Muito do Mar Por Preservar: O Brasil Precisa Seguir criando Áreas Marinhas de Proteção Integral
Muito do Mar Por Preservar, por José Truda Palazzo Jr.
Ao me aproximar dos 40 anos de dedicação ao ativismo ambiental, recebi do João Lara Mesquita o primeiro presente para marcar esse aniversário. Um espaço regular para escrever aos leitores do Mar Sem Fim. Hoje este é o mais qualificado espaço de informação e discussão de temas marinhos – conservação inclusive – do Brasil. Para começar, gostaria de seguir explorando um tema bastante presente aqui, o das Áreas Marinhas Protegidas.
Mar protegido: as novidades
A imensa maioria das instituições e ativistas envolvidos na proposição, criação e apoio à implantação de Unidades de Conservação marinhas festejaram a criação das novas e imensas áreas protegidas no entorno dos arquipélagos oceânicos de São Pedro e São Paulo e Trindade e Martim Vaz. Mais de 11 milhões de hectares de ambientes oceânicos totalmente protegidos contra usos predatórios como a pesca e a mineração. E, em torno de 80 milhões nos quais haverá regulação dos usos para buscar sua sustentabilidade. Não é pouca coisa.
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Como sempre acontece, apareceram a posteriori os espíritos de porco para criticar a medida histórica. Dentre eles os que nunca ajudam na prática da conservação. Mas isso não reduz a importância dessas novas UCs. Se por um lado é verdade que a exclusão de uma parte das ilhas ocupadas pela Marinha, a pedido desta, deixou parte dos habitats de espécies importantes desprotegida, por outro a proteção assegurada ao entorno é de tamanha ordem que, se implementada, fará grande diferença para a biodiversidade do mar brasileiro como um todo. Para corroborar essa opinião, basta ler alguns dos muitos artigos científicos e peças de opinião escritos pelos maiores especialistas mundiais em biologia marinha e conservação. Todos defendem grandes áreas oceânicas de Proteção Integral. Quem é contra isso ou não entende nada do assunto ou não tem compromisso com a conservação.
Mar protegido e críticas burras
Uma das críticas burras que se ouviu foi que o foco nas áreas oceânicas reduziria o ânimo para a criação de mais áreas protegidas em regiões mais costeiras. Quem diz isso não acompanha o que vem sendo feito para dar continuidade aos processos de proteção do mar brasileiro. Senão saberia que mesmo durante a batalha pela criação das grandes Unidades de Conservação oceânicas, a questão das áreas mais próximas ao continente e ainda pendentes de proteção foi constantemente lembrada. Em boa parte graças à antipatia dos governos LuLLa e Dilma com a conservação, ficaram mofando nas gavetas brasilienses muitas propostas de imensa relevância. Mas os ambientalistas seguem batalhando. E esperam o breve encaminhamento para efetivação.
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Banco dos Abrolhos e a necessária ampliação
Uma dessas propostas se refere a um dos mais conhecidos e celebrados sistemas vivos marinhos do Brasil e meca do Mergulho Recreativo nacional, o Banco dos Abrolhos, maior banco de coral do Atlântico Sul. Esta é a principal área de reprodução das baleias jubarte e berçário vital para espécies de peixes já muito depredadas pela pesca – “artesanal” e industrial – no sul da Bahia.
Nesta região, o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos protege em seus 91.300 hectares alguns espaços-chave. Mas, para que o conjunto da biodiversidade regional possa sobreviver, é urgente a sua ampliação para leste. É preciso que abranja áreas de maior profundidade onde corais, rodolitos e outros organismos ainda abundam. E onde existem estoques de matrizes pesqueiras cuja proteção é vital para que a atividade continue acontecendo na costa ainda de modo saudável. Isso apesar da pressão da pesca predatória já estar chegando lá.
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Contra a ampliação de Abrolhos joga uma campanha de asquerosa má-fé de alguns acadêmicos vindos de longe. Eles perambulam pelo Sul da Bahia arengando as comunidades contra a proposta. Abusam da ignorância local. E de mentiras sobre a “proibição total da pesca na região”. É hora do ICMBio e MMA terem a coragem de enfrentar essas mentiras. E fazer o que é certo, divulgando a proposta de ampliação do Parque com limites claros. Assim, demonstrariam de maneira inequívoca que, sem essa proteção das matrizes de espécies de interesse comercial numa UC maior, aí sim é que a pesca na região vai acabar. E por falta de peixes!
Parque Nacional Marinho do Albardão
Outra proposta de enorme importância, mas numa região bem menos conhecida, é a do Parque Nacional Marinho do Albardão. Ele fica no extremo sul da costa brasileira, próximo da fronteira com o Uruguai. Ali, uma área próxima da costa com fundos marinhos consolidados abriga uma grande concentração de espécies raras e ameaçadas de extinção.
Além de servir como local de alimentação para tartarugas-marinhas e de reprodução para tubarões e raias. Incluindo os criticamente ameaçados cações-anjo e tubarões-martelo.
Porção emersa do Albardão
Na porção emersa proposta para o Parque Nacional destacam-se os concheiros. Acúmulos de conchas fósseis entre as quais restos de antigos mamíferos extintos ainda são encontrados.
E as paisagens agrestes de dunas e lagoas que podem gerar um novo polo de Ecoturismo numa região remota, muito carente de emprego e renda de qualidade. Esta é a razão pela qual é preciso não apenas avançar com a proposta, mas resistir a bobagens vindas de dentro do próprio ICMBio propondo criar ali uma Unidade de Conservação que tire o foco do imenso valor turístico do lugar.
Mar protegido: temos que avançar
É fundamental que avancemos na criação de mais áreas de Proteção Integral em mais ambientes marinhos e costeiros do Brasil. Isso se quisermos cumprir com retidão a Meta 11 de Aichi. Ela exige não apenas que se proteja ao menos 10% do espaço marinho nacional, mas também que seja feito de maneira representativa em relação aos ecossistemas. Agora, para que isso aconteça, é fundamental que continuemos pressionando e empurrando o mastodonte brasiliense para que se mexa. Fique de olho no Mar Sem Fim pra acompanhar os próximos passos dessa batalha!