresas de fachada.

Entretanto, diz a BBC, o relatório da Environmental Justice Foundation diz que a chinesa Dalian Mengxin Ocean Fishery Company é a proprietária final do MV Comforter 2 e que faz parte da frota Meng Xin.

Mortes misteriosas a bordo de navios chineses

Antes de encerrar a matéria, a BBC conta o caso do sumiço de um observador ganense a bordo de um dos pesqueiros chineses. A prática de colocar um observador a bordo é comum nestes casos. Porém, quando eles agem com empenho acabam ‘sumindo’ sem explicações.

Nada de novo. Ian Urbina contou alguns destes casos em seu livro e nada aconteceu. Tanto é assim, que a situação se repetiu com o observador de pesca Emmanuel Essien da mesma frota Meng Xin.

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‘Em 5 de julho, Essien desapareceu da traineira Meng Xin 15, informa a BBC. Ele jantou com o resto da tripulação antes de voltarem para o cubículo para dormir. Na manhã seguinte, não estava em lugar nenhum’.

Mais de três anos depois, a família ainda não tem respostas. Uma investigação policial não encontrou “nenhum sinal de violência ou qualquer coisa incriminatória”.

A BBC entrevistou vários observadores ganenses. Eles contaram que os baixos salários (pagos pelos chineses) atrasam até 4, 5 meses, frequentemente. Então, os capitães subornam alguns para que não relatem os casos mais espinhosos.

“A maioria desses observadores aceita subornos. É isso que fazemos para cuidar de nossas famílias,” disse um deles à rede inglesa.

Mas isso não é tudo. Segundo a mesma fonte, “Às vezes, o que eles fazem é jogar o observador na água – isso já aconteceu antes”, diz. “Por causa do medo, normalmente não relatamos problemas como esse.”

Não pense que este seria um caso isolado. A BBC conversou com Steve Trent, fundador e chefe da Environmental Justice Foundation.‘ A alta concentração de propriedade chinesa nas frotas de arrasto é um problema em toda a África Ocidental. Mas, em Gana, o problema é “particularmente agudo.”

Não à toa, o título do livro de Ian Urbina é “Oceano sem lei”.

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