Planos para o litoral engavetados no Ministério de Meio Ambiente
Nosso litoral, e mar territorial, continuam a ser maltratados pelo poder público. Ali impera a lei do mais forte. Salvo pelas ações da Marinha do Brasil, sempre foi assim e continua sendo. Este site se sente muito à vontade para comentar a omissão do ministério do Meio Ambiente porque fomos os pioneiros a mostrar o abandono da costa brasileira. Hoje, vamos falar dos planos para o litoral engavetados pelo Ministério do Meio Ambiente.
Vasculhando nosso litoral
Entre 2005 e 2007, produzimos cerca de 45 horas de documentários, em 90 episódios para a TV Cultura, mostrando cada detalhe da costa brasileira desde a fronteira Norte, o rio Oiapoque, até a Sul, o Chuí. Foi a partir desta série que a imprensa passou a dar ao bioma marinho um tratamento semelhante ao que dava para os terrestres. Da mesma forma, foi somente a partir desta série que as grandes ONGs passaram a ter ações para o litoral. Por isso nos sentimos à vontade para comentar o tema.
Planos para o litoral engavetados no MMA
Escrevemos com frequência para mostrar que os os ecossistemas costeiros são os mais ameaçados pelos potenciais impactos da mudança do clima. E recentemente publicamos um post sobre um dos muitos problemas graves da zona costeira, Litoral engolido por eventos extremos e sem políticas públicas.
Nele, mostrávamos que o aquecimento global e os eventos extremos, uma desforra da natureza para nossas ações insustentáveis, estão comendo os litorais mundo afora. E alertávamos para o fato de que ‘até agora não há qualquer ação governamental para amenizar o problema’.
Mais lidos
Declínio do berçário da baleia-franca e alerta aos atuais locais de avistagemA mídia e o pernicioso vício dos ‘paraísos do litoral’Vicente de Carvalho, primeiro a dizer não à privatização de praiasVírus da gripe aviária mata milhões de aves mundo aforaPara ilustrar, publicamos manchetes e fotos de jornais ao longo dos Estados costeiros demonstrando a acirrada erosão que vem comendo os litorais não só do Brasil, mas do mundo. Mas cometemos um equívoco ao dizer que ‘não há qualquer ação governamental para amenizar o problema’. Havia.
Mas foram engavetados pelo atual ministro. Para ele, e a julgar pela atitude desleixada quando do vazamento de óleo de 2019, litoral seria apenas um ‘espaço de lazer’…ou nem isso.
PUBLICIDADE
Programa Nacional para Conservação da Linha de Costa – Procosta
Este programa foi elaborado pelo Ministério do Meio Ambiente, e aprovado pela PORTARIA Nº 76, de 2018. O País já estava atrasado. Mas antes tarde que nunca. Assim, durante a gestão de Sarney Filho, que já apontamos como o melhor ministro de Meio Ambiente que tivemos, o MMA arregaçou as mangas e pôs mãos à obra.
O diagnóstico é que não havia, até então, dados confiáveis em escala nacional sobre a zona costeira, suas infinitas composições, e as ameaças da subida do nível do mar (de 2006 até 2019, o nível vem aumentando em cerca de 3,6 mm por ano), alem do aumento de eventos extremos.
Leia também
Vila do Cabeço, SE, tragada pela Usina Xingó: vitória na JustiçaInvestimentos no litoral oeste do Ceará causam surto especulativoCafeína, analgésicos e cocaína no mar de UbatubaNa época, o site do MMA publicou: “Diante das mudanças climáticas e aumento de eventos extremos nas cidades costeiras, o mapeamento de riscos e vulnerabilidades precisa ser inserido no planejamento e no orçamento da União, Estados e Municípios.”
Planejamento estratégico para a zona costeira
O plano, ‘feito em parceria com instituições e academia’, como frisava o MMA, visava criar ‘um planejamento estratégico para enfrentamento dos efeitos da mudança do clima e a elaboração de estudos que envolvam análises de risco, vulnerabilidades e impactos associados a cenários atuais e futuros, além de projeções de eventos extremos’.
Nada mais correto. O que aconteceu desde então? Em 2019 entrou um ministro que não acredita na influência humana no aquecimento global. E, assim como o chefe, Ricardo Salles desconsidera a ciência.
O plano foi engavetado, a despeito de ter sido feito com ‘auxílio da academia’, e talvez, exatamente por isso mesmo. O resultado é que nosso litoral está sendo engolido aos poucos, sem nenhuma ação de mitigação.
Em tempo: já mostramos neste site que estudos, como o do Instituto de Economia da UFRJ que mostram que o custo dos eventos extremos no Brasil entre 2002-2012 oscilam entre R$ 180 bilhões até R$ 300 bilhões. Daí a necessidade de ‘um planejamento estratégico para enfrentamento dos efeitos da mudança do clima’.
Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima (PNA)
Também estávamos órfãos neste quesito. Até que o Ministério do Meio Ambiente, em maio de 2016, apresentou o Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima (PNA). Na época, o site do MMA publicou: (este) ‘instrumento elaborado pelo governo federal em colaboração com a sociedade civil, setor privado e governos estaduais que tem como objetivo promover a redução da vulnerabilidade nacional à mudança do clima e realizar uma gestão do risco associada a esse fenômeno’.
O MMA, à época, explicava seus objetivos:
No primeiro está escrito: ‘Ampliação e disseminação do conhecimento científico, técnico e tradicional: produção, gestão e disseminação de informação sobre o risco climático’.
‘Ampliação e disseminação do conhecimento científico‘. Conhecimento este, demonizado pela atual administração. É estranho mais este engavetamento, porque o ministro desde sempre disse que seu foco eram as cidades brasileiras.
As mesmas e despreparadas cidades que são depredadas pelos eventos extremos. Vide o que aconteceu quando a maior e mais rica cidade do País, São Paulo, naufragou nas últimas chuvas.
PUBLICIDADE
Estudo do INPE
Criado em 1961 com o objetivo de capacitar o País nas pesquisas cientificas e nas tecnologias espaciais, o órgão também estuda as questões do clima.
Um de seus boletins explica que ‘a sustentabilidade do desenvolvimento na América do Sul está fortemente ligada à capacidade de responder aos desafios e oportunidades associadas com as mudanças climáticas’.
‘A região é vulnerável às mudanças climáticas e será profundamente impactada pelas mudanças no futuro.
A economia está fortemente baseada em recursos naturais dependentes do clima. As fontes de energia renováveis, a agricultura e a biodiversidade são potencialmente muito vulneráveis às alterações climáticas’.
O que fazer quando os detentores do poder, em seus devaneios, demonizam cientistas e rebaixam os órgãos em que eles fazem pesquisas?
Imagem de abertura: https://www.elnuevodia.com/
Fontes: http://mudancasclimaticas.cptec.inpe.br/~rmclima/pdfs/newsletters/Boletim_No8_Port.pdf; https://www.mma.gov.br/gestao-territorial/gerenciamento-costeiro/procosta2 https://www.mma.gov.br/images/arquivo/80182/LIVRO_PNA_Resumo%20Executivo_.pdf.